Sessão ordinária em 8 de Dezembro de 1918
Aos oito dias do mês de Dezembro do ano de mil novecentos e dezoito, n´esta vila de S. Vicente da Beira e sala destinada ás sessões da Gerencia da irmandade da Misericórdia d´esta mesma vila,pelas treze horas, estando presentes os cidadãos Eusebio Gomes Barroso, Provedor, João Mesquita, tesoureiro, João da Silva, secretario e os mesarios Manuel Roque e Francisco Duarte, aberta a sessão, foi lida e aprovada a acta da sessão anterior. O Provedor e vogais da mesa deliberaram que, antes de tudo fosse exarado n´esta acta o seguinte:
Não sendo de prever que as povoações d´esta freguesia fossem atacádas pela epidemia reinante tão rapidamente como foram, nem podendo resolver-se cousa alguma na sessão de dez de Novembro, que não se realizou por grassar já, com toda a intensidade, a epidemia e caírem com ela quase todos os membros da mesa e, em razão das circunstancias anormáes e angustiosas com que luctava a pobreza, tornando-se de urgente e absoluta necessidade, durante o período da doença internar no hospital um numero superior de doentes ao que em sessões anteriores se havia determinado, como então, por força dessas circunstancias extraordinarias e admitissem dez ou mais, a gerencia administrativa aprovada hoje por unanimidade o que se fez.
E bem assim aprova o augmento do preço da carne que em Outubro ultimo preterito foi de mais cinco centavos o kilo e passou depois em Novembro e nos demais a ser de dez centavos, por terem declarado os indivíduos do talho que não podiam continuar a fornecer a casa por menos.
Aprovaram ainda os pagamentos seguintes (alterou-se o aspecto gráfico deste parágrafo):
• Ao Reverendo João Fernandes Santiago do oficio funebre pelos irmãos defuntos, doze escudos;
• a Manuel Simão de um dia de trabalho a traçar lenha, oitenta centavos;
• a Francisca Faustina de quinze quilos de batata, um escudo e cincoenta centavos;
• a diversos pobres de esmolas com que foram subsidiados, nove escudos e cincoenta e tres centavos;
• a Manuel Diogo de três kilos duzentas e cincoenta gramas de banha de porco, quatro escudos e noventa e cinco centavos;
• a Crestina da Conceição de dois dias de lavagem de roupa, sessenta e oito centavos;
• a Ambrosio Diogo de quatro kilos de toucinho, seis escudos e quarenta centavos;
• aos empregados do hospital de ordenados do mes de Novembro, trinta e dois escudos;
• a Viriato Lopes Russo de medicamentos fornecidos no dito mes, sessenta e dois escudos e setenta e tres centavos;
• aos fornecedores de pão, carne e leite, idem, cincoenta e sete escudos e sessenta e nove centavos;
• a Francisco Lourenço de mais dezasseis litros de leite, um escudo e sessenta centavos
• e de Maria Celeste Silva de mercearias e outros artigos quinze escudos e trinta e oito centavos.
Apresentou-se o balancete do referido mês de Novembro, verificando-se que a receita foi de setecentos setenta e seis escudos e dez centavos e a despesa de duzentos e cinco escudos e vinte seis centavos, resultando um saldo que transita para o mês seguinte de quinhentos setenta escudos e oitenta centavos. E não havendo mais nada a tratar se encerrou a sessão pelas quinze horas.
(Seguem-se as assinaturas dos participantes)
Algumas notas:
1. A esta sessão, faltaram os mesários Antonio da Silva Lobo e Joaquim dos Santos.
2. Na época, o farmacêutico da vila era Viriato Lopes Russo. A sua filha Maria Isabel (Belinha) casou com António Lourenço de Azevedo (Toninho Lourenço) e viveram no solar construído no local do antigo convento franciscano.
3. Maria Celeste Silva era a esposa de Manuel da Silva, que então se encontrava, com outros vicentinos, a participar na Primeira Guerra Mundial.
4. Esta guerra provocou uma grave crise económica, a qual acabaria por ser a principal causa do derrube da Primeira República. A acta informa sobre o aumento do preço da carne, em cinco centavos, em Outubro, e dez centavos, em Novembro.
5. Em 1918, 1 litro de leite custava 10 centavos, no produtor; 1 quilo de batatas também 10 centavos; 1 quilo de toucinho custava 1 escudo e 60 centavos. Em Junho, o preço do toucinho ainda era de 1 escudo e 20 centavos, mais uma prova da carestia de vida.
