quinta-feira, 16 de abril de 2015

Os Correios



Naquele tempo, reinava em Portugal D. Manuel I, o rei venturoso. Valido do vicentino D. Álvaro da Costa, que muito novo partiu para Beja, onde se tornou moço de câmara do então duque de Beja. Mais tarde foi cavaleiro da casa real, como moço de guarda-roupa, e armador-mor. O museu da Santa Sasa da Misericórdia de Lisboa possui um quadro onde aparece um homem de barbas brancas, essa figura é o vicentino D. Álvaro da Costa...
Mas estou a fugir ao pensamento que quero explanar.

Decorria o ano 1520, quando o rei criou  o correio português. Nesses tempos as comunicações entre os povos eram muito difíceis, carruagens, cavalos, a pé.
Durante muitos anos, o selo mais banal que havia era um cavaleiro montado num cavalo galopando, que tocava uma corneta anunciando, desta maneira, a chegada do correio.
Peregrinos, viajantes, almocreves levavam  mensagens que entregavam  às pessoas a quem se destinavam
O rei e os nobres necessitavam de uma comunicação regular, nasciam os correios. Nessa altura, o monarca cria o cargo de correio-mor que era a pessoa responsável pelo funcionamento e escolha de gente séria, honesta...
Na vila vicentina, os correios surgiram nos anos quarenta do passado século. Hipólito Raposo foi um dos responsáveis pela sua implantação na vila.
Estavam sediados no R/C da Domus Municipalis; era composto pelo chefe da estação (quem não se lembra do senhor Manuel dos Correios), telefonistas e carteiros.
O senhor José Alves "Zé Tôno" ia todos os dias à estação de Castelo Novo
levar e trazer o correio. Estou a vê-lo a cavalo,  na sua carroça carregada com os sacos que traziam a correspondência, encomendas; caixas de peixe (sardinha, carapau, chicharro) Óles acima, a caminho da vila. A sua esposa a prima Palmira "sardinheira"  andava pelas ruas da vila apregoando o carapau "fesquinho"... A senhora Ilda "sardinheira", a senhora Maria de Jesus, esposa do senhor Adelino "pinura" vendiam na vila também
Dos correios da vila partiam várias pessoas  com as sacas que levavam as cartas a todas as aldeias anexas.
A Ti Maria (chamiça) mais o marido aproveitavam e vendiam a sua caixa de sardinhas; faziam o mesmo o António Bróxa, o Luís Matias e outros. Percorriam as povoações, caixa de carapau e sardinha, às costas; vida dura... À vinda, agarravam no boxeiro  apanhavam torga e faziam carvão que era depois vendido na vila. Zé Nicho, ti Aires da Tónha...foram carvoeiros também.
O primeiro carteiro que houve na vila chamava-se Cipriano.
Sempre me lembro do senhor Joaquim (mestre), o homem da senhora Zézita. O meu pai era assinante do jornal "Beira Baixa" que eu lia com muita atenção. Outros houve, entre eles o senhor António do Ninho
Mais tarde, o serviço de transporte do correio passou a ser feito pelo senhor Domingos Matias que o levava para Castelo Branco.
Nos nossos dias, este serviço está a cargo da Junta de Freguesia, situando-se ma esquina da Rua Velha com a Rua do Quintalinho.

J.M.S

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Big Brother



A documentação que passo a transcrever consultei-a no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, no fundo da Câmara Eclesiástica de Castelo Branco, Visitações, Maço 2094. Tem visitações de 1754 a 1770, referentes às povoações da parte norte do atual concelho de Castelo Branco e às povoações do atual concelho do Fundão a sul da Gardunha. A parte que se apresenta é apenas referente à paróquia de São Vicente da Beira e as nossas anexas parecem ter sido poupadas/ignoradas, talvez porque desse muito trabalho ir lá e porque os delatores desconheciam o que lá se passava.
Periodicamente, um representante do bispo da diocese, neste caso da Guarda, percorria as paróquias fiscalizando toda a vida religiosa e deixando conselhos aos párocos com vista ao aperfeiçoamento do seu trabalho. Eram as Visitações Episcopais, que, como vamos constatar, também atuavam na área dos costumes, tentando moralizá-los.
O clérigo chamava pessoas da povoação, uma de cada vez, fazia-as jurar sobre os Santos Evangelhos e depois inquiria-as sobre as escandaleiras que por lá se passavam. E registava tudo, por escrito.
Adivinha-se, pelas notas, uma estreita colaboração entre poder temporal e poder espiritual, embora por vezes pareça que as recomendações caíam em saco roto.

1754

Marianna, solteira, filha de Ellena Gonçalves, amigada com Joaquim Joze Sobral.

Maria, a do Marco, amigada com Antonio Velho, solteiro.

Marianna, solteira, filha de Francisco de Azevedo, amigada com Joaõ Baptista Nogueira.

O Doutor Manoel Tavares da Cunha e juiz de fora, amigado com Felicia, filha de Francisco de Azevedo.

