terça-feira, 31 de dezembro de 2019

O nosso património

Segue-se uma notícia do jornal Reconquista, da passada semana. Há duas referências ao património de São Vicente da Beira, a primeira por boas razões e a segunda para nossa vergonha.
Que ideia foi essa de, num pacote de 5 propostas de classificação de património, incluir duas capelas que já não existem e de que restam apenas os topónimos? Mais olhos que barriga dão no que deram!
E como é que as propostas para outras duas classificações foram tão mal feitas que reprovaram?! Sei que o poder central do município olha sobretudo para o seu umbigo que é Castelo Branco. Há tantas periferias...
Depois classifica-se o Castelo Velho sem o estudar e ainda por cima  inclui-se no Louriçal (a divisão das freguesias passa no picoto, sendo a parte oeste da freguesia de SVB, isto é, quase toda a área do Castelo Velho.
Notas: 
1. A Senhora da Orada não tinha hipótese nenhuma, pois o seu retábulo, vindo da igreja de São Francisco, está a desfazer-se há demasiados anos. 
2. Certamente o jornalista refere-se à capela de São Francisco e não à extinta igreja de São Francisco, do convento das religiosas franciscanas.

José Teodoro Prata

quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

domingo, 22 de dezembro de 2019

Bom Natal


Mais uma vez, não resisto a partilhar convosco o cartão de Natal que o Francisco Barroso me enviou. É que ele, nesta quadra, fica especialmente inspirado!

Na nossa terra, a fogueira de Natal promete. Hoje de manhã já estava enorme e ainda havia muitos madeiros para lhe meter. Parabéns à malta das sortes!

Bom Natal Para Todos!

José Teodoro Prata

quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Histórias de mulheres tristes

