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domingo, 7 de fevereiro de 2016

O centurião Damião

Ó pai, porque é que chamam Fonte da Portela à mina que se encontra no caminho que vai para as vinhas.
- Os antigos diziam que é muito antiga, vem do tempo dos romanos.
Mas ó pai, que nome aquele:-Portela. - Haveria lá alguma porta pequena que a tapasse?
- Nada disso, aquela portela quer dizer passagem; foi o teu avô que me disse, ao lado está uma estrada - como tu sabes - era uma via romana que vinha da Egitânia, por sua vez fazia ligação a Mérida. No tempo dos romanos esta cidade chamava-se Emérita Augusta, daqui partiam vias que a ligavam a Roma que era a capital do império.


Ó pai, se todos os caminhos vão dar a Roma, quer dizer que o caminho da Fonte da Portela também lá ia dar.
- As coisas que tu sabes. Vamos para a mesa, o caldo está deitado. Que cheirinho, está a escaldar…
- Assopra.
- A propósito, um destes dias ao passar junto à fonte, sentei-me numa pedra, baixei-me para beber água e sabeis o que me aconteceu! Até tenho vergonha de contar, não me chamem maluco.
Conte pai, o que é que lhe aconteceu?
Fala homem; não te acanhes.
- Só se me prometerdes que não dizeis a ninguém. Enquanto matava a sede, apareceu no espelho aquoso uma mulher com uma bilha na mão, ia acompanhada por um homem. A mulher estava a encher a bilha, de repente surge um cavaleiro trajado com vestes romanas que se apeou do cavalo e pediu água. A mulher passou-lhe a bilha para a mão e bebeu até se saciar. Anoitecia, ofereceram guarida ao viandante que aceitou; moravam perto…
Agora é que eu entendo porque é que no outro dia te trancaste no quarto
Ó mãe o que é que o pai terá escrito?
Não faço ideia, dá-me uma cavaca, o lume está a morrer, continua a nevar, o dia está feito.
Que bom; farinheira cozida. Abre a gaveta e tira a faca para a cortar, que saborosa; pinga no pão.
Ó pai; leia lá o que escreveu.
- Comamos primeiro a farinheira, tenho as mãos engorduradas, dá cá o abano, o lume está a apagar-se, onde é que estão as tenazes?
Olhe que ainda lhe mordem, veja debaixo do seu banco.
Dá-me o fervedor para tirar água quente da panela para lavar a loiça.


- Querem ouvir ou não?

Venho de longe, de muito longe
Dá-me de beber mulher bonita
Como se chama esta fonte, mulher bendita
Fonte da passagem senhor, tomai, bebei

Onde estou! Como se chama este lugar
Chama-se Trans Serre cavaleiro
Quem é o senhor! Forasteiro
Venho de longe e ainda tenho muito que andar

Venho de Roma, sou um centurião romano
Bracara Augusta é o destino da minha viagem.
No alto daquela serra, na passagem
Encontrará outras vistas, diz o paisano

Onde posso pernoitar
Diz o centurião.
Na nossa casa pois então
Faça favor de nos acompanhar

É uma casa pobrezinha
Mas está sempre limpinha.
É bastante asadinha
Responde o soldado da cozinha

Que pão gostoso.
É feito de bolotas senhor
Prove nosso vinho por favor
Ummm…que queijo saboroso

Quem é! Pergunta uma vizinha
É um soldado romano
Vai para Bracara Augusta, responde o paisano
Beba mais uma pinguinha

Bem-haja, estou cansado
Quero descansar
Onde me posso deitar
Para dormir um bocado

Todo o dia a cavalgar.
Venha comigo, vou-lhe mostrar
O lugar onde vai pernoitar
E o cavaleiro começou a dormitar

A noite passou a correr.
Dormiu bem senhor…Damião
Responde o centurião.
Venha connosco comer

Tenho que partir…
Façam favor de aceitar
Não é para vos pagar
Bem-haja, diz o centurião a sorrir

Que os deuses o acompanhem soldado Damião
Adeus, meus amigos, nunca vos esquecerei
Quem sabe se algum dia não regressarei
E a pouco-e-pouco afastava-se o centurião

Meu pai, é uma história muito bonita, até me vieram as lágrimas aos olhos.
-Não é caso para tanto…


Zé da Villa

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Os coutos das Vinhas

Das terras baldias de S. Vicente da Beira, nos séculos passados, já demos notícia em dois trabalhos anteriores: “Os Enxidros” e “Coutos e mais enxidros”. Como prometido, aqui deixamos as confrontações dos coutos das Vinhas.

