quinta-feira, 15 de julho de 2021

Por falar em análise Swot...

 Peço desculpa pela sobriedade deste texto, o qual, penso que até toca as raias da aridez. Mas esta coisa das leis é assim mesmo! Achei, todavia, muito interessante trazê-lo aqui pela importância que poderá (ou poderia) ter a sua aplicação, em casos concretos, na Vila e sua freguesia; quer pelos imigrantes estrangeiros que aqui têm chegado, quer mais   pelos nossos jovens que têm que decidir o seu futuro. Mas vamos ao diploma legal que aqui está em causa. No fim, do texto logo vos direi a minha opinião.

Pelo Decreto-Lei n.º 64/2018 de 7 de agosto, foi criado em Portugal o Estatuto da Agricultura Familiar, cujo objeto visa, nos termos do seu artigo 2.º:

"a) Reconhecer e distinguir a especificidade da Agricultura Familiar nas suas diversas dimensões: económica, territorial, social e ambiental;

b) Promover políticas públicas adequadas para este extrato socioprofissional;

c) Promover e valorizar a produção local e melhorar os respetivos circuitos de comercialização;

d) Promover uma agricultura sustentável, incentivando a melhoria dos sistemas e métodos de produção;

e) Contribuir para contrariar a desertificação dos territórios do interior;

f) Conferir à Agricultura Familiar um valor estratégico, a ter em conta, designadamente nas prioridades das políticas agrícolas nacional e europeia;

g) Promover maior equidade na concessão de incentivos e condições de produção às explorações agrícolas familiares."

 

Quer dizer, é a própria lei que consagra aquilo a que, nesta análise, se podem considerar os pontos fortes. Não sou eu que o faço!  Além dos constantes das normas acabadas de referir, há vários outros (ver diploma)!

Muita gente, a começar pelos nossos pais, pensou, ao longo dos tempos, que não valia a pena produzir mais que aquilo de que necessitava para si, para a sua família e para os animais. Era a economia familiar de subsistência. As pessoas viviam daquela maneira, em que quase nada se estragava. Mas essa forma de viver era básica. Dizemos que era feliz! Pois sim! Mas penso que essa felicidade se refere mais aos tempos de criança e aos bons momentos. Isso sim! O resto não deixou saudades.

Para dar um exemplo quase da idade da pedra, posso testemunhar que quando tinha uma dor de dentes, como não havia dentistas, o meu pai dizia-me para pôr uma areia de sal no dente que o bicho assim sossegava! Perante isto, acho que não é preciso dizer mais nada! E eu ainda era daqueles que sempre tive sapatos e roupa e comida. Escuso de dizer algumas coisas que via nas famílias numerosas que, aos olhos da malta de hoje, parecerão barbaridades!  Por isso, fico por aqui.   

Mercê da alteração da legislação a nível sanitário, as pessoas já não podem criar livremente e abater animais de maior porte para alimentação. Embora isso também não seja necessário dado o acesso generalizado à alimentação. Aliás, relativamente às nossas comidas, o que hoje se verifica é uma seleção em que têm que se ter tomados em consideração critérios de escolha para uma boa saúde. Quem diria!

A grande inovação que este decreto-lei parece trazer é, para quem o lê, a possibilidade de o agente investidor poder, não só sobreviver com seu trabalho, mas escoar os seus excedentes para o mercado, através de canais determinados, coisa que antes não acontecia, pelo menos como agora foi legislado. E, com isso, compor os seus rendimentos diretos (em espécie) com outros (em moeda), por forma a viver com maior dignidade que noutros tempos.  Dantes, embora já houvesse essa possibilidade, ela apenas funcionava para certas quantidades e seria só reservada ao azeite e pouco mais.

Na hipótese do regime do presente decreto-lei entram todos os produtos e para qualquer quantidade! É, pelo menos, o que lá diz! 

Mas o texto legal continua com muitas outras coisas; desde benefícios fiscais, até às linhas de crédito, etc, etc.