Maria de Tavora, consentidora de suas filhas.
(Notas: presa; morta)

Maria de Tavora, a predita, por má-língua e comungar depois de almoçar e por não ouvir missa.

Manoel de São Tiago, filho do Capitão Antonio Velho, amigado com Maria de Souza.

Maria de Souza, a predita com o predito.

Martinho da Costa, alcoviteiro do juiz de fora.

Maria Lopes, mulher de Gaspar Simoes, amigada com Francisco Nunes Galecho.

Maria, mulher de Antonio Francisco, filha de Ellena Gonçalves, consentidora de sua irmã Leonor.

Maria da Assunçaõ, mulher de Joaõ Roiz, soldado, amigada com Francisco Duarte, filho de Manoel de Carvalho.

1755

Maria Gaspar, viúva, amigada com Christovaõ Correa.

Maria, solteira, filha do predito Christovaõ Correa, amigada com Joze, solteiro, filho de Joaõ Nunes, e com Joaõ, solteiro, filho de Antonio da Costa.

Manoel Soares e sua mulher Maria Antunes, por darem casa de alcova e más-línguas.

Martinho de Andrade, solteiro, filho de Manoel de Andrade, amigado com Marianna de Azevedo, solteira, filha de Francisco de Azevedo.
(Nota: morta)

O Doutor Manoel Tavares Falcão, solteiro, juiz de fora desta vila, amigado com Felicia, solteira, filha de Francisco de Azevedo.

Maria de Tavora, mulher de Francisco de Azevedo, consentidora de suas filhas.
(Notas: presa; morta)

Maria da Assunçaõ, mulher de Joaõ Nunes, amigada com Francisco Duarte Çapateiro, solteiro.

Maria Lopes, mulher de Gaspar de Oliveira, amigada com Francisco Nunes Galecho.

1746

Maria Mendes, solteira, amigada com seu futuro esposo e parente em 3.º ou 4.º grau, Valentim Roiz, solteiro, filho de Francisco Roiz.
(Notas: seja presa; livrou-se no ano de 1761)

Maria Christovaõ, solteira, filha de Christovaõ Correa, amigada com Caetano, solteiro.

1747

Maria de Tavora, viúva de Francisco de Azevedo, por consentimento de sua filha Rita
(Notas: livre-se presa, morta)

Maria Christovaõ, solteira, filha de Christovaõ Correya, amigada com Caetano, solteiro, filho de Antonio da Costa Cabral.

Manoel de Saõ Tiago, solteiro, soldado, filho do Capitaõ Antonio Velho, amigado com Maria de Souza, solteira.


1750

Maria Christovaõ, solteira, amigada com Caetano da Costa.

1751

Maria Mendes, mulher de Antonio Francisco, amigada com Br.do(Bernardo?) Joze Carpinteiro.

Maria Christovaõ, solteira, amigada com Caetano da Costa Cabral, casado.

Maria da Costa, mulher de Manoel Lourenço Tecelaõ, alcoviteira
(Nota: foi admoestada)

1753

Macario Nunes, casado, bêbedo
(Nota: pagou 200 réis)

Mathias, solteiro, filho de Soares, bêbedo.

Maria Christovaõ, solteira, amigada com Caetano da Costa, casado.
(Nota: condenada a degredo)

1754

Padre Manoel de Almeida, amigado com Roza, solteira, filha do Doutor Miguel Henriques.

Maria, solteira, filha de Joaõ Alves Leitaõ, amigada com o Padre Joze Cabral.

Margarida Simoa e seu marido Joaõ Alves Leitaõ, consentidores da sua predita filha.

Maria dos Santos, mulher de Francisco Duarte Çapateiro, amigada com Joze Nunes, solteiro, filho de Joaõ Nunes.

Maria Roiz(?), viúva, natural do Ninho do Açor, amigada com o seu amo, o Padre Pedro Dias Jacome.
(Nota: condenada a sair de casa no prazo de 8 dias).

Maria, solteira, filha de Christovaõ Correya, amigada com Caetano da Costa Cabral.
(Nota: seja presa)

Maria Rita e Felicia, irmãs, filhas de Francisco de Azevedo, incestuosas com Joaõ Correya, solteiro, barbeiro.
(Nota: não o podem admitir em sua casa, sob pena de ser comprovado o incesto)

1755

Maria, solteira, filha de Joaõ Alves Leitaõ Barbeiro, amigada com o Padre Jozeph Cabral.

1756

Maria Christovaõ, solteira, filha de Christovaõ Correya, amigada com Caetano da Costa Cabral, casado.
(Nota: seja presa)

Maria Leitoa, solteira, filha de Joaõ Alves Leitaõ e Margarida Simoa, amigada com o Padre Joze Cabral.

Margarida Simoa, mãe da predita, por consentidora.

Maria da Costa, mulher de Manoel Lourenço Tecelaõ, amigada com Joze Antonio, solteiro, filho de Manoel Mendes Mouco.