«E logo no mesmo dia, mês e ano atrás escrito e declarado (dezasseis dias do mês de Novembro da era de mil setecentos e sessenta e sete anos), pelo dito Doutor Juiz de Fora e deste Tombo, foi mandado aos medidores medissem os coutos das Vinhas e por eles foi dito que, pelos muitos cantos que em si tinham, se não podiam medir à vista, do que o dito ministro lhes mandou dessem as confrontações dos mesmos.
(…)
E costumam-se arrendar, o ano de restolhos, os pastos deles, por doze mil réis, e o segundo ano se fica por oito mil réis e no terceiro ano se semeiam de pão. E o Cabeço da Velha se costuma arrendar por três mil réis e uns anos vão por mais e outros por menos. E todas estas terras dos coutos são de ervas e só o Cabeço da Velha é do concelho. E nestes ditos preços tem o concelho duas partes e a terça de Sua Majestade Fidelíssima.»

Como um dia me ensinou o meu tio João Teodoro, a tendência natural das pessoas é para aldrabar e, por isso, quem manda não pode transigir.
Condescendeu o juiz de fora à preguiça dos medidores e fez-se a confrontação dos coutos, muito por alto, sem rigor. Tiveram de lá voltar, a 3 de Dezembro de 1768,
«...visto a confusão em que se achavam os Coutos das Vinhas e as contendas que havia sobre o dar das coimas nos ditos coutos...»

«Acharam que principiavam os mesmos no sítio do Penedo Sombreireiro e deste correm direito toda a estrada abaixo, até chegar aonde chamam a Tapada de Simam Dias do Louriçal, e daí vai todo o ribeiro abaixo, até chegar aonde chamam o Porto.
Do dito sítio do Porto vai toda a estrada adiante, que vem do dito lugar do Louriçal para o do Sobral, até chegar à de João Gago, aonde se ferrou um marco defronte da quina da vinha que é de Francisco Joze do Casal da Serra, junto à dita estrada pela parte de baixo.
E deste dito marco pela dita estrada adiante, direito aonde chamam o Vale de Topadela e daí vai toda a estrada velha, que vai do Louriçal para o Sobral, direito à laje do Ribeiro da Ordem e daí vai a dita estrada velha adiante até chegar a um penedo redondo, que está no sítio do fundo da terra, que é do Excelentíssimo Conde desta vila de São Vicente, no qual penedo se fez uma cruz.
E daí vai direito o vale acima, partindo com o limite do lugar do Sobral, até chegar à ribeira, e daí vai toda a dita ribeira acima até chegar ao Casal do Pisco, que também é do mesmo Excelentíssimo Conde.
E daí corre pegando com o dito casal até chegar à Fonte da Portela, vai toda a estrada adiante até chegar ao casal de Antonio de Azevedo, que administra e traz de foro Manoel Vas Rapozo, ao ribeiro que chamam dos Aldeões, e daí vai todo ao longo acima da parede da tapada, que chamam dos Aldeões, que é do Capitão-Mor Manoel Caetano de Morais Sarmento, até chegar ao carril de carro ao cimo do Vale de Miguel Vicente e daí vai direito ao dito Penedo Sombreireiro, aonde se deu princípio a esta demarcação e confrontação.
Os quais coutos se costumam coutar somente de dia de São Tiago por diante, até que se vindimem as uvas das vinhas. E costumam-se vender, como se disse no primeiro termo.»


Parte da Carta Militar n.º 268. À direita da Fonte da Portela, está escrito Curral do Pisco. É erro, devia estar Casal do Pisco. A parte norte dos Coutos das Vinhas, onde se situava o casal que trazia aforado Manoel Vas Rapozo (o Casal do Aires) e os Aldeões, pertence a outra carta militar. Clicar, para ver em pormenor.

Num futuro próximo, apresentaremos a demarcação do Cabeço da Velha, da Fonte da Portela e da fonte concelhia das Vinhas, todos situados dentro destes coutos das Vinhas.