Só que agora vem o pior. E o pior também está na lei. Senão vejamos e depois façamos algumas interrogações: 

Artigo 6.º

Direitos da Agricultura Familiar

"1 — A atribuição do título de reconhecimento do Estatuto permite o acesso:

...

e) Aos mercados e aos consumidores, concretizado através do apoio à criação e reativação de mercados de proximidade e de circuitos curtos de comercialização;

f) A um regime específico de contratação pública para fornecimento de proximidade de bens agroalimentares (escolas, hospitais, Instituições Particulares de Solidariedade Social e Forças Armadas);

Ora, é exatamente aqui que começam as dificuldades. Alguém me sabe dizer o que já foi feito para a "criação e reativação de mercados de proximidade e de circuitos curtos de comercialização"?

ou,

Se foi criado "um regime específico de contratação pública para fornecimento de proximidade de bens agroalimentares (escolas, hospitais, Instituições Particulares de Solidariedade Social e Forças Armadas"?

No primeiro caso, claro que não! No segundo, pode ter sido criado um regime específico de contratação, mas de nada serve!

Para ilustrar, dou apenas um exemplo:

Alguém acredita, por exemplo, que a Santa Casa da Misericórdia da Vila vai contratar o fornecimento da fruta, aproveitando os excedentes dos agricultores de São Vicente da Beira? Com certeza que não! E não há aqui nada mal! Apenas, não existe obrigatoriedade legal de contratação, nem de um lado nem do outro. Por isso, se houver alguns agricultores que têm excedentes vendem-nos, por norma, aos intermediários que têm os seus armazéns na A23 e estes é que os comercializam com os seus lucros! São estes que dispõem de quantidades suficientes para fornecer as instituições. Esses agricultores são, normalmente, os que já têm certas quantidades, porque têm pomares com essa finalidade. E os armazenistas não querem os pequenos excedentes. Por isso, tudo fica na mesma!

Estes são os pontos fracos desta análise. Não é preciso eu invocá-los porque eles também estão todos na lei ou, melhor, na impossibilidade de esta ser concretizada.

É mais um daqueles normativos legais que parece muito bom, mas que, salvo raras exceções, vem apenas carregado de boas intenções. No entanto, se, na verdade, fosse aplicável à generalidade das famílias que pudessem fazer da agricultura a sua vida, então era mesmo capaz de ser revolucionário para a nossa região! Mas, infelizmente, parece que não!

José Barroso    

3 comentários:

Anônimo disse...

Na verdade, há um enorme sentido poético no legislador atual, que conhece bem os assentos da AR, dos gabinetes governamentais dos prestigiados escritórios de advogados, mas não o verdadeiro mundo rural.
Tudo se combate hoje com brilhante e imensa legislação. A comprovar a teoria, vejam as resmas de normas publicadas após os incêndios de 2017. Execução no terreno? Alguém sabe o que foi implementado? Talvez o Professor Xavier Viegas...
Já pedi por duas vezes à Direção Regional de Agricultura do Centro informação sobre praticas agrícolas adequadas aos terrenos pobres da Serra, arvoredo bem-adaptado, ao clima da vertente Sul da Gardunha, literatura sobre a matéria. Respondes-te tu?
Alguém tem noticia da visita oficiosa de qualquer técnico, de qualquer Serviço a S. Vicente a dar informação sobre as melhores práticas agrícolas, a boa gestão da água, produção animal, reflorestação?
É compreensível. Um país que andou a cavar até aos anos 60 e se conseguiu libertar dessa vida fugindo para as repartições publicas…à fresca do ar condicionado, quem é que o tira de lá depois de ter perdido a referência às minas fresquinhas da Gardunha?…nem a mim que ainda que conheço os sítios.
De maneiras que é assim…a nossa cultura cívica e democrática…como que à espera de Godot.
FB

José Barroso disse...

A propósito do meu artigo deste post, não deixa de ser curioso o texto que o Adelino Costa publicou no facebook. Ele está no seu papel, pois com certeza!

"Campanha da batata
Apelo a todos os amigos que sejam produtores de batata, e as tenham em excesso e queiram fazer um ato de solidariedade, para com a Santa Casa da Misericórdia de São Vicente da Beira.
Que façam uma oferta aqui no lar de São Vicente uma doação das batatas que os nossos idosos agradecem Bem Haja"

Abraços, hã!
JB

Anônimo disse...

Doar o excedente de batatas ou qualquer outro hortícola! Essas instituições não necessitam pois levam um balúrdio para admitirem lá um idoso mesmo sendo irmão da misericórdia!