quarta-feira, 23 de junho de 2021

Cidadania

A Libânia enviou-me o texto do discurso de Margarida Duque Vieira, proferido na recente reedição do livro da Póvoa. Deixo-vos uma parte dele, pois relaciona-se indiretamente com a publicação Zero, que aqui fiz.

Ainda a propósito da mesma publicação, o José Miguel Teodoro enviou um comentário que poucos terão lido, pois chegou quando já andávamos pelas autárquicas. Publico-o a seguir ao texto da Póvoa, pois é um excelente desafio para uma reflexão séria sobre o que somos e aspiramos a ser.

Na apresentação da 1.ª edição em Castelo Branco no Cineteatro, a Benedita chamou a atenção para 3 casos que lhe pareciam estar a desvirtuar esse passado.

Só recordo dois: o aparecimento recente de um grande portão metálico branco rasgando um belo muro em pedra e, a inusitada plantação de palmeiras junto à Barragem de Santa Águeda num local em que expressamente a Lei determina que “Nesta zona devem ser favorecidas as ações de beneficiação dos carvalhais existentes e de arborização de novas áreas recorrendo às espécies existentes”.

Qualquer destes temas mantém-se bem atual.

Não há muito tempo, alguém que não recordo quem fosse elogiava o cuidado existente na Póvoa na recuperação das velhas casas. Creio que a Autarquia também tem estimulado isso dificultando a sua destruição.

No entanto, esse esforço das pessoas e da Câmara poderia ainda produzir melhores resultados se houvesse um apoio técnico a juntar aos gostos de cada um que, como se diz, “gostos não se discutem”, mas podem ser melhorados.

Não será certamente a Junta de Freguesia a poder assumir esse papel, mas aproveitando a presença do Sr. Presidente da Câmara atrevo-me a apelar para que essa função seja assumida ativamente pela Câmara com benefício para a Póvoa, o Concelho, a região.

Há na Póvoa ainda bastante para olhar e cuidar desde a pequena casa familiar, ao edifício que se pensa ter sido sede de Câmara, à chamada “casa do Juiz”, o moinho que continua em ruínas ou aquele em que se assinala que “no ano de 1575 vale o pão a cruzado”. Neste Livro regista-se um razoável número de portados na maioria quinhentistas. É preciso manter e dignificar esses vestígios de outros tempos que valorizam a terra, não possibilitando a sua destruição ou abastardamento quando se realizam obras.

Voltando à Barragem

Dizem-me que foi a população a conseguir que o nome da Santa que veneram - a Santa Águeda - cuja capelinha ficou submersa na albufeira, se mantivesse identificando o local e, quiseram também que a construção de uma nova perpetuasse a sua memória e tradição.

O alerta que foi dado naquela sessão e, talvez não só, despoletou a criação de uma Plataforma destinada á defesa da Barragem. Conseguiu esta Plataforma a retirada das ditas palmeiras, o recuo da área que ilegalmente tinha sido ocupada, o embargo de obras ilegais, e até agora, a contenção de novos projetos do mesmo tipo.

Mas o perigo continua, agora agravado pela intenção de construir um regadio denominado “Gardunha Sul” cujo fornecedor será a Barragem de Santa Águeda que irá consumir mais água do que a destinada ao consumo público. Já sabemos as consequências na qualidade da água originadas pelo uso excessivo de pesticidas, com tendência para agravar, obrigando ainda a custos anormais no seu tratamento que recaem sobre o erário público que deveria ser melhor aplicado.

Recentemente, conseguiu que um grupo de membros da Plataforma, na maioria técnicos na matéria, visitasse a Estação de Tratamento da Água. O parecer técnico enviado às instâncias superiores, elaborado pelo Eng. Químico e sanitarista, José Cardoso Moura que foi responsável pela construção de várias ETAR.s em Portugal e no estrangeiro, é demolidor para a iniciativa. Também tem sido pública a contestação ao projeto feita pelo antigo Vereador da Câmara, Eng. Carvalhinho.

