domingo, 10 de abril de 2022

A guerra na Ucrânia (1)

No início deste conflito, escrevi 4 crónicas para a Rádio Castelo Branco (Racab), dando algumas informações elementares que permitissem naquele momento entender melhor a guerra. Hoje a realidade é muito mais complexa e trágica, mas continua a valer a pena publicar.

Vou publicar um texto por dia.

Podem ser ouvidos na rubrica "História ao Minuto, em: http://www.radiocastelobranco.pt/audioteca/

RÚSSIA

No século XVI, a Rússia começou a expandir-se, conquistando regiões e povos vizinhos, de tal modo que, entre 1721 e 1917, formou um grande império, que ia do Oceano Ártico ao Mar Negro e do Mar Báltico ao Oceano Pacífico, possuindo ainda o Alasca que vendeu aos Estados Unidos.

Na Europa, este Império abrangia, além da Rússia, os territórios e povos dos seguintes países na atualidade: Finlândia, Estónia, Letónia, Lituânia, parte da Polónia, Bielorrússia, parte da Moldávia e Ucrânia.

Estas regiões foram recebendo emigrantes russos, em movimentos migratórios que continuaram no século XX, então integrados na União Soviética (exceto a Finlândia), pelo que não é de estranhar que nestes atuais países uma significativa percentagem da população seja russófona. Com o fim da União Soviética, estas repúblicas desligaram-se da Rússia e tornaram-se totalmente independentes.

Embora o país continue a ser o maior do Mundo, o seu atual presidente, Putin, é um nostálgico da antiga grandeza da Rússia e por outro lado sente-se pressionado pela crescente expansão da Nato para países com os quais a Rússia faz fronteira. Por isso anexou a península da Crimeia, em 2014, e já antes apoiara regiões russófonas que não querem integrar os países a que ficaram a pertencer.

Foi o que aconteceu com Donetsk e Lugansk, duas regiões da Ucrânia que fazem fronteira com a Rússia. Este conflito interno na Ucrânia já fez 14 mil mortos desde 2014 e nem os acordos de Minsk, em 2015, vieram resolver o conflito. Agora a Rússia invadiu a Ucrânia com o argumento de ir defender esta população russófona.

José Teodor Prata

quinta-feira, 7 de abril de 2022

IRS - Misericórdia

 CONSIGNAÇÃO DO IRS

CONSIGNAÇÃO DO IRS

Na declaração do IRS, existe a possibilidade, sem aumento de encargos para o contribuinte, autorizar que 0,5% do valor liquidado do seu IRS possa reverter a favor de uma Instituição de Solidariedade Social (IPSS).

Assim, vimos apelar para que não deixe passar esta oportunidade de ajuda à Santa Casa da Misericórdia de S. Vicente da Beira.

A adesão à campanha de consignação de IRS é um meio de garantir um contributo e apoio a esta obra tão meritória e nobre e a obtenção de meios para alcançar os seus objetivos.

Para o efeito, deverá no Modelo 3, assinalar no Quadro 11, com uma cruz no Campo 1101 (Instituição de Solidariedade Social e Utilidade Pública) e indicar o NIPC  501 135 618  correspondente a esta Santa Casa de Misericórdia.


José Teodoro Prata

domingo, 3 de abril de 2022

Escravos em São Vicente da Beira

 A escravatura, nas diversas formas que foi adquirindo ao longo de milhares de anos, em diferentes civilizações, terá sido a prática mais aberrante de organização e relacionamento social. A partir do século XV, com os milhares de escravos trazidos de África para a Europa ou levados depois para a América, tornou-se ainda mais desumana.

«Os escravos pululam por toda a parte. Todo o serviço é feito por escravos e mouros cativos. Portugal está a abarrotar com essa raça de gente. Estou em crer que em Lisboa os escravos e as escravas são mais que os portugueses livres de condição. Dificilmente se encontra uma casa onde não haja pelo menos uma escrava dessas. Mal pus o pé em Évora julguei-me transportado para uma cidade do inferno – por toda a parte topava negros.» É com esta citação de um flamengo em Portugal no século XVI que Fernando Rosas começa o programa “Escravos e escravatura em Portugal” (https://ensina.rtp.pt/artigo/escravos-escravatura-portugal/) que vale muito a pena ver ou rever.

