quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

O nosso falar: manear

Leva-se a cabra aluada ao chibo e fica coberta.
Mas às vezes maneia, isto é aborta.
Quando assim é, o dono fica desconfiado da sua utilidade como reprodutora e, se não vingar à próxima, mata-a e come-a, assada, guisada, em chanfana...
Se o mundo animal é implacável, o dos homens então nem se fala!
Manear deriva de maneio, que no passado designava a criação de gado, como sinónimo de pecuária.

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

4.º Aniversário

Nem o mundo acabou, nem os políticos endireitaram as coisas nesta ponta da terra chamada Europa. Que desgraça, ninguém acerta uma!
E ainda nos ameaçam que 2013 será pior...
Valha-nos o blogue Dos Enxidros, que hoje completa 4 anos.
É ainda muito tenro, dirão, mas este blogue não se compara a uma pessoa, é mais como um animal que aos 4 anos já é adulto. No pior dos casos, como uma árvore de fruto que atinge a maturidade aos 5 anos.
Este ano que passou foi a continuidade dos anteriores, com a novidade de se terem juntado a nós os primos Francisco e José Barroso. Leram a crónica do Chico sobre a avó Rita? Um monumento à literatura e ao amor!
E ainda o A. dos Santos, um vicentino que agora se inicia nas lides da poesia.
O blogue aumentou o número de pessoas que o consultam, sobretudo a partir do verão. Neste período, o número de entradas diárias subiu das habituais 100 para cerca de 150. 
Não creio que o número de leitores habituais do blogue (cerca de 100) tenha aumentado. Penso que o aumento do número de entradas se deve ao facto de o blogue já ter muito material que aparece nas buscas por temas, sendo por isso consultado por gente completamente alheia ao blogue e à freguesia de São Vicente, seja em Portugal ou no estrangeiro.
Há tempos, um vicentino estranhava que o blogue fosse mais conhecido entre a comunidade vicentina de França do que pelos residentes na Vila. De facto, os vicentinos a viver fora, seja noutras terras portuguesas ou em países de diferentes continentes, serão dos mais fiéis seguidores Dos Enxidros.
Por eles lamento não ter em São Vicente um ou mais colaboradores permanentes que contem as novidades a quem está longe. Ainda este Natal, que para mim foi muito familiar, mas pouco vicentino, ficaram sem notícias sobre a nossa terra (no dia de Natal, de manhã, já vários cá tinham vindo, na esperança de matar saudades). Aqui deixo o desafio a quem mora na Vila e nas várias anexas!
Apesar das ameaças que políticos e economistas não se cansam de nos fazer, BOM ANO 2013!

A prenda que vos deixo é um lindo poema de Carlos Drummond de Andrade, adaptado a vídeo.

"Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão.
Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos.
Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui pra diante vai ser diferente."

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

5.º CENTENÁRIO DO FORAL MANUELINO DE S. VICENTE DA BEIRA

A arte na época do foral
Estamos a dias do final do ano em que se completaram 500 anos da atribuição de um novo foral a São Vicente da Beira, por D. Manuel I.
Para fecho das comemorações, nada melhor que mostrar as obras de arte que nos deixaram os vicentinos desse tempo.


A construção do edifício da Câmara Municipal será dessa época. O brasão, que até ao início do século XX estava sobre a porta de entrada, ostenta duas esferas armilares, símbolo do rei D. Manuel.
A Igreja da Misericórdia é também do século XVI, mas da segunda metade, período em que foi fundada a nossa Misericórdia e de que existem registos de enterramentos nesta Igreja. No entanto, o atual edifício é de 1643.


O nosso pelourinho é anterior ao foral manuelino, pois não tem nenhum dos símbolos de D. Manuel I e tem um símbolo (o pelicano) do rei anterior, D. João II, o qual confirmou o foral medieval de São Vicente da Beira.
Por outro lado, ostenta o brasão da Ordem de Avis, cuja comenda de São Vicente possuía muitas propiredades e poderes na gestão dos bens da Igreja, mas ainda não aparece o brasão da Ordem de Cristo, pois a respetiva comenda só foi criada depois da sua construção.
Inclui-se o pelourinho nesta listagem de obras de arte da época do foral manuelino, pois foi erguido poucos anos antes de 1512.


As portas e janelas com arestas chanfradas (cortadas) são típicas do século XVI. Em São Vicente, existem muitas, algumas infelizmente tapadas com cimento, tinta, persianas...
Esta casa, onde viveu o tio Bernardino Candeias, localiza-se na Rua do Convento.


Janela de uma casa situada ao fundo da Rua Manuel Lopes. Tem arestas chanfradas e o lintel ostenta motivos manuelinos. A data é muito anterior (MCCLXXI - 1271), pelo que a pedra terá sido reutilizada.


