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domingo, 10 de maio de 2020

Os Sanvicentinos na Grande Guerra

Bernardo da Cruz


Bernardo da Cruz nasceu no Casal da Serra, a 1 de dezembro de 1894. Era filho de Bartolomeu Cruz e Anna de Jesus, esta natural de Alcongosta.
Segundo a sua folha de matrícula, era analfabeto e tinha a profissão de jornaleiro quando se alistou em 9 de julho de 1914. Ficou pronto da recruta no dia 12 de maio de 1915 e foi licenciado nesse mesmo dia, indo domiciliar-se no Casal da Serra.
Apresentou-se novamente em 1916 e, fazendo parte do CEP, embarcou para França no dia 21 de janeiro de 1917, integrado na 1.ª Companhia do 2.º Batalhão do Regimento de Infantaria 21, como soldado com o n.º 379 e a placa de identidade n.º 8872-A.
Do seu boletim individual e folha de matrícula militar consta o seguinte:
a)    Baixa ao hospital, em Março de 1917, onde permaneceu por quatro dias;
b)    Em Junho, ficou adido junto do Quartel-General da 1.ª Divisão, onde prestou serviço até Fevereiro de 1918. Seguiu depois para a sua Unidade, onde chegou no dia 9 desse mês;
c)    Em Abril, foi colocado no Batalhão de Infantaria 11, 1.ª Companhia. Talvez por esta mudança de batalhão, terá sido um dos poucos vicentinos a participar na batalha de La Lyz, que ocorreu no dia nove desse mês;
d)    Em três de Maio, foi internado na ambulância n.º 6, onde permaneceu cinco dias. Foi dado como incapaz e ficou a aguardar o repatriamento, aprovado nos termos da circular 475/11 de 25/05 /1918.
e)    Embarcou para Portugal, a bordo do navio Gil Eanes, e chegou a Lisboa no dia 23 de Julho de 1918. 
Condecorações:
·      Medalha Militar de cobre com a legenda: França 1917-1918;
·      Medalha da Vitória.
O seu boletim individual do CEP não o refere, mas, de acordo com a relação dos militares que participaram no raide de 9 de março de 1918, apresentada em "A Covilhã e a I Grande Guerra 1914/1918", Bernardo Cruz também participou no referido raide e deve, por isso, ter sido louvado.


Quando chegou à terra, vinha ainda convalescente dos ferimentos e bastante perturbado pelos gases e traumas de guerra. Apesar disso, ainda foi castigado por faltar à inspeção no ano de 1921, tendo sido considerado ausente e sem domicílio conhecido. Passou à reserva ativa, em 1928, e em 1931 foi considerado incapaz. Em 1939, foi internado no Asilo de Inválidos Militares Princesa Maria Benedita, em Runa, de onde saiu em 1945, por vontade própria.
Na sua folha de matrícula constam ainda alguns castigos durante este período de internamento psiquiátrico:
a)    Punido pelo comandante do asilo, em fevereiro de 1942, com privação de vinho por 30 dias, por levar para fora do refeitório a ração de manteiga que lhe estava atribuída e tentar vendê-la a outros internados;
b)    Punido com 15 dias de detenção, porque tendo-lhe sido chamada a atenção por um seu superior, por o não ter cumprimentado militarmente, tomou a rigorosa posição de sentido e, com ar de troça, fez e desfez a continência 2 vezes, perguntando, no fim, ao superior se estava satisfeito;
c)    Punido com 5 dias de prisão disciplinar, por não ter cumprido prontamente a ordem de formatura para a 2.ª refeição, dizendo que não estava ali para isso.
Terá posteriormente sido internado na Casa de Saúde do Telhal, onde passou o resto da vida. Ainda recebeu a visita de alguns familiares, mas nunca mais voltou à terra. 



Dizem que era uma pessoa muito religiosa e, durante o tempo em que permaneceu no Casal da Serra, passava os dias a ensinar a doutrina às crianças. Quando elas aprendiam bem as orações, até lhes dava umas moedas para comprarem rebuçados. Também há quem diga que foi ele que ofereceu a Sagrada Família que, durante muitos anos, andou de casa em casa, no Casal da Serra.
Bernardo Cruz faleceu na freguesia do Algueirão, no dia 22 de janeiro 1970.


(Pesquisa feita com a colaboração de vários moradores do Casal da Serra)


Maria Libânia Ferreira
Do livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"