domingo, 8 de maio de 2016

As casas

As casas, os castelos, os palácios têm alma, guardam histórias, alegrias, tristezas, emoções de quem as habita ou habitou, são sacras as casas.
Verdadeiros alfobres, sejam ricas ou pobres, são beléns, ninhos de amor; carnal, filial, locais de união familiar, recordações que nos trazem à memória a nossa meninice, nossos pais e avós.
Todas as casas são lugares sagrados, refúgio para os seus.
Quando terminam o ciclo de darem guarida aos legítimos proprietários, outros as deviam utilizar:- associações de carácter lúdico ou social.
Preferível será “vende-las ou cede-las” a quem delas cuide e mantenha que deixá-las apodrecer, cair. Porque não as autarquias criarem mecanismos que incentivem à recuperação das casas degradadas através de regulamentação, apoiando no material: “areias, cimentos, tintas”…
As casas têm alma, fazem parte da paisagem urbana ou rural onde se situam, representam uma determinada época mais ou menos longa, se as pedras falassem, quantas confidências, quantas histórias, aventuras, não contariam as casas.
Cada vez que deixamos cair uma, o lugar fica amputado, pode nascer outra mais moderna, funcional, mas a história da anterior caiu com ela. É um ciclo novo que nasce, a alma daquelas pedras sagradas no momento da demolição desapareceu.
Há por aí tanta gente a necessitar de uma habitação condigna, vivem nas ruas, em casebres, sem qualquer conforto, sujeitos às intempéries.
Antes de caírem, reconstruam-se, mantendo a fachada original, depois; aluguem-se por um preço justo. É preferível, que abandoná-las como quem abandona um animal.
As casas têm alma, ao olharmos para elas imediatamente nos vem à memória pessoas da nossa geração que nelas habitaram, nossos pais e avós contavam-nos também nomes de vizinhos que nunca vimos mas ficámos a saber que para além dos Antónios, Josés, Marias… nossos e nossas contemporâneas outras e outros as habitaram.
Nesta existiu um sapateiro; naquela, um latoeiro; mais acima um barbeiro; naquele portão vendia-se vinho a copo, era uma taberna; um pouco mais abaixo nos baixios de um solar havia grandes tonéis onde os taberneiros se abasteciam, era uma adega; na mesma rua, comerciantes mercadejavam toda a espécie de mercadoria…
As casas têm alma enquanto estão de pé, quando caem; adeus.
Não são gente, mas deram e continuam a dar guarida às pessoas, a ser a pátria de cada um de nós; por isso e por cada casa que desaparece do mapa digo:
- Réquiem.

J.M.S.

