Para
quem é de fora, é difícil acreditar quando dizemos que, cá na terra, somos
todos primos. Para nós, que crescemos com esta verdade, nem nos passa pela
cabeça pô-la em causa.
Esta
é a minha contribuição para provar que assim é. Recuei apenas à minha trisavó
materna, Maria Castanheira, e, pelo número dos descendentes do seu segundo
casamento até à minha geração, é fácil concluir que estaremos quase todos
unidos por laços familiares mais ou menos próximos.
Maria Castanheira nasceu no Souto da Casa no ano de 1844, filha de António
Castanheira e Rosaria Maria da Costa Domingues.
Casou
em 1865, com Lucas Martins, exposto
na roda de Alpedrinha e dado a criar no Souto da Casa. Ela tinha vinte e um
anos e ele quarenta e quatro.
Deviam
ser boa gente e uma mulher e homem d’ armas, que pegaram na trouxa e vieram
morar para S. Vicente. Viveram uns anos na Rua Nicolau Veloso, ela doméstica e
ele criado, e aí lhes nasceram as duas primeiras filhas:
1 - Mariana (1865) que herdou o nome da madrinha, Mariana Robles
Monteiro (é provável que o pai fosse criado daquela família). Casou com Joaquim António Craveiro e tiveram oito
(?) filhos:
Francisco (1885)
Auta
(?) (1887)
Álvaro (1888)
Patrocínia (1890)
António (1893)
Joaquim (1900)
Maria de Lurdes (1904)
Maria da Conceição
(1905)
2 - Maria (1887) que terá morrido ainda criança.
Maria Castanheira e Lucas Martins mudaram-se para a Rua da Cruz e foi
aí que lhes nasceu o terceiro filho:
3 - António (1872/1951) que casou no Souto da Casa com Josefa dos
Santos.
(Deste ramo da família de Maria
Castanheira descenderão os irmãos Craveiro, pelo que ficam aqui com muito
trabalho para fazer...)
Maria Castanheira enviuvou de Lucas Martins em 1880 e casou com José Carvalho em Maio de 1881. José Carvalho,
natural de Freixedo, Santa Comba Dão, tinha cinquenta anos e era também viúvo.
Tiveram uma filha:
Maria da Conceição Carvalho, mais conhecida por Maria Carvalha (1882/1954). Foi uma
das minhas bisavós e é a pessoa da família de quem tenho memórias mais remotas.
Lembro-me dela na casa da rua Velha e a caminho da Oles, de saias rabudas e
sempre de cesta enfiada no braço. Diz que era para apanhar as bostas com que
estrumava a horta.
Casou
aos dezassete anos com José Fernandes Trindade, de vinte e cinco, solteiro,
cultivador, e tiveram cinco filhos:
Maria
Carvalha (?) com alguns dos filhos e netos
1 - Maria do Rosário Carvalho (1901);
diz que era parecida com a mãe no corpo, mas sobretudo no génio lutador e no
amor pela sua Oles, onde via o dia a nascer e donde regressava já noite escura.
No verão tinha a casa sempre cheia de netos, filhos e noras que todos os anos
vinham passar férias, mas sobretudo ajudar nas hortas e na vindima.
Casou
com José Fernandes Candeias, também
ele um bom homem, trabalhador e amigo da família. Contam que um verão, só de
imaginar que os filhos podiam estar a comer pão seco, passou o tempo todo a
olhar para uma chouriça que a mulher lhe tinha posto na merenda que levou para
o quinto, sem coragem de a comer. Quando voltou trazia-a inteira e comeram-na
todos à ceia, uma talhadinha para cada um.
Maria
do Rosário com o marido, no dia em que festejaram as Bodas de Ouro
Maria do Rosário e José
Candeias tiveram sete filhos:
João
de Deus - Casou em primeiras núpcias
com Deolinda Torres, com quem teve dois filhos: Teresa Candeias e Luís
Candeias. Depois de enviuvar casou com Edite Pinto. Deste casamento não teve
filhos.
Joaquim
Fernandes Candeias - Casou com Ilda
Saraiva, com quem teve três filhas: Luísa Maria Saraiva Fernandes Candeias
(Alves) ; Teresa Maria Saraiva Candeias
(Rodrigues) e Anabela Saraiva Candeias
(de Assunção);
Guilhermino
Candeias - Casou com Maria de Jesus Candeias e tiveram tês filhos: João Manuel dos Santos Candeias, José
Carlos dos Santos Candeias e Ana Paula dos Santos Candeias;
Luís
Candeias - Casou com Maria da Conceição e tiveram duas filhas; Filomena Candeias e Maria José
Candeias;
António
Maria Candeias - Casou com Maria Augusta Vide e tiveram dois filhos: Nuno Filipe Vide Candeias e Maria Margarida Vide Candeias;
Francisco
Candeias - Casou com Lúcia Moura e tiveram dois filhos: Paulo José Moura
Candeias e Carla Alexandra Moura Candeias;
Maria
José Candeias - Casou com José Afonso Reis e tiveram dois filhos. Ana
Cristina Candeias Reis e Bruno Candeias Reis.