Há poucos anos, numa sessão comemorativa da aprovação da Constituição que teve lugar em Castelo Branco, no Cineteatro, O Sr. Presidente da República, O General Ramalho Eanes e o Professor Jorge Miranda foram unânimes na ideia de que a falha na concretização da democracia em Portugal é a fraca participação dos cidadãos.

Muitos ainda fazem como Pilatos, lavam as mãos o que no caso, levou à condenação de um Homem bom.

É altura de se estar atento e ajudar quem decide a sentir-se apoiado pelos cidadãos. É altura de o povo da Póvoa exercer novamente o papel de defesa da sua Barragem de Santa Águeda.  

Margarida Duque Vieira

Tentei há dias fazer um exercício sobre a nossa terra, tipo análise swot. Comecei pelo princípio, pelos pontos fortes: se eu quisesse "vender" SVB como um destino, como um lugar para morar ou para investir, ou apenas para visitar durante um dia, ou uma semana, que "argumentos" eu podia usar?
Recomendo o exercício.
A seguir, se quisermos ir mais longe, podemos fazer o mesmo exercício, procurando identificar os pontos fracos, uma lista que poderá constituir um "caderno de encargos", um guia de ação, uma lista de coisas concretas que é preciso fazer para "colocar no mapa" SVB.
No meu ver, usando uma ferramenta simples, podemos perceber onde estamos - sendo cruel, pode acabar com mitos sem sentido, e, de vez, fazer-nos perceber que é dentro de casa que têm de se encontrar as razões e agentes do que se faz ou não se faz.
Podemos partilhar.

JMT

Deixo-vos com o desafio do José Miguel, a que eu próprio vou responder brevemente. Publicarei aqui as minhas conclusões e aguardo pelas vossas.

José Teodoro Prata

domingo, 20 de junho de 2021

Autárquicas 2021

 


Só faltava o nosso homem do Violeiro para baralhar ainda mais as contas que alguém já tivesse feito.

Depois da recusa do PS em recandidatar Luís Correia, que se apresenta como independente, da candidatura socialista de Leopoldo Rodrigues e da candidatura social-democrata de João Belém, à revelia da concelhia, que já apelou para o órgão nacional de jurisdição, eis que avança Rui Amaro Alves, com uma candidatura independente.

Podem ler aqui a notícia da Reconquista: https://www.reconquista.pt/articles/autarquicas-rui-amaro-alves-e-candidato-independente-em-castelo-branco

José Teodoro Prata

quarta-feira, 9 de junho de 2021

Zero

É quanto valemos no turismo da região em que nos inserimos: zero. 

Encontrei este site da comunidade intermunicipal da Beira Baixa (https://beirabaixatour.pt/home/), que pretende promover esta região, na época estival que se aproxima.

Quanto às rotas pedestres (Trilhos e Percursos), temos a da Gardunha, que desce das proximidades do Castelo Velho para a Torre, pelo Casal da Serra. Mais nada.

Experimentem clicar em O que Visitar!

José Teodoro Prata

quarta-feira, 2 de junho de 2021

Parque do Barrocal

Visitei o Parque do Barrocal, em Castelo Branco. As opiniões têm sido muito positivas, mas eu vim de lá algo apreensivo. As linhas que se seguem são apenas uma reflexão pessoal, sem quaisquer pretensões, nem sequer de estar certo.

Não me admira ter sido premiado a nível internacional, pois está tudo muito bem feito. O meu problema é que o que se fez foi urbanizar um pedaço de natureza às portas da cidade, ainda em estado quase puro. Quase todos os percursos de fazem sobre passadiços em madeira nuns locais e metal noutros.

É verdade que se pode admirar a natureza, sem a pisar, mas também sob os passadiços nada cresce e se crescer é imediatamente cortado. Passeei pelos Alpes Suíços, por carreirinhos que pareciam de cabras e não consta que alguém se venha queixar que ali a natureza não é respeitada.

Neste parque, os citadinos transferiram para a natureza as comodidades de que gozam na cidade: sem lama, sem ramos a rasgar ou ferir, sem escorregadelas. Estacionam num parque automóvel e a ele voltam sem praticamente terem pisado terra ou rocha, sempre ao colo dos milhões que aquilo custou.

