domingo, 29 de abril de 2012

BORDA D´ÁGUA

Em desespero de causa, comprei o Borda d´Água, mesmo indo o ano já adiantado.

Notícas da meteorologia:
Maio - Tempo instável
Junho - Bom tempo
Julho - Frescote
Agosto - Frescote, exceto os meados do mês, que serão de calmarias
Setembro - Bom tempo no início e no final; instável pelo meio

Conclusão: Ainda haverá alguma chuva em maio, mas depois acabou-se, pois os frescotes de Julho e Agosto são apenas isso, como aliás no ano passado. Mas não levem isto demasiado a sério, pois hoje estava previsto sol intenso!

Vamos ter chuva para criar os legumes e frutos da Primavera, mas não acredito que chegue para recuperar os lençóis de água e fazer correr as nascentes, durante o Verão.
Melhor que nada!


E para festejar, flores da Primavera. As do costume, mas sempre lindas.




sexta-feira, 27 de abril de 2012

O Zé não era

O meu pai contava aos filhos a mesma lengalenga que o Ernesto Hipólito aqui publicou a 22 de abril, mas numa versão diferente:

Era uma vez,
o Zé não era,
que andava na serra,
com os bois de bogalho
e o arado de palha.
Recebeu a notícia,
que tinha o seu filho morto
e o seu pai p´ra nascer.
Deitou os bois às costas
e o pôs o arado a comer.
Chegou lá à frente,
encontrou uma vinha carregada de melancias,
atirou-se a elas
e comeu-as todas.
Mais adiante,
encontrou um meloal cheio de uvas,
deitou-se a elas
e comeu-as todas.
Veio de lá o dono
«Ai seu patife! Ai seu maroto!»
Atirou-me com uma beringela ao joelho,
Dei-lhe cabo do tornozelo.
Eu atirei-me a ele
e ele a mim
e como eu era mais forte do que ele,
atirei com ele para cima de mim.
E eu fiquei debaixo dele
e ele debaixo de mim.
Debaixo de nós estava um ninho de magafos,
magafos, magafaguinhos,
morreram os magafos
e ficaram os magafaguinhos.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Chuva!

Após quase uma semana de ameaças, finalmente começou a chover, hoje, depois do almoço. Confesso que já tinha saudades de ver a chuva cair! Os próximos dias prometem mais.
Bendito 25 de Abril.

Estava para colocar aqui os "Índios da meia praia", do Zeca, canção que vem na linha da publicação de ontem (fazermos as coisas, sem esperarmos que as façam por nós), mas o Google mudou a configuração do blogue e ainda não consegui colocar um vídeo.
Vão vocês ao Youtube e encham a barriga: José Afonso, Fausto, José Mario Branco, Sérgio Godinho, Adriano Correia de Oliveria...
Há por lá muita coisas velhinha (1974/75) que vos vai surpreender!

terça-feira, 24 de abril de 2012

25 de Abril: generosidade, criatividade...

Amanhã comemora-se o 25 de Abril e nada melhor do que recordá-lo com este texto do Daniel Oliveira, publicado no Expresso on-line. A experiência da Escola da Fontinha tinha muito do que foi ou queríamos que tivesse sido o 25 de Abril.

Escola da Fontinha: just do it
Daniel Oliveira(www.expresso.pt) 8:00 Terça feira, 24 de abril de 2012

A Escola da Fontinha era um edifício abandonado durante cinco anos, usado por toxicodependentes. Como é num bairro pobre, nunca Rui Rio se preocupou com isso. Um dia, um grupo de cidadãos resolveu fazer o que a Câmara não fazia: dar um uso àquele espaço. Arranjaram, limparam, pintaram. E durante um ano aquele edifício abandonado foi usado pela comunidade: atividades culturais, acompanhamento escolar para os miúdos, aulas. As pessoas que ali trabalharam faziam-no de graça. E isso Rui Rio nunca entenderá. Muito menos a ideia de um grupo de cidadãos se juntar, na "sua" cidade, sem a sua superior autorização, para fazer alguma coisa pelos outros. Muito menos para desenvolver qualquer tipo de atividade cultural que não passe pelo seu crivo provinciano. Rui Rio matou a vida cultural do Porto, transformando uma das mais vibrantes cidades portuguesas numa pequena cidade de província. Porquê? Porque Rui Rio é um verdadeiro autoritário. Abomina a liberdade dos outros, a criatividade dos outros, a opinião dos outros.

Mas a Escola da Fontinha carregava outro perigo: ao usarem uma ruína da incúria do poder local para fazerem qualquer coisa de útil para os outros, coisa que todos os vizinhos agradecem e aplaudem, aquelas pessoas exibiam, sem terem de abrir a boca, a negligência do presidente da Câmara. E passavam uma mensagem que Rio não aguenta: se quem te governa não cumpre, faz tu. Muito menos quando quem o faz não procura o lucro. O despejo violento de gente que usa um espaço abandonado, ao qual o Estado se recusa a dar uso, para ajudar a comunidade, é um excelente retrato da cultura política e cívica, o poder do Estado português. Não serve para servir a comunidade. Serve para impor a vontade do governante. E para exibir o seu poder, não se importa de deixar um edifício emparedado no lugar onde alguém fazia alguma coisa de útil.

