sábado, 3 de março de 2018

Campanha do azeite


Estamos no início de Março e claro a campanha da azeitona/azeite está a terminar...



Roda do lagar do Major


Nesta época do ano, mês de novembro e princípios de dezembro, com alguma variação das condições climatéricas, os campos enchem-se de uma enorme agitação com ranchos familiares, amigos e vizinhos para fazerem a apanha da azeitona. 
Estamos no ano de 1980, eu com 10 anos, todos os dias ia levar o almoço e jantar ao meu irmão Fernando que, com 13 anos, trabalhava no lagar do sr. Major, mesmo ali ao lado da horta do meu avô.
Era um lagar muito bem equipado e com  um dos melhores acessos. O mestre era o sr. António Rodrigues (da Rosa) e mais três lagareiros: o Lino (homem da Ramos), o Tó Relojoeiro e o meu irmão Fernando. O ganhão era o sr. João da Resgate, sempre com o carro de bois a transportar a azeitona dos  ditos ranchos que andavam colher a azeitona.
O Lino era um homem com uma força bruta, quando chegava a azeitona em enormes sacas que chegavam a pesar cerca de 100 Kg, era ele que subia aquela escada para o piso superior onde se encontravam as tulhas.
O lagar trabalhava 24 horas sobre 24 horas, nos períodos em que havia mais stock da matéria-prima. Os lagareiros dormiam no lagar  durante toda a campanha.
Quando ia levar o almoço ao meu irmão Fernando, entrava no lagar e aquele cheiro intenso e o calor da fornalha... Hoje digo que eram mesmo momentos mágicos que nunca vou esquecer. Almoçavam todos juntos, mas sempre alguém com atenção à rotina do lagar. Adorava explorar todos os cantos, mas com a autorização do mestre, e até ia deitar azeitona no pio, o que se fazia pelo piso superior.
O mestre sempre na sua zona a controlar todo o trabalho dos lagareiros e a gerir a separação do azeite para as tarefas e medir o azeite dos clientes para as vasilhas que eram do lagar. O ganhão também tinha a responsabilidade de entregar o azeite aos clientes que depois devolviam as vasilhas. 
Havia sempre homens que provavam as tradicionais tibornas e que eu também comia. Eram deliciosas! Um belo pedaço de pão torrado na fornalha e mergulhado no azeite, era uma delícia.  
No final do século XX, o método tradicional de produção de azeite sofreu grandes alterações. As novas tecnologias levaram ao processo de transformação contínuo, tendo-se assistido, também, à mecanização na apanha da azeitona, ainda que em alguns locais continue a ser efetuada manualmente. 
          As forças políticas desta maravilhosa vila e a cidade de C.B. nunca pensaram em realizar um verdadeiro museu, aproveitando este belo lagar.
Em jeito de conclusão: Vale a pena pensar nisto...


Pio


Prensas


Tulhas

Nota: A foto da roda do lagar é da minha autoria e as restantes foram retiradas da net.

Jaime da Gama

3 comentários:

José Barroso disse...

Muito interessante este texto do Jaime da Gama. Faz recordar os tempos da apanha da azeitona e da produção do azeite. E as tradicionais tibornas do pão torrado na fornalha e depois molhado em azeite! Este produto foi, na época, talvez o mais importante na economia local, a par da floresta.
Sá acrescento isto: no lagar do Major, a energia para mover as galgas (pedras) do pio que esmagavam a azeitona, era hídrica. Tal como em todos os outros lagares da vila. Ou seja, era a força da água que movia a roda externa (tal como a fotografia) e que a transmitia às galgas, através de um eixo.
Mas as prensas já eram hidráulicas, o que significa que já havia um motor "diesel" (a gasóleo), para fazer de compressor.
Nesta última, residia a diferença entre o lagar do Major e os outros lagares. Pois os outros ainda tinham prensas de vara. E por essa diferença (e só por ela), chamávamos ao lagar do Major "a fábrica". Não se pode explicar aqui o sistema da prensa de varas. Uma coisa é cefrta: é muito simples e compreende-se com grande facilidade num qualquer site da Internet.
A ideia do museu é excelente. É o que se faz em em todas as terras! Mas em S. Vicente da Beita há muitas coisas difíceis de entender!... Na minha opinião o museu devia ser de um lagar de varas e não hidráulico porque o sistema é muito mais antigo! E o melhor era o lagar das passadouras (uma maravilha!). Todo o mecanismo, mesmo em rodas dentadas, era em madeira!! Não vi lá uma única peça metálica! A não ser, com certeza, os pregos das sonaves! Não sei como hoje está! Mas gostava de ver!
Abraços.
JB.

José Barroso disse...

Mas, já agora: ainda quanto às "couves extremas", a Libânia veio lançar a dúvida (que eu já tinha) sobre o caso, ao escrever "estremes" (que eu pensava ser um regionalismo). E também há o termo "estremas".
"Extremo" quer dizer, grosso modo, o ponto mais distante, o último. Daí que, em tempo de fome, julgava eu, comiam-se as couves numa situação extrema, última, de necessidade.
"Estrema", por sua vez, quer dizer fronteira, raia, limite. E aqui também tive dúvida sobre qual o termo utilizar no título, por causa desta ideia de "limite".
"Estreme" quer dizer muito puro, sem mistura, selecto.
Ora, nestas condições, apesar do meu comentário anterior (inserto no respectivo post), opto agora pelo termo "estremes". É o mais adequado, quiçá, o correcto. Agradeço à Libânia ter levantado a questão porque, apesar da dúvida que tinha, sem isso, não teria ido pesquisar melhor. É esta a riqueza da língua portuguesa.
Abraços.
JB.

José Teodoro Prata disse...

Entrava neste lagar uma vez em cada campanha, não como o Jaime que ia lá todos os dias. E não era todos os anos, foram poucos.
Mas também nunca esqueci o cheiro intenso a azeite e o sabor da tiborna que o meu tio Joaquim Nicolau (Pique) me oferecia, de uma fatia de pão cortada a todo o comprimento da regueifa (raio, pois a regueifa era/é circular).