Vários pontos de interesse foram acrescentados à paisagem, como a ponte suspensa que nos dispensa de descer e subir uma pequeníssima depressão entre duas rochas ou o túnel do lagarto que não passa de uma estrutura metálica colocada sobre o caminho.

Para mim é um parque urbano muito bem feito e não o quero desvalorizar. O que me preocupa é que projetos como este estão a tomar conta do país, transformando alguns dos sítios mais bonitos de Portugal numa Disneylândia. Em Oleiros chamou-se o Siza Vieira para prolongar com uma pala um lindo miradouro; em Vila de Rei construíram-se alguns metros de passadiços que custaram 600 mil euros; Arouca já reivindica ter a maior ponte suspensa do mundo, mas entretanto os seus passadiços do Paiva já arderam por duas vezes.

Queremos urbanizar a nossa paisagem? Mas não é uma forma de adulterar a paisagem, uma forma de poluição? Sobra dinheiro ao poder local? É o dinheiro dos nossos impostos e os portugueses não estão a viver bem!

Nota: sempre alertei os meus alunos para, se um dia nos reencontrássemos e eu dissesse mal da escola e dos alunos, em comparação com o passado, não ligassem, pois estaria a ficar velho; neste caso estarei a ficar velho ou isto que se está a fazer um pouco por todo o país é mesmo uma saloiice?

José Teodoro Prata

domingo, 30 de maio de 2021

Boletim agrícola

Esta oliveira é bical, variedade que não gosta do frio da serra. Mas este ano carregou de flor. A primavera chuvosa e quente foi favorável às oliveiras, por isso estão carregadas de flor, mesmo as que deram no ano passado,  como é o caso das minhas (não esta, só as galegas).

 Esta ameixeira dá um fruto longo, azul escuro, que amadurece em fins de setembro. Dá-se bem no clima da serra, o que não acontece com muitas.

Este kiwi está carregado de flor, mas infelizmente só a planta macho; a fêmea nem uma para amostra. É uma experiência que estou a fazer e parece que resulta neste clima.

Há bastantes cerejas, este ano. Esta ainda está a recuperar do incêndio de 2017, como é visível na imagem. Como não pulverizo, as que não forem colhidas já, são para os bichos... 

Nota: perdera a máquina fotográfica, mas o cão dos meus vizinhos David e Helena, o Frigo, encontrou-a e levou-a aos donos. Se o virem, acompanhado da Maya, dois cachorros muito simpáticos, façam-lhes umas festas por mim.

José Teodoro Prata

quinta-feira, 27 de maio de 2021

Eleições autárquicas

Deixo-vos com as primeiras notícias sobre as eleições autárquicas no concelho de Castelo Branco e consequentemente na nossa freguesia. Sei pouco, muito menos do que quem está na Vila, por isso esta publicação é sobretudo para quem vive longe.

O anterior presidente da câmara, Luís Correia, do PS, perdeu o mandato por decisão judicial, mas queria voltar a candidatar-se. O partido não o aceitou e por isso desfiliou-se e concorre como independente. Está bem inserido nos meios empresarial e autárquico de Castelo Branco e por isso teve quem o incentivasse a avançar. Em São Vicente já tem uma lista, encabeçada pelo Filipe Goulão (do armazém de rações).

O PS candidata à Câmara o atual presidente da Junta de Castelo Branco, Leopoldo Rodrigues. Em São Vicente já há lista formada; o cabeça de lista é o David Moreira, filho do Manel Ar

No PSD as coisas são ainda mais complicadas. O candidato apresentado pela direção nacional é João Belém, antigo deputado e recentemente reformado de diretor do Agrupamento de Escolas Amato Lusitano. Só que o candidato da concelhia era o seu presidente, Carlos Almeida, que não aceitou a escolha de Rui Rio (a concelhia sempre se opôs a Rui Rio, embora um pequeno grupo de “notáveis” locais o apoiem). No passado, estas divisões já custaram ao PSD a perda da sua única(?) junta de freguesia, Tinalhas, que passou a independente. Temos então em João Belém um general sem exército, no momento mais crítico para o PS. Em São Vicente, penso que ainda não há lista, embora venha a haver certamente, pela tradicional implantação do PSD na freguesia.

