quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

O nosso falar: lareta e bacalhoeira

Uma aluna minha teve uma atitude que a minha mãe classificaria de lareta. E saiu-me, tendo em seguida de lhe explicar o que era, pois nunca ouvira tal palavra.
Lareta era uma rapariguita esperta, alegre e algo atrevida. Consultei um dicionário online que me informou significar esperta e também que recolhera essa informação no Fundão. Lá está, a nossa cultura comum da Gardunha!
Mas um outro site dizia que é uma pessoa incapaz de guardar um segredo, pessoa palavrosa que conta tudo a todos. Ora para essas o nosso termo é bacalhoeira, palavra bastante depreciativa para a pessoa a quem é dirigida, pois é o mesmo que lhe chamar grosseira, o significado que lhe dá outro dicionário online.
Bacalhau com todos até se compreende, mas lareta?! De onde virá?

José Teodoro Prata

2 comentários:

M. L. Ferreira disse...

É um termo a que acho muita graça, quando o oiço, ainda agora (e oiço-o muitas vezes aqui no Casal), mas não deve referir-se a uma característica abonatória da pessoa a quem se dirige; agora, mas principalmente no tempo em que eu era criança e adolescente. Muitas vezes me mandaram calar quando me metia na conversa dos adultos ou tinha curiosidade em perceber qualquer assunto que, como diziam, não era para a minha idade. Chamavam-me lareta, metediça, curiosa, e outras coisas do género, qualidades que hoje são estimuladas, mas naquele tempo eram mal vistas. E a escola também não ajudava porque aquilo que exigiam de nós era que decorássemos o que vinha nos livros, sem grande espírito crítico ou sequer de compreensão. Que bom que, também nesta aspeto, as coisas tenham mudado.
É por isso que quando oiço dizer que antigamente os estudantes, só com a quarta classe, sabiam mais do que agora com o quinto ano, não posso estar mais em desacordo. Se calhar sabíamos melhor a tabuada e os rios e as serras, mas não tínhamos a compreensão do mundo que os nossos filhos hoje têm, mesmo dando o devido desconto da facilidade de acesso à informação que eles têm atualmente e nós não tivemos.

José Barroso disse...

Já que mais ninguém se mostra disponível para 'remoer ódios velhos' (nem sequer o FB !!) e, após ler o que diz a Libânia, pergunto com um indisfarçável sorriso: por que é que só se ouve "lareta" (no feminino)?
Se calhar, por ser uma qualidade (sim, acho que é uma qualidade!) muito feminina, é que eu simpatizo com ela. Desta vez, não pude consultar um dicionário (um extenso dicionário do Circulo de Leitores) onde, há anos, encontrei a palavra 'pangaluno', regionalismo muito utilizado na Vila; lá se dizia que era originária das Beiras. Mas um dos léxicos online que vi, diz que 'lareta' é sinónimo de 'traquina'. Ora, uma rapariga a quem se aponte este ou idêntico qualificativo como os que refere o ZT:'esperta', 'atrevida' e, talvez, 'ladina', 'irrequieta', só podemos mesmo simpatizar ela.
É certo que, alguns destes epítetos, podem ser também apontados aos rapazes ('traquina', 'irrequieto', 'esperto', etc); mas então volto ao que disse no início: por que se diz 'lareta' apenas no feminino...?!
Quanto ao aspecto negativo do conceito 'lareta' (mas já não dos seus sinónimos), é minha opinião que ele aparece devido à intensidade e às circunstâncias concretas de cada situação.
Era natural que uma rapariga, porque mais perto da lida de casa, fizesse algumas coisas, se intrometesse ou ouvisse conversas que as mães achavam que iam além do admissível para a sua idade; e quando percebiam que o fazia voluntaria e ostensivamente, afastavam-na; pois, o mais certo era que ela, com a sua natural curiosidade, o fosse contar às da sua idade! Os adultos entendiam assim as coisas. Lembro-me que quando tínhamos 8 ou 9 anos, depois do toque das avé-marias, se nos aproximássemos de uma roda de malta grande na Fonte Velha ou na Praça, eles ameaçavam-nos com o cinto!
De tudo isto afasto o termo 'bacalhoeira/o', porque isso é aplicado a alguém (homem ou mulher adulta) que soube alguma coisa (ou bisbilhotou mesmo) e depois anda por aí a contar a toda a gente. Isto não é nada simpático! E acho que nada tem a ver com 'traquinice' ou 'irrequietude' que é próprio das crianças. E é nestes que tem lugar e se insere o termo 'lareta'.
Abraços, hã!
JB