sexta-feira, 29 de maio de 2015

O meu hortejo



Fui à horta
Semeei pepinos
Comi cerejas
Para que vejas

Reguei a hortaliça
Plantei alfaces
Depois; fui à missa

As ervas daninhas
Vou arrancar
para as sementeiras
Poderem vingar

O melro no silvado
Canta, sem parar
Lindo é seu trinado
Não se cansa de cantar

Arroios cantarolando
De pedrinha em pedrinha
De manhã à tardinha
Os mimos vão regando

Na horta o hortelão
Cria hortaliças
Repolhos, nabos, nabiças
Couves, alfaces e feijão

Tem que ser cavada
A terra a cultivar
Depois de preparada
Está pronta a semear

A minha horta é pequenina
Não passa de um hortejo
Mesmo assim gosto do que vejo
Olha, uma abóbora menina

Que rico laranjal
Macieiras e figueiras
Pessegueiros e parreiras
Como é belo o olival

Gosto de hortar
A minha pequena hortita
É uma horta bonita
Gosto de lá andar

Zé da Villa

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Da generosidade



Em resposta ao desafio colocado pelo José Teodoro, pedi à minha aluna da Partida, Filipa António, para perguntar à avó o que sabia sobre o assunto, e a resposta foi a seguinte:

             Entre os anos de 1960 a 1970, o povo da Partida andava revoltado com a situação do padre.
            O povo queria um padre que estivesse sempre a viver na Partida. Os habitantes não eram contra o padre Branco, porque este também não tinha culpa desta situação.
            O povo, para manifestar o seu descontentamento, deixou de ir à missa e o padre deixou de celebrar a missa na Partida. Quanto ao apedrejar do jipe do padre Branco, a minha avó já não se lembra.
            Através desta revolta, conseguiram então um padre chamado Artur Campos. Assim, os povos da Partida e do Vale de Figueira construíram uma casa para ele. Os habitantes ofereciam hortaliça, azeite, fruta, para mostrarem o seu contentamento.

Filipa António

            A resposta desta senhora fez-me recordar a generosidade e o dinamismo das gentes do pinhal (curiosamente, a partir dos Pereiros, aqui tão perto, a personalidade e a gastronomia são já muito diferentes das nossas). Talvez devido ao isolamento e o desejar não ter menos regalias ou privilégios que os das outras terras, fez com que, ao longo dos tempos, valorizassem muito a presença de quem fosse para lá viver, principalmente se fosse padre ou professor.
            Há cerca de 15 anos, estive colocada por dois anos no Sobral de Cima concelho de Oleiros, entre Álvaro e Madeirã. Daqui lá, 76 km de curvas, 150 diários. Quando lá cheguei, ainda tinham a casa do professor em frente à escola, embora já sem condições de habitabilidade. A oferta de produtos agrícolas e até animais, principalmente na matança do porco, eram frequentes.
            Um dia, convidei a minha colega das Sardeiras de Baixo (a Maria José, também de São Vicente), a ir lá com os alunos dela visitar os moinhos de água ainda a funcionar. Duas mães ofereceram-se para nos dar o almoço. No total, não éramos mais de 12, mas o banquete chegava para 50.
            Relativamente ao comentário da Libânia acerca do padre Branco, recordei que também estive um ano em Janeiro de Cima, onde idolatravam o padre Branco, que tem uma fotografia grande no Centro Paroquial (penso que cá não há em nenhum local) e diziam que ele nunca devia de ter saído de lá, que tinha sido o bode expiatório (o mais novo de três padres que viviam nas Bogas de Baixo) e que era mentira o que diziam dele, o culpado tinha sido outro!

M.ª da Luz Teodoro

terça-feira, 26 de maio de 2015

Mais cor





Realmente de extasiar, a nossa Serra nesta altura! Sobretudo pela vegetação, mas também pela quantidade e variedade de pássaros e outros animais.
Ontem, na Senhora da Orada, vi uma espécie de lagarto lindíssimo e pouco vulgar. Era tão colorido que quase fazia lembrar um papagaio. Estava mesmo em cima do parapeito da ponte sobre a ribeira, como que a assistir também ao concerto da banda. Quando me preparava para tirar o retrato, alguém achou que corria perigo e enxotou-o.
Hoje voltei lá para ver se o avistava novamente, mas só com muita sorte, que não tive…
Mas vi este belo exemplar.
Entre a primeira e a última fotografia passou uma hora, quase sem respirar, mas valeu a pena.

M. L. Ferreira

domingo, 24 de maio de 2015

Paleta de cores






 

Hoje, na Senhora da Orada, todos encheram os olhos com as cores da serra. Eu ontem peguei na máquina e breves minutos bastaram para me extasiar com esta autêntica paleta de cores. O que mais me impressiona é o elevado número de flores azuis que há na Gardunha, talvez apenas por partirmos do princípio de que as cores das flores vão apenas do branco ao roxo.

