terça-feira, 28 de junho de 2016

Justiças

Era um dia como todos os outros. O sineiro trazia a vara do sino do concelho na mão e preparava-se para o badalar; as portas dos paços da câmara abriram-se, na praça já havia cidadãos que esperavam para resolverem assuntos pessoais
O meirinho chamou o carcereiro e disse-lhe para ir à enxovia buscar o preso que tinha sido encarcerado na véspera, para ser presente ao juiz de fora
Um pobre diabo que cometeu o erro de roubar uma galinha ao senhor conde. A mulher estava muito mal, o boticário recomendou caldos de galinha…
Coitado, dizia o povo em surdina. Quem rouba pouco é ladrão, mas quem rouba muito é barão.
Era um dia outonal, o sol entrava por entre as grossas grades da cadeia, o coitado estava sentado por detrás das grades, recebendo os raios solares da manhã.
A noite tinha sido gélida, a palha lhe serviu de cobertor, carcereiro chamou-o e levou-o à presença do juiz. A mulher carregadinha de sezões tremia como se fosse uma cana agitada pelo vento, a ninhada dos filhos agarrados à saia da mãe choravam copiosamente, as pessoas pediam clemência, o vigário subiu as escadas do balcão da cadeia, entrou no tribunal para interceder, já tinha ido falar com o senhor conde. O juiz condenou-o a passar o dia no pelourinho e que não voltasse a fazer o mesmo; se fosse apanhado a roubar, a forca seria o seu destino

Os condenados recebiam do juiz sentenças punitivas, pecuniárias e condenatórias.
Nas punitivas, os réus eram expostos ao sarcasmo das pessoas que passavam em frente ao pelourinho; à noite, soltavam-nos e seguiam em paz para suas casas. Nas pecuniárias, o réu pagava uma coima ao tribunal e ao queixoso e não passava pela vergonha de… Havia condenados, casos raros; ao fim do dia eram desamarrados do pelourinho e levados para a forca que ficava na Devesa, onde eram enforcados.
À frente, o pregoeiro anunciava o motivo da condenação, atrás o vigário juntamente com o povo rezavam ladainhas para implorarem a misericórdia divina, ao mesmo tempo abafavam a voz do pregoeiro…



Este ferro fazia parte da grade da cadeia, situa-se numa propriedade no Valouro que pertence ao doutor Lino. (Não sei se ainda lá se encontra).

J.M.S

4 comentários:

José Teodoro Prata disse...

O ferro da foto seria de uma janela rasgada na horizontal, larga mas pouco alta, na enxovia dos presos. Aliás, se repararmos no atual edifício, dá para perceber que a parte inferior, onde agora é a sala de trabalho da Junta (não da receção), foi remendada.
O ferro da foto estaria na horizontal, a meio, e em cada buraco passaria um ferro na vertical, curto. É uma hipótese.
Do andar superior não era, pois as janelas tinham gradeamento, mas de pau.

Anônimo disse...

Era garoto e sempre ouvi contar às pessoas idosas que a grade pertencia à porta onde outrora ficava a farmácia."Se anterior à porta existiu uma janela rasgada na horizontal, não sei"
Esta sala comunicava com o resto da cadeia e foi fechada. O espaço interior da prisão devidamente remodelado, faz parte actualmente do museu da misericórdia. Resta o postigo que mantém os dois ferros.
J.M.S

Anônimo disse...

Triste sina, ser-se pobre! Então, como agora…
Mas aqui temos mais uma boa história para ser representada quando formos nós a fazer a nossa Feira Medieval. Depois das sugestões deixadas pelo José Teodoro na última publicação, não acredito que haja alguém que se negue…

M. L. Ferreira

José Teodoro Prata disse...

De facto, existia a porta a que se refere o José Manuel e acho que ele tem razão, pois baseia-se na tradição oral e essa porta existia mesmo. A porta comunicava com a zona da cavalariça. É natural que fosse segura e por outro lado permitia ver os presos.