6. Nesse ano, um trabalhador braçal ganhava 80 centavos/dia e uma mulher a lavar roupa 34 centavos /dia.
7. De facto, a sessão de dez de Novembro não se realizou, por estarem doentes quase todos os membros da Gerência, assim como muitos funcionários do hospital.
8. A Misericórdia subsidiava os pobres e também pagava ao coveiro, pelas covagens (abertura da sepultura) feitas aos pobres falecidos. Por exemplo, na sessão de 30 de Junho deu-se ordem de pagamento de vinte centavos, ao coveiro Manuel Rodrigues, «...pela covagem feita a um pobre....».
9. Embora o segundo parágrafo não seja bem perceptível, entende-se que, durante a Pneumónica, o número de internados no hospital subiu para 10, número superior ao que dantes estava estabelecido pela Gerência.
Enxidros era a antiga designação do espaço baldio da encosta da Gardunha acima da vila de São Vicente da Beira. A viver aqui ou lá longe, todos continuamos presos a este chão pelo cordão umbilical. Dos Enxidros é um espaço de divulgação das coisas da nossa freguesia. Visitem-nos e enviem a vossa colaboração para teodoroprata@gmail.com
Mostrando postagens com marcador hospital da santa casa da misericórdia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador hospital da santa casa da misericórdia. Mostrar todas as postagens
sábado, 11 de dezembro de 2010
segunda-feira, 15 de novembro de 2010
Pneumónica 1
Óbitos no Hospital
Em Outubro e Novembro de 1918, estiveram internados, no Hospital da Santa Casa da Misericórdia de São Vicente da Beira, um total de 34 doentes, sofrendo 29 deles de gripe, pneumonia gripal, gripe brônquica ou bronco-pneumonia. Com diferentes diagnóstivos e complicações, a maioria destes terá tido gripe pneumónica e alguns uma simples gripe que, no entanto, os obrigou a internamento.
Os doentes ali internados, nestes dois meses, eram todos de São Vicente, ao contrário do habitual. Talvez se tenha evitado a deslocação de doentes e porque o Hopostal só tinha 10 camas e esteve com o pessoal auxiliar também doente, assim como quase toda a direcção.
Os (dois) médicos, então de serviço, só não conseguiram curar 4 dos seus doentes, que acabaram por falecer. Quatro é muito pouco, num universo de 86, a totalidade de mortos, na freguesia, durante esses dois meses. Mas a eles chegarei, noutro dia. Hoje, ficamo-nos pelos que faleceram no Hospital, todos de São Vicente da Beira. Faz agora anos, por estes dias:
31-10-1918: Antonio Candeias, filho de Manuel Luis Candeias e de Maria da Conceição, jornaleiros. Tinha 14 anos e era pastor.
01-11-1918: Francisco Jeronimo, filho de Jose Jeronimo e de Olalia da Conceição. Tinha 26 anos, era cultivador e estava casado com Maria da Luz Romualdo.
08-11-1918: João Agostinho, filho de Andre Agostinho e de Maria da Conceição. Era sardinheiro e tinha 19 anos.
18-11-1918: Maria de Jesus Hipolito, filha de Joaquim Hipolito de Jesus e de Maria Antonia. Tinha 30 anos(35, segundo o registo da Igreja), era doméstica e estava casada com Joaquim Maria dos Santos Caio, funileiro e, na época, enfermeiro do Hospital. Deixou dois filhos menores: um, com 5 anos, Joaquim Caio; outro, com 7 anos, João Caio. Na sessão ordinária de 12 de Janeiro de 1919, a gerência do Hospital deliberou autorizar o enfermeiro a comer no local de trabalho, descontando-se-lhe do ordenado.
Nota:
O óbito de Francisco Jerónimo está registado no Hospital e na Igreja Matriz, mas levanta-nos, a nós Jerónimos, uma questão que ainda não consegui esclarecer, embora já tenha ido falar com a minha tia Eulália(como a avó).
