terça-feira, 25 de setembro de 2012

5.º CENTENÁRIO DO FORAL MANUELINO DE S. VICENTE DA BEIRA

(Inicio hoje a divulgação dos 4 artigos que publiquei no jornal Reconquista de Castelo Branco, uma vez que a maioria dos leitores Dos Enxidros vivem fora desta região e não tiveram acesso a eles. Algum do seu conteúdo já aqui foi referido, mas outras informações e conclusões são completamente originais)

As gentes do concelho à época do foral

No próximo mês de novembro, completam-se quinhentos anos da publicação do foral manuelino do antigo concelho de São Vicente da Beira.

O extinto concelho nascera em 1195, por concessão da família real, do Convento de São Jorge de Coimbra e da Albergaria de Poiares. Este território e as gentes que nele viviam ganharam então autonomia face à Covilhã que os havia administrado nos primeiros anos da nacionalidade. Os seus limites ficaram definidos pelos cumes da serra da Gardunha e pelos cursos das ribeiras da Ocreza e de Almaceda/Tripeiro.

O “Numeramento de 1496”, uma contagem da população realizada poucos anos antes da publicação do foral manuelino, permite-nos conhecer com algum rigor a população do concelho, nesta época.

O concelho tinha, então, 337 vizinhos (agregados familiares), o que corresponde a uma população de pouco mais de 1000 pessoas, dispersas por aldeias e casais. As principais povoações eram então, além da sede de concelho, a Póvoa de Rio de Moinhos que, desde o século XIII, formava um concelho à parte, em certos domínios, e que, no plano religioso, também se autonomizara da Igreja de São Vicente, formando uma paróquia. Seguiu-se-lhe Tinalhas, já paróquia autónoma, antes de 1539, e Louriçal do Campo, em meados do século. As restantes freguesias foram fundadas durante a União Ibérica.

Viviam, no concelho, um fidalgo chamado Diogo da Cunha e 4 escudeiros: Pedro Vasques, Rui Fernandes, Lopo de Azevedo e Pero Camelo (os dois últimos criados do rei e do infante).

Havia ainda 9 oficiais: 3 tabeliães, sendo um também escrivão das sesmarias (distribuição de terrenos incultos por cultivadores sem terra) e outro coudel (capitão de cavalos); 1 escrivão da coudelaria (criação de cavalos); 1 escrivão da câmara e almotaçaria (abastecimento do concelho, fixação de preços e inspeção de pesos e medidas); 2 juízes dos órfãos; 1 juiz das sisas; 1 escrivão das sisas.

Estas eram as pessoas mais importantes do concelho, constituindo, no conjunto da Beira Interior, uma das maiores percentagens de privilegiados, em relação ao resto da população: 4%. Castelo Branco tinha 1% e a Covilhã 1,6%. Belmonte ultrapassava-nos com 4,1% e Salvaterra do Extremo com 4,4%.

Existia, em São Vicente, uma importante comunidade de judeus que já dispunham de autonomia, pois formavam uma comuna juntamente com os judeus de Castelo Branco. Esta autonomia custava-lhes 23 000 réis, pagos ao rei, anualmente. Alguns judeus já aqui viveriam anteriormente, mas a maioria seria originária de Espanha, de onde haviam sido expulsos em 1492.

A obra “A BEIRA BAIXA NA EXPANSÃO ULTRAMARINA”, de Joaquim Candeias Silva e Manuel da Silva Castelo Branco, dá-nos a conhecer alguns habitantes do concelho que participaram na expansão portuguesa dos séculos XV e XVI.

Lopo Martins lutou em importantes expedições militares, na primeira metade do século XV: Ceuta, 1415; Canárias, 1424…

Duarte de Azevedo era natural da Terra da Feira e passou a viver na vila de São Vicente, onde casou com D. Joana, “senhora de grande qualidade”. Serviu na Índia e no Norte de África, na 1.ª metade do séc. XVI.

D. Álvaro da Costa era filho de Martim Rodrigues de Lemos e Isabel Gonçalves da Costa, herdeira da fazenda vinculada do Ninho do Açor. Tornou-se escudeiro-fidalgo da Casa Real. Depois foi guarda-roupa e camareiro-mor de D. Manuel e armeiro-mor do Reino. Foi embaixador do rei a Espanha e a Roma. Teve a comenda de S. Vicente da Beira da Ordem de Cristo, foi vedor da Casa da rainha D. Leonor e primeiro provedor da Misericórdia de Lisboa.

O Pe. Leonardo Nunes nasceu em S. Vicente da Beira, possivelmente em 1518. Entrou no colégio da Companhia de Jesus, em Coimbra, no ano de 1548, e depois partiu para o Brasil, na armada de Tomé de Sousa, integrado num pequeno grupo de missionários chefiados pelo Pe. Manuel da Nóbrega. Criou uma escola para crianças índias e portuguesas, o chamado Colégio dos Meninos de Jesus, inaugurado em 1553, sendo, por isso, considerado fundador da instrução no Estado de S. Paulo.

Sebastião Falcão partiu para a Índia, em 1533, incorporado na armada capitaneada por D. Pedro de Castelo Branco.

O Irmão Domingos Vaz entrou para a Companhia de Jesus, em 1588, com 29 anos. Nos finais de 1594, achava-se no Colégio de Cochim (Índia), sendo então coadjutor.

Simão de Sousa de Refóios foi o primogénito de Jácome de Sousa de Refóios, 9.º senhor do morgado de Santa Eulália, que viveu nas suas casas nobres de S. Vicente da Beira, com a mulher e prima Maria de Refóios. Ele era descendente de Rui Vasques de Castelo Branco que no séc. XIV herdara do tio Martim Esteves o dito morgado e ela, além de pertencer à mesma linhagem, descendia dos Costa de Alpedrinha, com solar no Ninho do Açor, desde o século XV. Simão de Sousa de Refóios acompanhou D. Sebastião a África e partilhou a sua sorte, na batalha de Alcácer-Quibir (1578). Morreu sem geração, pelo que o morgado passou à irmã D. Leonor de Sousa. Esta casou com Nuno da Cunha e deles foi 2.º neto João Nunes da Cunha que chegou a vice-rei da Índia e a quem D. Afonso VI concedeu o título de 1.º conde de São Vicente.

Púlpito manuelino na Igreja Matriz de Tinalhas.
(Foto de Carlos Matos)

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