E também houve escravos em São Vicente! Não será possível saber ao certo quantos, mas seguramente muitos mais do que estas duas mulheres que, por terem tido filhos, ficaram identificadas nos Registos Paroquiais:

José, que nasceu no dia 21 de outubro de 1738. Diz o registo que era filho de Luzia de Jesus, preta, escrava de Francisca Xavier de Andrade, que a trouxe de Lisboa. (Francisca Xavier de Andrade, filha de Manuel da Costa Aragão e Maria Simões, possivelmente uma das sobrinhas e herdeira do presbítero Manuel Simões). O padrinho da criança foi o licenciado Francisco Simões Cardoso.

Luzia de Jesus teve uma vida longa - faleceu em 1798. No registo de óbito dizem que se chamava Luzia Preta e que era pobre…

Este registo dá-nos conta do nascimento de uma criança (Francisca?) em 1753, filha de Francisca (?), solteira, menor, escrava de João da Costa Fragoso, natural do Teixoso. O registo está muito danificado, mas percebe-se que Francisca teria vindo da América, dizia que não conhecia os pais nem sabia os seus nomes. Os padrinhos da criança foram o licenciado António de Mesquita, e Cecília Velosa, recolhida no convento da Vila.

Não consegui saber se estas crianças sobreviveram e deixaram descendência. É possível que sim, e alguns de nós tenhamos sangue escravo a correr-nos nas veias.

Em Portugal a situação dos escravos começou a mudar a partir do século XVIII, com a legislação do Marquês de Pombal. Mas, com muitos avanços e recuos, incumprimentos e ambiguidades das muitas leis produzidas, só passados mais de cem anos, em 1869, a escravatura foi finalmente abolida de todo o território nacional. Seguiu-se-lhe depois a servidão, principalmente nas comunidades rurais, que muitos ainda conhecemos.

M. L. Ferreira

Nota: há comentários novos e interessantes, nas duas publicações anteriores; peço desculpa aos autores pelo atraso.

José Teodoro Prata

domingo, 27 de março de 2022

Gente nossa

 Ana Rita Teodoro

Foi notícia no jornal Público de ontem, integrada no suplementpo Ípsilon: 

https://www.publico.pt/2022/03/25/culturaipsilon/noticia/ana-rita-teodoro-comeco-fim-2000058

Hoje soube desta entrevista no Youtube: https://youtu.be/TvJrIyd1684 (Ver até ao fim, é imperdível!)

Esta nossa Rita é filha do Adelino Costa e da Eulália Teodoro. Desde cedo que escolheu o difícil caminho das artes, no seu caso da coreografia e da dança. Divide-se entre Portugal e França, as suas bases de onde parte para outras paragens.

Segundo a notícia do Público, esteve recentemente em Serralves (Porto) e apresenta neste momento o seu espetáculo no Teatro do Bairro Alto, em Lisboa.

José Teodoro Prata

quinta-feira, 24 de março de 2022

Mitologia popular portuguesa - as bruxas

Ando a ler este livro sobre a mitologia popular transmontana. Nele é apresentada, na p. 135, esta história recolhida em Vila Seca, Adoufe, Vila Real:

«A camisa de linho

Numa ocasião havia um rapaz que andava interessado numa determinada rapariga lá da sua terra. Mas antes de falar com ela, a pedir-lhe namoro, resolveu vigiá-la, para ver o que fazia e o que não fazia. Descobriu então que, em certas noites, à mesma hora, ela pegava e saía sozinha de casa, o que naquele tempo não era coisa que se tolerasse numa rapariga.

- Coisa estranha!... - pensava ele.

Vai daí, numa dessas noites seguiu-a, acabando por ir dar com ela, junto de outras mulheres, no meio do arvoredo, onde todas se estavam a despir. Viu-as então despirem-se e a seguir viu-as desaparecer.

Ele vai, pega na roupa dela. e esconde-se nos arbustos. Passadas algumas horas, as mulheres voltaram, vestiram-se e foram embora. Só ela é que não, pois não encontrava a roupa. Aperece-lhe então o rapaz, e diz:

- Toma lá a roupa, e vai para tua casa! Já sei o que andas a fazer.

