domingo, 3 de novembro de 2013

IN ILLO TEMPORE

No tempo em que o Agostinho (Sargento) era garoto, vivia no Cimo de Vila, na casa que pertence agora à Cila, a funcionária da Junta de Freguesia.
O Agostinho (Sargento) sempre foi uma pessoa rude, mesmo em criança.
Numa célebre Quinta Feira Santa realizou-se à noite a procissão do Ecce-Homo, na qual uma das imagens, penso que o Senhor do Bom Fim, tinha e ainda tem uma corda a envolver-lhe as mãos e o pescoço.
O Agostinho que estava à janela a ver passar a procissão, quando enxerga a imagem,  vira-se para dentro de casa e diz muito alto:
- Ó  madrinha, venha cá depressa que vem aqui  um santo com uma corda atada ao focinho!

SI NON EST VERO!

Foi também numa Semana Santa que a imagem do Senhor na cruz teve que viajar para Norte, a fim de ser submetida  a um processo de restauração.
Por isso tiveram que arranjar um rapaz que substituísse a imagem do Cristo, para se realizarem as cerimónias.
Naquele ano, a Maria Madalena era uma moça de seu nome Henriqueta, cujo papel se resumia a estar agarrada aos pés do Cristo durante toda a cerimónia.
Procuraram a faixa de pano  para por à cintura do rapaz, para depois  o  atarem à cruz, mas não a encontraram e por isso tiveram que lhe enrolar um papel com uns alfinetes a segurar, o que o deixou numa situação precária.
Rasgam-se os véus do Tempo e que quadro mais bonito!
A Henriqueta tinha o cabelo comprido e, com o vento que fazia, esse mesmo cabelo voava e batia  nas pernas do rapaz. Além disso, na posição incómoda em que ela se encontrava, estava sempre a mexer-se,  de tal forma que o papel da cintura do rapaz começou a levantar-se.
O rapaz aflito baixa a cabeça para a Maria Madalena e diz-lhe:
- Stá quieta Henriqueta que se rasga a papeleta!
O Pregador que se encontrava no púlpito, mesmo em frente ao Calvário, a comentar aquela cena tão triste, apercebeu-se  do que se estava a passar. Salta do púlpito e a correr vem com a sobrepeliz para tapar aquela desgraça.
O pobre do rapaz ainda mais aflito vira-se para o Pregador e diz-lhe lá de cima, como se o estivessem a crucificar a sério:
-Não lhe mexa que é pior!!!

P.S.  Desculpem qualquer coisinha!

Ernesto Hipólito

4 comentários:

Vitor B. disse...

uma delicia
obrigado

Anônimo disse...

Com os mestres que tiveste, começando pelo exemplo do teu pai, inspirado depois pelos talentosos contadores de histórias que a carrinha da Gulbenkian trazia à nossa Praça, mas sobretudo por motivações e dotes pessoais, não admira que agora sejas tu a contar-nos estes episódios deliciosos! Tendo como cenários e protagonistas locais e pessoas que conhecemos, estas histórias tornam-se ainda mais significativas e saborosas para todos nós.
Acho que deve ter sido a partir da observação e narrativa de acontecimentos como estes que o Miguel Torga escreveu os “Contos da Montanha” com os quais muitos de nós nos identificamos… Força!
M. L. Ferreira

Anônimo disse...

Óh Ernesto
mas que estórias incríveis que tu sabes. Ainda bem que te decidiste partilhá-las connosco.
Como não és Henriqueta, tem que se mudar o refrão:
Óh Ernesto vamos lá contar estórias que nem precisas papeleta.
Magnificas é o adjetivo.
F.Barroso

Anônimo disse...

Já vi que ainda continuas com a veia...
Histórias apimentadas ou mordazes, como esta, no quotidiano, não hão de faltar.
Portanto, o que isso quer continuidade.
Um abraço.
Zé Barroso