Foi um bom momento de partilha, com histórias dos mais variados assuntos, mas com maior incidência nas nossos memórias das Festas de Verão. Venham mais Conta-me histórias.
José Teodoro Prata
Fotos da Maria da Luz Teodoro e do Joaquim Varanda
Enxidros era a antiga designação do espaço baldio da encosta da Gardunha acima da vila de São Vicente da Beira. A viver aqui ou lá longe, todos continuamos presos a este chão pelo cordão umbilical. Dos Enxidros é um espaço de divulgação das coisas da nossa freguesia. Visitem-nos e enviem a vossa colaboração para teodoroprata@gmail.com
Foi um bom momento de partilha, com histórias dos mais variados assuntos, mas com maior incidência nas nossos memórias das Festas de Verão. Venham mais Conta-me histórias.
José Teodoro Prata
Fotos da Maria da Luz Teodoro e do Joaquim Varanda
É o lugar mais conhecido do Casal (quando mo perguntam e digo que moro em frente da taberna da Amália, ficam logo a saber onde é a minha casa), mas a fama já vem do tempo do pai, quando ainda era a do Marcelino, com outro ar e outra freguesia.
Atualmente é ponto de encontro, quase
só de mulheres, para um café e dois dedos de conversa; nas tardes de verão há
quem se demore na esplanada a beber um cai-bem,
refresco feito com uma mistura de refrigerante gasoso e xarope de groselha,
receita caseira. Mas isto são coisas dos tempos modernos, que, há pouco mais de
cinquenta anos, nenhuma mulher se atrevia a entrar na taberna, mesmo que fosse
para ir chamar o homem, esquecido a matar a sede depois de uma tarde de domingo
a jogar à malha. Por isso mandavam os filhos, se já se fazia tarde para a ceia,
que às vezes também eram encorridos para casa, apenas pelo apontar de um dedo e
o olhar esbugalhados de quem quer afirmar a autoridade do chefe da família. Eles
iam ficando sempre mais um pouco…
Mas havia o Ti Miguel Jerolme, um andarilho toda a vida, sempre
de um lado para ao outro à procura das melhores rezes para criar ou vender a
quem lhas rogasse nos mercados e nos talhos. Era uma paz d’alma, amigo de toda
a gente; também do Ti Marcelino, quase da mesma criação.
Quando deixou de andar por lá, no
negócio do gado, era raro o dia em que não aparecesse no Casal, quem sabe se
num chamamento do coração ao ninho onde se criou, ali a dois passos, e ficava
até se fazer noite, entremeando a conversa com mais um copinho. Vendo-o magrito,
não fosse o vinho cair-lhe na fraqueza, a Tia Trindade oferecia-lhe muitas
vezes uma bucha, quase sempre um bocado de pão com uma mancheia de azeitonas ou
uma talhada de queijo, e ele não dizia que não.
Quando começava a passar da hora, ia-lhe
dizendo: «É melhor ir andando, Ti Meguel, que se faz tarde e a sua mulher já
deve estar ralada…». Mas ele nunca tinha pressa de abalar: «Já vou…», e ia-se
deixando ficar, sentado num dos bancos corridos encostados à parede. Até que,
já noite escura, aparecia a Tia Laurentina com a lanterna na mão, e parecia ele
que via Deus: levantava-se logo, com a alegria de uma criança confiante na mãe
e, com o equilíbrio possível, caminhava atrás dela, pela vereda que os levava até
casa, no outro lado do ribeiro. E era assim, muitos dias…
Após a morte da Tia Laurentina, foi a
Chão, a última das filhas em casa, que, com a mesma dedicação e amor da mulher,
lhe serviu de estrela, alumiando-lhe as noites escuras no regresso, desde o
Casal da Fraga da sua infância, até ao Casalito onde se tinham criado os dez filhos que Deus lhes deu.
