sexta-feira, 15 de abril de 2022

Andorinhões na Praça

 Há anos, a nossa Praça era animada por bandos de andorinhões que faziam voos acrobáticos em volta da torre, soltando gritos estridentes. Recordo-me vagamente que deixaram de nos visitar depois de umas obras na torre da Igreja, mas tenho esperança de estar a ser traído pela memória.

Podemos vê-los aqui: https://youtu.be/FzddGqEVHTk

Lembrei-me deles ao ler esta crónica do Miguel Esteves Cardoso, no Público:

«Amanhã é noite de lua cheia. As luas cheias amalucam as pessoas. E os bichos. E os mares. E abrem-nos os olhos.

Olhar para a lua cheia é quase como voar. A lua vai-se aproximando de nós, como se fôssemos nós que nos estivéssemos a chegar ao pé dela.

Que pena, que estupidez, que desperdício que o luar seja hoje só uma palavra bonita, que faz o favor de rimar com quase todos os verbos que se quiser produzir.

E o luar propriamente dito? Merece ser visto só de uma janela, quando se olha para a lua, como qualquer coisa que a lua entornou?

Pobre luar, que nem sequer tem direito a ser luz, a não ser quando se liga a luz do telemóvel e se repara, porque perdeu a força do costume, que já não é necessária.

Se ainda há tolos que se sentem obrigados a decidir entre cães e gatos, porque é que, já agora, a tolice não se estende a escolher entre o luar e a luz do sol?

Este sábado, se tem sorte de ter andorinhões por perto, ponha-se a ver como eles se portam com a lua cheia. Anders Hedenstrom, da Universidade de Lund, descobriu recentemente que alguns andorinhões reagem de maneira espectacular à lua cheia, voando até à altura de quatro ou cinco quilómetros.

Mesmo antes de ver os primeiros andorinhões do ano, vejo sempre os passarinhos e os pombos atarantados, a fugir da balbúrdia daqueles turistas: os andorinhões que fazem de vistoriadores, estudando os telhados e a concentração de insectos voadores, para emitir os avais para o resto da malta.

E, de resto, faço minhas as palavras que P.R. deixou ontem num comentário:

“Chegaram hoje, finalmente. Já voam em bando freneticamente, aqui mesmo à frente do 7.º piso. O céu está tão azul que conseguimos ver os movimentos das asas, do planar ao voo picado, ao mergulho. Estão mesmo bem-dispostos, acabadinhos de chegar. Ainda não vi nenhum entrar em ninhos nas frestas das pedras, ainda estão a matar saudades da luz e da beleza desta cidade. Bem-vindos.”»

José Teodoro Prata

quarta-feira, 13 de abril de 2022

A guerra na Ucrânia (4)

 CHINA

Com a atual guerra na Ucrânia, parece estar a desenhar-se uma nova ordem mundial, assente em duas superpotências, os Estados Unidos e a China. Após a 2.ª Guerra Mundial, o mundo dividiu-se entre os apoiantes dos Estados Unidos e da Rússia/União Soviética, depois os Estados Unidos ficaram sozinhos a dominar o mundo e agora parece haver intenção de voltar a dividi-lo em duas áreas de influência, cada uma com sistemas opostos à outra, na economia, nas finanças, na tecnologia, na informação, nas artes, nas humanidades, etc. Segundo alguns analistas, quem vai vencer esta guerra é a China, precisamente por não estar envolvida nela. Por isso devemos conhecermos melhor este gigante asiático, que atualmente desempenha o papel de fábrica do mundo.

A China é o país mais populoso do planeta, com quase um quinto da população da Terra.

Ao longo dos milhares de anos da sua existência, esta civilização realizou algumas das mais importantes invenções da humanidade: o papel, a imprensa, a pólvora, a seda, o papel-moeda, a bússola, o sismógrafo, os números negativos, o ábaco, entre outras.

Após 1949, a China adotou um regime comunista, mas em 1978 voltou ao capitalismo e fez reformas económicas que a tornaram numa das economias de mais rápido crescimento no mundo, sendo o maior exportador e o terceiro maior importador de mercadorias do planeta. A industrialização reduziu a pobreza de 53% (em 1981) para 8% (em 2001). 

A China é a segunda maior economia do mundo e é membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, além de ser uma potência nuclear e de possuir o maior exército do mundo em número de soldados e o segundo maior orçamento de defesa.