Fotos de José Teodoro Prata

quinta-feira, 5 de maio de 2016

Antes do amanhecer

A condição da mulher no Estado Novo
                                                                 
         A Revolução do 25 de Abril foi o acontecimento mais importante da História contemporânea do nosso país, pelas mudanças que proporcionou em quase todos os setores da sociedade, permitindo uma evolução extraordinária nas vidas de todos nós. Mas, se as alterações foram enormes para a maioria dos portugueses, foram ainda mais significativas para as mulheres, descriminadas, quase sempre, pela lei, pelos costumes e preconceitos de toda a ordem.
         A Constituição da República Portuguesa de 1933, embora em vários aspetos mostrasse algum retrocesso relativamente à de 1910 e ignorasse as mudanças que aconteciam já em muitos países, continuava a pretender consagrar a igualdade de todos os cidadãos perante a lei. No artigo 5º escrevia-se: «A igualdade perante a lei envolve … a negação de qualquer privilégio de nascimento, nobreza, título nobiliárquico, sexo, ou condição social, salvas, quanto à mulher, as diferenças resultantes da sua natureza e do bem da família…». Esta redação era contraditória com o conceito de igualdade que queria fazer crer e, na prática, significava que, aliados aos efeitos da ditadura que negava muitos direitos a todos os cidadãos, as mulheres sofriam ainda as descriminações decorrentes da sua condição feminina, ficando reduzidas, quase exclusivamente, ao papel de donas de casa, mães e companheiras, e vendo diminuídos muitos dos seus direitos de cidadania, de liberdade, de independência e até o direito à sexualidade.
         Além de não poderem votar (esse direito era exclusivo dos homens maiores de 21 anos que soubessem ler e escrever, dos chefes de família e de algumas mulheres em condições muito bem definidas – menos de 2% do total da população), às mulheres era ainda dificultado, ou mesmo vedado, o exercício de cargos políticos, na magistratura ou na diplomacia.
         É exemplar o caso de Carolina Beatriz Ângelo que, em 1911, aproveitando-se de uma lacuna na legislação que se referia aos chefes de família, mas não especificava o sexo, invocou a sua situação de viúva, e por isso chefe de família, para exigir o direito ao voto. Foi a primeira mulher a votar em Portugal. A partir de então esse direito sofreu alguns avanços e recuos, mas foi autorizado quase sempre em situações muito específicas, dependendo do nível de escolaridade ou estatuto social e económico. Só depois do 25 de Abril, votar se tornou um direito igual para todos os homens e mulheres maiores de idade. Em termos profissionais, salvo raras exceçõe, eram poucas as mulheres que, fora dos trabalhos agrícolas, domésticos ou fabris, tinham uma atividade profissional remunerada. As que eram casadas tinham de ter autorização dos maridos para exercerem determinadas profissões e, a qualquer momento, podiam ver cessar o contrato de trabalho a mando deles. Acrescia ainda o facto de o salário que lhes era pago ser significativamente mais baixo que o dos homens, mesmo que o trabalho fosse igual. Para além de injusto, isto deixava-as numa situação de grande fragilidade e dependência relativamente aos maridos, com as inevitáveis consequências daí decorrentes.
         O papel da mulher no seio da família era muito importante, mas, como diz o ditado «Cá em casa manda ela e nela mando eu», também de submissão ao marido. O homem era o chefe e a ele estavam cometidos muitos dos direitos sociais e políticos da família; competia-lhe também o seu sustento. À mulher estava reservado o governo da casa e a educação dos filhos.
         Não era permitido às mulheres ter conta bancária nem ausentar-se do país sem o consentimento do marido, mesmo que tivessem possibilidades financeiras para o fazer. Não seria o caso de muitas, mas essa situação mantinha-se mesmo que o casal estivesse separado de pessoas e bens.  
         As enfermeiras e hospedeiras de bordo não podiam casar-se e as professoras tinham que pedir autorização superior para o fazer. No caso de o homem não ser considerado pessoa de bem ou não tivesse um ordenado igual ou mais elevado que o da mulher, a autorização era negada.
     O divórcio não era permitido e os filhos nascidos fora do casamento eram considerados ilegítimos, mesmo que assumidos pelo pai biológico. Esta situação era altamente penalizadora para as mulheres, mas também para as crianças que viam reduzidos muitos dos seus direitos, para além da descriminação social a que estavam sujeitas.
A moral sexual vigente até quase ao final do Estado Novo era dominada pela visão altamente castradora da Igreja Católica que defendia a sexualidade apenas dentro do casamento. Desse modo, a finalidade das relações sexuais era a procriação, sendo pouco valorizadas as questões da afetividade e, sobretudo, do prazer.
         Mas a rigidez desta visão, baseada em crenças morais e religiosas muito redutoras, aplicava-se sobretudo às mulheres, já que aos homens eram toleradas as relações antes do casamento e extraconjugais. Em alguns meios esta prática estava de tal modo enraizada e era tão bem aceite que fazia parte do estatuto social de certos homens. No caso das mulheres, se não fossem virgens na altura do casamento, era motivo para a anulação do matrimónio. O homicídio, em caso de adultério, era tolerado socialmente e a pena aplicada pelos tribunais tinha muitas atenuantes; a maior parte das vezes não ia para além do afastamento temporário da residência habitual, continuando a usufruir das regalias de que beneficiava anteriormente.
         O aparecimento e progressiva despenalização legal e social dos métodos contracetivos, assim como as consultas de planeamento familiar e saúde materno infantil contribuíram significativamente para ajudar a vencer os medos, a vergonha e muitas ideias preconceituosas relativamente ao sexo. Permitiram também, a homens e mulheres, viverem a sua sexualidade de forma mais equilibrada, igualitária, e gratificante.
         Passados mais de quarenta anos após o 25 de Abril, refletir sobre estas questões, mesmo que de forma breve, pode fazer lembrar feminismos já ultrapassados, mas a realidade mostra que não é bem assim. Apesar das alterações legislativas e das mudanças em termos dos costumes e mentalidades, as mulheres continuam a ser o elo mais fraco duma sociedade de características ainda marcadamente masculinas: recebem salários mais baixos em muitas profissões; são quase sempre as mais atingidas pelo desemprego; continuam a ser descriminadas pela maternidade; sofrem ainda de chantagem e assédio nos locais de trabalho; têm mais dificuldade em aceder a lugares de chefia, quer nas empresas quer na política (a lei da paridade estabelece que 33% da composição das listas para a Assembleia da República, Autarquias e Parlamento Europeu têm que ser mulheres, mas na prática não serve de muito porque, para além do número ser altamente discriminatório, as mulheres são muitas vezes colocadas em lugares dificilmente elegíveis).
         Os números da violência doméstica e dos homicídios praticados no seio da família dizem-nos que a lógica que regulou a vida das nossas avós e das nossas mães não está tão distante como possamos imaginar. Por isso vale a pena ter memória e a consciência de que os direitos adquiridos, neste e noutros setores, não são conquistas sem retorno.
Ceifeira, de Almada Negreiros, atualmente no CCC de Castelo Branco.

