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quinta-feira, 27 de julho de 2023

Um padre visionário

 Estive há dias na apresentação do livro «Estêvão Dias Cabral» de Lídia Barata, jornalista do Reconquista. É um livro pequeno, quase todo de investigação sobre os trabalhos na área da engenharia hidráulica em que Estêvão Dias Cabral participou (ou apenas sonhou...), mas que revela muita pesquisa.

É o caso do “capítulo” A PROJEÇÃO DE UMA FÁBRICA DE PAPEL NA BEIRA BAIXA”, que achei extraordinário, apesar de nunca se ter concretizado:

«Na Beira Baixa, seu berço, Estêvão Dias Cabral também estudou com detalhe as potencialidades que a Serra da Gardunha oferecia para a instalação de uma fábrica de papel, projeto que nunca vingou e nunca saiu do seu pensamento técnico nem do papel, sendo à época, seguramente, visto como visionário e arrojado, ou até mesmo megalómano.

Além do potencial em termos de matéria prima, o seu foco terá incidido na quantidade de nascentes de água das quais a Gardunha é fiel guardiã, ou não fosse a água um dos elementos fundamentais no fabrico de papel.

Além de científico, o seu pensamento também se refletia no campo económico, considerando que com este projeto havia potencial para Portugal deixar de importar papel e, além de colmatar as necessidades de consumo interno, poderia até vendê-lo a outros países.

No seu manuscrito “Memória sobre o Papel”, Estêvão Dias Cabral realça a importância da oferta que cada país tem para a criação da sua imagem. “Paciência, se somos obrigados a comprar em casa alheia o que a nossa terra não dá”, referindo-se a produções naturais, mas no que toca à manufatura, o que depende da arte e do engenho do homem, o Jesuíta considera que “ muitas vezes a boa indústria converte miséria em felicidade e pobreza em riqueza”. Pensamento assente no facto de, à época, Portugal desembolsar anualmente “duzentos mil cruzados” na compra de papel, sobretudo a Génova e Holanda. Cabral reitera assim que não tínhamos necessidade de comprar um produto que podíamos vender. E fundamenta e explica porquê.

E foi como “boa indústria” que classificou a fábrica de papel que projetou para a Beira Baixa. Precisava apenas de garantir que os três pilares fundamentais estavam cumpridos, nomeadamente trapos de linho (mas também papel usado e de livros velhos), água e uma máquina para transformar a mistura dos outros dois elementos.

Certo já de que tudo se aproveita e transforma, considerava que seria fácil, com uma pequena compensação financeira, convencer as criadas das casas abastadas e os mais pobres sem ocupação, a recolher todo este tipo de material, fosse na casa dos patrões, fosse nas ruas. Isto seria, na sua perspetiva, um pequeno investimento que geraria um grande retorno. Introduzia à época o conceito daquilo a que hoje chamamos reciclagem.

Quanto à água, que defendia ter de ser “clara, abundante e com queda tal que possa voltar rodas e mover máquinas”, achou-a em abundância num passeio no Outono de 1790 pela sua região natal.

Num local que designou por serra de Alpedrinha, próximo da localidade de Louriçal do Campo, Torre e Casal da Serra, a água do Ocreza servia perfeitamente o propósito, tal como a proximidade das aldeias, que poderiam fornecer a mão de obra necessária. E mais uma vez, olhando à redução dos custos, apontava que os trabalhos mais leves podiam ser feitos por mulheres, rapazes e raparigas, que ganhavam menos que os “dois tostões” diários pagos aos homens.

Este local ficava, como sublinhou, a ”quatro léguas de Castelo Branco e a sete ou oito de Vila Velha”, Vila Velha de Ródão que, no seu entender, seria o local ideal para fazer escoar o produto final, já que beneficiava da navegabilidade do Tejo. Escoamento que também podia ser feito por Abrantes, em alternativa. A facilidade dos acessos era um fator relevante para o seu estudo. Faltava o terceiro pilar, uma máquina que poderia ser como as referenciadas na literatura francesa, onde esta indústria estaria mais avançada, mas também sugeria que se pudesse visitar uma fábrica que, à data, já laborava na Lousã. Em 1716 a qualidade do Engenho de Papel do Penedo, valia-lhe o prestígio de fornecer a tipografia da Companhia de Jesus de Coimbra, vindo depois a juntar à sua lista de clientes a Tipografia Académica e a Casa da Moeda. De qualquer forma, esta tipografia da Lousã seria de menor dimensão que a projetada por Cabral para a Gardunha.