José Teodoro Prata

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Senhora da Orada



Manhã radiosa; o santuário estava preparado para receber mais uma romaria.
Uns a pé, outros a cavalo em burros, carros de bois lindamente enfeitados com colchas, rosmaninho, giestas floridas iam chegando.
Romeiros cantavam loas à Senhora.
A ganapada ia para a estrada nova ver passar os devotos, alguns passavam dentro da vila, entravam numa taberna, emborcavam um cajeirão e seguiam.
De vez em quando um romeiro, cajado na mão, botas atadas aos ombros, descalço; promessa.
Os moradores do cimo de vila subiam a serra pelo ribeiro D. Bento, ranchos e ranchos de moços e moças cantavam: “Nossa Senhora da Orada...”
À medida que se aproximavam do santuário, ouviam-se realejos, harmónios, guitarras.
Rapazes cantam ao desafio, para impressionar as raparigas
Nas margens do ribeiro os taberneiros montam a tenda e vendem vinho a copo, tremoços, pirolitos...
Alguns fazem assaduras, montam pequenos restaurantes improvisados.
Ao fundo do terreiro, uma colcha exibe flores de papel com penas coloridas; uma banca vende santinhas de açúcar.
Mais abaixo, à socapa, o homem da vermelhinha faz seu jogo enganando os mais incautos.
É uma confusão organizada.
Antes da missa, os romeiros dirigem-se à mesa da confraria onde compram velas, estampas de Nossa Senhora e pagam suas promessas.
Junto ao altar deixam braços, pés, pernas, cabeças em cera... O ermitão coloca-as na parede.
O senhor vigário inicia a santa missa, os romeiros acotovelam-se dentro da capela, não cabem todos, (a maioria participa no terreiro à sombra da enorme amoreira e do freixo), assistem com fé ao santo oficio divino.
A procissão é enorme, mesmo os que não assistem à missa não faltam à grande manifestação de fé, pessoas descalças, velas acesas nas mãos.
À passagem da procissão, um velhote tira o chapéu da cabeça, segura-o contra o peito, inclina-se benzendo-se.
O adeus à Senhora é uma manifestação de amor, carinho e saudade; as lágrimas correm, efeitos do sermão, as palavras do pregador comoveram.
Por aquelas quebradas serranas, romeiros saboreiam saborosas merendas.
No alto da Portela, uma pequena nuvem surgiu, pouco-e-pouco tornou-se cada vez maior, num ápice todo o céu se cobriu de escuras nuvens anunciadoras de trovoada.
Um trovão, outro e outro. Grossos pingos de chuva; pasmada, torrencial...
À pressa, as mulheres arrecadam as virtualhas nos cabazes, cestos ou alcofas. São às centenas os guarda-chuvas pretos que se abrem.
Caminhos poeirentos depressa se transformam em lamaçais.
Uma das tendas que se situava junto ao ribeiro não aguentou a pancada, foi pelos ares com a ventania que entretanto se formou. O pipo rebola ribeiro abaixo, o taberneiro viu-se grego para o resgatar
Quem pode refugiou-se na capela
O céu a pouco-e-pouco regressou ao azul celeste, o sol com todo o seu esplendor voltou. Conforme apareceu, desapareceu a trovoada.
A banda começou a tocar, os rapazes catrapiscavam as raparigas e dançavam.
As mães, lenço na cabeça atado escorrendo até aos peitos, mãos debaixo dos xailes negros.
Um avental protegia a saia domingueira, os bolsos serviam para guardar  amêndoas farinhentas, santinhas de açúcar...
Alguns romeiros que ainda não tinham cumprido suas promessas davam voltas à capela de joelhos e descalços. Os mais frágeis eram amparados por familiares, um em cada lado.
Quem passava para a fonte condoía-se, em frente à porta da capela benziam-se.
Ao fundo do terreiro, ouvia-se um harmónio subindo a ladeira acompanhado por alguns rapazes chapéu na cabeça enfeitado com uma estampa da Senhora da Orada.
A banda vicentina tocava marchas alegres.
A certa altura as músicas confundiam-se; banda de um lado, harmónio e cantoria do outro.
Brilhava o sol intensamente, aquecendo as verdejantes encostas com as mais variegadas cores; qual paleta.
Junto aos ribeiros, férteis nateiros cobertos de batatais regados com água da Senhora.
Pífaros, realejos, guitarras, harmónios ouviam-se por toda a parte.
Taberneiros apregoavam os vinhos:
- Ó fregueses aproximem-se, este é do bom e do barato, dez tostões o quartilho, provem; é beber e gritar por mais
Os homens encostam a barriga ao balcão improvisado, na mão direita seguram uma grossa bengala com uma grande cachaporra na ponta, enfiado no braço esquerdo, o guarda-chuva.
Flores de papel, estampas...enfeitam os chapéus.
As mulheres lindas e formosas agarram seus maridos pela cintura: “Anda homem...”
Um grupo do cimo de vila improvisa uma dança no ribeiro D. Bento ao som de um realejo
A tarde já ia velha, na fonte os romeiros continuam a encher suas vasilhas com água santa, eis que, em cima da ponte levanta-se do nada um sururu, tiram-se de razões dois valentões; (um da vila, outro do Souto da Casa), esbofeteiam-se, agarram-se, até que um cai estatelado no ribeiro
“Credo, já mataste o homem!”
Regedor acompanhado pelos cabos de ordem toma conta da ocorrência.
Romeiros continuam a banhar-se e a encher as vasilhas.
A banda toca, dando voltas à capela, o povo canta:
Nossa Senhora da Orada
Quem vos varreu a capela
Foram as moças de São Vicente
Com um raminho de marcela
Nossa Senhora da Orada
Ó que Senhora tão linda
Chega Vossa nomeada
À cidade de Coimbra
Nossa Senhora da Orada
Ó que Senhora tão boa
Chega Vossa nomeada
À cidade de Lisboa
Nossa Senhora da Orada
Vossa água tem virtude
Com ela muitos doentes
Recuperam a saúde

(…)

J.M.S