Era no tempo em que se vendia a alma ao diabo por uma leira de terra. Há até quem se lembre ainda de, por causa duns marcos, dois vizinhos se terem matado ou, por uma passagem, irmãos passarem a vida desavindos. Não admirava, por isso, que se arranjassem casamentos entre parentes chegados, mesmo temendo que lhes nascessem os filhos poucochinhos do juízo. Bastava uma dispensa canónica ou, quantas vezes, que se levasse ao padre uma galinha das mais gordas. Não admirava também ver homens velhos a casar com mulheres que podiam ser filhas, ou ao lado de mulheres que mais pareciam as próprias mães. Tudo para não partirem as terras herdadas dos pais, ou aquelas de que, por artes e manhas, se assenhoravam, chamando suas às que sempre tinham sido do povo.   
Por essa altura chegou à Vila um mancebo, pouca barba ainda, mas já com modos de senhor. Vinha montado numa égua branca, luzidia, e seguiu direito à casa do Pároco, onde se hospedou. O povo, pouco avezado a grandes generosidades clericais, estranhou. Não havia casa nem taberna em que não se comentasse o caso e fizessem suposições: Seria algum fidalgo fugido à justiça de Lisboa? Um irmão, nascido fora de tempo? Algum filho encoberto, como havia tantos? Que ele lhe dava parecenças, lá isso dava, pelo menos nos modos. O mistério não durou muitos dias porque a criada, sempre à escuta atrás das portas e amiga de levar e trazer, depressa esclareceu o mistério: o menino era parente chegado do senhor vigário e tinha vindo para se casar com a Dona Maria José.
A Dona Maria José era uma senhora respeitável, também aparentada com padres. Viera de fora, já mulher feita, para se casar com um dos grandes proprietários da Vila, com idade para ser pai dela. O casamento não durou muito porque ele entregou a alma ao Criador ao fim de poucos anos de casados. Talvez por isso, e apesar de se dizer que “Homem velho e mulher nova, filhos até à cova”, o ditado não se cumpriu. Num tempo em que os pobres tinham ninhadas tão grandes, era um mistério gente tão rica não ter ao menos um filho, com tanta terra para lhe deixar. Parecia castigo de Deus.
Dona Maria José já passara há muito dos quarenta, mas na Vila ninguém estranhou a notícia daquele noivado. Viúva, sem filhos, precisava de quem a ajudasse a tomar conta das fazendas, dos rebanhos, das juntas de bois e dos lagares que herdara do marido enterrado há pouco tempo. Poderia era ter escolhido homem com outra idade, mas já diziam as más-línguas que teria ali andado a mão do confessor, que ela levava tão a peito que nem a de Deus Nosso Senhor.
Feito o casamento, o morgado meteu mãos à obra e, não tardou, mostrou que trazia a lição bem aprendida da casa paterna, também senhora de grandes teres espalhados entre a Estrela, o Açor e a Gardunha. E o que não sabia, depressa aprendeu com os outros proprietários da Vila, que, receosos que viesse criar maus costumes aos que, todos os dias, mendigavam por uma jorna, lhe foram enchendo os ouvidos de bons conselhos. Logo pela manhã atravessava a Praça a cavalo, todo empertigado na cela, agarrado às rédeas como se fosse o imperador romano de quem usava também o nome. E ai de quem não tirasse o chapéu e curvasse a cabeça à sua passagem: era certo e sabido que não tornava a ganhar uma jorna nas terras que eram dele.
Pareciam entender-se bem, Dona Maria José e o morgado. Já diz o povo, “ Casal unido, mulher mais velha que o marido”. Enquanto ele andava por lá a dar volta às terras e a inteirar-se dos alqueires de cereais, dos almudes de vinho ou da fundição da azeitona, ela ficava em casa, a dar ordens às criadas. Tinha uma de dentro, já antiga, que era quem punha e dispunha em quase tudo o que houvesse para decidir; a outra, mais nova, era quase só para os recados, ir à fonte, esfregar o chão e arear os tachos. Também era ela que tratava da criação miúda, nas capoeiras do quintal.
Durante a semana Dona Maria José só saía para ir à missa da manhã e, de caminho, aproveitava para mudar a água e compor as flores do altar do santo da sua devoção. Se alguma coisa lhe roía a consciência ou atormentava a alma, passava pela sacristia e pedia para ser ouvida em confissão ou apenas desabafar. Tinha um dia certo para dar esmola aos pobres que se acotovelavam à porta das traseiras todas as primeiras sextas-feiras do mês. A troco de um padre-nosso pelas almas de quem lá tinha, dava uma malga de azeitonas, uma fatia de pão ou uma medida de azeite velho, que o novo era para os gastos de casa, para a igreja, e para vender ou dar a quem bem entendiam. Dizia-se que todos os anos mandavam cinco almudes para as Necessidades, mas depois que mataram o rei (e amigo que ele era do povo, que ainda por aqui passou mais que uma vez, quando vinha à caça) e os republicanos tomaram conta do poder, nunca mais; que não estavam para alimentar aquela corja de assassinos e ladrões, que era o que eles eram.  
Também era a dona Maria José que ensinava o catecismo às crianças para a Primeira Comunhão; tinha até uma sala, com oratório e tudo, de propósito para a doutrina e para fazer as suas orações antes de ir para a cama. Pelo menos um rosário à Nossa Senhora para agradecer as graças e pedir perdão pelas próprias faltas e pelos pecados do marido, que sabia serem muitos; alguns por culpa dela, a quem o tempo ia esmorecendo os atrativos de mulher e diminuindo as possibilidades de lhe dar ao menos um filho. Era por isso que, sabendo o que sabia (e não sabia da missa a metade…), fechava os olhos; às vezes, com a bênção do confessor, até lhe facilitava os tresmalhos.
Aos domingos o casal saía de casa juntos para irem à missa do meio dia. Ela tinha uma cadeira com genuflexório almofadado a veludo, mesmo à frente, junto das senhoras mais virtuosas da Vila, que não gostavam de se misturar com o povo; ele ficava nos bancos ao lado do altar-mor, onde só tinha lugar a fina-flor dos machos da terra. Depois da missa, Dona Maria José ia a correr para casa a ver se estava tudo em ordem para receber o senhor Vigário, convidado habitual para o almoço de domingo. Ele ficava a saber das novidades, na Praça, enquanto o padre se desparamentava. A seguir ao almoço, geralmente canja e galinha com arroz tostado ou cabrito assado no forno com batatas coradas (a sobremesa era quase sempre arroz doce, que o padre pelava-se pelo arroz doce da criada), Dona Maria José retirava-se para a sua sesta ou ficava a dormitar no canapé da sala. Os homens ficavam a jogar às cartas, mordiscando biscoitos e a provar os licores caseiros, do melhor que já lhes tinha passado pela goela.
Era nestas alturas, quando ficavam a sós depois do almoço, e já com a língua mais solta, que o pároco e o parente faziam um ao outro as confidências mais íntimas, quase sempre relativas à quebra dos votos eclesiásticos ou matrimoniais. E teriam muito que contar, que, do padre, constavam-se belas coisas! Do morgado, sabia-se bem que nem todas as crianças que apadrinhava, eram só afilhadas; bastava olhar-lhes para as caras, mesmo encardidas, para encontrar parecenças. 
Foi numa destas tardes de domingo que o assunto veio à baila: Tratava-se da filha mais velha do pastor das cabras, já antigo na casa. Por acaso até afilhada de Dona Maria José, ainda do tempo do defunto marido. Andaria aí dos quinze para os dezasseis, pouco mais ou menos, e já há muito que andava de olho nela, se a via nas mondas, curvada sobre o milho ou o trigo, nas vindimas ou na apanha da azeitona, nas terras que eram dele. Cachopa desenxovalhada, com os olhos sempre a rir; a cantar, nem um lírio:

Loureiro verde loureiro
Loureiro assim, assim
Enganaste uma donzela
Casa com ela, ó Joaquim.

Casar com ela não caso
Que ela de mim não faz conta
Loureiro verde loureiro
Seco no meio verde na ponta.

Era tão despachada para o trabalho que até parecia que tinha quatro braços, em vez de dois. Já tinha até falado à mulher que a metesse de criada, mas ela não tinha querido, que não precisava. Poderia o vigário dar-lhe uma palavrinha? O vigário demorou um pouco a responder, que a rapariga era filha de gente honesta, mas como uma mão lava a outra, lá se resolveu: «Deixa estar, que vou ver…». E a verdade é que, passado pouco tempo, a rapariga largou o trabalho no campo e passou a criada de servir. Sempre era melhor do que andar à torreira do sol, de verão, ou debaixo de água todo o dia, no inverno.
Não tardou muito, um dia, já à boca da noite, chegou a casa debulhada em lágrimas. Por mais que a mãe lhe perguntasse as razões de tanto pranto, ela não as disse. Só que não tornava para casa da madrinha; antes morta. Não foi difícil à mãe descortinar o que se andaria a passar, mas, acomodada ao domínio dos ricos sobre os pobres como se o destino dela tivesse que se perpetuar no destino dos filhos (sempre assim fora), sabe Deus com que mágoa, não encontrou outros argumentos: «Tens que voltar, filha. Se te vieres embora eles põem o teu pai também na rua, e o que é que vai ser de nós, que mais ninguém lhe torna a dar trabalho? Com os teus irmãos ainda tão pequenos, só se formos todos estender a mão à caridade». E a rapariga voltou, mas a partir daquele dia nunca mais se lhe viu um sorriso na cara. Não tardou, começou a ver-se-lhe a barriga a medrar. Era um menino, mas dizem que morreu ao nascer. A mãe, quase uma criança ainda, ia morrendo também, de tristeza.
Passados alguns anos encontrou um homem bom que quis casar com ela. Tiveram muitos filhos, e depois muitos netos e bisnetos, mas as lembranças daqueles tempos, tão cheios de penas, apagaram para sempre o brilho dos seus olhos. 
É assim que me lembro dela. 


M. L. Ferreira

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

O nosso falar: lareta e bacalhoeira

Uma aluna minha teve uma atitude que a minha mãe classificaria de lareta. E saiu-me, tendo em seguida de lhe explicar o que era, pois nunca ouvira tal palavra.
Lareta era uma rapariguita esperta, alegre e algo atrevida. Consultei um dicionário online que me informou significar esperta e também que recolhera essa informação no Fundão. Lá está, a nossa cultura comum da Gardunha!
Mas um outro site dizia que é uma pessoa incapaz de guardar um segredo, pessoa palavrosa que conta tudo a todos. Ora para essas o nosso termo é bacalhoeira, palavra bastante depreciativa para a pessoa a quem é dirigida, pois é o mesmo que lhe chamar grosseira, o significado que lhe dá outro dicionário online.
Bacalhau com todos até se compreende, mas lareta?! De onde virá?

