domingo, 27 de março de 2022

Gente nossa

 Ana Rita Teodoro

Foi notícia no jornal Público de ontem, integrada no suplementpo Ípsilon: 

https://www.publico.pt/2022/03/25/culturaipsilon/noticia/ana-rita-teodoro-comeco-fim-2000058

Hoje soube desta entrevista no Youtube: https://youtu.be/TvJrIyd1684 (Ver até ao fim, é imperdível!)

Esta nossa Rita é filha do Adelino Costa e da Eulália Teodoro. Desde cedo que escolheu o difícil caminho das artes, no seu caso da coreografia e da dança. Divide-se entre Portugal e França, as suas bases de onde parte para outras paragens.

Segundo a notícia do Público, esteve recentemente em Serralves (Porto) e apresenta neste momento o seu espetáculo no Teatro do Bairro Alto, em Lisboa.

José Teodoro Prata

quinta-feira, 24 de março de 2022

Mitologia popular portuguesa - as bruxas

Ando a ler este livro sobre a mitologia popular transmontana. Nele é apresentada, na p. 135, esta história recolhida em Vila Seca, Adoufe, Vila Real:

«A camisa de linho

Numa ocasião havia um rapaz que andava interessado numa determinada rapariga lá da sua terra. Mas antes de falar com ela, a pedir-lhe namoro, resolveu vigiá-la, para ver o que fazia e o que não fazia. Descobriu então que, em certas noites, à mesma hora, ela pegava e saía sozinha de casa, o que naquele tempo não era coisa que se tolerasse numa rapariga.

- Coisa estranha!... - pensava ele.

Vai daí, numa dessas noites seguiu-a, acabando por ir dar com ela, junto de outras mulheres, no meio do arvoredo, onde todas se estavam a despir. Viu-as então despirem-se e a seguir viu-as desaparecer.

Ele vai, pega na roupa dela. e esconde-se nos arbustos. Passadas algumas horas, as mulheres voltaram, vestiram-se e foram embora. Só ela é que não, pois não encontrava a roupa. Aperece-lhe então o rapaz, e diz:

- Toma lá a roupa, e vai para tua casa! Já sei o que andas a fazer.

Ela pediu-lhe que não contasse a ninguém. E em troca, disse que lhe dava uma camisa de linho que ela própria tinha feito. No dia seguinte, ele lá recebeu a camisa de linho, só que, em vez de a vestir, atou-a ao pescoço de um cão.

E qual não foi o seu espanto quando viu o cão andar às voltas, às voltas, até que desapareceu. Nunca mais ninguém soube dele. E por isso o rapaz desistiu de pedir namoro à rapariga. Nem quis mais contas com ela.»

Esta história é outra versão (quem conta um conto, acrescenta-lhe um ponto) da recolhida pela Libânia e publicada neste blogue e no livro "Dos Enxidros ao Casais". Prova que há um património comum às diferentes regiões do país. Eis "A dança das bruxas":

Das muitas tabernas que existiram na nossa terra, já só resta a do Marcelino, no Casal da Fraga (hoje é da Amália, que a herdou do pai). Gosto de lá ir à tardinha ou à noite, principalmente agora no verão, porque é a hora em que param por lá bons contadores de histórias.
Quem contou esta foi a ti Trindade Marcelino que, diz, ainda se lembra do homem a quem aconteceu o seguinte:
Há muitos anos, se calhar mais de cem, havia um rapaz nos Pereiros que namorava uma rapariga das Rochas. Sempre que podia lá ia ele a pé, por montes e vales, até chegar à terra da namorada que ainda ficava a umas boas horas de caminho.
Uma vez, já a lua ia alta, ao chegar ao cimo da serra do Açor vê aproximarem-se uns pássaros pretos que traziam uma luz no bico. Poisaram todos num cruzamento que por ali havia e, ao tocarem no chão, transformaram-se em belas raparigas. A seguir chegou um pássaro ainda maior que se transformou num homem. As raparigas juntaram-se todas à volta dele, fizeram uma roda e puseram-se a dançar e, de vez em quando, chegavam-se ao meio e beijavam-no.
Ao fim dum bom bocado chega mais um pássaro que também se transformou em mulher e se juntou à roda, mas o homem, zangado, perguntou-lhe porque é que estava a chegar tão atrasada. Ela respondeu-lhe o seguinte:
“Quem tem filhos para dormir e homem para acalentar, da Sertã aqui não tem que tardar?”
E lá continuaram a dança até que, de repente, se transformaram de novo em pássaros e voaram cada um para seu lado.
O rapaz, que se tinha escondido atrás dumas giestas que por ali havia, assistiu a tudo com muito medo e bastante zangado, porque tinha reconhecido a namorada numa das raparigas. Apesar disso, resolveu continuar o caminho até às Rochas e tirar tudo a limpo. Quando lá chegou, a namorada já estava em casa. Ele contou-lhe o que tinha visto e quis que ela explicasse o significado daquela cena. A rapariga confessou que era bruxa e disse-lhe o seguinte:
“Agora que sabes a verdade, não és obrigado a casar comigo, mas ai de ti que, enquanto eu for viva, contes a alguém o que viste hoje! Se alguém souber, mato-te! Em paga do teu silêncio, vais receber todos os anos uma camisa e umas ceroulas de linho.”
O rapaz voltou para os Pereiros, arranjou nova namorada e passado pouco tempo estava casado. Todos os anos lhe aparecia em casa uma camisa e umas ceroulas e a mulher, desconfiada, fazia sempre a mesma pergunta:
“Ó homem, mas que diabo é que te manda todos os anos esta roupa tão fina?”
Ele respondia sempre o mesmo:
“Come e cala-te, mulher de Deus. Tu nem queiras saber…”
Foi assim durante muitos anos. Quando a encomenda deixou de chegar, o homem contou finalmente à mulher o que tinha visto naquela noite a caminho das Rochas e a história espalhou-se por toda a aldeia e arredores. Ainda hoje a contam…
O homem morreu de velho, cego, a caminhar com uma bengala pelas ruas.

