T,
de Talassa, ou os Guês pelos Esses
Há nomes que
encerram enorme complexidade. Jesus e Eugénio são exemplos que baste.
Jesus, vai para
um ano que o conhecemos – um episódio insignificante. Nas palavras do próprio
(reproduzem-se de memória, não vá a realidade desmentir-me) o personagem propôs-se
à militância em favor dos maltratados pelo capital e outro necessitados, mas os
profissionalões da causa olharam-no de lado porque a missão pedia nomes de
guerra consequentes. Querendo ser verdadeiros, há que declarar que conhecíamos o
dito Jesus por outro nome – um prosaico José, que também é nome com peso
bíblico, mas, vamos lá, de segunda linha; entre nós, para nos defendermos da
dificuldade em pronunciar algumas sílabas – eg, Jogé, por Jozé – tratávamos o
pobre por Zé.
Foi uma vocação
que se perdeu, vamos lá. Banalizando, mais um tiro na causa da redenção dos
humildes que o nosso poeta se propunha servir.
Cabe aqui outro José, o rimador, que
dizem colega de Ernesto Hipólito, um outro poeta nosso conhecido de há muitos
anos. Fontinhas, o versejador, fez-se gente na Atalaia e poeta no Porto, onde o
dão como profissional dos serviços médico-sociais (outro escriba, em meu lugar,
escreveria “modesto funcionário”). Foi o próprio que explicou como se fazem
versos: “Toda a ciência está
aqui, na maneira como esta mulher dos arredores de Cantão, ou dos campos de
Alpedrinha, rega quatro ou cinco leiras de couves: mão certeira com a água,
intimidade com a terra, empenho do coração. Assim se faz o poema”, lia-se em
1992 no Rente ao Dizer. Como diz o Martinho, poeta sem obra
escrita, que vende livros usados, não pode ser feliz quem não tenha lido versos
do Eugénio. Pode ser exagero, mas quem conhece o Martinho – e o Eugénio, vamos
lá – compreende o que o homem quer dizer. Poesia à parte, recentremo-nos na
razão de trazer aqui o rimador: fosse porque o José lhe fugia para Jogé, fosse
para separar o funcionário do poeta, o companheiro de escola Zé Fontinhas é,
para toda a gente, o Eugénio de Andrade, poeta.
Mais um José que se fez outro.
E há um terceiro que tal. Vem no
jornal e, para que conste, aqui vai em meia dúzia de linhas. Havia notícia de
que ZTP iria dar uma lição de História na única terra do país (que eu saiba)
que conserva uma fonte/chafariz de duas bicas que evoca a capacidade
realizadora da Ditadura Nacional – “Obra da Ditadura, 1932”, está lá gravado na
pedra. Organizado por monárquicos – coisa que agora não tem o peso que teria
quando se fez a Fonte Nova ou Fonte da Ditadura – o anúncio do evento
declinava um único nome na coluna dos oradores, o Teodoro da Tapada. Porque a
alguns cai mal que ainda deixem andar os monárquicos por aí à vontade,
porventura temerosos de uma bernarda restauracionista, vitimaram o pobre com
uma catadupa de recados e mensagens, não poucas com ameaças, basicamente
exigindo a retractação do melro, se o homem era dos nossos, isto é um
irrepreensível republicano, ou se era um convertido à causa dos cacetismo
miguelista ou outra especialidade do tempo dos reis. Inclusive, um que conheço,
nascido e jurado detractor de “raposões” e “talassas” (termos amigáveis com que
morde, palavras dele, “a canalha monárquica”, seus “declarados inimigos”), esse
artista se me declarou esperançado em ascender a algum título ou prebenda,
quando fosse tempo, pela mão do bondoso da Tapada. À-vontades que eu não tenho,
meus senhores!
Sosseguei quantos pude e como
soube – “acompanhar com, não é o mesmo que ser”,
pareceu-me argumento bastante, ainda que fraco. Só que a glória estava guardava
para quem a havia de ter – no caso, os tipos da má-língua, os detractores do
costume, que vieram aí ontem, atirando-me às ventas (o termo é forte, mas
adequado, dadas as evidências) a página do jornal da paróquia, desta
sexta-feira. Pintaram a manta lá à porta, “talassa” para aqui, “talassa” para
acolá, as palavras como balas dirigidas ao mestre dos Enxidros, brandindo o
jornal, aberto na notícia com o título assassino: “Monárquicos contam a história
do Louriçal”, com foto do mestre palestrando para uma plateia de utentes da Fonte da Ditadura.
Foi gente rija, aquela com que me
bati, que a mim tanto se me dá se o homem é talassa ou outra coisa política.
Para ser prático, vou-me preparando, que já sei de uns quantos plebeus que a
história tornou titulares – saibam quantos… que eu pedir, não peço, pois não
está no meu feitio, mas se sua excelência quiser lembrar-se de mim para um
título ou imunidade, não sou eu quem o vai decepcionar: tem aqui um soldado às
suas ordens.
Seja ou não seja, amigos como
dantes. Se é que me faço entender.
Vosso, do c.,
Sebastião Baldaque