M. L. Ferreira 

terça-feira, 3 de maio de 2016

Esperança

DE ABRIL A MAIO

De abril, arrojado,
Nasceu maio,
Entre a noite e a madrugada,
Cresceu o trabalho, em liberdade,
Num povo até aí escravizado.
Manhã há muito desejada,
Promessa de confiança,
Futuro de dignidade,
Em fúlgida primavera,
Horizonte de esperança.

Tu foste, na minha jovem idade,
Ainda sem nódoa, sincera,  
Num país em sossego, silenciado,   
Quase meu sonho de criança.

Foste só parte, foste ensejo,
Não pudeste ser o todo,
Eu sei,
Pois, mesmo uma boa ideia,
Com uma enorme fé e um colossal desejo,
- Oh! Gente nossa! Oh! Ingenuidade! -
Como eu sempre imaginei,
Não pode ser totalidade.

E ainda que a revolta,
Se diga justa e traga desagravos,
É sempre, em parte, desilusão,
Mesmo se em vez de balas, disparar cravos,
Diretos ao meu coração.
Porque, perfeita, só a utopia, intocável e distante,
Que somente resiste por um motivo,
E apenas por um instante.

Pois, agora, firmemente ligados,
Porque o projeto é indivisível,
O anseio é uno, num momento,
Mas logo, num ápice, afastados,
Cada um por si,
P’lo seu pensamento,
Certeiro, hábil, expedito!
É essa ilusão que, no fim, nos dói,
Em todas estas revoluções!
E o que ontem era herói,
Amanhã será proscrito!


