No livro Novelas do Minho, de Camilo Castelo Branco, mais propriamente na novela Maria Moisés, refere-se a origem do topónimo Santarém.
Já aqui escrevemos sobre o culto da corça pelos Celtas (0s
Lusitanos eram Celtas) e da sua presença nas lendas de São Pedro de
Vir-A-Corça, Monsanto, e da Senhora da Orada, São Vicente da Beira.
Mas vamos então ao Camilo:
O rei da Lusitânia Gorgoris teve uma
filha que se apaixonou por um homem de baixa extração. O que denunciou estes
amores foi, diz Bernardo de Brito em uma palavra de cunho português de
lei, foi a «emprenhidão».
- Credo! Que palavra! – exclamou com engulho
D. Maria Tibúrcia.
- Não parece palavra de pessoa
eclesiástica! – notou a outra senhora não menos escandalizada.
O mano Teutónio, como tinha piscado o
olho direito ao cónego, ria-se, e o cónego, com a maior gravidade, disse:
- Minhas senhoras, os antigos faziam
as coisas e diziam-nas; hoje em dia a civilidade não permite dizê-las. Ande lá
com a filha de Gorgoris, sr. desembargador.
- Deu ela à luz um menino, que o avô
deitou às feras; e, como as feras o não comessem, atirou-o ao Tejo. Foi o
menino encontrado no sítio que hoje chamam Santarém; e, como quer que uma corça
lhe desse o primeiro leite, chamou-se o menino Abidis, e daí veio
chamar-se o lugar Esca Abis (manjar de Abidis), e, corrupto, Scalabis,
etc.
Notas:
Frei Bernardo de Brito (1569-1617) escreveu uma
monumental História de Portugal, em oito volumes, chamada Monarchia Lusitana.
É a ela que o desembargador se refere para explicar a origem do nome Santarém.
Nestas 3 situações em que intervém uma corça a amamentar um
bebé nascido de uma gravidez indesejada (no caso da nossa Orada, a corça
alimenta a moça ainda grávida), a corça é como uma mãe que se dá num amor
incondicional. Seria essa a caraterística que os Celtas atribuíam à corça, no
culto que lhe prestavam?
José Teodoro Prata
3 comentários:
Se calhar nem tem nada a ver, mas, sendo a corça uma cabra selvagem, quem sabe?: acontecia, ainda há relativamente pouco tempo, entregarem os recém-nascidos indesejados ou ilegítimos, juntamente com uma cabra, a uma ama que, na altura, não estivesse em condições de o amamentar com o próprio leite.
Temos um caso interessante, contado no livro "A casa de Romarigães", e também nos processos de alguns expostos. Serão memórias ancestrais?
Já agora, consegues relatar aqui o caso de A Casa de Romarigães?
Em publicação ou em comentário.
Lá conseguir, consigo, mas tenho que voltar a ler pelo menos essa parte do livro, que já li há tempos.
Penso que é um dos melhores do Aquilino, e, só por ele, vale a pena passar pela Biblioteca e lê-lo todo.
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