O Casal do Baraçal, já tão diferente, visto do Casal da Fraga (apenas as casas em primeiro plano, ao fundo é já a Devesa)
Nota: O senhor Miguel Jerónimo nasceu no Casal da Fraga, em 1905, numa casa duma travessa da rua de Santa Bárbara, uma das mais antigas do Casal, que ainda é habitada. Era filho de António Jerónimo Lopes, já aqui nascido, e de Maria Josefa, natural dos Pereiros. Teve oito irmãos. À exceção de uma irmã, todos se criaram, casaram e terão tido filhos. Do casamento com a senhora Laurentina Hipólito teve dez filhos, todos criados até à idade adulta, e só o Padre Zé e a Conceição (Chão) não deixam descendência. Será, por isso, uma das famílias com mais parentes em São Vicente. Faleceu em 1 de junho de 1981, poucos anos depois da mulher.
ML Ferreira
São horas, está tudo a acordar
Um
novo dia se aproxima
Vamos
todos levantar
Em
direção à cozinha
Após ter
passado uma noite bem dormida ao lado de três irmãos, dois para cima e dois
para baixo, eis que oiço o galo cantar, dando sinal de que vamos entrar num
novo dia. Levanto-me, dirijo-me à cozinha e encontro a minha mãe já levantada,
preparando o nosso pequeno-almoço, ou seja, café de cevada, que todos nós
degustávamos com alguma satisfação, misturando um pouco de leite das ovelhas
dos meus avós, quando havia e quando não havia era preto. Partíamos uma fatia
de pão cozido no forno da tia Maria Estela para uma malga e tudo misturado, era
a nossa primeira refeição, ou seja, o café migado.
Fizemos
a higiene pessoal
Acompanhados
da nossa mãe
A
seguir fomos para o quintal
A
ouvir o galo também
A minha
mãe já tinha preparado uma grande bacia de roupa que iria lavar para a ribeira
da senhora Encarnação (1), mas antes de sair de casa tinha a preocupação de nos
lavar na casa de banho, porque já tínhamos esse miminho, não havia era a água
canalizada ainda, tínhamos de a ir buscá-la à fonte, que está ali perto,
despejá-la para um depósito no forro. A canalização estava feita internamente
ligada a esse depósito, podendo assim utilizá-la na casa de banho e na cozinha,
onde já havia uma torneira.
Tomámos
o nosso café migado
Com
alguma satisfação
Que a
minha mãe tinha preparado
Antes
de ir para a ribeira da senhora Encarnação
Acordo bem-disposto,
porque finalmente entrámos de férias escolares, e feliz estava, porque tinha
passado para a terceira classe. Depois de a minha mãe ter terminado todo este
ritual e de ter acomodado as galinhas e os perus que tínhamos no quintal,
dirige-se a mim, porque entendia que eu era o mais jeitoso para a ajudar, e
diz-me:
- Daqui a
três horas vais ter comigo à ribeira para me ajudar a trazer a roupa, porque é
muita e eu não posso sozinha.
Eu,
quando entendi, saio de casa, passo na Fonte Velha, vinha a Dona Zara a sair de
casa, dirigindo-se a casa da Dona Maria; quando passo por ela, dou-lhe a
salvação.
Desço
rua abaixo contente
E na
fonte paro um pouco
Vejo
o João Carvalho e o Joaquim Valente
A entrar
na tasca do João Coxo
Passo em
frente à taberna do sr. João Coxo, estavam a entrar os senhores Joaquim Valente
e João Carvalho, que de certeza iam matar o bicho. Vou direito à rua Velha,
onde encontro o sr. Joaquim Ribeiro, mais tarde meu tio, porque casou com a
minha tia e madrinha, à porta da sua casa, a ver quem passava. Chego a casa do
sr. Albano Jerónimo e vejo um carro de bois à porta dele, sem o ganhão, que
deveria estar a receber ordens dentro de casa; entretanto chega o sr. João
Paulino com o seu grande burro, que devia ir para a propriedade que tinha na
Senhora da Orada.
Em
frente à casa do senhor Albano
Um
carro de bois está parado
O
ganhão recebe ordens do comando
E
deve cumprir o que ficou combinado
Chego à
Estrada Nova e vejo ao meu lado esquerdo o sr. Jaime Pique, que se encontra à
porta do forno do sr. José Matias (2), a fumar o seu cigarrinho; e prossigo o meu objetivo
direito à ribeira da senhora Encarnação. Entro no caminho onde se encontra
agora o Nicho e chego à ribeira. Além da minha mãe, há outras mulheres a fazer
o mesmo trabalho. Já estava calor, porque tínhamos entrado no Verão, mas a
ribeira ainda levava água suficiente para lavar a roupa.