2 - Guilhermino Fernandes (1902) Um
lindo homem, com um coração que não lhe cabia no peito. Quem queria, era vê-lo
de charrua na mão ou à frente do carro de bois, sempre dum lado para o outro. Mas
aos domingos, depois da missa, passava as tardes na sociedade com os amigos, e
quando chegava a casa, noite alta e a cantar, tinha que ser algum dos filhos ou
dos netos a descalçar-lhe as botas. A tocar os pratos, na banda, ninguém o
igualava, sobretudo na alegria e gosto que tinha pela música.
Casou
com Maria José dos Santos, uma santa
mulher. Ouvi muitas vezes dizer que no tempo da guerra ajudou a dar de comer a
muita gente; e no verão não era só o homem e os filhos que espreitavam a ver se
já lá vinha ao fundo do caminho com o cesto da merenda à cabeça: havia sempre
uma malga de sopa ou um prato de batatas ou feijões a mais para alguém que andasse
ali por perto com fome. Para além dos muitos filhos que teve, ajudou também a criar
alguns dos mais de trinta netos.
Guilhermino
com o filho Joaquim
Guilhermino e Maria José
tiveram nove filhos:
Joaquim
Fernandes - Casou com Maria Angelina e tiveram cinco filhos: Maria da Luz
Fernandes, Maria José Fernandes, João Fernandes, José Manuel Fernandes e Maria
do Carmo Fernandes;
Maria
da Luz dos Santos - Casou com Luís Moreira e tiveram quatro filhos: Maria
Libânia S. Moreira, António S. Moreira, José Manuel S. Moreira e Maria José da Luz
Moreira;
Albertino
Fernandes - Casou com Maria Ascensão Moreira e tiveram cinco filhos: José
M. Fernandes, Luís M. Fernandes, Guilhermino M. Fernandes, Maria da Nazaré M.
Fernandes Maria de Fátima M. Fernandes
Maria
Esmeralda Fernandes - Casou com Luís pinheiro e tiveram quatro filhos:
Maria Manuela F. Pinheiro, José F. Pinheiro, Maria de Fátima F. Pinheiro e
Cristina F. Pinheiro;
Maria
Libânia Fernandes (morreu ainda jovem);
Maria
Patrocínia Fernandes - Casou com António Tomé; não tiveram filhos;
Maria
José Fernandes - Casou com João Jacinto e tiveram cinco filhos: António F.
Jacinto, José F. Jacinto, Maria de Fátima F. Jacinto, Maia Teresa F. Jacinto e
Manuel F. Jacinto;
Maria
Leonor Fernandes - Casou com João Caio e tiveram seis filhos: João F. Caio,
José F. Caio, Maria de Fátima F. Caio, Luís F. Caio e Cristina F. Caio;
Maria
Adelaide Fernandes - Casou com Jaime Silva e tiveram três filhos: Isabel F.
Silva, Pedro F. Silva e Cláudia F. Silva.
3 - Benevides Fernandes (1904) Um excelente homem, trabalhador e amigo de ajudar quem
precisava. Dado à paródia, tinha sempre uma graça para tudo.
Em
novo, ainda solteiro, trabalhou na agricultura e depois na construção dos
caminhos de ferro. Casou com Maria Sabina Ramalho e abalaram para
Lisboa onde a fama de artista como jardineiro o levou a trabalhar na casa de
muita gente influente da sociedade lisboeta daquele tempo.
Benevides e Sabina tiveram
um filho:
João
Fernandes - Casou com Maria da Conceição Azevedo e tiveram
um filho: João Fernandes.
4 - Maria de Jesus - Mulher
meiga, generosa e sempre de sorriso nos lábio, mas também uma mulher de armas. Contam
que numa noite de invernia lhe bateu à porta um homem a pedir alguma coisa de
comer. Depois de lhe ter aconchegado a barriga e aquecido a roupa ensopada,
reparou-lhe na falta de dedos numa das mãos; viu logo que era o Pistotira, que
por aqueles tempos era o terror das gentes da Vila e arredores. Mandou um dos filhos,
ainda criança, a chamar o pai à taberna do Arbotes, e foi assim que prenderam o
malfeitor. Casou com José Maria Prata,
primo direito, e tiveram seis filhos:
António Miguel Rodrigues - Casou com Maria Manuela Duarte e tiveram um filho-João
Manuel Duarte Rodrigues;
João Maria Rodrigues - Casou com Maria
Leonor Duarte e tiveram dois filhos: Maria Fernanda Duarte Rodrigues e
João Francisco Duarte Rodrigues;
Maria Fernanda Rodrigues - Casou com
Arnaldo Coutinho e tiveram duas filhas: Ana Cristina Rodrigues Coutinho e Carla
Alexandra Rodrigues Coutinho;
José Carvalho Prata – Não casou nem
teve filhos
Maria de Jesus Prata - Casou com
Miguel Hipólito Jerónimo e tiveram duas filhas: Carla Prata Jerónimo e Ana
Margarida Prata Jerónimo;
Miguel
Carvalho Prata – Casou com Maria José
Lourenço Prata e tiveram um filho: Luís Miguel Lourenço Prata.