João Gabriel Saraiva

segunda-feira, 2 de maio de 2016

Alunos em visita de estudo

Visita de estudo à rádio Castelo Branco e ao jornal Reconquista





No dia 20 de abril de 2016, fomos a Castelo Branco visitar a rádio Castelo Branco e o jornal Reconquista.
Quando chegámos a Castelo Branco, lanchámos. De seguida, o nosso grupo formado pelo 1.º e 2.º anos foi visitar a rádio. Uma menina muito simpática mostrou-nos a sala de redação, a discoteca e o estúdio, onde se fazem as emissões em direto e onde estava o locutor que se chamava Ricardo. As paredes do estúdio e da discoteca eram de esponja para o som não se ouvir cá fora.
O Ricardo também era muito simpático, falava ao microfone e punha músicas. Quando entrámos entrevistou-nos, o Vasco e a Sofia falaram em direto e no final, cantamos uma canção.
Enquanto o grupo do 3.º e 4.º anos visitava a rádio, fomos conhecer o mercado e o parque infantil.
A seguir, fomos de autocarro até ao Parque da cidade, onde almoçámos e brincámos.
Depois do almoço, às 2 horas da tarde, fomos visitar o jornal Reconquista. O jornalista José Furtado mostrou-nos máquinas antigas, explicou-nos como se escrevem as notícias (em colunas), como se compõem as notícias e as fotografias no computador. De seguida são impressas numa chapa de metal, que é colocada na rotativa. Nessa máquina é colocado um rolo de papel reciclado de 500 quilos, que vai passando pelas chapas e o jornal vai sendo impresso. Depois são cortados e colocados em pilhas. Outra máquina dobra-os e embala-os em plásticos.
Por fim, são organizados por destinos, colocadas etiquetas com o nome e a morada dos assinantes e enviados pelo correio para todas as partes do mundo. Outros são vendidos em quiosques ou papelarias.
Gostámos muito desta visita de estudo e aprendemos como funciona a rádio e como se fazem os jornais.

EBI de São Vicente da Beira, Turma A - 1.º e 2.º anos (Texto coletivo)

sábado, 30 de abril de 2016

Dia da Mãe

A Mãe, por Miguel Torga
Introdução
Para celebrar todas as Mães, lembrei-me deste poema do Miguel Torga, um dos grandes poetas deste país. Foi também contista, romancista, dramaturgo e ensaísta. É outro daqueles escritores com quem mais me identifico, já que era um homem ligado à terra, o que diz (ou devia dizer) muito a quantos nascem no interior de Portugal, mais perto da montanha, das plantas e dos ribeiros! O escritor era médico em Coimbra, onde estudou e onde ainda tive o privilégio de o conhecer em vida.
Sempre fez questão de celebrar a sua origem rústica de transmontano. Prova disso é que tendo, pelo batismo, o nome de Adolfo Rocha, veio a adotar, enquanto homem de letras, o nome de Miguel Torga. E, como se sabe, torga, é a raiz da urze com que se fazia o carvão. O que diz bem da intenção de não ser apenas português por ter nascido em Portugal, como ter no solo pátrio mergulhadas as suas raízes. E fê-lo, de maneira emblemática, através de uma planta (dita) pouco nobre. O que também revela a sua humildade e vontade de continuar, simbolicamente, unido às montanhas da sua aldeia, onde ia de tempos a tempos, matar saudades e até caçar.     
Homem, portanto, de grande apego à ruralidade que se deixava entrever, diz quem com ele privou, nos seus modos e até – Oh! Natureza! – na sua figura telúrica de camponês, somos depois confrontados por uma alma, uma sensibilidade e uma inteligência que surpreende, atestadas pela sua poesia e escritos em geral.
Fiquem, então, com este extraordinário poema à Mãe, no momento em que ela lhe faltou para sempre.
José Barroso
Mãe
Mãe:
Que desgraça na vida aconteceu, 
Que ficaste insensível e gelada? 
Que todo o teu perfil se endureceu 
Numa linha severa e desenhada? 


Como as estátuas, que são gente nossa 
Cansada de palavras e ternura, 
Assim tu me pareces no teu leito. 
Presença cinzelada em pedra dura, 
Que não tem coração dentro do peito.



Chamo aos gritos por ti — não me respondes. 
Beijo-te as mãos e o rosto — sinto frio. 
Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes 
Por detrás do terror deste vazio. 