Ela pediu-lhe que não contasse a ninguém. E em troca, disse que lhe dava uma camisa de linho que ela própria tinha feito. No dia seguinte, ele lá recebeu a camisa de linho, só que, em vez de a vestir, atou-a ao pescoço de um cão.

E qual não foi o seu espanto quando viu o cão andar às voltas, às voltas, até que desapareceu. Nunca mais ninguém soube dele. E por isso o rapaz desistiu de pedir namoro à rapariga. Nem quis mais contas com ela.»

Esta história é outra versão (quem conta um conto, acrescenta-lhe um ponto) da recolhida pela Libânia e publicada neste blogue e no livro "Dos Enxidros ao Casais". Prova que há um património comum às diferentes regiões do país. Eis "A dança das bruxas":

Das muitas tabernas que existiram na nossa terra, já só resta a do Marcelino, no Casal da Fraga (hoje é da Amália, que a herdou do pai). Gosto de lá ir à tardinha ou à noite, principalmente agora no verão, porque é a hora em que param por lá bons contadores de histórias.
Quem contou esta foi a ti Trindade Marcelino que, diz, ainda se lembra do homem a quem aconteceu o seguinte:
Há muitos anos, se calhar mais de cem, havia um rapaz nos Pereiros que namorava uma rapariga das Rochas. Sempre que podia lá ia ele a pé, por montes e vales, até chegar à terra da namorada que ainda ficava a umas boas horas de caminho.
Uma vez, já a lua ia alta, ao chegar ao cimo da serra do Açor vê aproximarem-se uns pássaros pretos que traziam uma luz no bico. Poisaram todos num cruzamento que por ali havia e, ao tocarem no chão, transformaram-se em belas raparigas. A seguir chegou um pássaro ainda maior que se transformou num homem. As raparigas juntaram-se todas à volta dele, fizeram uma roda e puseram-se a dançar e, de vez em quando, chegavam-se ao meio e beijavam-no.
Ao fim dum bom bocado chega mais um pássaro que também se transformou em mulher e se juntou à roda, mas o homem, zangado, perguntou-lhe porque é que estava a chegar tão atrasada. Ela respondeu-lhe o seguinte:
“Quem tem filhos para dormir e homem para acalentar, da Sertã aqui não tem que tardar?”
E lá continuaram a dança até que, de repente, se transformaram de novo em pássaros e voaram cada um para seu lado.
O rapaz, que se tinha escondido atrás dumas giestas que por ali havia, assistiu a tudo com muito medo e bastante zangado, porque tinha reconhecido a namorada numa das raparigas. Apesar disso, resolveu continuar o caminho até às Rochas e tirar tudo a limpo. Quando lá chegou, a namorada já estava em casa. Ele contou-lhe o que tinha visto e quis que ela explicasse o significado daquela cena. A rapariga confessou que era bruxa e disse-lhe o seguinte:
“Agora que sabes a verdade, não és obrigado a casar comigo, mas ai de ti que, enquanto eu for viva, contes a alguém o que viste hoje! Se alguém souber, mato-te! Em paga do teu silêncio, vais receber todos os anos uma camisa e umas ceroulas de linho.”
O rapaz voltou para os Pereiros, arranjou nova namorada e passado pouco tempo estava casado. Todos os anos lhe aparecia em casa uma camisa e umas ceroulas e a mulher, desconfiada, fazia sempre a mesma pergunta:
“Ó homem, mas que diabo é que te manda todos os anos esta roupa tão fina?”
Ele respondia sempre o mesmo:
“Come e cala-te, mulher de Deus. Tu nem queiras saber…”
Foi assim durante muitos anos. Quando a encomenda deixou de chegar, o homem contou finalmente à mulher o que tinha visto naquela noite a caminho das Rochas e a história espalhou-se por toda a aldeia e arredores. Ainda hoje a contam…
O homem morreu de velho, cego, a caminhar com uma bengala pelas ruas.

José Teodoro Prata

segunda-feira, 21 de março de 2022

Procissão dos Terceiros

Andei a passear-me pelas várias publicações do blogue sobre a Procissão dos Terceiros em São Vicente, e já nem fazia ideia dos vários artigos, com bastante informação, que foram sendo deixados, a propósito, ao longo destes anos. É fácil encontrá-los (para quem ainda não sabe, basta escrever Procissão dos Terceiros no retângulo à esquerda, quando se acede ao blogue, e aparecem vários artigos sobre o tema).