(Texto alterado/atualizado a 29 de maio)

José Teodoro Prata

domingo, 23 de maio de 2021

Festas e romarias

 A cultura popular tem muitas manifestações, mas as festas e romarias são talvez das mais antigas e mais importantes: num tempo em que as populações eram ciclicamente atormentadas por pestes, pragas (principalmente de gafanhotos), guerras e secas, a fome, a doença e a morte eram uma ameaça constante na vida das pessoas. O povo, quase sempre pobre e pouco instruído, não tinha outra forma de enfrentar estas ameaças, muitas vezes sentidas como castigo divino pelos pecados do mundo, senão através da oração, do cumprimento de promessas ou de esmola aos mais pobres ou à Igreja. Foi desta forma que, por todo o país surgiram igrejas e capelas onde as populações se juntavam em preces pelo auxílio divino, da Virgem ou dos santos da sua devoção.

Mas não eram apenas locais de oração, estes santuários. Ao longo dos séculos foram-se tornando também lugares de festa, diversão e convívio social, tão aguardado pelas populações durante o ano inteiro de trabalho no campo. A Beira Baixa é um bom exemplo desta prática, testemunhada pela abundância de ermidas espalhadas por todo o território, quase todas com uma lenda associada.

Segundo Jaime Lopes Graça, só no distrito de Castelo Branco existem perto de oitenta destes pequenos templos, quase sempre capelas com alpendre, dedicados às mais variadas devoções. São muitos os santos e Senhoras venerados, mas há alguns que têm maior representação entre nós: São Sebastião, Santa Bárbara, Santo António, Santa Cruz, Senhora dos Remédios, Senhora das Preces, e vários outros.    

Muitas destas capelas situam-se dentro ou às portas das povoações, mas algumas foram construídas em locais mais distantes, quase sempre de grande beleza natural ou com vistas desafogadas. É o caso da Senhora de Mércules, em Castelo Branco, da Senhora do Almortão, em Idanha-a-Nova ou da Santa Luzia, no Castelejo. Serão também estes os santuários que mais peregrinos concentram nos dias das suas festas; a maior parte das povoações à roda, mas muitos vindos de longe.

Na nossa freguesia, à semelhança de tantas outras da Beira Baixa, dizimada ciclicamente por toda a espécie de calamidades, é antigo o culto a vários santos e à Nossa Senhora:

 

O São Sebastião

Tem capela numa das entradas da Vila, no largo com o seu nome. A festa, realizada no fim-de-semana mais próximo do dia 20 de janeiro; é simples, mas cheia de valor simbólico para toda a população: no sábado à noite, depois duma oração, a imagem do santo é levada para a Igreja Matriz onde permanece até ao dia seguinte. Na manhã de domingo regressa em procissão, acompanhado pelo São Vicente, para a sua capela onde é rezada a missa.

A São Sebastião pede-se proteção contra a fome e as doenças, e é o único santo a quem continuamos a celebrar o bodo. Esta prática antiga consiste, entre nós, na bênção de papo-secos que são distribuídos pela população (antigamente seria apenas aos mais pobres). Acredita-se que se forem guardados até ao ano seguinte, não faltará pão em casa ao longo todo o ano. Depois da missa, são também oferecidas filhós e tremoços a todos os presentes, e vendidas fitas coloridas que era hábito colocar à volta do pescoço das crianças para as proteger das doenças. Não serviriam de muito porque continuavam a morrer às dezenas todos os anos, mas também não era por isso que a fé no santo diminuía…  

Na Partida o São Sebastião também tem uma capela, e continuam a fazer-lhe a festa no dia 20 de janeiro. 

 

 

A Santa Bárbara

Já foi do Sobral, mas agora tem capela no Casal da Fraga, onde lhe fazemos a festa no terceiro fim-de-semana a seguir à Páscoa. Nem sempre foi assim, mas desde há alguns anos que a imagem da santa é levada na véspera à tarde para a Igreja Matriz onde fica até à noite. Regressa depois à sua capela numa, procissão à luz das velas e na cadência do toque da Banda. Já na capela, é feita uma oração com muitos fiéis a assistir no exterior, por não caberem lá dentro. No domingo, depois da missa, faz-se também a procissão acompanhada pela Banda.