Mãe: 
Abre os olhos ao menos, diz que sim! 
Diz que me vês ainda, que me queres. 
Que és a eterna mulher entre as mulheres. 
Que nem a morte te afastou de mim! 

Miguel Torga, in 'Diário IV'

quinta-feira, 28 de abril de 2016

Demografia (e não só)

Queixava-se há tempos o Zé Barroso de, no blogue, não haver ninguém a dar notícias cá da terra. Referia-se nomeadamente à morte de conterrâneos, da qual tem muitas vezes conhecimento apenas através da Reconquista. Tem ele toda a razão; mas quem é que se acha com coragem de falar da morte de alguém e, por consequência, da morte anunciada da nossa terra?
            Pelo censo de 2011 havia na Freguesia 1259 habitantes. De lá para cá os nascimentos são cada vez menos: um ou dois por ano. Os óbitos até cortam o coração: no ano passado foram trinta e oito e este ano também já foram bastantes (só na semana passada foram três no mesmo dia). As contas não são assim tão simples, mas é bom de ver que, se a situação não se inverter, dentro de pouco mais de três década, pouco restará da freguesia. 
            Hoje estamos todos tristes, porque os sinos dobraram pelo senhor José Matias. Teria muitos defeitos como todos nós, mas em criança ouvia-lhe chamar pai, e à mulher, Maria do Céu, mãe dos pobres. Acho que na altura não percebia muito bem a razão de ser desta qualificação, mas na última conversa que tive com ele, há cerca de um mês, compreendi finalmente.
            Entre várias coisas que contou do seu percurso de vida, nem sempre fácil, falou-me duma promessa que tinha feito caso conseguisse vencer as dificuldades em que se encontrava em determinado momento, e que passava por dar aos pobres um determinado montante em sacas de farinha. Passados anos, quando sentiu que estava em condições de cumprir a promessa, aconselhou-se com o confessor que o terá convencido a mudar o alvo da sua generosidade. Um pouco contrafeito aceitou a proposta, mas quando chegou a casa desabafou com a mulher que também não gostou nada do novo acordo. Para tentar remediar a situação, a Senhora Maria do Céu prometeu que dali para a frente havia de confortar a família de todas as pessoas que morressem com uma panela de canja quentinha na noite do velório. Cumpriu enquanto pôde, e quando adoeceu foi o marido e os filhos que continuaram a cumprir a promessa até ao fim da vida dela.
            Há casais assim, que foram feitos mesmo um para o outro, e, se o Céu existe, já estão de novo juntos. Nós é que hoje nos sentimos todos um pouco mais pobres…


M. L. Ferreira 

terça-feira, 26 de abril de 2016

Os Gama

Recebi duas mensagens, via e-mail, de Leonor Gama, uma estudiosa da família Gama nesta nossa região. A sua mensagem veio na sequência da minha publicação, neste blogue, sobre a guerrilha da Enxabarda (Invasões Francesas 7).
Porque sei que há pessoas interessadas no assunto, nomeadamente na Partida (sem falar no nosso Pedro Inácio Gama), pedi autorização e aqui deixo as informações que trocámos. A minha parte está em itálico.
Relembro que a mãe de Hipólito Raposo, Maria Adelaide Gama, era natural de Janeiro de Cima.

Sou descendente dos Gama de Maxial da Ladeira e tenho estado a pesquisar sobre a família, tendo-me deparado com a história das invasões francesas. Depois de pesquisar, cheguei à conclusão que existem contradições na tradição oral que gostaria de lhe expor e confrontar com os dados que tem.

Refere que a tradição oral indica Manuel Joaquim Gama como o estratega do ataque aos franceses. Manuel Joaquim Gama nasceu em 1801 teria 10 anos em 1811, não podendo ser o estratega que a tradição oral refere. E, de facto, ele viveu em Bogas de Baixo, ao contrário dos restantes Gama, mas a sua mulher, Rosália dos Santos, era de Bogas de Baixo e a sua casa seria, provavelmente, de seus pais, a qual herdou, beneficiando Manuel Joaquim Gama, enquanto seu marido. Manuel Joaquim Gama foi o primeiro da família com esse nome, tendo havido outro, seu filho, nascido em 1835.