O gesto autoritário do presidente da Câmara, injustificável aos olhos de qualquer pessoa com o mínimo de sentido cívico, faz todo o sentido: não é Rui Rio que serve o Estado para este servir os cidadãos. É o Estado que serve Rui Rio para os cidadãos se vergarem ao seu poder. Querem saber porque somos um país atrasado e subdesenvolvido? Porque admiramos a autoridade de homens como Rui Rio.
Como se a força bruta fosse a única forma de poder que entendemos.

Do meu lado, aqueles que fizeram a Escola da Fontinha só podem merecer o respeito, admiração e solidariedade. Eles são, com a sua vontade e generosidade, quem pode fazer deste país uma sociedade decente. Rio, na sua soberba autoritária, é apenas um reflexo da estupidez arrogante do poder que nos atrasa há séculos. E não encontro melhor data para escrever este artigo do que o dia 24 de abril.

domingo, 22 de abril de 2012

História da minha avozinha

Ernesto Hipólito

A minha avó Maria do Carmo contava-me histórias, para eu adormecer.

Andando na serra lavrando com os bois
Notícia me veio que o meu pai era morto e minha mãe por nascer.
Eu logo vi que isto não podia ser
Agarrei nos bois às costas, dei-lhes o arado a beber.
Subi por uma rua abaixo e encontrei uma aboboreira carregada de maçãs
Fui-me a ela e colhi romãs.
Eis que chega o dono e diz-me:
Ó homem de faval alheio
Quem o manda colher os meus pepinos?
Atirei-lhe com uma nêspera ao pescoço que lhe fiz deitar sangue dum tornozelo.


Nota:
Este texto foi escrito ao abrigo do acordo ortográfico celebrado em 1958 entre mim e o saudoso Professor Artur Eugénio Couto a quem presto as minhas homenagens.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

O nosso falar: pringuero, bacalhoeiro...

Eu aqui poupadinho, a economizar na lista de palavras que vou relembrando e estes amigos, na última publicação, gastaram-me logo uma catervada delas.
O Zé Barroso recordou-nos o Tchalim, defendido pelo irmão, que punha a cabanir a criançada mal educada. E ainda a Caruca que lhes chamava pangalunos.
O Chico Barroso disse que o Ernesto Hipólito era um grande pringuero e o Ernesto chamou-lhe bacalhoeiro.
Assim, a gastar a artilharia toda duma vez, como querem aguentar este blogue por muitos anos?

Ri à gargalhada quando o Chico me recordou a palavra pringuero (preguiçoso). Bacalhoeiro existe, mas é um barco de pesca do bacalhau, um negociante de bacalhau ou um grande apreciador do fiel amigo. O nosso bacalhoeiro é uma pessoa que conta tudo, mesmo o que é suposto ser segredo!

Mas o Chico tem razão! Eu, tal como ele, passámos pouco tempo na Vila, divididos entre o Seminário e as encostas da Gardunha. Depois partimos. Por isso, há muitas vivências da nossa comunidade que nos passaram ao lado. Ora o Zé Barroso e o Ernesto Hupólito, e muitos outros, estiveram quase sempre no coração da Vila, entre a Praça do Ernesto e a Fonte do Zé.
Um abraço para os três.

Catervada vem de caterva: uma multidão, um grande número. O sentido é o mesmo, só alongámos a palavra.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

O nosso falar: cabanir, pangaluno…

José Barroso

A propósito do Tchalim… a Caruca e o Muda’torre
Também eu não recordo o verdadeiro nome dele, do Tchalim (a).
Nem o nome do irmão que, com deficiência física nos pés, era um artista com as mãos, como sapateiro.
Lembro-me, sim, que este defendia o outro, o Tchalim, energicamente, contra a estupidez da canalha, que eram muitos de nós. Sim, tínhamos muitas vezes, nas nossas brincadeiras, tanto de bom e inocente como de desprezível!! Éramos muito duros com o pobre do Tchalim. As crianças, diz-se, são cruéis. Talvez porque dizem a verdade como a vêem e sentem…
E quando o Tchalim aparecia, com o seu andar trôpego de espasmos involuntários, os seus esgares, de olhar vazio, inexpressivo e a babar-se, parecia-nos algo de demoníaco. Todos nós temos um lado nobre, mas também um lado pérfido; ou, como diria o Rui Veloso, “a nossa face negra (e) nem eu, nem tu, fugimos à regra”. É preciso controlar este lado mau. Mas…eis, pois, muitas vezes, quando a desgraça bate à porta de alguém, vem ao de cima a nossa faceta hedionda: “Se Deus o marcou, algum defeito lhe achou”.
Em vez de sermos afáveis, procurando compreender o mal e a dor dos outros, como no caso do Tchalim, acirrávamo-nos ainda mais e atirávamos, sem dó:

- Tchalim, tchalota, abre o cu e fetcha (b) a porta!!