Nesta janela, só o lintel nos interessa, pois a parte restante é obra da requalificação da Igreja Matriz, nos anos 80 do século passado. O lintel manuelino foi trazido de uma casa arruinada, na Rua Velha, a qual, em finais do século XIX, servia de cozinha do solar construído pelo Visconde de Tinalhas, então Presidente da Câmara e por isso residente em São Vicente. No século XX, morou lá o tio Albano Jerónimo e atualmente é do Zé Barroso (e de sua mãe), colaborador dos Enxidros.


Esta pia de água benta é uma jóia da arte manuelina e encontra-se à entrada da porta principal da Igreja da Misericórdia. Tem coluna oitavada (oito faces), tal como o nosso pelourinho. A parte inferior é um acrescento recente e em pedra diferente.


Outra jóia da arte manuelina, esta na ermida da Senhora da Orada. É também uma pia de água benta.


O cruzeiro da Senhora da Orada é da mesma época da pia de água benta acima apresentada e do atual edifício da capela. Possivelmente todos mandados fazer por D. Álvaro da Costa, comendador da Ordem de Cristo, em São Vicente da Beira. De notar que o cruzeiro, tal como a pia de água benta anterior, ostenta o brasão dos Costa.



Janela manuelina de uma casa no alto da Rua Manuel Lopes. Possivelmente, ali viveu Manuel Lopes Guerra que deu nome à rua e foi avô de Dona Benedita, casada com um Cunha Pignatelly, os quais deram origem à Casa Cunha, em São Vicente.


Pórtico manuelino da capela de Santa Bárbara, no alto do Casal da Fraga, mais propriamente já no Casal do Monte do Surdo (um nome em desuso). Esta capela situava-se no limite entre o Sobral e São Vicente e era propriedade da Câmara Municipal. Nos inícios do século XX, estava totalmente arruinada, sendo as pedras deste pórtico, e outras, trazidas para o Casal da Fraga, na década de 30. O meu avô Francisco Teodoro, aqui morador, andou com um carro de bois a acarretá-las.


A Fonte Velha, até ao início do século XX chamada apenas fonte, ostenta a data de 1578 e o nome do rei D. Sebastião. Foi primitivamente construída no espaço em frente ao edifício atualmente arruinado da Casa Cunha, no local onde foi plantada uma palmeira, quando as trasladaram para a face do largo, sendo pouco depois mudada para o local onde hoje se encontra.

domingo, 23 de dezembro de 2012

Chanfana com ervas

Fui almoçar aos Pereiros.
Chanfana à moda da Charneca, com ervas e batatas do Casal da Fraga, tudo regado com um tinto vicentino muito bem apaladado. E ainda tigelada à sobremesa.
MIIINHA NOOOSSA SENHOOOORA!!!!!!!











quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

O nosso falar: aluada e crostos

Estive a comer requeijão e apetece-me escrever sobre os crostos, mas antes é preciso levar a cabra ao chibo, quando estiver saída, isto é, aluada.
Aluada deriva de lua, este satélite incansável, sempre a dar voltas à nossa terra, originando as fases da lua. E são elas que regem a vida dos agricultores (Semear um canteiro de couves no quarto crescente ou minguante?), o corte de cabelo (No quarto minguante, cresce mais devagar!(?)), o ciclo reprodutor da mulher (28 dias, tal como o ciclo lunar) e talvez também o das cabras. Pelo menos, o nosso povo diz de uma cabra com cio que está aluada.
Logo que a cabra começava a berrar incessantemente, tínhamos de lhe arranjar um chibo. Mas uma cabra não é como uma porca, despachada, a cabra requer rituais mais demorados. Ela e o chibo tinham de viver juntos, por uns dias. O melhor era pedir o chibo a um vizinho ou levar a cabra para um rebanho. No caso dos meus pais, o habitual era pedir ao primo Miguel Jerónimo que aceitasse a nossa cabra no seu rebanho.
Mais tarde, tivemos três ou quatro cabras e já compensava criar um chibo para as cobrir. Ficou nos anais da família o recado que o primo Luís Teodoro nos deixou escrito a carvão, na porta do palheiro do Ribeiro de Dom Bento (Julgávamos que ele não sabia escrever!): Levara o nosso xibo para o Mato Branco e vinha trazê-lo quando cobrisse as cabras dele. Ok, primo Luís, disponha sempre!
Bom, a cabra ficava pranha e depois era só esperar uns meses até chegar a altura em que já mal conseguia andar. E é agora que entram os crostos. Íamos todos ver a cabra a parir e ajudávamos os cabritinhos a pôr-se de pé e a encontrar a teta da mãe cabra. Por vezes, era logo ali que perfilhávamos um cabritinho e lhe dávamos nome (Estrelinha, invariavelmente, para uma chibinha com uma mancha branca na testa, Malhada, se tinha manchas de diferentes cores...). Eles mamavam pouco e a minha mãe ordenhava o resto do leite, para os seus filhos. Entretanto, eu apanhava as páreas e ia a enterrá-las.
Esse primeiro leite era diferente. Ao cozer, cortava, ficava quase requeijão, mas mais aguado. Eram os crostos, uma festa para a pequenada! Ainda hoje me engano e só me sai crostos quando quero dizer requeijão. 

