Saiu o relatório da comissão de "sábios", sobre os incêndios. O ponto 4, que nos diz diretamente respeito, transcrevo-o no final deste texto.
Nele consta a recomendação de diversificar a floresta, com mais castanheiros e carvalhos, mais sobreiros e medronheiros, espaçar as árvores e manter o solo limpo de matos.
Para mim, este último é que é o calcanhar de aquiles. O que fazer aos matos e ramos que se cortam? Todos sabemos que é neles, a par da densidade das árvores, que reside a quase impossiblidade de combater os incêndios.
O Cabeço de Pisco é um bom exemplo desta questão. No ano passado cortaram-se os pinheiros maiores e ficaram os jovens e os eucapiptos; este ano cortaram-se os eucaliptos. A floresta ficou muito rala, quase sem matos, mas com um depósito de caruma de mais de 20 anos e as ramagens de dois cortes em anos consecutivos. Aparentemente, estava bem, de acordo com as melhores práticas recomendadas no relatório. Mas como apagar um incêndio ali?
Informa-me a internet que já existe uma central de compustagem na Chamusca e outra em Vila Nova de Famalicão. Elas são a solução ideal para tratar estes resíduos florestais, mas a área que abrangem será uma gota de água nas nossas necessidades para manter a floresta limpa. Há anos, falou-se numa para Oleiros, mas ficou pelo caminho.
E como limpar a floresta, neste cenário de desertificação humana? Temos falta de gente, mas muitos não querem ouvir falar de imigrantes, como se nós todos não fossemos descendentes de imigrantes. Também seria necessário muito dinheiro para ter uma equipa de sapadores florestais quase em cada freguesia. Mas seriam mais algumas famílias a manterem-se em cada freguesia deste interior despovoado. E o dinheiro? Acho que os milhões gastos quase inutilmente em aviões e helicópteros seriam suficientes. O problema é a fase de transição, em que terá de se manter este gasto quase inútil, ao mesmo tempo que já se pagam aos sapadores.
Com a floresta limpa e ordenada, os incêndios seriam controláveis. No fim de uns anos, teríamos madeiras nobres que tornariam desnecessária a importação.
Nota: Não saiu da minha cabeça esta da limpeza da floresta em vez do uso sistemático de meios aéreos que apenas abrandam o fogo. A opinião é de uma luso-americana especialista em incêndios que, em entrevista à Visão, defendia o que acima escrevi, dizendo que mais de metade da água lançada pelos aviões evapora com o calor do fogo antes de chegar ao solo.
Faz-me confusão andar na Gardunha, por entre as áreas queimadas. Vamos fazer como de costume e esperar que matos e pinheiros nasçam/rebentem, para daqui a anos arderem de novo? Seria bonito ver a nossa terra com uma moldura de sobreiros, na meia encosta da Gardunha, isto é, nos Enxidros. Dão-se cá tão bem e são tão rentáveis! E nas linhas de água poderia haver carvalhos e castanheiros, como há cem anos, antes de cá chegarem os pinheiros.
E o que vai ser feito para proteger do fogo o que resta da nossa floresta? O São Pedro que trate disso?
«4. Ordenamento e
Gestão
- Deverão criar-se mecanismos que garantam a
intervenção num espaço, de largura a
definir para cada caso – actualmente está regulamentado em 100 metros – à
volta dos aglomerados que assegure pela sua ocupação (pela carga reduzida
e descontinuidade do complexo combustível), uma reduzida intensidade do
fogo e a protecção das habitações e de outros bens. Devem ser promovidos
usos do solo que reduzam a intensidade do fogo e o risco de propagação
para edificações e utilizadas espécies de baixa inflamabilidade, com
elevado teor de humidade nos períodos secos, ou que promovam o
desenvolvimento de complexos vegetais de reduzida combustibilidade. Estas
medidas devem privilegiar a minimização das intervenções de manutenção não
produtivas, a promoção de actividades humanas de manutenção e as culturas
agrícolas de sequeiro ou regadio – anuais ou perenes - desde que os
proprietários ou quem a eles se substitua tenha capacidade para a sua
gestão e manutenção.
- Os utilizadores do espaço florestal deverão ser
mobilizados para uma intervenção que instale formações arbustivas
ou arbóreas com menor combustibilidade e da adopção de práticas
que reduzam o risco de incêndios e ajudem a mitigar o problema.
- Deverá proceder-se a uma reformulação da
Autoridade Florestal Nacional nos seus princípios, forma e capacidade de
actuação, preocupada com a regulação do sector florestal em geral e
focalizada na gestão das áreas sob regime florestal e na prevenção
estrutural.
- As organizações representativas das entidades privadas
no sector devem concorrer para apresentar alternativas de utilização e de
gestão aos proprietários.
- Promoção da compartimentação das manchas
florestais puras através de 19 plantações novas, ou reconversões, ou ainda
adensamentos, com outras espécies arbóreas ou arbustivas de baixa
inflamabilidade/combustibilidade ou
plantadas em faixas de alta densidade, promovendo um efeito de barreira
por quebra da continuidade de combustível ao nível do solo.
- Reconhece-se que povoamentos puros ou mistos
de pinheiro bravo ou eucalipto sem redução efectiva da
carga de matos no seu interior conduzem, em situações de secura, a
incêndios de grande intensidade com elevada possibilidade de projecções de
focos secundários a grandes distâncias. Para estas duas espécies a regra é
a da gestão do combustível no sub-bosque. Sem combustível no seu interior
estas florestas, em vez de um problema sério, podem fazer parte da
solução.
- As melhores soluções de ordenamento para a
mitigação dos incêndios florestais passam pela diversificação da
floresta e a utilização de espécies que conduzam a formações menos
combustíveis, nomeadamente das folhosas de folha caduca, como os carvalhos,
castanheiros ou outras folhosas, por terem um grande teor de
humidade. Estas espécies não são propícias a fogos de copas e devem,
portanto, ser consideradas em misturas com outras espécies ou em áreas
estratégicas para contrariar a fácil propagação dos incêndios. No Pinhal
Interior modelos de silvicultura apropriados com Sobreiro e com
Medronheiro têm também demonstrado fazer parte integrante de uma solução
em que a diversificação da floresta tem de ser um objectivo.
- Deve dar-se uma redobrada atenção à finalização,
a curto prazo, dos novos Programas Regionais de Ordenamento Florestal, os quais podem ser utilizados para que, a partir do conhecimento dos
últimos dados do Inventário Florestal Nacional (a aguardar publicação), se
revejam as metas inicialmente estabelecidas no sentido de possibilitar que
a nível da Região PROF e dos concelhos, sejam cada vez mais incorporadas
as questões associadas aos incêndios florestais. As suas propostas deverão
ser integradas nos Planos Directores Municipais e ser alvo de maior
proximidade e acompanhamento do ordenamento florestal pelas entidades
municipais.
- Criação de programa específico que compense a
perda de rendimento por alguns anos para a criação de florestas de
carvalhos, castanheiros e outras folhosas. Este programa deverá incentivar os proprietários e gestores
florestais a optarem por estas espécies que a médio e longo prazo poderão
ser ainda mais rentáveis do que as actuais alternativas e com menor perigo
de incêndio para as próprias florestas e para as aldeias existentes nos
espaços florestais.»
José Teodoro Prata