Mas se o irmão ouvia, vinha a terreiro defendê-lo:

- Andem cá que vos coço, corja de malandros!! Ponham-se daqui a cabanir (c) !!!

Fugíamos a sete pés! Não que o pobre do homem, com as suas dificuldades de locomoção, pudesse fosse o que fosse contra nós, que éramos ágeis no correr, mas porque (sempre) se tratava de um adulto e, sobretudo, porque estávamos cientes do mal que fazíamos.

E isto não se passava só com o Tchalim. O mesmo sucedia com outras pessoas, normalmente, as mais desprezadas ou porque tinham uma qualquer mazela ou porque eram de uma pobreza extrema. Era (e é) a comunidade de iguais, impassível, a excluir os estanhos, aqueles com os quais não se identifica, atitude que, parecendo insignificante, tantos dramas tem custado à humanidade. Por isso, quase inevitavelmente, tinha que acontecer também com a Caruca (d) (a quem também chamávamos A Que Fuma) e com o Muda’torre.

Quanto à primeira, não faço, hoje, mais uma vez, a mínima ideia do seu nome. Só sei que era uma mulherzinha muito pobre de aspecto andrajoso e que, segundo penso, vivia quase só da esmola alheia ou de pequenos expedientes. Mas, nós, a canalha, com a sua insensibilidade e crueza, inquietávamo-la e chamávamos-lhe nomes ofensivos:

- Caruca!! Que fuma!! Caruca!!

Ela alçava o braço, fingia que apanhava uma pedrita para nos atirar e ripostava:

- Pangalunos (e)!! Caruca é a vossa mãe!! Pangalunos!!

Fugíamos ao menor gesto dela, para depois voltarmos a investir.

- Caruca!! Olha os 50 escudos!!

Foi assim a história dos 50 escudos:
Um dia soou pela vila que ela se teria apoderado indevidamente de dinheiro alheio, uma nota de 50 escudos. Talvez em casa de alguém que, incauto, lhe franqueou as portas. 50 escudos, à época, era dinheiro!!!
Tanto quanto me lembro, a Caruca terá ido ao Posto da Guarda (GNR) e lá teriam tentado que confessasse o furto, procedendo os guardas a uma pequena revista. Mas, ela, com o fito de esconder a nota, tê-la-á metido no ânus, muito bem dobradinha!!
Nunca vim a saber se o episódio do furto terá tido algum fundamento de verdade. O que, para o caso, também não interessa.

No que toca ao Muda’torre (Mudo da Torre), também nunca soube o seu verdadeiro nome. Porém, como indica o epíteto, era um homenzinho mudo, residente na Torre (Louriçal do Campo), que aparecia na vila a pedir esmola. O que, naturalmente, acontecia, com mais frequência, em épocas festivas ou aos domingos.

Um de nós (dos mais velhos) acenava-lhe com uma moeda de 5 tostões, escrevia num papel umas garatujas sem significado, fazia-lhe sinal e dizia, apontando o papel:

- Lê;

E ele, que era analfabeto e, coitado, não tinha voz, lia:

- Guaguum, guaguum, guaguum;
- Guaguum, guaguum, guaguum;

Expondo-se, humilhando-se e exibindo a sua miséria, para gáudio geral… E lá levava os 5 tostões da esmola…

Mas às vezes acabava-se-lhe a paciência ou - travessura das travessuras - negavam-se-lhe os prometidos 5 tostões e, de tanto o chatearmos, corria atrás de nós, brandindo o varapau que sempre o acompanhava, emitindo os seus sons guturais, impossíveis de entender:

- Guaguum, guaguum!!! Em tom de ameaça, como que a querer dizer qualquer coisa que sabíamos ser algo, para nós, desagradável, mas que não podíamos decifrar.

- Guaguum, guaguum!!!, com o varapau no ar!!! E fugíamos em debandada para, em seguida, voltarmos à carga!

Tenho imensas saudades de ti, Tchalim, de ti, Caruca e de ti, Muda’torre !! Oh ! Se tenho!!!

(Escrevo com ortografia anterior ao actual Acordo).


Notas:
(a) Tchalim: Julgo que o termo procura interpretar o tremelicar constante daquele homem, por causa da sua doença, uma disfunção neuro-motora.
(b) Fetcha: fecha; do verbo fechar.
(c) Pôr-se a cabanir: pôr-se a andar; afastar-se de certo local; não encontrei sinónimo nos dicionários.
(d) Caruca: tenho a noção que esta palavra é o mesmo que “velha”, “caduca”; mas não a encontrei nos dicionários on line com este significado;
(e) Pangaluno: trata-se de um termo ainda hoje usado que, localmente, significará qualquer coisa como “valdevinos” ou “vagabundo”; não encontrei sinónimo nos dicionários portugueses.