5 - Maria dos Anjos (1907) -
uma das pessoas mais generosas que conheci. Abalou cedo a servir para Lisboa, e
por lá casou e ficou a viver. Na casa dela, pequenina, a porta estava sempre
aberta e havia sempre lugar para mais uma cama ou um prato à mesa para quem
precisasse. Raros foram os irmãos ou sobrinhos que não lhe tivessem batido à
porta. E contava histórias como ninguém. Foi com ela que aprendi a Formiga
Rabiga e a Cabra Cabrez.
Casou
com Francisco Martins que com ela
partilhava a generosidade e o amor à terra que adotou como sua. Nos últimos
anos de vida já pouco cá vinham, mas, sempre que encontravam portador, mandavam
visitas para toda a gente. Tiveram duas filhas:
Liliana
Martins - Casou com José Rodrigues e
tiveram dois filhos: José Rodrigues e
António Rodrigues;
Maria
José Martins - Casou com António Pinheiro e tiveram dois filhos: Joana
Martins Pinheiro e Gonçalo Marins Pinheiro.
Maria da Conceição Carvalho enviuvou de José Fernandes e casou com Joaquim
Marques, do Louriçal do Campo, em 1914. Tiveram três filhos:
Leonor
de Jesus - Casou com José Ramalho e tiveram um filho: João Ramalho – Teve dois filhos.
Ana
Marques - Casou com José (?) e tiveram um filho:
Vítor Carvalho que não teve filhos.
João
Marques – Lembro-me de o ver a subir a rua Nicolau Veloso, ao fim do dia,
com as ferramentas de resineiro às costas. Lembro-me também que vivia em frente
do Convento, numa casa que era o meu limite no avanço pelo Cimo de Vila. À
janela estava sempre uma das filhas, com olhar estranho, os cabelos que nem
palha, a balançar-se. O medo que aquilo me metia, a mim e às outras cachopitas
da minha idade. Mesmo assim subíamos muitas vezes a rua e púnhamo-nos cá de
baixo a fazer-lhe caretas. Ela ficava ainda mais agitada e arrepelava os
cabelos, e nós fugíamos pela rua abaixo.
Ao
longo da vida lembrei-me muitas
vezes desta e doutras cenas, motivadas pelo medo, pela ignorância e por alguma
crueldade própria da infância. Não lhes serviu de nada, mas muitas vezes dei
comigo a abraçar os meus alunos e a pensar no mal que fiz a esta minha prima,
ao Chalim, à Dita e a outras pessoas da nossa terra que nasceram diferentes,
num tempo em que a deficiência era ainda entendida como qualquer coisa de
demoníaco, da qual tínhamos que nos proteger.
João
Marques casou com Maria do Rosário
e tiveram quatro filhos: Maria do
Rosário Marques, Luís Marques, Isabel Marques e Maria da Luz Marques.
João Marques enviuvou e voltou a casar com Maria da Luz. Tiveram quatro filhos: Maria João Santos, Paula
Marques, Maria dos Anjos Marques e Nuno Marques.
Maria Castanheira enviuvou de José Carvalho e casou com António Prata
em 1884 (Este ramo da família de Maria Castanheira está referido em Prata 2 – Os avós mais novos). Contam
que no dia do casamento, durante a troca de alianças, ela se terá atrapalhado por
não saber em que dedo havia de a enfiar. Depois, para se desculpar, terá dito:
«Também não é todos os dias que uma pessoa se casa…», ela que se tinha casado
três vezes! O mais provável é nenhum dos noivos anteriores lhe ter oferecido
uma aliança e ter usado uma emprestada no dia do casamento, como era vulgar
naquele tempo.
Para
além dos muitos filhos que teve, Maria Castanheira foi parteira e ajudou a
nascer muitas crianças. Foi também ela que acareou e criou alguns dos meninos
expostos na roda da Vila, ao cimo da rua da Cruz, onde morava.
Mulher
de vida cheia e coração grande, terá sido dela que muitos dos filhos e netos
herdaram as qualidades de que tantos de nós, seus descendentes, pudemos
beneficiar.
Nota: Esta pesquisa está em aberto,
aguardando a contribuição de quem possa ajudar a corrigir alguma informação que
não esteja correta, ou a acrescentar dados e documentos a que
complementem.
M.
L. Ferreira