José Teodoro Prata

segunda-feira, 21 de março de 2022

Procissão dos Terceiros

Andei a passear-me pelas várias publicações do blogue sobre a Procissão dos Terceiros em São Vicente, e já nem fazia ideia dos vários artigos, com bastante informação, que foram sendo deixados, a propósito, ao longo destes anos. É fácil encontrá-los (para quem ainda não sabe, basta escrever Procissão dos Terceiros no retângulo à esquerda, quando se acede ao blogue, e aparecem vários artigos sobre o tema).

De todas, a publicação que mais me impressionou foi a de três de março de 2011, que mostra fotografias da procissão que se realizou em 1967, a primeira de que muitos temos memória. Mas não apenas por ser a primeira; é também porque as imagens nos lembram o mar de gente que era a nossa terra há pouco mais de cinquenta anos, e nos fazem recordar tantas histórias da infância; dalgumas pessoas, ter saudades. Mostram também a fé e recolhimento com que se viviam estas manifestações religiosas, pela necessidade que o povo tinha de se entregar à proteção dos santos que lhes acudiam nas muitas dificuldades da vida. Às vezes a oração era a única esperança que tinham.

Nas publicações dos anos mais recentes vê-se como as procissões vão trazendo ainda muita gente à terra no terceiro domingo da Quaresma; alguma vinda de longe, com fé ou apenas pela tradição. Vê-se ainda a presença de várias instituições (o Rancho, os Escoteiros ou os Bombeiros) que entretanto desapareceram ou estão em risco de acabar. A pouco e pouco a desertificação que se faz sentir em tantos outros aspetos da vida no interior, também vai tendo aqui os seus efeitos.  

Mas este ano, apesar das previsões meteorológicas não serem muito favoráveis, ainda mantivemos a tradição. Não deve ter sido fácil aos organizadores conseguir reunir as quase sessenta pessoas que são necessárias para transportar os 14(?) andores que integram a procissão. São tantos que, em alguns momentos pareciam mais que os participantes...


... mas depois tudo se compôs um pouco mais…


... e com a nossa Banda a acompanhar, foi ainda mais bonito!

M. L. Ferreira

domingo, 20 de março de 2022

Os Sanvincentinos na Grande Guerra

 João Simão

 

João Simão nasceu no Casal da Serra, a 9 de julho de 1893. Era filho de Simão Caetano e Maria Patrocínio, cultivadores.

Assentou praça no dia 9 de julho de 1913 e foi incorporado no 2.º Batalhão do Regimento de Infantaria 21, em 14 de maio de 1914. Na altura era analfabeto e tinha a profissão de jornaleiro. Pronto da instrução da recruta, em 28 de abril de 1914, veio domiciliar-se em São Vicente da Beira.

Apresentou-se novamente em 5 de maio de 1916, passando à formação do 1.º Batalhão do Regimento de Infantaria 21, em 11 de outubro.

Mobilizado para a guerra, embarcou para França no dia 21 de janeiro de 1917, integrando a 7.ª Companhia do 2.º Regimento de Infantaria 21, como soldado com o n.º 638 e a chapa de identidade n.º 9543-A.

