Partida
«…a aldeia seria em tempos recuados constituída por duas partes, separadas pela Ribeira do Portabeira. Seria, assim, uma povoação «partida» e daí o nome Partida.» (Luís Leitão em «Partida»). Esta explicação, não estando provada, é bastante plausível. Seria assim no tempo em que, segundo a lenda, o Santiago ainda penava nas Lameiras, antes de lhe terem feito a capela no cimo do Cabeço.
Dá-nos também ideia da antiguidade do povoamento daquele lugar.
À medida que foi crescendo a povoação trepou, encosta acima, em ruas íngremes, entrelaçadas umas nas outras, por onde dá vontade de nos perdermos.
A maior parte dos nomes confunde-se com os lugares que lhe são próximos e as culturas mais comuns nos campos à roda: Rua do Esteval, Rua das Hortas, Rua dos Olivais, Travessa da Moreira (Amoreira), Rua da Barroca, Rua do Cabeço…; outras lembram o nome dos santos da devoção das gentes da terra: Rua de Santiago, Largo de São Sebastião,
Rua da Igreja.
A caminho do Vale de Figueiras vai a Rua dos Almos. O nome eleva-nos o pensamento, a sugerir alguma divindade, mas é possível que lhe venha de uma das muitas espécies da vegetação que ladeia a Ribeirnha, a correr-lhe quase paralela.
À Rua do Coredágua, que desce desde quase o cimo do povo, assenta-lhe bem o nome: dizem que em dias de muita chuva é um louva a Deus de água por ela abaixo.
À semelhança de todas as outras povoações da freguesia, também aqui muitas casas vão ficando vazias e, com o passar dos anos, acabam por cair. Mas, ao contrário do que se passa noutros lugares, há muitas a ser reabilitadas. É o caso destas na Rua do Outeiro. Na da esquerda terá funcionado a primeira Escola da Partida.
Mourelo
Terão por lá andado os mouros? É possível… Existem ali à roda lugares, a fonte de mergulho e a Gruta da Moura, que podem prová-lo.
Logo à entrada do povo, no Largo da Portela, o Santiago a abençoar e proteger:
Depois são algumas ruas alinhadas, cortadas por outras que as atravessam e unem. Os nomes lembram-nos a importância da agricultura naquele lugar: Rua do Lameirão, Rua da Vinha Velha, Rua do Vale do Linho (poderia existir também a Rua dos Olivais, porque há oliveiras seculares por todo o lado).
A placa da Rua do Vale do Linho foi mudada para Rua da Escola; resta a memória desse tempo na Travessa do Vale do Linho.
O cultivo e tratamento do linho foi uma das principais atividades das mulheres do Mourelo até meados do século passado. Das poucas que lá vivem, falei com uma que recorda esse tempo e conta como era duro o trabalho: «Olhe aqui como estão os meus dedos, todos tortos. Foi de tanto fiar, desde que era pequena. De inverno, o serão era passado à roda do lume a dar ao dedo. Nem nos dias em que meu homem lá ia a casa a namorar-me tinha descanso. Mal podíamos falar um para o outro.» À beira dos oitenta anos e já viúva, naquele dia ainda andava a semear feijões numa horta que fazia inveja.
A Rua do Forno já foi Rua dos Correios. Ainda restam vestígios dos tempos em que as cartas eram levadas por mulheres, a pé, por caminhos de cabras, sujeitas a todos os perigos. Há quem por lá se lembre ainda da Ti Mari’ Correia e da Ti Mari’ Chamiça.
Na Rua da Portela encontramos alguns dos melhores exemplos da arquitetura da época, com casas de um ou dois pisos e paredes levantadas em xisto. Impossível não meter o olho pelo buraco da fechadura…
E nesta casa, na Travessa do Fundo da Rua, que pena não haver gente à varanda ou sentada no poial, entre as portas.
Houve tempos em que muitas casas tinham estes bancos de pedra. As mulheres, sentavam neles para descansar do trabalho no campo, que começava ainda antes do nascer do sol. Às vezes aproveitavam para remendar, fiar, ou a catar os filhos quando as pragas de piolhos atacavam. Depois da ceia, vinham só para dar à língua umas com as outras e aproveitar o fresco da noite. As crianças brincavam às escondidas ou sentavam-se ao pé, a ouvir contar histórias.
E ao fundo da Rua da Capela, quase à saída, o Santo António a dar proteção aos moradores e aos que passam a caminho do Tripeiro…
M. L. Ferreira
(continua…)