Mostrando postagens com marcador nomes de ruas. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador nomes de ruas. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 17 de maio de 2021

Os nomes das nossas ruas (continuação)

 Partida

«…a aldeia seria em tempos recuados constituída por duas partes, separadas pela Ribeira do Portabeira. Seria, assim, uma povoação «partida» e daí o nome Partida.» (Luís Leitão em «Partida»). Esta explicação, não estando provada, é bastante plausível. Seria assim no tempo em que, segundo a lenda, o Santiago ainda penava nas Lameiras, antes de lhe terem feito a capela no cimo do Cabeço.

 

Dá-nos também ideia da antiguidade do povoamento daquele lugar.

À medida que foi crescendo a povoação trepou, encosta acima, em ruas íngremes, entrelaçadas umas nas outras, por onde dá vontade de nos perdermos.

A maior parte dos nomes confunde-se com os lugares que lhe são próximos e as culturas mais comuns nos campos à roda: Rua do Esteval, Rua das Hortas, Rua dos Olivais, Travessa da Moreira (Amoreira), Rua da Barroca, Rua do Cabeço…; outras lembram o nome dos santos da devoção das gentes da terra: Rua de Santiago, Largo de São Sebastião,

Rua da Igreja.

A caminho do Vale de Figueiras vai a Rua dos Almos. O nome eleva-nos o pensamento, a sugerir alguma divindade, mas é possível que lhe venha de uma das muitas espécies da vegetação que ladeia a Ribeirnha, a correr-lhe quase paralela.

À Rua do Coredágua, que desce desde quase o cimo do povo, assenta-lhe bem o nome: dizem que em dias de muita chuva é um louva a Deus de água por ela abaixo.     

À semelhança de todas as outras povoações da freguesia, também aqui muitas casas vão ficando vazias e, com o passar dos anos, acabam por cair. Mas, ao contrário do que se passa noutros lugares, há muitas a ser reabilitadas. É o caso destas na Rua do Outeiro. Na da esquerda terá funcionado a primeira Escola da Partida.


E que lindas ficam estas ruas!

 

Mourelo

Terão por lá andado os mouros? É possível… Existem ali à roda lugares, a fonte de mergulho e a Gruta da Moura, que podem prová-lo.

Logo à entrada do povo, no Largo da Portela, o Santiago a abençoar e proteger:

Depois são algumas ruas alinhadas, cortadas por outras que as atravessam e unem. Os nomes lembram-nos a importância da agricultura naquele lugar: Rua do Lameirão, Rua da Vinha Velha, Rua do Vale do Linho (poderia existir também a Rua dos Olivais, porque há oliveiras seculares por todo o lado).

A placa da Rua do Vale do Linho foi mudada para Rua da Escola; resta a memória desse tempo na Travessa do Vale do Linho.

O cultivo e tratamento do linho foi uma das principais atividades das mulheres do Mourelo até meados do século passado. Das poucas que lá vivem, falei com uma que recorda esse tempo e conta como era duro o trabalho: «Olhe aqui como estão os meus dedos, todos tortos. Foi de tanto fiar, desde que era pequena. De inverno, o serão era passado à roda do lume a dar ao dedo. Nem nos dias em que meu homem lá ia a casa a namorar-me tinha descanso. Mal podíamos falar um para o outro.» À beira dos oitenta anos e já viúva, naquele dia ainda andava a semear feijões numa horta que fazia inveja.

 

A Rua do Forno já foi Rua dos Correios. Ainda restam vestígios dos tempos em que as cartas eram levadas por mulheres, a pé, por caminhos de cabras, sujeitas a todos os perigos. Há quem por lá se lembre ainda da Ti Mari’ Correia e da Ti Mari’ Chamiça.

Na Rua da Portela encontramos alguns dos melhores exemplos da arquitetura da época, com casas de um ou dois pisos e paredes levantadas em xisto. Impossível não meter o olho pelo buraco da fechadura…

 

E nesta casa, na Travessa do Fundo da Rua, que pena não haver gente à varanda ou sentada no poial, entre as portas.

Houve tempos em que muitas casas tinham estes bancos de pedra. As mulheres, sentavam neles para descansar do trabalho no campo, que começava ainda antes do nascer do sol. Às vezes aproveitavam para remendar, fiar, ou a catar os filhos quando as pragas de piolhos atacavam. Depois da ceia, vinham só para dar à língua umas com as outras e aproveitar o fresco da noite. As crianças brincavam às escondidas ou sentavam-se ao pé, a ouvir contar histórias.

E ao fundo da Rua da Capela, quase à saída, o Santo António a dar proteção aos moradores e aos que passam a caminho do Tripeiro… 

M. L. Ferreira

(continua…)

segunda-feira, 3 de maio de 2021

Os nomes das nossas ruas

Terras de heróis anónimos. Quase sempre homens e mulheres de unhas encardidas e mãos calejadas assim que começavam a ser gente. Uma vida a trabalhar de sol a sol para tirar da terra o sustento dos muitos filhos que Deus lhes dava e tantas vezes lhes levava, mal eram postos no mundo ou no correr da infância, mortos de fome. A melhor fatia do que produziam mal dava para pagarem as rendas àqueles que, por uma ordem social e moral velha, que ninguém contestava, se diziam donos delas. Não ficaram para a História imortalizados no nome de uma rua ou de uma praça. É natural, não haveria ruas nem praças que chegassem para escrever os nomes de tanta gente.