José Teodoro Prata

sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

Os Sanvicentinos na Grande Guerra


António José


António José nasceu no Casal da Fraga, a 9 de junho de 1895. Era filho de João José, natural do Casal da Serra, e de Mariana Duarte.
Alistou-se em 19 de junho de 1915, como recrutado, apresentando-se no Regimento de Cavalaria n.º 10, em 13 de janeiro de 1916. Sabia ler, escrever e contar corretamente e, durante esse ano de 1916, completou o curso de habilitação para 1.º Cabo e o curso de Serviço Telegráfico Militar, no qual ficou aprovado com distinção.
Pronto da instrução, passou à Companhia de Telegrafistas de Praça, em 30 de setembro de 1916, ficando obrigado a servir no quadro permanente por mais um ano a partir daquela data. 
Fazendo parte do CEP, embarcou para França, no dia 26 de maio de 1917, integrando a Unidade Territorial Companhia de Telegrafistas, como soldado com o n.º 1358 e a placa de identidade n.º 26812.
Foi promovido a 1.º Cabo em 16 de abril de 1918, e equiparado a 2.º Sargento, desde 19 de outubro, nos termos do regulamento para a promoção e equiparação das Praças das Secções de Telegrafistas e Sinaleiros. Embarcou de regresso a Portugal, no dia 5 de abril de 1919, a bordo do navio Pedro Nunes.
Em junho desse ano, domiciliou-se em Sacavém, Loures, e ingressou na Companhia de Telegrafistas da GNR, em 16 de outubro. A 1 de abril de 1922, passou ao Batalhão n.º 2 da mesma Guarda.
Aprovado no concurso para Furriel, foi promovido a esse posto e passou ao Batalhão n.º 4 da GNR, em Julho de 1932. Em maio de 1938, foi promovido a 2.º Sargento (nesta altura já estava colocado na região norte do país).
Passou à situação de reforma, por ter atingido o limite de idade, em 9 de junho de 1951.
Registo na folha de matrícula militar:
a)    10 dias de detenção aplicada pelo Comandante da Companhia, porque «em 12 de Agosto de 1918, não substituiu uma sentinela que estava doente, consentido que ela estivesse no seu posto sem a devida correção.»
Prémios, condecorações e louvores:
  • 2.º prémio, de 3$00, pelo curso de habilitação para 1.º Cabo;
  • Medalha da vitória;
  • Medalha Militar de cobre de classe de comportamento exemplar;
  • Medalha militar de prata de comportamento exemplar em substituição da de cobre que lhe havia sido atribuída anteriormente;
  • Louvado por, «na instalação do posto de Penafiel e organização dos respectivos serviços e ainda como amanuense dos mesmos ter desenvolvido notável atividade e manifestado excepcional competência e extraordinária dedicação, colaborando para o prestígio da Corporação a que pertencia.» (Folha de matrícula militar);
  • Condecorado pelo comandante do Batalhão n.º 4 da GNR «pela grande dedicação e competência profissional de que deu provas ao cabo de mais de 31 anos de exemplar comportamento nas fileiras do Corpo de Tropas, sempre no serviço rural, onde revelou apreciáveis qualidades de trabalho e muito interesse pelas suas funções de Comandante de Posto, o que muito contribuiu para o seu prestígio pessoal e engrandecimento da Corporação.» (Folha de matrícula militar).


Família:
António José casou com Virgínia dos Santos em 1924. Deste casamento nasceu uma filha: Maria da Conceição dos Santos José. 