Com
alguma satisfação
Finalmente
chego ao destino
À
ribeira da senhora Encarnação
Local
onde bem me sinto
Eu
gostava de estar ali, porque entrava na água e divertia-me. Não estava sozinho,
havia outras crianças e todos nos divertíamos: uns apanhavam peixes com um
cesto e outros divertiam-se a bachicarem-se uns aos outros e a jogarem às
escondidas. Havia meninas em combinação, porque as mães aproveitavam para lhes
lavarem os vestidos, para que no final viessem lavadinhas para casa.
Em frente
encontrava-se o lagar da Luz Mesquita, mas de momento não estava a trabalhar.
Lá mais a cima, junto às passadoiras, havia outro lagar que pertencia à Casa
Conde. De repente vejo um homem a passar as passadoiras do Casal para a Vila.
Era o tio Tota que era o varredor das ruas e ao mesmo tempo o coveiro. Mais
tarde vim a saber que tinha morrido uma pessoa e ele vinha abrir a cova.
Toca
o sino a dobrar
Sinal
de que alguém morreu
O tio
Tota vai passar
Pergunto-lhe,
quem é que faleceu?
Entretanto,
a minha mãe já lavou a roupa, a pôs a corar ao sol, voltou a passar pela água e
colocou a secar. Quando está quase seca, vimos para casa. E assim se passou
mais um dia na ribeira da senhora Encarnação.
João Maria dos Santos
Notas:
(1)
Antes do lagar da sr.ª Luz Mesquita ser construído, havia uma azenha
naquele local, cuja moleira era a senhora Encarnação; por isso o sítio da
ribeira em frente tinha o nome da moleira.
(2)
O local primitivo do forno do sr. José Matias foi ao fundo da Rua Nicolau
Veloso, à esquerda, já junto à estrada.
Fonte Ferreira, atualmente. No passado, era uma fonte de mergulho.
Da minha casa vê-se este caminho.
Não a Fonte Ferreira, mas o caminho, a
Barreira de São Francisco quase toda.
À
Fonte Ferreira vinhamos buscar água para beber, que guardávamos em cântaro de
barro - em todas as cantareiras, em todas as casas havia um cântaro de barro,
para a água de beber.
Também
se bebia água no local, joelho em terra, o nariz dentro da poça, a água tantas
vezes a entrar tanto na boca como no nariz.
No
Inverno a Fonte quase sempre desaparecia, era preciso refazê-la quando acabavam
as enchentes de Inverno na Ribeira.
A
água para outros gastos de casa era apanhada ali em cima, do lado de cima das
passadouras, mesmo depois de fazerem a Fonte do Casal.
Isto
só mudou, nesta parte, para quem morava do lado de baixo da Estrada, quando,
muito mais tarde, se construiu uma outra Fonte, no lado de cima da Quelha, na
junção com o caminho que agora se chama travessa ou rua dos Nicolaus, fonte
essa mais recentemente destruída, quando passou a haver água canalizada nas
casas.
Do
lado do Casal, este caminho chamava-se A Quelha; do lado da Vila, Barreira de
São Francisco.
E
a ribeira, pelo menos lá em casa, era a daqui, a Ribeira das Passadouras, e ali
em baixo, a Ribeira da Azenha. O nome desta vinha do que todos conhecem como
Lagar do Zé Mesquita, para nós uma edificação que fazia parte da história da
família: ali tinha sido uma azenha, de moer cereal, a minha avó Encarnação era
a Moleira, e ali na Azenha lhe nasceram vários filhos e filhas, incluindo a
minha mãe, a mais nova. Por isso, àquele edifício, ouvi muitas vezes chamar
"a nossa Azenha".