(…)

Na Gardunha abundava a pedra para facilitar a construção do edificado. Carecia de madeira, sempre alvo fácil de incêndios, mas poderia ser fornecida pelas matas de castanho de Alcongosta ou pelo carvalho do Souto da Casa, madeiras nobres que considerava até poderem ser usadas na construção de navios, pela sua qualidade.

Estêvão Dias Cabral defendia que, havendo método, o papel poderia dar ao Estado o mesmo lucro que este já retirava dos lanifícios da Covilhã. Uma coisa era certa na sua cabeça, a beira baixa reunia todas as condições para acolher a “melhor fábrica de papel do mundo”. 

M. L. Ferreira

NOTA: Para quem possa não saber, Estêvão Dias Cabral, filho de Theodoro Faustino Dias, de Tinalhas, e Maria Cabral de Pina, do Violeiro, foi padre jesuíta e engenheiro hidráulico. Nasceu em Tinalhas, a três de fevereiro de 1734, e faleceu em São Vicente, no dia um de fevereiro de 1811.

domingo, 10 de setembro de 2017

Mais Maiores Contribuintes

A listagem que se segue não está datada, mas situar-se-á entre 1843 e 1852, tal como a lista anteriormente publicada. Mas é certamente posterior a ela. As informações relativas ao Ninho estarão na parte de Tinalhas (Fernando da Costa), assim como as do Freixial do Campo (o património de João Duarte Simões dividia-se entre Tinalhas e o Freixial).

CONCELHO DE SÃO VICENTE DA BEIRA
Relação dos maiores contribuintes de décima

Almaceda
Domingos Gomes – 7$026
José Bernardo Ribeiro – 9$268
São Vicente da Beira
João António Ribeiro Robles – 10$768
Bonifácio José de Brito – 8$830
Francisco António de Macedo – 8$000
João Pereira de Carvalho – 10$600
João Ribeiro Garrido – 19$976
João dos Santos Vaz Raposo – 7$070
José Maria de Moura Brito – 6$602
Manuel Martins Dâmaso – 7$630
Nogueira (?) – 4$040
Póvoa de Rio de Moinhos
Francisco José Dias de Oliveira – 11$184
António Joaquim de Carvalho – 7$516
Doutor António Luciano da Fonseca – 45$810
Bernardo da Silva Carrilho Marques – 8$864
Francisco António de Matos – 7$224
Francisco Duarte Carrilho – 7$200
José Alves de Azevedo – 4$218
Tinalhas
José do Espírito Santo – 3$740
Fernando da Costa – 11$510
João Duarte Simões – 12$015
Joaquim Augusto de Magalhães – 8$060
José Coutinho Barriga – 63$388
José Inocêncio Lalanda – 104935
Sobral do Campo
João Paulo do Rosário – 6$440
José Vaz Duarte – 6$110
Luís de Proença – 8$145
Manuel Ramos de Proença – 12$545
Manuel Ribeiro do Rosário – 7$452
Padre Sebastião Bernardo Ribeiro – 8$722
Louriçal do Campo
João António Ribeiro Gaspar – 9$530
Manuel António Ribeiro Gaspar – 9$142
Manuel Ramos Preto – 45$737
Padre Manuel Alves – 5$048

José Teodoro Prata

segunda-feira, 24 de abril de 2017

Moinho de mão

Penso que no passado lhe chamávamos atafona.
O grão do cereal colocava-se no buraco do centro e os orifícios laterais serviam para encaixar algo em que se pegava para mover, à mão, a mó de cima, chamada galga. A farinha saía pelo buraco lateral, à direita.
O sr. Zé Ar (José Duarte?) contou-me um dia que havia uma atafona (chamou-lhe zangarra) na casa onde morava, na Rua da Costa. Já lá estava quando ele comprou a casa.
No século XVIII, existiam duas atafonas em Tinalhas, uma na Rua do Cabo e outra na Praça. Talvez fossem maiores e por isso movidas por animais.
Esta encontrei-a, no Restaurante O Lagar, no Estreito da Câmara de Lobos, Madeira. Mas nas nossas terras haveria muitas, utilizadas ainda nos inícios do século XX.

José Teodoro Prata

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Fontes: casamento no Violeiro

Eis o casamentro de Theodoro Faustino Dias, de Tinalhas, com Maria Cabral de Pinna, do Violeiro, dois dos jovens mais importantes da região. O seu bisneto seria o 1.º visconde de Tinalhas.
A noiva teve no seu casamento os tios padres Manoel Cabral de Pinna e Estevaõ Alvares de Pinna, irmãos da sua mãe Brites Cabral de Pinna, todos da Quinta da Canharda, Fornos de Algodres.