Mas a tradição oral refere sempre, segundo tenho lido, o nome Manuel e o apelido Gama. Essa é a única constante em todos os relatos.

Todos os Gama do Maxial descendem de Maria Martins da Gama, natural de Rochas de Cima, dos "da Gama" de Almaceda, que casou com Manoel Gonçalves Branco que adotou o apelido Gama, de sua mulher. O casal teve cinco filhos, Maria Teresa, Domingos, Ana, João e Manuel, todos nascidos entre 1752 e 1773 (aproximadamente).

Assim sendo, a tradição confrontada com os factos parece remeter-nos para Manuel Martins Gama, nascido cerca de 1773 e que teria sensivelmente 38 anos de idade na altura da batalha.  

Por alguma razão, a informação vai sendo deturpada e um Manuel Joaquim Gama, excessivamente jovem na época, passa a ser apontado no séc. XX como o "estratega".

Dizem na tradição oral que esse Manuel Gama teria tido um filho que casou em Janeiro de Cima, o que nunca aconteceu, pois todos os Gama com o nome João se casaram em Bogas de Baixo, embora um deles se tenha casado com uma mulher natural de Janeiro de Cima, precisamente o irmão de Manuel Gama. O pai de ambos, Manuel Martins Branco, nascido em 1732, seria demasiado velho para ser o "estratega", para além de que o apelido Gama que usava não era seu, como já referi, era de sua mulher.

Tenho andado a fazer o levantamento dos registos paroquiais da freguesia de São Vicente da Beira, cerca de 1800, e têm-me aparecido muitos Gamas da freguesia de Almaceda a casar na freguesia de São Vicente. Por eles já concluíra que a informação do professor Carlos Gama e que publiquei neste blogue de que todos os Gamas da região descendiam do Gama que comandara a guerrilha, casado após as Invasões, estava errada, pois encontrei Gamas de Almaceda anteriores à invasão.

Ainda estou em fase de pesquisa e à medida que for obtendo informações posso enviar-lhe, se desejar. De facto, os Gama do Maxial parecem descender todos de Maria Martins da Gama, nascida em Rochas de cima em 1733 e casada com Manoel Gonçalves Branco, natural do Maxial, nascido em 1732; este último acabaria por ser conhecido por Manoel Gama. Seriam eles os pais do Manoel Gama, que penso ter sido o estratega do Maxial.

Há uma tradição que fala em dois irmãos e de que um teria roubado as moedas de ouro ao outro. Não encontrei nenhuma evidência, tão pouco, de terem existido moedas de ouro, nem de diferenças económicas entre os Gama do Maxial. Creio que a estória foi crescendo com o tempo. Eram todos proprietários, lavradores, o que indica que seriam donos das casas onde viviam e dos campos que exploravam, sem grandes riquezas.

Para completar o quadro, há também os Gama de Janeiro de Cima, que descendem de um sobrinho de Maria, Domingos Martins Gama, que casou em Janeiro de Cima.

Todos os Gama da zona têm o mesmo tronco, que começa em Almaceda.

A ascendência de Almaceda também me intriga, porque creio ser resultante do mesmo tipo de situação da do Maxial, ou seja, um natural de Almaceda casou com uma Gama que veio de fora e criam geração. Há uma Catherina da Gama, nascida cerca de 1623, que penso estar na origem de toda a descendência Gama daquela zona. Casou com António Freire. Penso que os Gama virão ainda de outro local. Se souber da existência de "Gamas"  em regiões próximas, agradeço a sua ajuda. Parece que na zona de Amieira do Tejo, Gavião e Vale da Gama (este nome também me intriga...) há alguns. Será que existem outros mais próximo?

José Teodoro Prata