Eugénio de Andrade é o pseudónimo literário de José Fontinhas, nascido na Póvoa da Atalaia, Fundão, em 1923. Cedo foi viver para Lisboa, tendo depois ido morar para Coimbra, onde conviveu com Miguel Torga e Eduardo Lourenço. Por razões profissionais, era Inspetor do Ministério da Saúde, acabou por fixar residência no Porto, onde viveu até à sua morte, em 2005.
A obra poética de Eugénio de Andrade mereceu-lhe vários prémios, como o prémio Camões, em 2001. Há uma biblioteca no Fundão com o seu nome (a biblioteca municipal, salvo erro).
É importante lermos a sua poesia, pois Eugénio de Andrade é também um fruto do campo que da Gardunha se estende até ao Tejo, possivelmente quase contemporâneo do nosso poeta José Lourenço, igualmente nascido numa das Atalaias. A obra de Eugénio de Andrade reflete intensamente a natureza desta Beira em que ele cresceu (até aos 10 anos).
Sou filho de camponeses, passei a infância numa daquelas aldeias da Beira Baixa que prolongam o Alentejo e, desde pequeno, de abundante só conheci o sol e a água. Nesse tempo, que só não foi de pobreza por estar cheio do amor vigilante e sem fadiga de minha mãe, aprendi que poucas coisas há absolutamente necessárias. São essas coisas que os meus versos amam e exaltam. A terra e a água, a luz e o vento consubstanciaram-se para dar corpo a todo o amor de que a minha poesia é capaz. As minhas raízes mergulham desde a infância no mundo mais elemental (...)
Conheçam-no aqui:
Nota: Agora nem trudo está disponível/fácil de encontrar. O melhor é ir mesmo ao motor de busca Google), escrever o nome do poeta e aparece muita coisa interessante. No Youtube, a mesma coisa.
José Teodoro Prata
6 comentários:
Os melhores poetas/escritores portugueses são das Beiras ou Trás os Montes:
Virgílio Ferreira (Melo – Gouveia);
Aquilino Ribeiro (Sernancelhe – Viseu);
Eugénio de Andrade (Fundão)
Miguel Torga (S. Martinho d Anta – Vila real).
Todos têm uma coisa em comum: um apego enorme à terra onde nasceram/cresceram, às Serras, ao campo… Isso é que fez deles os maiores escritores de todos… nunca perderam isso ao longo da vida…
Segue uma passagem para complementar:
“…A minha relação com as terras baixas e interiores da Beira é materna, quero dizer: poética. A tão grande distância do tempo em que ali vivi os primeiros oito anos da minha vida, o rosto de minha mãe confunde-se com a cor doirada do restolho e daquela terra obscura onde emergem uns penedinhos com umas giestas á roda, e alguns sobreiros de passo largo a caminho do Alentejo. Mas também os olivais de muros baixos de pedra solta me chegam nas suas falas, as dela e as de toda essa gente de Póvoa de Atalaia, camponeses na sua quase totalidade; e quando o não eram, o seu ofício era ainda o de uma relação privilegiada com as coisas da terra: pedreiros, carpinteiros, ferreiros. Fora destes mesteres, o restante da população lavrava, semeava, sachava, colhia. Ou pastava o gado, e fabricava queijo, azeite, vinho, pão. Lembro-me do cheiro dos lagares, das queijeiras, do forno, da forja - eram cheiros que entravam pelas narinas como tantos outros, mas só esses se infiltraram no sangue e aí ficaram, depositados em sucessivas camadas, para sempre, como ficou ficou o aroma das estevas e do feno. E ainda o das folhas secas dos castanheiros, trazidos ás carradas e depositados ao lado do balcão - e eu já as esperava e precipitadamente atirava-me sobre o montão de folhagem, com restos ainda de verão de S. Martinho; outros corpos caíam, um até sobre o meu, quente, demasiado quente, a boca próxima da minha, um beijo quase; voltávamos a subir os degraus, e o prazer e os gritos repetiam-se, até que minha mãe chamava por mim; anoitecera, o avô já chegara, os tios também, toda a gente, por carreiros e quelhas de sombra, havia já regressado dos campos, o cheiro a coentros não tardaria a subir da panela. Ouvia a voz de minha mãe ralhar com doçura, enquanto me despia e mergulhava na selha; um porquinho, era o que eu era, um porquinho sem emenda - no dia seguinte regressaria ao montão de folhas, ou aos montes de feno, ou de palha, no canto da eira, tanto faz, porque todos serviam para nos escondermos uns dos outros, ou uns com os outros.»