José Teodoro Prata

sábado, 24 de outubro de 2009

Cabeço do Padre Teodoro


Foto do Cabeço do Padre Teodoro, na actualidade, visto do lado do poente.

No relato da minha experiência autárquica, no iníco dos anos 80 ("Experiência Autárquica" de 16 de Outubro), fiz referência ao Cabeço do Padre Teodoro.
Este sítio, junto ao Marzelo, local onde se cruzavam as estradas norte-sul (C. Branco-Fundão/Covilhã), pelas Vinhas e Poldras, seguindo pela Corredoura, em direcção à Senhora da Orada, e este-oeste (Alpedrinha-Almaceda), por dentro da Vila e saindo pela ponte, junto a Santo André, era, em 1975, propriedade dos herdeiros do visconde de Tinalhas.
Porquê este topónimo (Padre Teodoro) e estes donos?
Eis a explicação:

O Padre Theodoro Faustino Dias viveu, no século XVIII, em Tinalhas. Foi cura (pároco) do Freixial do Campo, no 3.º quartel desse século.
Era um grande agricultor, tendo herdado propriedades de vários familiares, um dos quais lhe deixou um morgado (conjunto de propriedades indivisível) que veio a ser a base do património dos seus descendentes, os viscondes de Tinalhas.
O Padre Teodoro era, por exemplo, o maior criador de gado bovino do concelho (cerca de 30 cabeças).
Mas nem sempre foi padre. Só seguiu o sacerdócio após enviuvar, pouco antes de 1750.
Casara com Maria Cabral de Pina, do monte do Violeiro, filha do Sargento-Mor Domingos Nunes Pouzam e de Brittis Maria Cabral de Pinna, ele do Violeiro e ela da Quinta da Canharda, freguesia de S. Miguel de Fornos, junto a Algodres.
Este casal teve vários filhos: a Maria, já referida, um Joam Cabral de Pinna, que viveu em S. Vicente e depois no Fundão, e outros quatro filhos que se fixaram em S. Vicente da Beira. Foram eles o Padre Manoel Cabral de Pinna, o Padre Estevam Alvares de Pinna, Brites Cabral e Joanna Cabral. Os dois irmãos padres e as duas irmãs solteiras viviam numa casa situada na rua que vai da praça para a ponte, como então se designava a actual Rua Nicolau Veloso.
Por morte dos pais, foram herdeiros de muitas propriedades, na Vila e no Violeiro. Por exemplo, pertenciam-lhes a Azenha Nova e o lagar junto à capela do Apóstolo Santo André, ao fundo da Devesa.
É natural que estas propriedades dos irmãos Cabral de Pina tenham sido herdadas pela sobrinha que tinham em Tinalhas, a filha de Theodoro Faustino Dias e de Maria Cabral de Pinna. Não era filha única. Tinha um irmão, Estevão Dias Cabral, que era padre jesuíta e faleceu, na Vila, em 1811. Também a herança deste terá passado, mais tarde, para a herdeira do já então Padre Theodoro Faustino Dias.
Chamava-se Euzebia Dias Cabral e casou com Antonio Jozé Ferreira Meyreles Ferreira Gramaxo, natural do Fundão, mas a viver na Soalheira.
Cerca de 1800, surge frequentemente na documentação o nome deste Antonio Meyreles, com muitas propriedades, incluindo residência, em S. Vicente da Beira, que eram as que a esposa herdada do ramo materno da família.
Foi o neto de Antonio Meyreles e de Euzebia Dias Cabral, chamado José Coutinho Barriga da Silveira Castro e Câmara, que recebeu o título de visconde de Tinalhas.
O seu filho e 2.º visconde, Tomás de Aquino Coutinho Barriga da Silveira Castro e Câmara, foi presidente da Câmara de S. Vicente da Beira, em finais do século XIX.
A sua residência era na casa onde viveu o tio Albano Jerónimo, situada na rua que vai da praça para a ponte, e que é agora de Luís Barroso. A casa anexa a esta, na Rua Velha, para o lado nascente, servia de cozinha à residência do visconde e foi dela que veio o lintel manuelino que está actualmente nas traseiras da Igreja Matriz, numa janela aberta aquando das últimas obras, nos anos 80.

O cabeço junto ao Marzelo seria, então, uma das propriedades da família Cabral de Pina, também antepassados dos viscondes de Tinalhas.