José Teodoro Prata

terça-feira, 12 de abril de 2022

A guerra na Ucrânia (3)

 NATO

Uma das causas do atual conflito militar na Ucrânia, na versão da Rússia, foi a possível adesão da Ucrânia à NATO. Esta sigla deriva do nome em inglês da Organização do Tratado Atlântico Norte, cuja sigla em português é OTAN. Tem a sua sede em Bruxelas, na Bélgica. Portugal foi um dos países fundadores, devido à posição estratégica dos Açores. Tem atualmente 30 membros, principalmente na Europa e América do Norte.

A NATO foi criada em 1949, pelos países ocidentais, que assim procuravam preparar-se para um eventual conflito militar com a Europa de Leste, devido à extraordinária expansão do comunismo nesta região, após a 2.ª Guerra Mundial.

De 1949 a 1989, NATO liderou o clima de tensão com a Europa de Leste, que, entretanto, também criara a sua aliança militar, o Pacto de Varsóvia, em 1955. A este período chamou-se Guerra Fria, pois, embora tenham sido tempos de grande tensão internacional, não ocorreu nenhum conflito militar direto entre estas duas potências nucleares.

Com o fim do comunismo na Europa de Leste, a NATO interveio militarmente na ex-Jugoslávia, por várias vezes, nos anos 90, no Afeganistão, na Líbia e de forma restrita nas várias guerras do Iraque. No atual conflito na Ucrânia, a NATO não pode intervir, pois uma guerra direta com a Rússia seria catastrófica para a humanidade, pois ambos os lados possuem grande número de armas nucleares.

José Teodoro Prata

segunda-feira, 11 de abril de 2022

A guerra na Ucrânia (2)

 UCRÂNIA

A Ucrânia é um país da Europa Oriental, situado a norte do Mar Negro. É o país maior da Europa, a seguir à Rússia europeia, tendo uma área superior à da Península Ibérica.

A região terá sido o lar da domesticação do cavalo. As suas terras são muito férteis, sendo considerada o celeiro da Europa. A indústria concentra-se sobretudo nas províncias de Donetsk e Lugansk, epicentro do atual conflito armado.

Foi na Ucrânia que nasceu a civilização russa, na Idade Média, primeiro em Kiev e depois dispersa por outros centros políticos como Moscovo. Ao longo dos séculos, a Ucrânia foi invadida e governada por vários povos, acabando por integrar o Império Russo e no século XX a União Soviética. Só se tornou um Estado-nação independente em 1991.

A sua população ronda os 42 milhões de pessoas, com várias minorias, sendo os russos 17% da população, sobretudo concentrados na península da Crimeia e nas províncias de Donetsk e Lugansk.

A Rússia ocupou a Crimeia em 2014, pois a península tem 60% da população russófona e o seu porto foi durante séculos a sede da armada russa do Mar Negro.

Logo a seguir, as repúblicas russófonas de Donetsk e Lugansk declararam a independência face à Ucrânia, originando uma guerra que já fez 14 mil mortos e que é a causa imediata do atual conflito armado entre a Rússia e a Ucrânia.

José Teodoro Prata

domingo, 10 de abril de 2022

A guerra na Ucrânia (1)

No início deste conflito, escrevi 4 crónicas para a Rádio Castelo Branco (Racab), dando algumas informações elementares que permitissem naquele momento entender melhor a guerra. Hoje a realidade é muito mais complexa e trágica, mas continua a valer a pena publicar.

Vou publicar um texto por dia.

Podem ser ouvidos na rubrica "História ao Minuto, em: http://www.radiocastelobranco.pt/audioteca/

RÚSSIA

No século XVI, a Rússia começou a expandir-se, conquistando regiões e povos vizinhos, de tal modo que, entre 1721 e 1917, formou um grande império, que ia do Oceano Ártico ao Mar Negro e do Mar Báltico ao Oceano Pacífico, possuindo ainda o Alasca que vendeu aos Estados Unidos.

Na Europa, este Império abrangia, além da Rússia, os territórios e povos dos seguintes países na atualidade: Finlândia, Estónia, Letónia, Lituânia, parte da Polónia, Bielorrússia, parte da Moldávia e Ucrânia.

Estas regiões foram recebendo emigrantes russos, em movimentos migratórios que continuaram no século XX, então integrados na União Soviética (exceto a Finlândia), pelo que não é de estranhar que nestes atuais países uma significativa percentagem da população seja russófona. Com o fim da União Soviética, estas repúblicas desligaram-se da Rússia e tornaram-se totalmente independentes.

Embora o país continue a ser o maior do Mundo, o seu atual presidente, Putin, é um nostálgico da antiga grandeza da Rússia e por outro lado sente-se pressionado pela crescente expansão da Nato para países com os quais a Rússia faz fronteira. Por isso anexou a península da Crimeia, em 2014, e já antes apoiara regiões russófonas que não querem integrar os países a que ficaram a pertencer.

