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quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

O 1.º plano de vacinação em Portugal (?)

 

Interessante este documento do Livro de Registos de Leis e Ordens que nos dá conta da que terá sido, provavelmente, a primeira campanha de vacinação em Portugal. Tem a data de seis de maio de 1820 e, no essencial, diz o seguinte:

«Dom João, por Graça de Deus Rei do Reino Unido de Portugal e do Brasil d’ Aquém de d’ Além-Mar em África Senhor da Guiné vos faço saber a vós, Corregedor da Comarca de Castelo Branco, que querendo eu que efetivamente se propague a vacinação pelo grande e reconhecido benefício que resulta deste seguro e (?) preservativo das bexigas naturais que tantos estragos produzem na população. Fui servido ordenar que todas as autoridades Eclesiásticas, civis e militares procurem, quanto for possível, a sua propagação servindo-se dos meios que, sem coação, forem mais convenientes para se obter este importante objeto. Pelo que vos mando que assim executeis pela parte que vos toca, dando-me conta pela Mesa do meu Desembargo do Paço, de três em três meses, das medidas que a esse fim tiverdes adoptado e do seu resultado…»

Sabemos que a vacina contra a varíola tinha sido descoberta em finais do século XVIII, e é notável que na segunda década do século XIX, encontrando-se Portugal numa situação económica difícil, até pela devastação causada pelas invasões francesas, já dispuséssemos de vacinas para toda a população. É importante o facto da obrigatoriedade de a campanha envolver todas as autoridades civis, eclesiásticas e militares, e que dela tivesse que dar-se conta, quer das ações, quer dos resultados. É também interessante que, embora fosse recomendada, pelo reconhecimento dos grandes benefícios que trazia para o combate à doença, não era obrigatória.

Não sei se há registo da aplicação deste plano de vacinação, mas é possível que não tenha sido muito eficaz (possivelmente porque não era obrigatória e pelas convulsões políticas da altura): a mortalidade continuou muito elevada por esses tempos. Só em São Vicente em 1820 morreram cerca de trinta anjos (crianças até aos dois anos), muitos, devido à varíola.

É um pouco injusta a ideia que nos passaram ou fomos criando de D. João VI, uma figura grotesca, quase a rondar a debilidade mental. Só por estas medidas revelou ter a sabedoria que se esperava de um rei e que falta a alguns estadistas da atualidade.

M. L. Ferreira