terça-feira, 26 de agosto de 2014

Esponsais

Na publicação de 8 de agosto, "Casamentos, 1803", um noivo contraiu esponsais com uma moça, mas casou com outra. Para isso, teve de obter dispensa do bispo da Guarda, relativamente ao contrato que celebrara anteriormente.
Como nos próximos dias vou publicar registos de casamentos onde aparece novamente esta situação, deixo aqui o esclarecimento sobre os esponsais.

Os rapazes e raparigas da minha idade ouviram muitas vezes os mais velhos falar de os pais do noivo irem a casa dos pais da noiva pedirem a rapariga em casamento, para o seu filho. Era um contrato apenas baseado na palavra, mas que acarretava muita honra a quem o cumpria e desonra e vergonha para todos os envolvidos no seu incumprimento. Isto nos inícios do século XX.

Cem anos antes, os registos de casamento falam de contrair esponsais e da dispensa deles por quem os rompera, dada pelo mais alto dignatário da hierarquia religiosa, o bispo da diocese. É a estas situações que se referem os regitos publicados e a publicar. Mas, embora haja registos do casamento, não existem relativamente à cerimónia dos esponsais.
Seria como foi com os nossos pais e avós? Pelo menos parece existir mais a intervenção do pároco!
No Brasil, isso ainda se faz, a julgar pelo texto que deixo no final, tirado do blogue


 Um pouco antes da época dos registos que ando a publicar, o poder político pretendeu impor aos esponsais um caráter oficial. Era o que estabelecia a lei de 5 de outubro de 1784 (mas certamente sem sucesso, pois não vingou):
«Que nenhuma pessoa, de qualquer qualidade e condição que seja, possa contrair esponsais, sem ser por escritura pública, lavrada por tabelião, e assinada pelos contraentes, e pelos pais de cada um deles; e na falta dos pais, pelos respetivos tutores, ou curadores, e por duas testemunhas ao menos; e que não produzam efeito algum quaisquer promessas, pactos ou convenções esponsalícias, que não forem contraídas por esta forma.»

ESPONSAIS E EXPLICAÇÕES
Pe. Humberto Gaspardo
É antiquíssimo o costume de se estipular, antes de  se celebrar o matrimônio, um contrato nupcial, com as promessas que se fazem de se celebrar o casamento em um tempo mais ou menos próximo, com os sinais da promessa e a leitura dos proclamas em dias festivos em presença dos fiéis. Os antigos romanos davam às suas noivas um anel de ferro sem adornos. Era um presente que poderia parecer pouco grato à esposa, pois que significava a indissolubilidade do vínculo conjugal, podia também simbolizar a rude dureza do jugo que durante toda a vida deveria pesar sobre seus ombros.
Os antigos francos ofereciam às noivas um anel, mais ou menos precioso, mas juntamente com o anel deixavam cair em suas mãos uma moeda, o que no fundo era um ato de barbárie que significava a compra da mulher como se fosse uma escrava.
No Antigo Testamento os primeiros esponsais de que se faz menção são os de Isaac e Rebeca e os presentes foram preciosíssimos. Os esponsais – palavra derivada da fórmula romana prometo juridicamente aptas. “Os esponsais não são absolutamente necessários, mas quer pelas vantagens que traz para os esposos,  quer pelo costume geral que existe nunca se deveriam omitir”. (SCOTONInst. Cateq.) A promessa de matrimônio deve ser assinada pelos noivos e pelo Pároco, se se faz diante dele, ou de duas testemunhas, se se fizer diante delas.
Se um ou nenhum dos esposos sabe escrever, ou não o pode fazer, deve-se fazer constar isso no texto, e acrescentar-se mais uma testemunha que assine por eles. No documento deve-se indicar a data precisa em que se há de realizar o casamento. Os esponsais bem feitos e nesta forma, são válidos, e têm força de um verdadeiro contrato, obrigando em consciência: primeiro obrigação de justiça de ambas as partes, de contrair matrimônio no tempo marcado; segundo, o dever de evitar todo namoro com terceira pessoa e todo e qualquer agravo a outra parte; terceiro, a inabilidade de contrair esponsais com outras pessoas; quarto, a inabilidade de contrair MATRIMONIO LÍCITO com outras pessoas.
Tudo isso obriga como lei moral, isto é, diante de Deus e da própria consciência.
Os esponsais podem-se tornar inválidos nos casos seguintes:
1- se uma das partes celebra matrimônio VÁLIDO com um terceiro;
2- pela renúncia expressa de ambas as partes, se a promessa foi bilateral, ou da parte aceitante se foi unilateral;
3 – passado o tempo determinado para o matrimônio;
4- pelo aparecimento de um impedimento não dispensável;
5- pela emissão de votos perpétuos ou ingresso em um estado mais perfeito de uma das partes.
Não há outros motivos suficientes para anular os esponsais? Sim; por exemplo: se um dos noivos, que estava com saúde, ou ao menos parecia que o estava, contrai uma doença incurável. Se era rico e um golpe de fortuna o tornou pobre. Quando se pensava que eram de bons costumes e se vem, a saber, que é um libertino. Se vivia em uma vila, ou próximo dela, e quer mudar para outro continente. Se a noiva declarou ter uma idade e de fato é mais velha. Julgava-se que ela era de bons costumes e chega-se a descobrir que não é tal. Os pais tinham-lhe prometido um dote razoável, e chegando o momento, deram-lhe outro muito menor, se foi atacada por varíola ou por outra enfermidade que deixa consequência.
Estes, pois, e outros casos semelhantes que possam  ocorrer, são suficientes para rescindirem-se os esponsais, isto  é, a promessa de matrimônio.

José Teodoro Prata

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