O MEU PRIMEIRO NATAL NO BRASIL
Maria de Lourdes Hortas
Foi em Olinda. Chegamos a Pernambuco em outubro de 1950.
Ficamos na casa de um amigo do meu pai, no Bairro Novo. E lá passamos o
primeiro natal brasileiro. O calor não me permitia acreditar que o aniversário
de Jesus pudesse acontecer sem neve, sem filhoses, sem madeiro ardendo na
praça, sem a minha avó e o meu avô, sem o cheiro de resina no pinheiro na
árvore, sem o musgo apanhado na ribeira, para o presépio.
Tudo era absurdamente estranho e melancólico para o meu
coraçãozinho de imigrante de apenas 10 anos.
Dias antes, uma das meninas da casa me revelou que o Pai
Natal (Papai Noel, no Brasil, até isso era diferente) não existia...
Me lembro bem. Passeávamos na praia, as ondas revoltas do mar
subiram, carregadas de sal, e apagaram a ilusão, como uma rajada de vento apaga
uma candeia. Em silêncio engoli algumas lágrimas ...
- Não existe?!...
E o Menino Jesus? Lá, em São Vicente, era Ele que vinha,
descendo pela chaminé. Na fria madrugada do dia 25 podia jurar que ouvia seus
passos de pluma e que na manhã seguinte os via impressos na neve...
Categórica, a menina concluiu:
-Também não...
Houve peru e abacaxi naquela ceia de Natal. A prenda, deixada
no meu sapato, foi um vestido de xadrez, em tafetá. Era lindo. Cheirava a
alfazema, ao mesmo perfume das meninas anfitriãs.
Lembrei de um outro vestido, prenda de outro Natal. Era de lã
cor de rosa. E minha mãe me disse, muito contrita, que tinha sido tricotado por
Nossa Senhora, nos serões do Céu.
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Agora, minha Mãe e Nossa Senhora talvez estejam tecendo outro
vestido, para mim: com ele espero me apresentar, à grande Ceia do Senhor.
(Do livro de inédito de memórias AS CASAS DO DESTINO.)
José Teodoro Prata
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