Comentário à PRIMAVERA

 Já é habitual... A primavera ainda não tem chegado no calendário e, por cá, já os campos e a maioria das árvores estão em flor. Este ano até a nossa Serra, por cima da Senhora da Orada, está toda pintada de lilás, linda! Do lado de lá está a ficar toda branquinha, a fazer inveja à Estrela, ainda coberta de neve no coruto.

Os dias, maiores, também estavam a aquecer; mas de repente o frio voltou. Caprichos antigos, como diz a Ti Maria Joaquina.

É da Partida; um corpo pequenino, escondido debaixo do xaile e do lenço preto (lembrei-me logo dela, quando li o poema Viúva Beirã). Do cimo dos seus noventa e dois anos, bem cheios de trabalhos, não deixa escapar nada do que se passa à volta. Tem uma memória que faz inveja, e resposta pronta para tudo.

Há dias desafiei-a:

 - Não quer vir um bocadinho lá fora, Ti Joaquina? Está um dia lindo!

Respondeu prontamente:

 - Então, não sabe? Março, marçagão, de manhã inverno e de tarde verão! E em abril, águas mil, se o frio não veio, está para vir! Sempre foi muito caprichoso, o tempo!...

O resto veio sem esforço:

           Maio pardo, centeio grado;

           Junho, foice em punho;

           Julho, já há bagulo (gachos maduros);

           Quem malha em agosto já malha com desgosto;

           Setembro, mês de vindima;

           Em outubro o lume é amigo;

           Em novembro põe tudo a secar, pode o sol não voltar;

20 de Janeiro já tem uma hora por inteiro; mas quem bem contar, hora e meia lhe vai achar;

Dia 2 de fevereiro é dia da Senhora das Candeias; se a Senhora ri, está o frio para vir; se a Senhora chora, está o frio fora.

É um gozo conversar com pessoas assim!

M. L. Ferreira