De todas, a publicação que mais me impressionou foi a de três de março de 2011, que mostra fotografias da procissão que se realizou em 1967, a primeira de que muitos temos memória. Mas não apenas por ser a primeira; é também porque as imagens nos lembram o mar de gente que era a nossa terra há pouco mais de cinquenta anos, e nos fazem recordar tantas histórias da infância; dalgumas pessoas, ter saudades. Mostram também a fé e recolhimento com que se viviam estas manifestações religiosas, pela necessidade que o povo tinha de se entregar à proteção dos santos que lhes acudiam nas muitas dificuldades da vida. Às vezes a oração era a única esperança que tinham.

Nas publicações dos anos mais recentes vê-se como as procissões vão trazendo ainda muita gente à terra no terceiro domingo da Quaresma; alguma vinda de longe, com fé ou apenas pela tradição. Vê-se ainda a presença de várias instituições (o Rancho, os Escoteiros ou os Bombeiros) que entretanto desapareceram ou estão em risco de acabar. A pouco e pouco a desertificação que se faz sentir em tantos outros aspetos da vida no interior, também vai tendo aqui os seus efeitos.  

Mas este ano, apesar das previsões meteorológicas não serem muito favoráveis, ainda mantivemos a tradição. Não deve ter sido fácil aos organizadores conseguir reunir as quase sessenta pessoas que são necessárias para transportar os 14(?) andores que integram a procissão. São tantos que, em alguns momentos pareciam mais que os participantes...


... mas depois tudo se compôs um pouco mais…


... e com a nossa Banda a acompanhar, foi ainda mais bonito!

M. L. Ferreira

domingo, 20 de março de 2022

Os Sanvincentinos na Grande Guerra

 João Simão

 

João Simão nasceu no Casal da Serra, a 9 de julho de 1893. Era filho de Simão Caetano e Maria Patrocínio, cultivadores.

Assentou praça no dia 9 de julho de 1913 e foi incorporado no 2.º Batalhão do Regimento de Infantaria 21, em 14 de maio de 1914. Na altura era analfabeto e tinha a profissão de jornaleiro. Pronto da instrução da recruta, em 28 de abril de 1914, veio domiciliar-se em São Vicente da Beira.

Apresentou-se novamente em 5 de maio de 1916, passando à formação do 1.º Batalhão do Regimento de Infantaria 21, em 11 de outubro.

Mobilizado para a guerra, embarcou para França no dia 21 de janeiro de 1917, integrando a 7.ª Companhia do 2.º Regimento de Infantaria 21, como soldado com o n.º 638 e a chapa de identidade n.º 9543-A.

Do seu Boletim Individual consta apenas o seguinte:

·        Baixa à Ambulância n.º 3, em 13 de janeiro de 1918, sendo evacuado para o Hospital Inglês, no dia 15, e para o Hospital Canadiano n.º 3, em 24. Teve alta no dia 26;

·        Regressou a Portugal, no dia 25 de Fevereiro de 1919, domiciliando-se na freguesia de São Vicente da Beira.



Passou ao 2.º Batalhão em 19/2/1920, à Brigada n.º 1 dos Caminhos-de-Ferro, em três de julho de 1924, e à Inspeção das Tropas de Comunicação, a 1 de Dezembro de 1924. Passou à reserva territorial em 31 de dezembro de 1931.

Condecoração:

Medalha de cobre comemorativa da expedição a França com a legenda França 1917-1918.

Família:

João Simão casou com Maria Pereira, natural da Póvoa de Atalaia, na Conservatória do Registo Civil de Castelo Branco, a 16 outubro de 1920. O casal viveu em Abrantes, localidade onde João Simão trabalhou como funcionário da CP. Não tiveram descendência.

Maria Pereira faleceu no dia 10 de outubro de 1959, no Rossio ao Sul do Tejo. Não foi possível saber a data nem o local da morte de João Simão, mas terá sido na mesma localidade, e em data posterior à da esposa.

 

 Maria Libânia Ferreira

Publicado no livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"