Nota:
Alguns de nós, como eu, dizemos/dizíamos crostos, mas o termo correto é colostros ou calostros, o primeiro leite das mães, humanas ou animais, após o parto. É um leite muito rico em nutrientes!
(Esta nota foi alterada a 03-01-21013)

sábado, 15 de dezembro de 2012

Saberes e sabores

Bebia-a de conversas com o Pe. Jerónimo ( um famoso bacalhau que comeu no lagar do Mesquita, feito pela Brocha), do José Miguel Teodoro (os livros são pretextos para o encontro de pessoas) e do Ernesto Hipólito (as tasquinhas de Alpedrinha em São Vicente...). Dirão que aprendi com os melhores, mas foi por uma boa causa!
A ideia foi fazendo o seu caminho. No passado dia 11 de novembro, já misturámos história, poesia e música, com castanhas e jeropiga. E repeti-a na apresentação do meu livro, em Castelo Branco, graças à generosidade das Águas Fonte da Fraga, da Jú Marau (as filhoses foram um sucesso!), dos Queijos Veríssimo (do Vale de Alfaia, Sobral) e do Vinho Quinta da Arrancada (Ninho do Açor e também Tinalhas). Foi uma geografia de saberes, sabores e afetos, um casamento perfeito.
Obrigado a todos eles, mais aos Amigos da Escola e ao Jaime Teodoro Nicolau e ainda à Câmara Municipal, aos Serviços Municipalizados e ao pessoal da Biblioteca Municipal.
Um agradecimento especial ao Carlos Matos e ao Miguel Santos que me ajudaram a produzir esta obra. E à Dr.ª Adelaide Salvado e ao Pedro Salvado, pela maneira sábia como a explicaram ao público presente, no auditório da Biblioteca Municipal de Castelo Branco, em tarde abençoada por muita chuva.


















Fotógrafo: Joaquim Trindade dos Santos

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

O livro em Castelo Branco

O meu livro vai ser apresentado em Castelo Branco. É na próxima sexta-feira, 14 de dezembro, pelas 18 horas, na Biblioteca Municipal.
Desejo que seja um importante momento de afirmação da identidade da região entre Castelo Branco e os cumes da Gardunha. Por mim, fiz o melhor que pude: escrevi o livro, convidei dois dos maiores vultos da cultura regional para o apresentarem (Adelaide Salvado e Pedro Salvado) e desafiei produtores a virem dar a provar os seus produtos: Águas Fonte da Fraga, Queijos Veríssimo e Vinho da Quinta da Arrancada, além do nosso pão e das nossas filhoses.
Aos leitores do blogue, peço que publicitem a iniciativa junto das pessoas da nossa região (freguesias de São Vicente, Louriçal, Ninho, Tinalhas, Freixial e Póvoa), sobretudo dos que vivem em Castelo Branco.


Sinopse
Foi há cerca de 250 anos.
Em Tinalhas, vivia Teodoro Faustino Dias, que casou com Maria Cabral de Pina, do Violeiro, filha do Sargento-Mor Domingos Nunes Pousão. Teodoro Dias foi alferes da capitania de Tinalhas. Era o maior criador de gado bovino no concelho, 31 cabeças. A sua filha Eusébia Dias Cabral casou com António Meireles Gramaxo, do Fundão e Soalheira, os quais deram origem à Casa Viscondes de Tinalhas. Teodoro Faustino Dias tornou-se presbítero, após enviuvar, perto dos 50 anos, e foi cura do Freixial.
O Pe. João Antunes era natural do Casal da Serra, onde fiscalizou a capela devotada a São João Baptista, particular dos irmãos Duarte Ribeiro. Foi o capelão de São Tiago, pago pelos vizinhos dos montes da charneca que se fintavam para lhe fazerem uma côngrua, a troco de assistência religiosa. Os espanhóis levaram-no preso, na Guerra dos Sete Anos.
Ana Maria do Carmo nasceu em Castelo Branco e casou com o Dr. Diogo José Pires Bicho Leonardo, natural de Tinalhas, mas residente no Ninho. Enviuvou cedo. Morava na Praça e era dona de uma azenha, no Freixial, e de um lagar confrontante com a ervagem do Vale do Curro.
O Pe. Manuel Marques era natural do Louriçal, já fora cura do Freixial e era-o então do Sobral. Ensinava Gramática aos filhos de parte da elite local: dos Duarte Ribeiro do Casal da Serra e dos Ramos Preto do Louriçal, mas originários do Sobral.
O tribunal e a cadeia eram na Câmara da Vila. Os pais cujos filhos sujassem a água do chafariz passavam 8 dias na enxovia dos presos e das presas. E quem colhesse uvas ou figos, em vinha alheia, pagava de coima 500 réis (Manuel Henriques andou um dia ao entulho, para as calçadas, e recebeu 150 réis).