Um democrata assumido
Discurso do Pe. José
Hipólito Jerónimo, na festa do 25 de Abril, no Tortosendo, a 27 de abril de
1974. Fonte: Jornal do Fundão, de 5 de maio de 1974 (agradece-se
partilha nas redes sociais)
Estamos aqui por uma
razão muito simples, mas muito importante, estamos aqui porque estamos
contentes. O dia 25 de Abril trouxe-nos a primeira alegria limpa, sã,
expontânea, de todo o bom povo português nos últimos 48 anos. Estamos a viver a
aventura de sermos livres pela primeira vez, de podermos mostrar abertamente,
sem medo, o que somos, o que pensamos, o que queremos. Numa palavra: estamos a
viver a felicidade de nos sentirmos, finalmente, homens no verdadeiro sentido
da palavra.
Amigos! Permiti que vos
dê conta de mais uma razão para o meu contentamento e para a minha presença
aqui. Eu, como cristão e como padre, estou feliz porque caiu um regime
anti-cristão, anti-democrático e anti-humano. Porque um regime que à mentira chamava verdade, às trevas
chamava luz, e, sobretudo, à opressão chamava liberdade, não era um regime
cristão, não era um regime humano.
Aliás, como cristão que
sou, e estou certo que muitos outros cristãos pensam como eu, não quero um
regime cristão para Portugal; quero sim um regime que represente todo o povo
português porque só assim poderá servir a todo o povo português.
Amigos! Não olhemos mais
para o passado. Não nos deixemos tomar do ódio nem da vingança, mesmo que
tenhamos sido - e todos fomos – agravados durante tantos anos. Sejamos
generosos! Mostremo-nos dignos da liberdade que o Movimento das Forças Armadas
nos conquistou, mas que nós próprios temos agora de consolidar através do nosso
trabalho, do nosso civismo, da nossa capacidade de escolha e das nossas opções!
Olhemos para a frente, demo-nos as mãos e, unidos, construamos todos
um Portugal mais justo, o Portugal do Futuro!
José Teodoro Prata
2 comentários:
No dia 25 de Abril todos os portugueses eram democratas, mas no dia 24, os democratas eram uma espécie rara e em constante perigo. Daí o mérito do Pe. Jerónimo, que se assumiu democrata quando amadureceu as suas ideias políticas e era perigoso fazê-lo. O caso dos democratas pós-25 faz-me lembrar uma canção do Sérgio Godinho, por esses dias (O Meu Compadre).
Curiosa a nossa memória, aliás há semanas o Pacheco Pereira alertava para os erros de memória e por isso os documentos são fundamentais.
Pensava ter estado na festa do 25 de Abril, no Tortosendo, mas não me lembro deste discuro e possivelmente só estive na do 1.º de Maio, onde de facto as pessoas nos perguntavam pelo Pe. Jerónimo, pois o queriam a festejar com eles.
Já li o texto algumas vezes e de todas fico com o coração ainda mais contente por haver um padre (haveria mais, mas não seriam muitos, como sabemos), nosso conterrâneo, que soube falar daquele dia 25 de Abril como o fez o Padre Hipólito. Nem a Sophia no seu poema.
E o melhor é que são bem visíveis as sementes que deixou em muitos dos que privaram com ele no seminário e fora dele.
Merece mesmo ser muito divulgado!
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