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sábado, 7 de abril de 2018

Fogos / Central de biomassa

Interior vai ter mais duas centrais, mas pode faltar a biomassa


Construção da central de biomassa na zona industrial do Fundão. 
A entrada em funcionamento está prevista para o final deste ano.

Está em marcha um investimento de €104 milhões em Viseu e no Fundão

Começaram a ser planeadas e construídas antes dos incêndios do último verão. Ou seja, com base num pressuposto de existência de biomassa florestal em quantidades mais que suficientes para a laboração normal destas duas novas centrais, no Fundão e em Viseu. Acontece que as chamas varreram tudo à sua passagem, incluindo a matéria-prima que estava disponível há anos — no chão das florestas e serranias — para estas duas unidades de produção de energia renovável.

Jornal Expresso online, 07.04.2018
José Teodoro Prata

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Pirocumulonimbo


O fenómeno que pode estar na origem dos fogos de 15 de outubro

            Tem um nome difícil de pronunciar, é raro, mas poderá ter-se registado por duas vezes este ano em Portugal
            Os incêndios mortais de Pedrógão Grande, a 17 de junho, e da zona centro, a 15 de outubro, poderão estar relacionados com um fenómeno raro, com um nome difícil de pronunciar: pirocumulonimbo. Dois elementos da Comissão Técnica Independente que investigaram os fogos do início do verão que mataram 64 pessoas acreditam que foi isso que aconteceu, segundo contaram à TSF.
            "Pirocumulonimbo é uma tempestade criada por um incêndio", diz Paulo Fernandes, doutorado em Ciências Florestais e Ambientais da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD). De entre as imagens que viu e os relatos que ouviu acerca dos incêndios, destaca a nuvem do incêndio, que descreve como "muito desenvolvida, muito alta, que a determinada altura começou a produzir relâmpagos e trovões". "Esse é um dos sinais do pirocumulonimbo", conclui.
            Este fenómeno já havia sido descrito pela Comissão Técnica Independente relativamente ao incêndio de Pedrógão. "É uma nuvem de fumo que sobe muito alto, a 10 quilómetros, 12. Quando essa nuvem sobe tão alto, além da condensação, forma-se gelo e é o atrito entre os cristais de gelo que pode provocar raios, provocados pelo próprio incêndios, e que por vezes dão origem a novas ignições", descreve o Paulo Fernandes, para quem a existência de um pirocumulonimbo "explicaria, pelo menos em parte, a devastação a que se assistiu nestes dois grandes incêndios do interior". De acordo com o que o investigador afirmou à TSF, "um incêndio florestal típico não causa aquela destruição", sendo necessário para isso acontecer "vento forte, com projeções a grande distância de materiais incandescentes".
            Carlos Fonseca, outro elemento da Comissão Técnica Independente, diz à mesma rádio que aquilo que viu foi "um incêndio de uma dimensão, de uma violência, de uma rapidez como nunca tinha assistido". O investigador, que também andou no terreno a combater as chamas junto da sua propriedade, recorda as "labaredas com mais de 30 metros, com fumos de múltiplas cores", um cenário com "toda uma dinâmica atmosférica estranha".

HÉLIO MADEIRAS, Diário de notícias
https://www.dn.pt/portugal/interior/pirocumulonimbo-o-fenomeno-que-pode-estar-na-origem-dos-fogos-de-15-de-outubro-8883123.html


José Teodoro Prata

domingo, 15 de outubro de 2017

Fazer diferente


Saiu o relatório da comissão de "sábios", sobre os incêndios. O ponto 4, que nos diz diretamente respeito, transcrevo-o no final deste texto.
Nele consta a recomendação de diversificar a floresta, com mais castanheiros e carvalhos, mais sobreiros e medronheiros, espaçar as árvores e manter o solo limpo de matos.
Para mim, este último é que é o calcanhar de aquiles. O que fazer aos matos e ramos que se cortam? Todos sabemos que é neles, a par da densidade das árvores, que reside a quase impossiblidade de combater os incêndios.
O Cabeço de Pisco é um bom exemplo desta questão. No ano passado cortaram-se os pinheiros maiores e ficaram os jovens e os eucapiptos; este ano cortaram-se os eucaliptos. A floresta ficou muito rala, quase sem matos, mas com um depósito de caruma de mais de 20 anos e as ramagens de dois cortes em anos consecutivos. Aparentemente, estava bem, de acordo com as melhores práticas recomendadas no relatório. Mas como apagar um incêndio ali?
Informa-me a internet que já existe uma central de compustagem na Chamusca e outra em Vila Nova de Famalicão. Elas são a solução ideal para tratar estes resíduos florestais, mas a área que abrangem será uma gota de água nas nossas necessidades para manter a floresta limpa. Há anos, falou-se numa para Oleiros, mas ficou pelo caminho.
E como limpar a floresta, neste cenário de desertificação humana? Temos falta de gente, mas muitos não querem ouvir falar de imigrantes, como se nós todos não fossemos descendentes de imigrantes. Também seria necessário muito dinheiro para ter uma equipa de sapadores florestais quase em cada freguesia. Mas seriam mais algumas famílias a manterem-se em cada freguesia deste interior despovoado. E o dinheiro? Acho que os milhões gastos quase inutilmente em aviões e helicópteros seriam suficientes. O problema é a fase de transição, em que terá de se manter este gasto quase inútil, ao mesmo tempo que já se pagam aos sapadores.
Com a floresta limpa e ordenada, os incêndios seriam controláveis. No fim de uns anos, teríamos madeiras nobres que tornariam desnecessária a importação.
Nota: Não saiu da minha cabeça esta da limpeza da floresta em vez do uso sistemático de meios aéreos que apenas abrandam o fogo. A opinião é de uma  luso-americana especialista em incêndios que, em entrevista à Visão, defendia o que acima escrevi, dizendo que mais de metade da água lançada pelos aviões evapora com o calor do fogo antes de chegar ao solo.