Mas deixaram pegadas por todo o lado que são testemunhos da sua passagem por estas terras. Não precisamos de estender muito o olhar para descobrirmos a herança generosa que nos legaram. É por isso que, com frequência, sinto que os nomes das ruas e lugares das várias povoações da nossa freguesia, não sendo de gente ilustre, são memoriais ao trabalho heroico dos nossos antepassados, incluindo os nossos pais e avós, os que nos estão mais próximos.

Certamente porque a História e a Geografia, mas sobretudo o modo de vida, as necessidades, as ambições e as crenças são comuns, os nomes das ruas, repetem-se ou assemelham-se muitas vezes nas várias aldeias da Freguesia: Rua da Eira, Rua da Fonte, Rua do Forno, Rua do Lagar, Rua da Barroca, Ruas dos Olivais, Rua da Igreja… Constatei isso ao percorrê-las:

 

Casal da Serra

«A aldeia era uma rua inclinada de poente para nascente. Semelhava uma cobra rabiscada por mão de criança. Dela se separam algumas ruelas. Em maior número para norte. Para Sul apenas duas, porque o declive era abismal…» (Albano de Matos, em “A casa Grande”).

Esta rua chama-se agora Rua da Fonte. Registos antigos dizem que já se chamou Rua do Forno, por referência a um forno, propriedade da Casa Grande, gente rica, dona de quase todas as terras ali à roda. O forno era particular, mas, em alguns dias, estava ao serviço da população.

Dela, sobem agora a Rua do Forno, a Rua da Capela, a Rua da Barreira, a Rua da Barragem e a Rua do Lagar.

De todas, a Rua da Lagariça, também para norte, é a que melhor testemunha a presença humana, desde há muito tempo, naquele lugar. As lagariças eram pequenos lagares escavados na rocha, onde se espremiam as uvas e fazia o vinho de forma bastante simples. Terão existido muitas na região da Beira Baixa. Algumas desapareceram, mas as que restam são consideradas pontos de interesse para os locais onde se situam. A do Casal da Serra foi coberta por uma camada de cimento…

Para Sul, correm a Rua da Ribeira, a Rua da Graça e a Rua Da Eira.

Neste conjunto de casas, a construção mais pequena, ao centro, terá sido a primeira habitação da família Simão Candeias. Foi ali que, mais tarde, funcionou também a primeira escola do Casal da Serra.

 

A eira que dá nome à rua ainda existe, à direita das casas, e está capaz de receber uma malha. Assim haja trigo, centeio e cevada, e braços fortes para levantar o mangual.  

 

Paradanta


A origem do nome da povoação - pedra de anta, de acordo com informação do José Teodoro - sugere que o lugar será habitado desde há muito. Pouco mais que a Rua Principal, empoleirada na crista de uma elevação que corre no vale, de norte para sul. Meio escondida, surpreende quem por lá passa.

Nasceram-lhe outras duas, pequeninas, quase ao fundo: a Rua da Tapada, para oeste, e a Rua da Fonte, para leste. 

Até há relativamente poucos anos era esta fonte que abastecia a povoação. A água é tão boa, que mesmo quem já não mora na terra ainda lá vai bebê-la e levá-la para casa. O local, junto duma cascata na ribeira, vale uma visita, pela frescura da água e pela beleza e tranquilidade do lugar.

 

Vale de Figueiras

 

Conta-se que o primeiro habitante do Vale de Figueiras veio desterrado de longe por ter matado um pinto de uma mulher rica e avarenta. Já lá irão muitos anos, mas há quem afirme que ainda existem vestígios da casa onde viveu, perto da ribeira. Verdade ou não, as ruínas de algumas habitações e a arquitetura de outras que ainda se aguentam de pé, falam bem da antiguidade do Lugar. Infelizmente falam também do despovoamento.

 

  A justificar o nome da povoação estará o facto de ter nascido no vale da ribeira, num local onde cresceriam algumas figueiras. Trepou depois, encosta acima, como um presépio nos postais de natal; primeiro numa das margens, depois ao longo da outra (talvez nas duas ao mesmo tempo…).

Para além da Rua da Escola, a Rua da Capela, a Rua do Terreiro e a Rua da Ponte, passamos também pela Rua da Várzea, a Rua da Barroca e a Rua do Forno. Esta, que sobe a pique desde a ribeira até ao cimo do povo, já se chamou Rua da Eira, por, quase lá no topo, ter existido uma eira comunitária. O local está agora calcetado.

 

Pereiros

 

É também uma Rua Central, a mais antiga, por onde passavam os moradores do Mourelo ou do Violeiro quando vinham tratar das vidas a São Vicente. Corre o povo quase de Norte para Sul e nela nascem outras mais pequenas para ambos os lados: a Rua da Ribeira, a Rua do Forno, a Rua das Lameiras, a Rua do Barro, a Rua da Laje… todas a provocar a imaginação e a pedir que se contem as histórias de quem por lá andou.

De todas as ruas e recantos dos Pereiros o que mais me encantou foi o Pátio das Cancelas. Não encontrei quem me desse a razão deste nome, mas não custa imaginar que, em tempos passados, fechariam as entradas da povoação com cancelas para protegerem o gado que dormia nas lojas e currais, junto das casas, dos ataques dos lobos esfomeados. Era assim em muitas aldeias isoladas.

 

Foi numa destas casas, agora só paredes que mal se aguentam de pé, que funcionou a escola até aos anos 60 do século passado. Dizem que era uma sala acanhada, cheia de crianças sempre ansiosas pelo toque da campainha. Que animação a daquele Pátio na hora do recreio!

Esta casa, quase de brinquedo, é um exemplo de como se podem aproveitar estas construções antigas para passar uns dias a descansar. Evita-se a derrocada e as terras ficam mais lindas.

(Continua)

M. L. Ferreira