Papéis
do Convento de São Francisco e Santa Clara à vista
Na
última arrumação lá em casa, apareceram uns papéis do Convento de São Francisco
de São Vicente da Beira, anteriores à implantação do Liberalismo. Para quem
possam interessar, aqui se dá o seu registo (ANTT-Devassas Gerais de
Freiráticos, 1810-1824 – São Vicente da Beira, 1816-1818, maço 1629).
No
fim do século XVIII, o Convento (fundado para nele viverem 33 freiras) dava
sinais de alguma decadência: o efectivo estava reduzido a 15 religiosas
professas, «todas velhas e decrépitas» (de que se dava como razão a
persistência da proibição de novas admissões nos conventos); por carta régia, é
autorizada a entrada de 15 noviças (Licença do Príncipe Nosso Senhor…,
27-01-1793, op. cit., ms. 1).
Por
esta documentação sabe-se que, em 1813, a situação do Convento é bem pior, com
apenas 7 religiosas (Mapa geral do estado actual do Mosteiro…, 19-08-1813,
id., ms. 9), apesar do ingresso de duas mulheres no noviciado: D. Ana
Mariana, do Casal da Serra, e Maria Rosa Arminda Machado, natural de Peroviseu,
dando elas ao Convento, em vida, respectivamente, 30 e 60 mil réis por ano (Cartas
do Ministro Provincial dos Menores Observantes da Província de Portugal,
26-01-1807 e 06-04-1807, id., mss. 6 e 7; idem, 13-09-1807, id., ms. 8).
Além
das freiras professas, o Convento acolhia outras mulheres, sem votos, como se
indica: em 1794, ali se recolhe, «para escapar ao mundo», D. Joana Inês de
Brito Mouzinho Homem, de São Vicente, «órfã de pais e sem parente algum
próximo», onde se sustentará, mais a criada, com «a pequena produção da sua
sorte» (Licença do Príncipe Nosso Senhor…, 17-01-1794, id., ms. 2); em
1796, Brites Catarina Machado, viúva, irmã da madre prioresa do Convento, com
sua criada, aí se juntando a (sua filha?) Maria Rosa Pires Machado, órfã, que
aí se criou, «para que, assim recolhidas, se livrassem dos riscos e
contingências do mundo» (Licença do Príncipe Nosso Senhor…, 25-08-1796, id.,
ms. 3). Em 1800, é admitida, também com criada, Maria Cândida, referindo a
documentação que com o consentimento de toda a comunidade conventual (Carta…,
06-06-1800, id., ms. 5), sendo por isso de presumir que era o procedimento
usual nas admissões de seculares. Em 1815, referencia-se o recolhimento, como
secular, de D. Mariana Xavier Taborda Pinhately (sic) de Sá Souto Maior Soares
de Albergaria, também acompanhada de uma criada, com meios com que se sustente
e expressa obrigação de «usar da modéstia e moderação nos vestidos [como praticam]
as educandas nos claustros religiosos» (Licença do Ministro Providencial…,
13-03-1815, id., mss.10 e 11).
Uma
referência às finanças da instituição: em 1799, tem de receita 592,5 mil réis
(de pensões, foros e rendas, e de padrões, estando já deduzida a dízima, destes
últimos, para o erário real, pagando ainda 8,2 mil réis de dízima eclesiástica
(Receitas do Convento de S. Francisco de S. Vicente da Beira, 25-04-1799,
id., ms. 4); em 1813, as receitas ascendem a 593,613 mil réis, pagando
28,78 mil réis (Mapa geral…, cit., ms. 9), registando o mesmo documento
que o edifício em que está o Convento é muito antigo, a precisar de obras, para
as quais são necessários, para trabalhos de carpintaria e de pedreiro,
respectivamente, 2.400 mil réis e 341,6 mil réis.
Na
janela temporal aberta por estes documentos, identificam-se duas prioresas do
Convento de São Francisco: Soror Maria Marcelina Josefa de Santa Ana (1796 e
1800) e Soror Maria Joaquina da Encarnação (1813), havendo ainda registo dos
nomes de outras freiras professas: as Irmãs Maria Inácia Agostinha de Santa
Ana, Clara Teresa de São Jerónimo (em 1799), Joana Batista Xavier da Visitação
e Luísa Ana de S. Diogo (em 1799 e 1813).
Do
lado de cá, continua em aberto a curiosidade sobre esta instituição, a par de
outra, também em São Vicente, o convento de Santa Clara, que acolheu, pelos
anos 80 do séc. XVII, as “boas irmãs” Polónia da Conceição e Juliana do
Nascimento. A ver vamos.
José Miguel Teodoro