Faz-me confusão andar na Gardunha, por entre as áreas queimadas. Vamos fazer como de costume e esperar que matos e pinheiros nasçam/rebentem, para daqui a anos arderem de novo? Seria bonito ver a nossa terra com uma moldura de sobreiros, na meia encosta da Gardunha, isto é, nos Enxidros. Dão-se cá tão bem e são tão rentáveis! E nas linhas de água poderia haver carvalhos e castanheiros, como há cem anos, antes de cá chegarem os pinheiros.
E o que vai ser feito para proteger do fogo o que resta da nossa floresta? O São Pedro que trate disso?

«4. Ordenamento e Gestão
  • Deverão criar-se mecanismos que garantam a intervenção num espaço, de largura a definir para cada caso – actualmente está regulamentado em 100 metros – à volta dos aglomerados que assegure pela sua ocupação (pela carga reduzida e descontinuidade do complexo combustível), uma reduzida intensidade do fogo e a protecção das habitações e de outros bens. Devem ser promovidos usos do solo que reduzam a intensidade do fogo e o risco de propagação para edificações e utilizadas espécies de baixa inflamabilidade, com elevado teor de humidade nos períodos secos, ou que promovam o desenvolvimento de complexos vegetais de reduzida combustibilidade. Estas medidas devem privilegiar a minimização das intervenções de manutenção não produtivas, a promoção de actividades humanas de manutenção e as culturas agrícolas de sequeiro ou regadio – anuais ou perenes - desde que os proprietários ou quem a eles se substitua tenha capacidade para a sua gestão e manutenção.
  • Os utilizadores do espaço florestal deverão ser mobilizados para uma intervenção que instale formações arbustivas ou arbóreas com menor combustibilidade e da adopção de práticas que reduzam o risco de incêndios e ajudem a mitigar o problema.
  • Deverá proceder-se a uma reformulação da Autoridade Florestal Nacional nos seus princípios, forma e capacidade de actuação, preocupada com a regulação do sector florestal em geral e focalizada na gestão das áreas sob regime florestal e na prevenção estrutural.
  • As organizações representativas das entidades privadas no sector devem concorrer para apresentar alternativas de utilização e de gestão aos proprietários.
  • Promoção da compartimentação das manchas florestais puras através de 19 plantações novas, ou reconversões, ou ainda adensamentos, com outras espécies arbóreas ou arbustivas de baixa inflamabilidade/combustibilidade ou plantadas em faixas de alta densidade, promovendo um efeito de barreira por quebra da continuidade de combustível ao nível do solo.
  • Reconhece-se que povoamentos puros ou mistos de pinheiro bravo ou eucalipto sem redução efectiva da carga de matos no seu interior conduzem, em situações de secura, a incêndios de grande intensidade com elevada possibilidade de projecções de focos secundários a grandes distâncias. Para estas duas espécies a regra é a da gestão do combustível no sub-bosque. Sem combustível no seu interior estas florestas, em vez de um problema sério, podem fazer parte da solução.
  • As melhores soluções de ordenamento para a mitigação dos incêndios florestais passam pela diversificação da floresta e a utilização de espécies que conduzam a formações menos combustíveis, nomeadamente das folhosas de folha caduca, como os carvalhos, castanheiros ou outras folhosas, por terem um grande teor de humidade. Estas espécies não são propícias a fogos de copas e devem, portanto, ser consideradas em misturas com outras espécies ou em áreas estratégicas para contrariar a fácil propagação dos incêndios. No Pinhal Interior modelos de silvicultura apropriados com Sobreiro e com Medronheiro têm também demonstrado fazer parte integrante de uma solução em que a diversificação da floresta tem de ser um objectivo.
  • Deve dar-se uma redobrada atenção à finalização, a curto prazo, dos novos Programas Regionais de Ordenamento Florestal, os quais podem ser utilizados para que, a partir do conhecimento dos últimos dados do Inventário Florestal Nacional (a aguardar publicação), se revejam as metas inicialmente estabelecidas no sentido de possibilitar que a nível da Região PROF e dos concelhos, sejam cada vez mais incorporadas as questões associadas aos incêndios florestais. As suas propostas deverão ser integradas nos Planos Directores Municipais e ser alvo de maior proximidade e acompanhamento do ordenamento florestal pelas entidades municipais.
  • Criação de programa específico que compense a perda de rendimento por alguns anos para a criação de florestas de carvalhos, castanheiros e outras folhosas. Este programa deverá incentivar os proprietários e gestores florestais a optarem por estas espécies que a médio e longo prazo poderão ser ainda mais rentáveis do que as actuais alternativas e com menor perigo de incêndio para as próprias florestas e para as aldeias existentes nos espaços florestais.»
José Teodoro Prata