Desculpem, mas não resisti, assaltei de novo o facebook. Mas foi por uma boa causa!
José Teodoro Prata
Porque é de novo Natal…
Conto de Natal de Francisco Candeias em São Vicente da Beira
Calcorreava a rua da Costa abaixo numa felicidade que
descontrolava o andar, fazendo alternar o passo, ora apressado, ora quase em
corrida.
Havia naquele dia alguma coisa que o mobilizava e que lhe
dava uma cor mais luminosa ao rosto, ausente em outros dias. Passou à porta do
Zé Ar, ar esse que ainda cheirava ao pão fresco!
A agitação era tanta que nem deu conta que a Menina Maria do
Céu estava à janela aguardando a salvação de um bom dia!
O vento, suave e frio, trazia com ele os aromas do inverno de
lenha queimada e que se misturava com o cheiro a cedro que vinha da Quinta.
Passou a Fonte Velha e entrou na Loja do Joaquim Boas Noites,
que àquela hora já estava cheia de gente. Eram as compras de última hora, logo
à noite não podia faltar nada!
- Vê lá o que o que é que o filho da Hermínia quer, disse
alguém na sua vez de ser atendida.
Tirou o papel bem dobrado da algibeira, e mostrou o recado:
dois quilos de açúcar, duas garrafas de óleo e farinha.
Transação feita sem dinheiro.
- A mãe depois vem pagar! Assim disse, como lhe transmitiram.
Passou pela praça só para comprovar que a fogueira ainda lá
estava. Madeiros colocados em pilha e depois escondidos por rama de pinheiros.
A fogueira seria a anfitriã da noite, recebendo as gentes procurando o calor
numa noite que é sempre fria.
Em casa, a sua avó vestida de preto, lenço na cabeça e já
emborralhada de farinha juntava os ingredientes recém trazidos para a iguaria
mais famosa do Natal: as filhoses.
O pinheiro já tinha ocupado o seu lugar uns dias antes,
enfeitado com fitas de cores colocadas de forma generosa.
O presépio, como sempre, presente: cama de musgo pulverizado
de pequenas imagens de barro, o moinho era acolhido numa montanha feita de
pedras e os Reis Magos ficavam sempre longe da Sagrada Família (porque ainda
teriam quinze dias de caminhada), os pastores tinham um ar feliz e a lavadeira
tinha um lago feito de prata de maço de tabaco Português Suave, os caminhos
foram feitos de farinha e uns pedaços de algodão os flocos de neve, porque era
importante dar realismo ao cenário natalício.
Dia importante, não se comia na cozinha. Mesa grande aberta
na sala, a melhor toalha, pratos e talheres.
A comida era abundante nessa noite. Bacalhau, peru, couves
cozidas, arroz doce, fatias douradas e tantas outras coisas.
O jantar de Natal decorria ao som da televisão a preto e
branco que transmitia a mensagem de Natal do Cardeal Patriarca.
Todos à volta da mesa partilhando o momento e sem dar conta
que aquela seria a mesa mais composta de sempre.
- A que horas vamos para a fogueira? Perguntou.
- Um pouco antes da missa, para ver acender a fogueira!
Responderam.
Descia a rua e já se conseguia ver o fumo.
De repente o pai diz:
- Esperem! Tenho que voltar a casa, esqueci-me da carteira.
A fogueira já estava acesa. As gentes da terra e as suas
famílias que tinham vindo passar o Natal espalhavam-se pela Praça Velha e junto
à fogueira, que estava a cargo dos mancebos da inspeção militar. Eles garantiam
que a fogueira não perdesse vida e que orgulho tinham quando alguém dizia:
- Já há muitos anos que não via uma fogueira tão grande!
A igreja cheia de gente, o presépio num dos lados do altar e
o Coro do outro, onde a Menina Maria de Jesus e a Nelita garantiam os últimos
ajustes. Tudo teria que correr bem, foram feitos dois ensaios durante a semana.
O Padre inicia a liturgia. O sermão é sobre o nascimento do Menino e o que Ele
contribuiu na caminhada cristã. Os cânticos criam um ambiente de festa, mas há
um que todos cantam enchendo a igreja de alegria: “Alegrem-se os céus e a
terra, cantemos com alegria, que já nasceu o deus menino, filho da Virgem
Maria"...
A celebração termina com o “beijar do Menino” e cá fora os
adultos ficavam por ali em conversa com as famílias ou juntavam-se com os que
não viam há muito tempo. As crianças estavam sempre ansiosas de ir para casa
para abrir os presentes.
Ao chegar a casa os presentes estão todos junto à chaminé.
Roupa e algum brinquedo. Ficou feliz, mas nada era o que imaginaria ter tido! A
sua imaginação esperaria sempre algo mais mágico.
- Para o ano tens que te portar melhor!
Ficou triste! Afinal havia meninos melhores que ele e por
isso ficaram com as melhores prendas.
Só algum tempo depois terá dado conta que o Pai Natal era o
pai que se esquecera da carteira. Mas todos os anos continua a desejar que a
magia dessa noite seja eterna.
Dizem que o seu espírito de criança surge todos os natais e a
dizer que fez tudo para se portar bem!
Que a magia desta quadra vos inspire e encha o coração!
Feliz Natal
2 comentários:
Muito feliz a expressão: ...numa felicidade que descontrolava o andar...
A fogueira já está armada e a Praça cheia de enfeites. Falta-lhe gente, por enquanto, mas não há de faltar quem se venha aquecer, antes ou depois da Missa do Galo, para eternizar a magia daquela Noite, de que tantos temos boas memórias.
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