domingo, 17 de novembro de 2013

A azeitona galeguinha...

 

Andava desesperado, quase há duas semanas que não ia a São Vicente! Ainda não eram oito horas quando abri a porta da rua, a caminho da azeitona. Dei um passo e parei, chocado: estava a chover. Não era muita e a previsão dava apenas chuva fraca para o Centro. Olhei os horizontes: todos abertos, só sobre Alcains é que estava o céu carregado. Pensei em desistir, mas resolvi arriscar, afinal podia não ter outra oportunidade de colher a azeitona.
À saída da cidade já se via a Gardunha: chuva só no lado este, de Alpedrinha ao cume, mas a parte oeste prometia bom tempo. Estranho, a chuva costuma vir do lado do mar e era ao contrário! Sobre São Vicente, o nevoeiro dos restos da chuva que caía sobre o cume da serra. Se estivesse a chover, era pouca.
Chão molhado só até à Póvoa, mais para diante ainda não chovera. Na zona da barragem começou a carujar. Mau, tenho o dia estragado. E a carujar continuou até chegar. Esperei no carro. Nem chovia em condições, nem parava de cair. Fui inspecionar e a rama das oliveiras ainda estava pouco molhada. Esperei mais um pouco e avancei. Uns minutos depois deixou de cair. Continuei, sempre à espera de ter de deixar o trabalho a qualquer momento. As nuvens mudaram as ameaças do Casal da Serra para o Casal da Fraga.
Depois abriu e veio o sol. A seguir limpou e a meio da manhã foi primavera durante meia hora. O vento voltou, mas fraco e aquecido pelo sol. O almoço comi-o na companhia de um pisco, sempre a piar baixinho (não tem corpo para mais) e a saltitar pelos matos.
Escurece cedo no Ribeiro de Dom Bento, sobretudo no buraco onde tenho a horta, ainda por cima tapado pelo pinhal do senhor Gomes. A partir das três horas da tarde, deixou de se ver o sol e fui colher a oliveira galega rente ao ribeiro. Azar: azeitona miudinha, engelada e agarrada! Só de lá saí perto das cinco, já quase noite. Ficou por colher a oliveira carrascanha e a cordovil. Esta fica a corar mais um pouco, para a talha, e a carrascanha talvez a deixe para os pássaros.
Quando cheguei a São Vicente, já a noite fechara o mundo na sua escuridão. Soube pela minha irmã Eulália que no Casal da Fraga esteve um barbeiro dos diabos, mas eu tive um belo dia de azeitona!
José Teodoro Prata

Um comentário:

Anônimo disse...

É verdade que quem se deixou para o fim de semana para começar a colher a azeitona, apanhou alguma chuva e muito frio!...
Eu tive mais sorte com o tempo porque a colhi durante a semana, aproveitando o verão de S. Martinho que este ano foi generoso. Mas, encavalitada no cimo da escada, dei comigo a pensar que já nada é como dantes. Onde é que já se viu andar na azeitona sozinha, de manga curta e a ouvir música rock (a música vinha da casa duma vizinha)? Azeitona como deve ser é com muita gente, muito frio, uma fogueira e o garrafão ao pé para aquecer as mãos e as almas arreganhadas e no ar, ao desafio, as cantigas próprias da época. Senti alguma saudade, não do tempo, mas das pessoas e dos rituais…
Mas parece que a azeitona este ano está boa! Pelo menos não caiu tanta para o chão, bichosa, como nos últimos anos… Vamos lá a ver se também funde bem…

M. L. Ferreira