Jose Jeronimo e Olalia da Conceição tiveram pelo menos 6 filhos: a minha avó Maria do Rosário Jerónimo, a tia Rosa Jerónimo (mãe de Maria do Céu Jerónimo Matias), o tio João Jerónimo (dos Arrebotes), o tio Miguel Jerónimo (do Cimo de Vila)o tio Albano Jerónimo e este Francisco Jerónimo. Só que ele foi combater para África, talvez na 1.ª Guerra Mundial, casou lá e nunca mais voltou. Os irmãos colhiam a azeitona da sorte dele, herdada dos pais, um ano cada um. Depois, devem ter dividido o terreno, entre si.
Por outro lado, Maria da Luz Romualdo, que ainda conheci moradora no Ribeiro de Dom Bento, foi casada com outro homem, de quem teve filhos. É possível que tenha voltado a casar, até porque os registos consultados não referem filhos menores que Francisco Jerónimo tenha deixado.
Mas, o mesmo Francisco Jerónimo, com duas vidas? Impossível. Irmãos? É possível!
Em Outubro e Novembro de 1918, estiveram internados, no Hospital da Santa Casa da Misericórdia de São Vicente da Beira, um total de 34 doentes, sofrendo 29 deles de gripe, pneumonia gripal, gripe brônquica ou bronco-pneumonia. Com diferentes diagnóstivos e complicações, a maioria destes terá tido gripe pneumónica e alguns uma simples gripe que, no entanto, os obrigou a internamento.
Os doentes ali internados, nestes dois meses, eram todos de São Vicente, ao contrário do habitual. Talvez se tenha evitado a deslocação de doentes e porque o Hopostal só tinha 10 camas e esteve com o pessoal auxiliar também doente, assim como quase toda a direcção.
Os (dois) médicos, então de serviço, só não conseguiram curar 4 dos seus doentes, que acabaram por falecer. Quatro é muito pouco, num universo de 86, a totalidade de mortos, na freguesia, durante esses dois meses. Mas a eles chegarei, noutro dia. Hoje, ficamo-nos pelos que faleceram no Hospital, todos de São Vicente da Beira. Faz agora anos, por estes dias:
31-10-1918: Antonio Candeias, filho de Manuel Luis Candeias e de Maria da Conceição, jornaleiros. Tinha 14 anos e era pastor.
01-11-1918: Francisco Jeronimo, filho de Jose Jeronimo e de Olalia da Conceição. Tinha 26 anos, era cultivador e estava casado com Maria da Luz Romualdo.
08-11-1918: João Agostinho, filho de Andre Agostinho e de Maria da Conceição. Era sardinheiro e tinha 19 anos.
18-11-1918: Maria de Jesus Hipolito, filha de Joaquim Hipolito de Jesus e de Maria Antonia. Tinha 30 anos(35, segundo o registo da Igreja), era doméstica e estava casada com Joaquim Maria dos Santos Caio, funileiro e, na época, enfermeiro do Hospital. Deixou dois filhos menores: um, com 5 anos, Joaquim Caio; outro, com 7 anos, João Caio. Na sessão ordinária de 12 de Janeiro de 1919, a gerência do Hospital deliberou autorizar o enfermeiro a comer no local de trabalho, descontando-se-lhe do ordenado.
Nota:
O óbito de Francisco Jerónimo está registado no Hospital e na Igreja Matriz, mas levanta-nos, a nós Jerónimos, uma questão que ainda não consegui esclarecer, embora já tenha ido falar com a minha tia Eulália(como a avó).
Jose Jeronimo e Olalia da Conceição tiveram pelo menos 6 filhos: a minha avó Maria do Rosário Jerónimo, a tia Rosa Jerónimo (mãe de Maria do Céu Jerónimo Matias), o tio João Jerónimo (dos Arrebotes), o tio Miguel Jerónimo (do Cimo de Vila)o tio Albano Jerónimo e este Francisco Jerónimo. Só que ele foi combater para África, talvez na 1.ª Guerra Mundial, casou lá e nunca mais voltou. Os irmãos colhiam a azeitona da sorte dele, herdada dos pais, um ano cada um. Depois, devem ter dividido o terreno, entre si.
Por outro lado, Maria da Luz Romualdo, que ainda conheci moradora no Ribeiro de Dom Bento, foi casada com outro homem, de quem teve filhos. É possível que tenha voltado a casar, até porque os registos consultados não referem filhos menores que Francisco Jerónimo tenha deixado.
Mas, o mesmo Francisco Jerónimo, com duas vidas? Impossível. Irmãos? É possível!
Assinar:
Postagens (Atom)