Habitantes
juntaram-se para manter terrenos limpos em Vila de Rei
Vítor Fernandes diz que população
decidiu agir em vez de esperar pelo Estado.
Cansados de esperar pelo Estado e da
aflição anual perante a chegada dos incêndios, os habitantes da aldeia de Monte
Novo criaram um grupo para identificar e limpar as terras.
Em Monte Novo, uma pequena aldeia do
concelho de Vila de Rei, a ameaça dos incêndios deste verão levou um conjunto
de habitantes a agir. "Quando estava tudo a arder em Pedrógão Grande, as
pessoas ficaram com medo que chegasse lá e mobilizaram-se todas. Andava tudo a
limpar os quintais com medo que o fogo chegasse", recorda Vítor Fernandes.
Foi nessa altura que o assistente de parque de estacionamento falou com os
vizinhos para que se juntassem e garantissem que os seus terrenos estavam
limpos o ano inteiro, de forma a que não andassem aflitos sempre que as chamas
espreitam.
"Percebi que eles já tinham falado
disso. Marcámos uma reunião, fortalecemos a nossa ideia, andámos com fitas
métricas a ver quantos metros era obrigatório limpar à volta dos terrenos. Já
temos tudo identificado, agora estamos a espalhar a ideia, a falar com os
proprietários das terras em volta da povoação." O que este grupo de dez
moradores de Monte Novo, na freguesia da Fundada, pretende é que ou os
proprietários limpem os seus terrenos ou que aceitem pagar pelos seus serviços
e eles certificam-se que as limpezas cumprem as normas legais.
Caso contrário, "quando houver um
incêndio, se for preciso, pegamos numa máquina e limpamos tudo, mesmo sem
autorização, porque não podemos é arriscar a segurança das nossas casas",
alerta Vítor Fernandes.
Apesar de viver em Lisboa, o mentor
desta ideia continua a ir à sua terra natal e mantêm bem presente a necessidade
de cuidar dos terrenos para que os incêndios não sejam piores. E já há algum
tempo que junta dinheiro - "como um condomínio na cidade" - para
tratar da limpeza das terras que mantém. O princípio para a limpeza da aldeia é
o mesmo que Vítor e os vizinhos aplicam com as suas terras: "Impusemos que
se tivermos alguma despesa a limpar terrenos dos outros, vamos custear isso e
juntamos dinheiro para isso. Toda a gente, com um euro por dia limpa o país
inteiro", defende.
Começaram pelos terrenos do interior da
povoação, que são propriedade dos dinamizadores do grupo, e agora fizeram o
levantamento dos terrenos que a envolvem. "Nas terras mais pequenas toda a
gente acaba por saber quem é o dono de cada bocadinho e torna-se mais fácil
chegar ao contacto com eles". Essa é uma fase que já passou e basta agora
terem uma autorização dos proprietários para fazerem a limpeza preventiva a que
se propõem.
Estes habitantes de Monte Novo acreditam
que a sua iniciativa pode ser um exemplo para que outras zonas do país se
mobilizem. "Temos de fazer alguma coisa e não podemos só empurrar para o
governo. O problema no momento é de todos."
Vítor fala até com a experiência de quem
já tinha lançado o desafio à autarquia de que se criasse um mecanismo que
obrigasse a cumprir a lei da limpeza dos terrenos. Na altura, tinha em mente
fazer desta atividade um negócio, mas quis garantir que iria haver quem
cumprisse a lei e precisasse de serviços como os seus. "A resposta foi de
que era difícil fazer cumprir a lei porque as pessoas não gostam de ser pressionadas",
lamenta.
Agora aos 60 anos, quer apenas manter um
grupo ativo de voluntários e conta com o apoio da autarquia para executar a
ideia. O executivo local está disponível para emprestar as máquinas necessárias
ao corte das árvores. Com a chegada das chuvas, Vítor e os amigos vão voltar a
contactar os donos dos terrenos que precisam de ser limpos para "chegarmos
a uma conclusão: ou eles limpam ou avançamos nós".
Diário de Notícias
Esta notíca interessa-me especialmente, quer pelo conteúdo, quer porque vivi 6 anos na Fundada e tive vários alunos do Monte Novo.
Nos comentários que se seguiam ao texto online, muitos escreveram que eles não fizeram mais do que a sua obrigação, pois não compete ao Estado limpar propriedades particulares. É verdade, muitas vezes a culpa que atribuímos ao Estado serve apenas para disfarçar a nossa inatividade. Mas este projeto é muito mais do que isso!!!
José Teodoro Prata
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