Do seu Boletim Individual consta apenas o seguinte:

·        Baixa à Ambulância n.º 3, em 13 de janeiro de 1918, sendo evacuado para o Hospital Inglês, no dia 15, e para o Hospital Canadiano n.º 3, em 24. Teve alta no dia 26;

·        Regressou a Portugal, no dia 25 de Fevereiro de 1919, domiciliando-se na freguesia de São Vicente da Beira.



Passou ao 2.º Batalhão em 19/2/1920, à Brigada n.º 1 dos Caminhos-de-Ferro, em três de julho de 1924, e à Inspeção das Tropas de Comunicação, a 1 de Dezembro de 1924. Passou à reserva territorial em 31 de dezembro de 1931.

Condecoração:

Medalha de cobre comemorativa da expedição a França com a legenda França 1917-1918.

Família:

João Simão casou com Maria Pereira, natural da Póvoa de Atalaia, na Conservatória do Registo Civil de Castelo Branco, a 16 outubro de 1920. O casal viveu em Abrantes, localidade onde João Simão trabalhou como funcionário da CP. Não tiveram descendência.

Maria Pereira faleceu no dia 10 de outubro de 1959, no Rossio ao Sul do Tejo. Não foi possível saber a data nem o local da morte de João Simão, mas terá sido na mesma localidade, e em data posterior à da esposa.

 

 Maria Libânia Ferreira

Publicado no livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"

segunda-feira, 14 de março de 2022

Ainda os nossos professores

 A educação, no Reino de Portugal e em todas as terras do seu domínio, foi durante mais de duzentos anos confiada quase exclusivamente à Companhia de Jesus. Tinha, por isso, uma influência teológica muito grande. Com a Reforma Pombalina, em meados do século XVIII, influenciada pelas ideias Iluministas que cresciam por toda a Europa, as escolas Jesuítas são encerradas e o ensino secularizou-se, passando para a responsabilidade do Estado.

Alvará de 28 de junho de 1759 no qual D. José I traça algumas das ideias do que deveria ser o ensino em Portugal (retirado do livro de Francisco Goulão - Ensino Popular na Beira Baixa.

 

Após o encerramento dos Colégios Jesuítas, e durante um período relativamente longo, o Marquês de Pombal mandou que se fizesse um levantamento minucioso das necessidades do país e planeou uma rede de escolas que cobria grande parte das localidades principais do território nacional. Nesse mapa é estabelecida a localização das escolas bem como o número de lugares docentes por cada disciplina: Gramática Latina (236 lugares), Mestres de Ler e Escrever (440 lugares), Grego (38 lugares), Retórica (49 lugares) e Filosofia (35 lugares). Com a publicação da Carta de Lei de 6 de Novembro de 1772 está criado, finalmente, o ensino público em todo o Reino

O livro de Joaquim Ferreira Gomes - O Marquês de Pombal, criador do ensino primário oficial (PDF disponível na internet) apresenta-nos uma tabela onde podemos ver a distribuição destes lugares pelas diferentes comarcas do país. Na comarca de Castelo Branco foram criados 23 lugares para as diferentes cadeiras. Curiosamente, São Vicente não consta dessa lista inicial. Só uns anos mais tarde, por provisão de 13 de fevereiro de 1780, tivemos a nossa escola oficial de Primeiras Letras. Um dos primeiros professores dessa escola foi o Padre Joaquim Marques que, como podemos ver no documento seguinte, em 1805 requereu que lhe fosse renovado o título de propriedade do lugar que já regia há vários anos. A pretensão foi aceite pelo Príncipe Regente D. João, que autorizou também que lhe fosse pago o ordenado anual de 60 000 réis, “pagos aos quartéis”, através do Cofre do Subsídio Literário.

 

O Padre Joaquim Marques era natural de Tinalhas, filho de Filipe Martins e Maria Marques, família com algumas posses (penso que poderá ser este Filipe Martins Marques que o José Teodoro refere no livro “O Concelho de São Vicente da Beira nos finais do Antigo Regime” dizendo que morava na Rua do Cabo, numa casa com altos e baixos e era dono de uma atafona.

Foi durante muitos anos cura em São Vicente, mas não terá chegado a pároco. O seu nome aparece várias vezes em registos de casamento e batizados, quer como testemunha, quer como oficiante. Faleceu no dia 25 de janeiro de 1840, não se sabe com que idade (os registos paroquiais de Tinalhas estão bastante danificados e por isso de difícil consulta) e foi sepultado no cemitério da Vila. Seria uma pessoa abastada, com propriedades herdadas ou adquiridas em Tinalhas, Ninho do Açor, São Vicente e Partida, que deixou em testamento a dois sobrinhos que tinha.  

