terça-feira, 29 de março de 2016

Lugares com histórias

Namoros antigos
  
Como é que começámos a namorar? Olhe que já lá vão uma tormenta d’anos, mas ainda me alembro como se fosse hoje.



Andava com o meu pai a fazer aquela casa além em cima e via-a passar para a fonte ou a caminho da horta, com a cesta enfiada no braço. Havia dias que abalava logo de manhã, com um molho de mantas à cabeça, e só voltava já rente ao sol-posto. Assim que a via aparecer ao fundo da rua, até parece que o coração me queria saltar do peito e já nem as pedras assentavam como devia ser, umas em cima das outras. Às vezes até me esquecia que o meu pai podia ver e ficava parado a olhar e a sonhar que ainda um dia ela havia de ser minha.
Era a rapariga mais linda das redondezas! Mas o diabo é que ela tinha tanto de bonita como de arisca e, se calhava estar à porta ou à janela quando eu passava, assim que me via arrecadava-se logo para dentro. De modo que o tempo foi passando e não havia meio de arranjar maneira de chegar à fala com ela. Um dia, já andávamos nas empenas, o meu pai volta-se para mim e diz-me assim:
- Mas que raio de homem és tu que nem tens porte para pedir namora à cachopa!
- Qual cachopa é que vossemecê diz?
- Atão eu não te tenho visto a olhar para aquela além?
E eu a julgar que ele ainda não tinha percebido nada…
- Vossemecê não está bom da cabeça! Onde é que me viu a olhar p’ra ela?
- Não que não vejo… E olha que a rapariga até é bem asadinha! E há de ser trabalhadora, que não pára, sempre numa fona de um lado para o outro.
Passados uns dias, estava ela sentada à porta de casa.
- Estava a migar couves para as pitas.
Vê como ela também ainda se lembra dessa parte?
E eu já não aguentava mais. Peguei numa pedrinha e atirei-a devagar, não fosse acerta-lhe na cabeça. Foi-lhe cair mesmo aos pés. Deve-se ter assustado que olhou a toda a roda e, quando deu comigo lá em cima, perguntou-me, a modos que zangada:
- O que é que tem que andar a atirar-me com pedras?
- Olhe que não fui eu! Ia lá agora atirar pedras a uma rapariga tão linda…
- Se não foi vossemecê, deve ter sido o meu anjo da guarda.
- Nunca se sabe…
Quando foi à noite, que largámos, passei-lhe à porta e já não se escondeu. Dei-lhe a salvação e ela, ainda meio entre dentes:
- Vão lá com Deus.
Nos dias a seguir, sempre que a via, a mesma coisa; e por fim até já dava um sorriso. E os olhos dela ficavam ainda mais lindos quando se ria! Passados uns tempos, a um domingo, esperei-a à saída da missa e acompanhei-a até à porta de casa. E mal arranjei maneira de começar esta casinha para nos metermos cá dentro, pedi-a em casamento. Até hoje!
-­­ Está a ver como as coisas são? Mal sabia eu que havia de ser ele o meu Anjo da Guarda! E olhe que bem me tem valido, nas horas boas e nas más, que também têm sido muitas…
- Então e não foi aquilo que prometemos um ao outro no altar?

M. L. Ferreira

2 comentários:

Anônimo disse...

No nosso tempo era um problema bicudo pedir namoro a uma cachopa, a vontade era muita, as pernas tremiam como canas agitadas, nas danças era só fanfarronice, muita parra... a cachopa também sofria.
Andava eu a trabalhar com o pai do Chico Barroso na quinta do Rolão Preto, o rendeiro tinha uma filha mais ou menos da minha idade, à tardinha, sentados cada um na sua soleira falávamos... certo dia diz-me o Joaquim Barroso:
-Beija-a; ai se eu tivesse a tua idade...
As pernas tremiam, a cara ruborizava, o coração parecia que queria sair, ele a atazanar:
-Ai se fosse comigo!...
Um dia; beijei-a, ficou estática, eu a tremelicar, não levei nenhuma "lambada"...
J.M.S

Anônimo disse...

Nunca me tinhas contado essa ó Zé Manel.
Os putos sentem o mesmo, só que 5 ou 6 anos mais cedo. O relacionamento está mais liberalizado começam logo a ser misturados no infantário e nas escolas primaria, mas quando bate o amor...
Giro como a Libânia apanha a linguagem ancestral.
FB