Tenho
memórias muito vivas associadas a este caminho:
-
os peixeiros da Vila, quando o peixe chegava a SVB, de caixa às costas,
descendo a correr, do lado de São Francisco, apregoando o que levavam, para
chamar os fregueses do Casal, a começar pelos da parte de baixo da Estrada,
tudo fazendo para serem os primeiros a chegar à "Charneca" - o
Maiaca, a Palmira Sardinheira, António Brocha, creio que o
Pinura,..."Dois, 25 tostões", o chicharro, em certa altura;
"Fresca e boa! Olha que é boa e barata", se era sardinha que levavam;
-
os grupos, aos 3 e aos 4, às vezes mais, nos domingos, a caminho da missa -
víamos eles descerem a Quelha, subindo depois ali do lado de São Francisco;
-
as "passadouras", que a ponte é um melhoramento recente, creio que
posterior ao 25 de Abril. E as enchentes da ribeira, que deixavam as
passadouras intransitáveis - e lembro-me de ver o meu pai a passar às costas,
em dia de missa, várias mulheres, do lado do Casal para o da Vila;
-
ainda nos domingos - é uma memória de Verão - homens bêbados, virem de lá para
cá, naquele estado, em graus diversos: foram à missa, trataram de algum
pendente à saída da igreja, encontraram-se com este e aquele, "vai um
copo?", o estômago em geral vazio, e regressavam a esta banda alguns em
péssimo estado. O bêbado mais notório do Casal era o tio António Tota -
lembro-me de o ver, dali da minha casa, sentado numa pedra, ali no cimo do
Covão, em grande cantoria, dizendo de vez em quando "Eu sou o Tota",
e chamando em altos berros: "Oh, Maria Amália", era a mulher, fula,
com razão, fechada em casa, e ele por lá ficava naquilo...;
-
muito viva ainda, a imagem das escadas do Calvário, ainda nos domingos, pejadas
de gente, homens também, mas principalmente mulheres. Era o local e a hora de
as mulheres mudarem de calçado, trocando os sapatos velhos, botas ou sandálias,
cobertos de pó e lama do muito caminho andado, por "calçado de ir à
missa"; no regresso, no mesmo sítio, voltavam ao "calçado de
andar", para demandarem Pereiros, Mourelo, Partida, e não sei que mais. E
eu, vendo-os, tinha um sentimento meio indistinto, acho que um misto de pena
(acho que por sabê-los pobres) e de vergonha! Sei lá porquê, na verdade.
E
por falar de calçado, há que falar de andar descalço. Na minha escola primária,
havia miúdos que iam descalços à escola. Até me lembro da inveja que tinha,
quando se jogava à "Espada Lua", em que é muito importante a
velocidade de corrida, a inveja que eu (que era um cepo a correr) tinha de um
outro miúdo, que corria muito - e eu associava o "correr muito" ao
facto de ele andar descalço.
Também
havia adultos que andavam descalços. Destes, a memória mais presente é de uma
senhora que todos os dias, ou duas a 3 vezes por semana, fazia o caminho, a pé,
de SVB para as Anexas - Pereiros, Mourelo, Partida - levando e trazendo o
correio. Tenho ainda muito viva a imagem dessa senhora, cabeça, tronco e
membros, o porte e o jeito de andar, mas ainda estou a ver, especialmente, os
pés dela... Era a tia Maria Chamiça.
...
Se
não tivesse já falado muito, ainda vos contava como eu e o meu irmão Artur
fomos apresentados, aqui neste local, às batatas doces - que, de todo, não
conhecíamos! -, e uma certa aventura de um martelo de brincar que me saiu numa
rifa, cujo prémio maior era uma cobiçada bola de borracha, martelo esse que eu,
a descer a Barreira de São Francisco, não tive coragem de deitar fora.
Casal
da Fraga, 23 de Junho de 2024
J. Miguel Teodoro (que também assina Sebastião Baldaque)
Foi um bom passeio, com muitas histórias para partilhar!
Comecemos pelo fim:
No final, na taberna do Marcelino, esperava-nos um bom lanche, para retemperar forças, e cadeiras para descansar as pernas. Obrigado pela generosidade!
Recordámos a ti Pulquéria e falámos da origem do nome Fraga.
Na ribeira, antes de subir para o Casal do Baraçal, a Libânia Ferreira, a Luz da Esperança, o José Teodoro e o João Manuel dos Santos contaram a história da guerra das lavadeiras, em 1970, quando Castelo Branco começou a beber a água da barragem do Pisco.
Antes, um pouco mais acima, onde começámos, falou-se da aventura que era atravessar as passadouras em dias de enchente, da sua substituição pelo pontão e de outras histórias que a ribeira guarda e só nos conta se lhe souberemos perguntar.
Aqui participaram tantos! Se não estiveram lá, terão de esperar pelas suas histórias, quando eles as passarem para o papel (como o João Maria já fez).