A fotografia do post diz tudo. O telhado da casa, as paredes toscas de granito, as ombreiras caiadas, as portas e números (nestes dois últimos já há algo de civilizacional), tudo é da Beira Baixa.
O Eugénio de Andrade tem reaparecido nas últimas semanas devido à celebração do centenário do seu nascimento. Há dias estava o Pedro Abrunhosa a declamá-lo na televisão.
A poesia moderna, como a deste poeta, tem regras muito abertas no emprego das palavras. Por isso, muitas vezes, nem sempre é fácil ao intérprete perceber o autor logo à primeira leitura. E isso pode dar a sensação de não se saber se estamos perante um grande poeta ou, inversamente, se estamos diante de um poeta menor. É preciso, por isso, o leitor conhecer o contexto para chegar a compreender melhor a obra escrita. Assim é, muitas vezes, na Literatura.
Ora, o Eugénio de Andrade afirmou-se, desde cedo, unanimemente, como um grande poeta português contemporâneo. Como ele diz, a sua infância pobre modelou-lhe a mente para falar das coisas simples na sua poesia. Aprendeu a viver com pouco e bastavam-lhe o sol e a água para ser feliz.
É a velha discussão do conceito de felicidade entre o mendigo e o rei. Mas agora não temos tempo para isso!
Já tinha lido alguns poemas dispersos deste autor, mas há poucos anos comprei "As Mãos e os Frutos" de que gosto muito.
Estava aqui a lembrar-me como é que a Academia Sueca deu, há poucos, anos o Prémio Nobel da Literatura ao Bob Dylan e deixa pelo caminho poetas deste calibre. Lá terá as suas razões, mas, para mim (e não só porque o escritor Vargas Llosa também se manifestou contra), incompreensíveis!
Abraços, hã!
J. Barroso
Deve ser este apego à terra e às coisas simples, que muitos partilhamos, que nos faz gostar tanto de ler estes escritores.
“Descobri” o Eugénio de Andrade há mais de trinta anos, era o meu filho um adolescente a querer dar os primeiros voos. Eu a fingir que estava tudo bem, mas, cá por dentro, a dor era imensa. Valeu-me o “Poema à Mãe” para me ajudar a lidar com tão grande sentimento de perda. Talvez por isso, apesar de tantos outros de que gosto muito, este seja o poema de Eugénio de Andrade que mais me emociona.
Uma crónica de António Lobo Antunes, que vem no mais recente livro de crónicas do A. ("As Crónicas", ed. Dom Quixote, 2021),lida nos CTT num destes dias, enquanto esperava vez, diz tudo sobre o poeta - uma ternura!
Lembrei-me então de uma outra crónica, com Eugénio em fundo, esta na abertura do saudoso Sopas&Missas, de 2009, que fui reler mais uma vez. Deixo aqui a morada, para alguém que queira conferir:
http://sopasemissas.blogspot.com/2009_03_22_archive.html
Bom proveito, meus amigos e amigas, se for o caso.
Sebastião Baldaque
Quem é que não gostava de ter escrito aquilo? Os poemas do Eugénio e os outros... Vale a pena conferir.
Ontem não consegui abrir, mas hoje já pude ler aquela maravilha!
Em: http://sopasemissas.blogspot.com/2009_03_22_archive.html
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