Foi o que aconteceu com Donetsk e Lugansk, duas regiões da Ucrânia que fazem fronteira com a Rússia. Este conflito interno na Ucrânia já fez 14 mil mortos desde 2014 e nem os acordos de Minsk, em 2015, vieram resolver o conflito. Agora a Rússia invadiu a Ucrânia com o argumento de ir defender esta população russófona.

José Teodor Prata

quinta-feira, 7 de abril de 2022

IRS - Misericórdia

 CONSIGNAÇÃO DO IRS

CONSIGNAÇÃO DO IRS

Na declaração do IRS, existe a possibilidade, sem aumento de encargos para o contribuinte, autorizar que 0,5% do valor liquidado do seu IRS possa reverter a favor de uma Instituição de Solidariedade Social (IPSS).

Assim, vimos apelar para que não deixe passar esta oportunidade de ajuda à Santa Casa da Misericórdia de S. Vicente da Beira.

A adesão à campanha de consignação de IRS é um meio de garantir um contributo e apoio a esta obra tão meritória e nobre e a obtenção de meios para alcançar os seus objetivos.

Para o efeito, deverá no Modelo 3, assinalar no Quadro 11, com uma cruz no Campo 1101 (Instituição de Solidariedade Social e Utilidade Pública) e indicar o NIPC  501 135 618  correspondente a esta Santa Casa de Misericórdia.


José Teodoro Prata

domingo, 3 de abril de 2022

Escravos em São Vicente da Beira

 A escravatura, nas diversas formas que foi adquirindo ao longo de milhares de anos, em diferentes civilizações, terá sido a prática mais aberrante de organização e relacionamento social. A partir do século XV, com os milhares de escravos trazidos de África para a Europa ou levados depois para a América, tornou-se ainda mais desumana.

«Os escravos pululam por toda a parte. Todo o serviço é feito por escravos e mouros cativos. Portugal está a abarrotar com essa raça de gente. Estou em crer que em Lisboa os escravos e as escravas são mais que os portugueses livres de condição. Dificilmente se encontra uma casa onde não haja pelo menos uma escrava dessas. Mal pus o pé em Évora julguei-me transportado para uma cidade do inferno – por toda a parte topava negros.» É com esta citação de um flamengo em Portugal no século XVI que Fernando Rosas começa o programa “Escravos e escravatura em Portugal” (https://ensina.rtp.pt/artigo/escravos-escravatura-portugal/) que vale muito a pena ver ou rever.

E também houve escravos em São Vicente! Não será possível saber ao certo quantos, mas seguramente muitos mais do que estas duas mulheres que, por terem tido filhos, ficaram identificadas nos Registos Paroquiais:

José, que nasceu no dia 21 de outubro de 1738. Diz o registo que era filho de Luzia de Jesus, preta, escrava de Francisca Xavier de Andrade, que a trouxe de Lisboa. (Francisca Xavier de Andrade, filha de Manuel da Costa Aragão e Maria Simões, possivelmente uma das sobrinhas e herdeira do presbítero Manuel Simões). O padrinho da criança foi o licenciado Francisco Simões Cardoso.

Luzia de Jesus teve uma vida longa - faleceu em 1798. No registo de óbito dizem que se chamava Luzia Preta e que era pobre…

Este registo dá-nos conta do nascimento de uma criança (Francisca?) em 1753, filha de Francisca (?), solteira, menor, escrava de João da Costa Fragoso, natural do Teixoso. O registo está muito danificado, mas percebe-se que Francisca teria vindo da América, dizia que não conhecia os pais nem sabia os seus nomes. Os padrinhos da criança foram o licenciado António de Mesquita, e Cecília Velosa, recolhida no convento da Vila.

Não consegui saber se estas crianças sobreviveram e deixaram descendência. É possível que sim, e alguns de nós tenhamos sangue escravo a correr-nos nas veias.

Em Portugal a situação dos escravos começou a mudar a partir do século XVIII, com a legislação do Marquês de Pombal. Mas, com muitos avanços e recuos, incumprimentos e ambiguidades das muitas leis produzidas, só passados mais de cem anos, em 1869, a escravatura foi finalmente abolida de todo o território nacional. Seguiu-se-lhe depois a servidão, principalmente nas comunidades rurais, que muitos ainda conhecemos.

M. L. Ferreira

Nota: há comentários novos e interessantes, nas duas publicações anteriores; peço desculpa aos autores pelo atraso.

José Teodoro Prata