A esta mártir pede-se proteção contra as trovoadas:

 

Santa Bárbara, Bendita

Que no céu está escrita

Com raminhos de água benta,

Livrai-nos desta tormenta.

Espalhai-a lá para bem longe

Onde não haja eira nem beira,

Nem raminho de oliveira,

Nem raminho de figueira,

Nem mulheres com meninos,

Nem ovelhas com borreguinhos,

Nem pedrinhas de sal,

Nem nada a que faça mal.

Amém!

 

Desde há alguns anos que esta festa alia também a vertente de diversão e convívio às manifestações religiosas. O concerto da Banda e a atuação do Rancho são os momentos mais esperados pelos mais velhos. Para os mais novos não falta a música para dançar até às tantas.

 

O Santo António 

Com capela na entrada da Vila, oposta à de São Sebastião, tem a festa em Agosto. Para além da missa e da procissão pelas ruas da Vila, também acompanhada pela Banda, fazia-se o leilão das ofertas doadas pelos fiéis. Protetor dos animais domésticos, principalmente dos porcos, faziam-se-lhe promessas de chouriças, morcelas e farinheiras se os livrasse das malinas que os atacavam com alguma frequência. Se morriam, faltava o conduto do ano inteiro…

Por alturas do carnaval organizava-se o ramo: um homem (o Ti Calmão, no nosso tempo) percorria as ruas da Vila com um pau muito comprido que tinha cravado outros mais pequenos a toda a roda. As pessoas que tinham feito promessas vinham à porta, ou mesmo da janela dependuravam as peças de enchido que tinham prometido. O ramo era depois leiloado e o produto da venda revertia a favor do Santo.

Para além de proteção para os animais, também lhe eram feitas preces para proteção do olival:

 

Santo Antoninho pequenino

Que anda plos olivais

A guardar as suas azeitoninhas,

Que lhas comem os pardais.

Cruz em monte, cruz em fonte

Que nunca o diabo encontre,

Nem de noite nem de dia

Nem às horas do meio-dia.

Já os galos cantam,

Já os anjos se alevantam

Já Jesus subiu à cruz

Para nos guardar pra sempre.

Assim seja, Ámen Jesus.

 

O povo da Partida, do Casal da Serra e do Mourelo também tem muita devoção neste santo. Faziam-lhe grandes festas durante o mês de Agosto, mas, à semelhança do que se passa na Vila, também por lá as celebrações têm vindo a perder o fervor e brilho de outros tempos.  

 

O Santiago

Diz a lenda que depois de muito penar nas Lameiras, ao fundo da Partida, o Santo lá conseguiu que lhe fizessem a capelinha no cimo do Cabeço. É modesta, mas de lá abarca tudo à roda e pode ver os irmãos, com os quais andaria desavindo. A festa fazem-lha os moradores da Partida, do Violeiro, do Mourelo e Vale de Figueiras no primeiro de maio (na Partida fazem-lhe outra em Agosto). E que festa! Nenhum dos povos, nomeado rotativamente, quer ficar atrás do outro.

Com que vivacidade recorda a Ti São Pedro: «Quando era pelo Santiago era uma alegria. Mesmo quem andava por lá, nunca faltava. Era uma festa muito linda. Cada terra trazia o seu ranchinho com um homem a tocar concertina, e as mulheres atrás, a cantar. Ia tudo a pé por esse caminho afora. Quando lá chegávamos dávamos a volta à capela, sempre a cantar, a ver quem ganhava. Os do Vale da Figueira ganhavam quase sempre porque vinham os do Açor e ajudavam-nos no rancho. Depois da missa vínhamos para casa e comia-se a carne e os doces que já tinham sido preparados de véspera ou de manhã cedo. As famílias todas juntas, nem cabiam dentro de casa e vinha-se para a rua a comer. Era muito lindo!»