 

Para além desta Escola de Primeiras Letras, sabemos também que na segunda década do século XIX já existia uma Escola de Gramática e Língua Latina em São Vicente. Um dos primeiros professores desta escola foi o padre Francisco José de Mesquita. Teria inicialmente o estatuto de professor substituto, mas, por Despacho da Real Junta da Directoria Geral dos Estudos, de 19 de Outubro de 1818, foi provido no lugar como professor “proprietário” dessa cadeira. Vencia o ordenado anual de 140 000 reis, que lhe era pago igualmente aos quartéis pelo Cofre do Subsídio Literário. Era quase o triplo do vencimento do professor de Primeiras Letras, o que, mesmo tendo em conta os anos que passaram entre esta provisão e a do padre Joaquim Marques, é bastante significativo.

 

O Padre Francisco José de Mesquita era natural de S. Vicente. É possível que tenha nascido em janeiro de 1767, filho de José de Mesquita e Maria Genoveva (esta informação pode não estar correta porque, sendo padre, o único documento que encontrei foi o registo de óbito, que não refere nem a idade nem a paternidade).

Também foi padre-cura, mas não terá chegado a paroquiar a freguesia. Não terá sido um padre muito generosa porque, referido pelo José Teodoro numa lista de pessoas que fizeram donativos para o exército português, em “O Concelho de São Vicente da Beira na Guerra Peninsular”, Francisco de Mesquita não terá contribuído com nada, apesar de, à semelhança dos seus pares, ser supostamente uma pessoa com algumas posses.

Faleceu no dia 25 de setembro de 1823 e foi sepultado na Capela de São Francisco (a atual ou a antiga capela do convento onde algumas pessoas, segundo os registos de óbito ou testamentos, pediam para ser sepultadas?). Deixou testamento.

 

Embora as intenções que orientaram a Reforma Pombalina tivessem a ambição de tornar Portugal num dos países europeus mais adiantados em termos educativos, o que conhecemos diz-nos que os resultados ficaram aquém do esperado. As razões serão várias, nomeadamente a falta de professores com preparação adequada para ocuparem os lugares deixados pelos Jesuítas, assim como a qualidade das instalações e materiais científicos e pedagógicos que existiam na maior parte das suas escolas. Terá sido também o contexto político e económico do país, que não terá permitido levar para a frente as medidas idealizadas.  O facto de, como aconteceu em São Vicente, os professores serem muitas vezes padres, também não ajudou à democratização do ensino, quer em termos de classe social quer relativamente à educação das raparigas em igualdade com os rapazes.

Os números do analfabetismo por todo o país, mas principalmente nas zonas rurais, não deixam dúvidas quanto a essa realidade. Se consultarmos os registos de casamento ou batismo a partir dos anos sessenta do século dezanove (só a partir daí os registos nos dão alguma informação a este respeito), verificamos que uma percentagem muito elevada de nubentes ou padrinhos não sabiam assinar o nome. Se nos referirmos às noivas ou madrinhas a percentagem é ainda maior. As exceções referem-se quase sempre a raparigas ou senhoras pertencentes a famílias de estatuto sociocultural ou económico mais elevado (algumas nem eram naturais de São Vicente) que poderiam ter professores particulares que se deslocavam ao domicílio. Em 1900, no distrito de Castelo Branco, o analfabetismo ainda era de mais de 85%.

E a situação mantém-se quase inalterada até meados do século passado, principalmente, ainda, por razões económicas e culturais, (os filhos eram necessários como fonte de rendimento e a escola era pouco valorizada nas classes sociais mais baixas). A partir dos anos sessenta, com alguma melhoria das condições económicas das famílias e a criação de escolas de formação de professores em várias localidades, a situação melhorou bastante. Depois do 25 de Abril de 1974, pudemos todos, fosse qual fosse a condição das nossas famílias, frequentar uma escola perto das nossas casa, com professores que ainda hoje lembramos com alguma saudade.

 

M. L. Ferreira

sábado, 5 de março de 2022

O Sol nasce e a Estrela d´Alva vai dormir

Ao ler a publicação anterior comecei logo a contarolar estas duas lindas canções.

https://youtu.be/A_fRemms0uY

https://youtu.be/8RdmU9ivZIs

José Teodoro Prata

quarta-feira, 2 de março de 2022

Ver o Sol Chegar

 Nem tudo são rosas na vida do campo, mas, com dias tão feios lá fora, é quase uma bênção acordar com a Estrela da Manhã

a anunciar a alvorada.

E finalmente ver o Sol chegar, no horizonte, a prometer um dia lindo.

Pudesse ser assim na Terra inteira!

M. L. Ferreira