1758

Maria de Proença, solteira, filha de Francisco de Proença, na má-língua
(Nota: pagou 400 réis)

Maria Antunes, ou Nunes Galega, casada, na má-língua.
(Nota: pagou 300 réis)

1760

Maria de Proença, solteira, amigada com Joaõ de Menezes, ou Roiz, casado, pedreiro.

1762

Manoel Coelho, solteiro, filho de Francisco Coelho, amigado com Angela Maria, mulher de Antonio de Moura.

Maria Candia, mulher de Luis Antonio, amigada com Antonio da Costa Pedreiro.

Maria Christovaõ, solteira, filha de Christovaõ Correa, amigada com Caetano da Costa Cabral.

1764

Maria dos Sanctos, mulher de Francisco Duarte de Corre…(?), amigada com Joze Pinto, casado.

Margarida Simoa, viúva de Joaõ Alves, por admitir em sua casa Joaõ Proença Gracia, solteiro.

Maria Barbara, solteira, incestuosa com Joaõ Pereira(?), solteiro.

Margarida Simoa, mãe da predita, consentidora dela e de suas irmãs.

1766

Maria Barreiros, solteira, amigada com o Padre Paulo.

1767

Maria Joaquina, casada, amigada com Eleuterio da Costa, solteiro.


Prometo não voltar a espreitar pelo buraco da fechadura da História. Mas este material tem que se lhe diga! Desde logo por um conhecimento mais completo da vida no passado, que às vezes idealizamos ou diabolizamos, sem conhecer.
Falta um estudo mais aprofundado, para se perceber bem como é que atuava a justiça temporal, ao receber as denúncias do enviado do bispo. Mas vamos ficar por aqui, até porque algum do material que eu queria consultar foi retirado, por estar em mau estado.
Agora já percebemos melhor a origem de muitas das crianças abandonadas na Roda! Numa primeira sensação, parece-nos que havia imensa gente envolvida nesta vida mais dissoluta, mas depois de uma breve reflexão percebemos que, na realidade, eram muito poucas as pessoas que vivam “em pecado”.
Quatro padres a viver amigados. Mas são “apenas” metade dos sacerdotes da paróquia e um homem não é de pau! Para os que não sabem, a castidade nos sacerdotes não é um princípio religioso, mas apenas uma regra disciplinar.
Também dá para perceber que, quando o casamento não resultava, embora não houvesse divórcios como agora, as pessoas já se separavam e cada um tratava da sua vida.

José Teodoro Prata

sexta-feira, 10 de abril de 2015

Una saeta



Na Segunda -Feira de Pascoela , em conversa com um amigo espanhol, surgiu o tema da Semana Santa. Estive então a explicar-lhe, com a ajuda deste blogue e das fotos nele publicadas  dias antes, como era a Semana Santa em São Vicente. Esse amigo, depois de ver as imagens e o sofrimento que delas emanava, disse-me o seguinte:
- Eu desde sempre quis ir a Sevilha ver a Semana Santa até ao dia em que ouvi o poema de António Machado "La Saeta". Tu já o ouviste?
- Eu já ouvi falar do António Machado, através do Patxy Andion, mas dele não conheço nada.
Claro que fui logo ver o que se passava e primeiro que tudo descobri que "saeta" são as canções sevilhanas que se dedicam  às imagens, quando passam nas ruas, durante as procissões. Depois estive a ouvir o poema-canção.
É aqui que eu tenho a certeza absoluta que vocês vão dizer: - Lá vem este chato outra vez!
Correndo esse risco, vou traduzir para Português, porque o Zé Teodoro comentou da outra vez (Paco Bandeira) que as pessoas hoje não tem vagar para estas coisas, o que é verdade.

A SAETA DOS CIGANOS

Diz uma voz popular:

Quem me empresta uma escada
Para subir ao madeiro
Para tirar os cravos
A Jesus Nazareno

A Saeta ao cantar
Ao Cristo dos ciganos
Sempre com sangue nas mãos
Sempre por desencravar

Cantar do povo Andaluz
Que todas as Primaveras
Anda a pedir escadas
para subir à cruz

Cantar da minha terra
Que deita flores
Ao Jesus da agonia
E é a fé dos meus maiores

Só não és tu o meu cantar
Não posso cantar NEM QUERO
A esse Jesus do madeiro
Mas ao que andou sobre o mar

Fiquei então a saber que este meu amigo prefere o Cristo vivo e glorioso ao Cristo sofredor e por fim morto.
Ainda não voltei a falar com ele, mas pensei que seria um bom tema para os nossos teólogos e filósofos que, ultimamente, têm andado tão calados neste nosso blogue. Daqui lanço o desafio.
Quero só salientar que António Machado faleceu em 1939, o que faz refletir sobre o que se pensava já naquela época.

O tema cantado quero dedicá-lo ao Francisco Barroso (cá por causa de umas couves).

E. H.

quarta-feira, 8 de abril de 2015

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Cerejeiras em flor

A borboleta e a flor






Nota: Este ano há muita flor. Como, infelizmente, a chuva desta semana será só basófias, está garantida uma boa produção (se entretanto não vier chuva aquando da maturação).

José Teodoro Prata