Com algumas diferenças, sinais dos tempos, a festa continua com o mesmo entusiasmo. Depois da missa e da procissão os homens dão várias voltas ao recinto a tocar bombos, pífaros, concertinas e castanholas; as mulheres, atrás, vão cantando e dançando. Um homem eleva a bandeira da terra que organiza a festa (neste ano vê-se a do Mourelo). Sempre que passam em frente da capela ajoelham todos, em recolhimento. A seguir, no adro, continuam a tocar, ao despique, e as mulheres dançam à roda. Uma alegria que contagia todos os que participam ou assistem.

Algumas famílias levam merenda, outras continuam a comê-la em casa, quase sempre com amigos que vêm de longe ou de outras terras ali à roda. Mais recentemente, já há que comer e beber com fartura no recinto da festa e muita gente mantém-se junto à capela até mais tarde. Aproveitam para cumprir uma tradição que diz que quem puser o chapéu do santo passa o ano inteiro livre de dores de cabeça:

 

Santiago, lá no alto,

É um anjinho do céu,

Tira as dores de cabeça

A quem põe o seu chapéu.

 

A Senhora da Orada

Por dentro há muito que a capela está a pedir obras, mas por fora é uma beleza. É também a que está no lugar mais bonito das redondezas. Será por isso que é visitado por muita gente ao longo de todo o ano; alguns para rezar e pagar promessas, mas muitos apenas para usufruírem da paz e beleza da paisagem e da frescura da água da fonte, com fama de milagrosa.

A festa é no quarto domingo de maio, mas houve tempos em que ainda o dia lá vinha longe e já no ar andavam as cantigas:

 

Nossa Senhora da Orada,

Este ano lá hei de ir,

Não vos hei de levar nada

Inda vos hei de pedir.

 

Nas vésperas era uma azáfama a fazer a merenda: tudo do melhor que havia em casa, a contar com a família toda. No domingo de manhã, um mar de gente, caminho acima; os cestos da merenda à cabeça das mulheres ou às costas dos homens. Os filhos mais pequenos, pela mão ou ainda ao colo.

Na missa campal, o sermão a contar a vida da menina escorraçada pelo pai ou a lembrar os que estavam longe, punha as mulheres em lágrimas. Depois era a procissão, toda a gente com velas que mal se conseguiam abarcar, para agradecer os favores recebidos ao longo do ano; quase sempre para pedir outros ficados por conceder.

O andor da Senhora, aos ombros dos rapazes mobilizados para a guerra.  

A seguir a merenda: uma fartura de tudo o que era bom estendida no chão, em cima duma toalha; a família toda à roda. Finalmente uma visita pelas tendas espalhadas ao longo do caminho ou um pezinho de dança ao toque de realejo ou concertina.

À tardinha regressava toda a gente a casa, já com saudades, mas ainda a cantar:

 

Nossa Senhora da Orada,

As costas vos vou virando,

Minha boca se vai rindo,

Os meus olhos vão chorando.

 

Algumas destas festas e romarias mantêm a mesma capacidade de chamar gente, quer seja levada pela fé ou apenas pela tradição, mas uma grande parte tem vindo a perder a importância de outros tempos. As razões são muitas, mas a principal será a perda de população em muitas terras, que começou com a emigração de muitos homens, principalmente para França. As mulheres que ficavam sozinhas com os filhos não tinham alegria para romarias; muitas acabaram por partir também e as terras foram-se esvaziando de gente. Por outro lado, a evolução da ciência e a melhoria da condição económica e social contribuiu para eliminar muitas doenças e a situação de pobreza que atravessava as gerações desde sempre. Deixou, por isso, de haver necessidade de recorrer tantas vezes à ajuda dos santos protetores.

Mas a fé no poder divino e dos santos continua. Ainda há dias o Papa Francisco pedia a união dos povos numa oração pelo fim desta pandemia. Conhecendo nós um pouco do seu pensamento e do teor das suas mensagens, não me parece que se referisse apenas a que batêssemos no peito e disséssemos muitos Pai-nossos e Ave-Marias…

M.L. Ferreira