Há dias nem sequer me dei ao trabalho de
responder a um comentário da Libânia em que (mostrando a sua grande
ignorância), afirmava que o Borda d´Água não fazia alusão às nossas
festas e feiras. Fiquei então a saber que ela nunca o deve ter lido, porque nas
páginas 20 e 22 dessa folhinha, na secção festas e feiras, lá está
escrito 3.º Domingo de Janeiro e 3. º Domingo de Setembro, S. VICENTE DA
BEIRA.
Esta deve ser daquelas que
transplanta as cenouras enterrando-lhe a rama, ficando a cenoura de fora!
Mas não era disto que eu queria
falar; foi só um desabafo de uma pessoa ofendida.
Nos anos cinquenta, além dos mercados
mensais que ainda hoje se fazem, havia também duas grandes feiras em S. Vicente
da Beira. Eram a feira de Janeiro como era conhecida, pendente da Festa de São
Vicente (22 de Janeiro), e a feira de Setembro que coincidia com as Festas de
Verão no terceiro Domingo desse mês.
Eram feiras de grande nomeada que
atraíam muita gente das redondezas e em que além dos tendeiros normais
também havia gente do povo a vender. Eram os agricultores que vinham vender ou
comprar gado; esses agricultores vendiam também os produtos das suas colheitas
tais com o feijão pequeno, o feijão grande, o grão, os alhos, as cebolas etc.
Vinha o cesteiro que enquanto vendia uns
cestos ia fazendo outros. Os oleiros vinham com as suas carroças carregadas de
talhas, alguidares, cântaros e cântaras, caçarolas, tachos etc.
Havia também os quinteiros que vinham
vender os leitões galinhas e pitos que lhe sobravam e que muitas vezes trocavam
por produtos que faziam falta.
Para a cachopada era dia de festa.
Lembro-me que numa feira de Setembro o meu pai me comprou uns sapatos muito
bonitos que iriam servir para aquelas festas e por aí adiante. Com o entusiasmo
do dia achei que devia estrear logo os sapatos e fui jogar à bola. À noite o
meu pai deu-me um jeito na roupa. Bem o merecia. Hoje seria violência
doméstica!
Noutra vez, deu-me vinte e cinco tostões
(uma fortuna), para gastar na feira e nas festas. Com a moeda na mão,
fui direitinho à taberna da Viúva e gastei tudo em amendoins. Fiz a festa
toda logo nesse sábado.
Numa dessas feiras, uma velhota foi
vender um leitãozito muito enfezadito que andava a criar.
Sentou-se na primeira escada do balcão
da cadeia com o animal ao lado, na esperança de o conseguir impingir. Era no
tempo da miséria e muita gente não tinha dinheiro para comprar ou mandar fazer
roupa interior e por isso simplesmente não usava.
A velhinha era pobre e, ao
sentar-se, ficou descomposta. Passaram então dois rapazes já espigadotes e um
deles, vendo a velha naquele preparo, vira-se para ela e pergunta:
- Oh Tiazinha, quanto é que vale o
seu arrepiado?
A velha, muito desempenada,
olha para o rapaz com má cara e responde-lhe:
- Arrepiédo não, que já hoje mamou
duas caldeiradas!
E.H.