domingo, 15 de dezembro de 2024

Conto de Natal

 Desculpem, mas não resisti, assaltei de novo o facebook. Mas foi por uma boa causa!

José Teodoro Prata


Porque é de novo Natal…

Conto de Natal de Francisco Candeias em São Vicente da Beira

Calcorreava a rua da Costa abaixo numa felicidade que descontrolava o andar, fazendo alternar o passo, ora apressado, ora quase em corrida.

Havia naquele dia alguma coisa que o mobilizava e que lhe dava uma cor mais luminosa ao rosto, ausente em outros dias. Passou à porta do Zé Ar, ar esse que ainda cheirava ao pão fresco!

A agitação era tanta que nem deu conta que a Menina Maria do Céu estava à janela aguardando a salvação de um bom dia!

O vento, suave e frio, trazia com ele os aromas do inverno de lenha queimada e que se misturava com o cheiro a cedro que vinha da Quinta.

Passou a Fonte Velha e entrou na Loja do Joaquim Boas Noites, que àquela hora já estava cheia de gente. Eram as compras de última hora, logo à noite não podia faltar nada!

- Vê lá o que o que é que o filho da Hermínia quer, disse alguém na sua vez de ser atendida.

Tirou o papel bem dobrado da algibeira, e mostrou o recado: dois quilos de açúcar, duas garrafas de óleo e farinha.

Transação feita sem dinheiro.

- A mãe depois vem pagar! Assim disse, como lhe transmitiram.

Passou pela praça só para comprovar que a fogueira ainda lá estava. Madeiros colocados em pilha e depois escondidos por rama de pinheiros. A fogueira seria a anfitriã da noite, recebendo as gentes procurando o calor numa noite que é sempre fria.

Em casa, a sua avó vestida de preto, lenço na cabeça e já emborralhada de farinha juntava os ingredientes recém trazidos para a iguaria mais famosa do Natal: as filhoses.

O pinheiro já tinha ocupado o seu lugar uns dias antes, enfeitado com fitas de cores colocadas de forma generosa.

O presépio, como sempre, presente: cama de musgo pulverizado de pequenas imagens de barro, o moinho era acolhido numa montanha feita de pedras e os Reis Magos ficavam sempre longe da Sagrada Família (porque ainda teriam quinze dias de caminhada), os pastores tinham um ar feliz e a lavadeira tinha um lago feito de prata de maço de tabaco Português Suave, os caminhos foram feitos de farinha e uns pedaços de algodão os flocos de neve, porque era importante dar realismo ao cenário natalício.

Dia importante, não se comia na cozinha. Mesa grande aberta na sala, a melhor toalha, pratos e talheres.

A comida era abundante nessa noite. Bacalhau, peru, couves cozidas, arroz doce, fatias douradas e tantas outras coisas.

O jantar de Natal decorria ao som da televisão a preto e branco que transmitia a mensagem de Natal do Cardeal Patriarca.

Todos à volta da mesa partilhando o momento e sem dar conta que aquela seria a mesa mais composta de sempre.

- A que horas vamos para a fogueira? Perguntou.

- Um pouco antes da missa, para ver acender a fogueira! Responderam.

Descia a rua e já se conseguia ver o fumo.

De repente o pai diz:

- Esperem! Tenho que voltar a casa, esqueci-me da carteira.

A fogueira já estava acesa. As gentes da terra e as suas famílias que tinham vindo passar o Natal espalhavam-se pela Praça Velha e junto à fogueira, que estava a cargo dos mancebos da inspeção militar. Eles garantiam que a fogueira não perdesse vida e que orgulho tinham quando alguém dizia:

- Já há muitos anos que não via uma fogueira tão grande!

A igreja cheia de gente, o presépio num dos lados do altar e o Coro do outro, onde a Menina Maria de Jesus e a Nelita garantiam os últimos ajustes. Tudo teria que correr bem, foram feitos dois ensaios durante a semana. O Padre inicia a liturgia. O sermão é sobre o nascimento do Menino e o que Ele contribuiu na caminhada cristã. Os cânticos criam um ambiente de festa, mas há um que todos cantam enchendo a igreja de alegria: “Alegrem-se os céus e a terra, cantemos com alegria, que já nasceu o deus menino, filho da Virgem Maria"...

A celebração termina com o “beijar do Menino” e cá fora os adultos ficavam por ali em conversa com as famílias ou juntavam-se com os que não viam há muito tempo. As crianças estavam sempre ansiosas de ir para casa para abrir os presentes.

Ao chegar a casa os presentes estão todos junto à chaminé. Roupa e algum brinquedo. Ficou feliz, mas nada era o que imaginaria ter tido! A sua imaginação esperaria sempre algo mais mágico.

- Para o ano tens que te portar melhor!

Ficou triste! Afinal havia meninos melhores que ele e por isso ficaram com as melhores prendas.

Só algum tempo depois terá dado conta que o Pai Natal era o pai que se esquecera da carteira. Mas todos os anos continua a desejar que a magia dessa noite seja eterna.

Dizem que o seu espírito de criança surge todos os natais e a dizer que fez tudo para se portar bem!

Que a magia desta quadra vos inspire e encha o coração!

Feliz Natal

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2 comentários:

José Teodoro Prata disse...

Muito feliz a expressão: ...numa felicidade que descontrolava o andar...

Anônimo disse...

A fogueira já está armada e a Praça cheia de enfeites. Falta-lhe gente, por enquanto, mas não há de faltar quem se venha aquecer, antes ou depois da Missa do Galo, para eternizar a magia daquela Noite, de que tantos temos boas memórias.