José Teodor Prata
Fotos de Francisco Barroso e Maria da Luz Teodoro
Este texto já foi aqui publicado, mas voltamos a ele, porque é muito bonito e bom para vos abrir o apetite para a 4.ª tertúlia do Conta-me histórias, desta vez no Casal da Fraga, no próximo domingo.
“Olha
lá cachopos, se vandes pra Lisboa e virendes por lá a minha ‘sabel, dai-lhe
recomendações nossas!”
“Nossas”
era como quem diz, da tia Pulquéria e do irmão da Isabel, ambos moradores numa
casa que já foi abaixo, pedra em cima de pedra, com um balcão que dava para a
estrada, no que eu sempre acreditei ser o lugar mais soalheiro do nosso Casal
da Fraga.
Já
grandes e com a arrogância que o cosmopolitismo aparentemente confere,
sorríamos e acenávamos que sim, incapazes de compreender tanta simplicidade – é
mesmo desarmante, a simplicidade, não é?
A
mesma inocência com que, depois das pregações da Semana Santa, quando,
regressados da igreja, descíamos a barreira de São Francisco, a tia Pulquéria
repetia partes inteiras do sermão, exaltando a beleza de um gesto bíblico ou o
sentido de uma parábola, que ela retivera e a nós, adolescentes de fresco,
soava a prosa infantil. “Não é tão lindo, cachopos?”, ouvíamos ela dizer.
Nesses dias, por causa das exéquias, ela calçava uma espécie de sapatos de pano
– pretos, com uma presilha que abotoava de lado.
Nunca,
que eu saiba, houve pessoa mais pura neste mundo.
Incapazes
de perceber, pequenos e grandes, à uma, fazíamos pouco dela: do porco foçador, já
com oito ou nove anos, que por vontade da dona nunca iria à faca; ou da pressa
com que se mexia – ela não andava, corria, porquê? se não se lhe conhecia sombra
de compromissos ou obrigações; ou do xaile ou pano preto com que sempre se
cobria, já em muito mau estado; ou da horta e da criação que não tinha. E do
afilhado, já homem e de bom físico, que a madrinha não deixava trabalhar, ao
dia, porque se cansava, ou da limpeza por fazer, tanto da casa, como do corpo
de passarinho; ou, ainda, de ela ter uma interpretação literal das parábolas da
Bíblia ouvidas na igreja, e de, na sua ideia, Lisboa ser apenas um pouco maior
do que São Vicente. Sem semear, nem
colher, interrogava-se o senso comum, que éramos nós todos, de que é que viviam
aqueles dois pobres de Cristo – por que milagre, sem um vintém a entrar-lhes em
casa?
Pobre
de espírito ouvi chamar mais de uma vez à tia Pulquéria, uma senhora que, nós
já adultos, ainda nos chamava “meninos”, para quem a pobreza era como se não
fosse – antes, uma condição natural vivida com amorosa ingenuidade.
Em
boa verdade, tal transcendência, para mim, foi durante muito tempo um caso de
santidade. Hoje, mais incomodado com o conforto das certezas do que com o
desconforto da dúvida, não vou tanto por aí. Ainda assim, guardo dela uma
memória feliz, e isso para mim é mais importante que as questões da santidade.
Sebastião Baldaque
SET. 2022
Juntámo-nos à Comissão das Festas de Verão, para dar também o nosso contributo. O primeiro cartaz é o do projeto Conta-me Histórias, que será usasdo para publicitar todas(?) estas tertúlias.
A organização é d´Os Amigos dos Enxidros. Dos Amigos, porque a realização das tertúlias e o êxito que tiverem será sempre mérito de quem as anime e de quem vá assistir. Dos Enxidros, porque lancei o projeto através do blogue Dos Enxidros e porque os enxidros eram, no passado, os baldios da encosta da serra, entre a vila e os altos, da Oles à Senhora da Orada. Tal como os enxidros, este projeto também se quer de todos. A foto que serve de base ao cartaz é da Rua da Misericórdia, antes da demolição da casa do coronel (ela simboliza aqui um pouco do passado que estará presente em cada história que for contada).
Agradeço que divulguem o cartaz nas redes sociais que frequentam.
José Teodoro Prata