Ao
lado da casa dos meus avós, no Casal, havia duas cerejeiras. Todos os anos
carregavam tanto que às vezes até esnocavam alguns ramos. Eram tão altas que só
os rapazes conseguiam trepar por elas, mas, para nós, o meu avô arrumava-lhes
uma escada, mal as cerejas começavam a ficar encarnadas, e só a tirava muito
tempo e grandes barrigadas depois, quando até as passas já tínhamos comido, a
meias com os pardais.
Era um tempo farto, e em que até as raparigas também ficavam mais bonitas, enfeitadas com os brincos novos todos os dias.
Contam
que a Amália Rodrigues, que terá nascido no Fundão, não foi registada logo à
nascença por falta de meios dos pais. Tempos mais tarde, quando a mãe a quis
registar e lhe perguntaram a data de nascimento da menina, terá respondido:
«Foi no tempo das cerejas». Isto prova que vem de longe a importância da cereja
na economia da região.
ML
Ferreira
Fotografia de Diamantino Gonçalves