O casamento durou poucos anos, porque Virgínia adoeceu gravemente, vindo a falecer em Fevereiro de 1933, vítima de tuberculose. Durante a doença da esposa, António José entregou a filha, na altura com 9 anos de idade, aos cuidados de familiares próximos, no Casal da Fraga.  
Entretanto, António José tinha sido colocado em Valpaços, no lugar de Argeriz, onde veio a casar com Albertina de Sousa Barroso, também já viúva, em outubro de 1935.
Após este casamento, veio buscar a filha ao Casal da Fraga, passando a menina a viver com o pai e a nova esposa. A criança foi muito bem recebida e integrou-se facilmente na nova família. Casou, anos mais tarde, com um sobrinho da madrasta, Anselmo Barreira, e tiveram cinco filhos: Maria Cidália Santos Barroso Barreira, Rosa Virgínia Santos Barroso Barreira, Natália Santos Barroso Barreira, Maria Manuela Santos Barroso Barreira e António José dos Santos Barreira.
Mesmo após o casamento, Maria da Conceição manteve sempre os laços com os familiares da terra do pai, que visitou regularmente enquanto foi viva.
António José prestou serviço como militar da GNR, em várias localidades, nomeadamente em Ponte de Lima e Penafiel, onde foi sempre muito considerado pela correção com que lidava com toda a gente, pela sua educação, caráter e coragem.
Diz-se que uma vez, provavelmente para acalmar os ânimos, se envolveu numa zaragata entre dois grupos que se debatiam à paulada. De repente, uma das partes virou-se para ele com os paus no ar; mal teve tempo de desembainhar a espada, mas enfrentou-os com coragem. Ainda hoje o neto mais novo guarda, com orgulho, essa espada, à qual falta um pedaço da ponta.
Contam também que um dia estava num café da terra onde vivia, e viram chegar uns homens que o algemaram e levaram preso. Foi acusado de oposição ao regime e, por mais que negasse, mantiveram-no preso durante algum tempo, em condições muito difíceis. Talvez por isso adoeceu gravemente, vindo a falecer em Carrazeda de Montenegro, Valpaços, no dia 14 de Fevereiro de 1959, vítima de angina de peito. Tinha 63 anos de idade.
(Pesquisa feita com a colaboração da esposa de um dos netos, Rosa Barreira)

Maria Libânia Ferreira
Do livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Poesia em São Vicente da Beira



“A QUATRO MÃOS” e “CUMPLICIDADES” são dois livros de poesia de Zulmira Mendes e Luis Infante apresentados este domingo, na nossa terra.


A Zulmira, é nossa conterrânea, nascida no Casal da Fraga. Muitos já lhe conhecíamos a voz poderosa para cantar, principalmente o fado, mas a maior parte desconhecíamos-lhe a alma de poeta, que só agora nos revelou.
O Luis Infante nasceu em Castelo Novo, mas, por amor, vai adotando a nossa terra como também um pouco sua. É já um “veterano” no mundo da poesia, com vários livros publicados.
Os poemas contidos nos dois livros apresentados, alguns guardados no “baú” da Zulmira há muito tempo, outros mais recentes, abordam temas muito diversos como o amor, a amizade, a saudade, a natureza; outros são recordações de lugares ou de amigos.
Os poemas não estão assinados por nenhum dos autores, justificando um pouco o título dos livros, e talvez para deixar aos leitores o jogo de adivinhar quem é que terá escrito o quê. Nem sempre é fácil, até porque como dizem os autores, muitos terão resultado do «casamento de duas mentes que lhes deram forma». 
Tive que ler alguns poemas na apresentação, mas não foi fácil escolher. Um dos que li foi este, por falar da Gardunha de que todos, os que crescemos à roda dela, gostamos tanto; talvez também porque, em quaisquer circunstâncias, mantém em nós a esperança de a ver sempre viva.  

ESPERANÇA

O sol já vai alto,
Brilhante, ligeiro,
Aquece o asfalto
Num gesto rotineiro.

Percorre a terra,
Por vezes
Por entre as nuvens se esconde
E eu olho para a serra,
Da minha janela,
Triste por não saber onde.

Onde paira o verde da minha serra?
Foi o sol que o queimou?
Não sei, mas vejo que se extinguiu
E tanta beleza fugiu,
O vento a soprou
E, a minha serra altaneira,
Sozinha ficou.

As estevas,
Os pinhais,
As andorinhas,
Os pardais
Vivem tristes, sem alegria
Porque suas irmãs perdizes
Que ali viviam tão felizes
Já não têm onde se acoitar
Porque a minha serra perdeu
Aquele ar
De saber dar
Tudo quanto tinha de seu.

Foi sentinela,
Agora olho para ela
Com uma tristeza infinda
Mas quero vê-la ainda linda.

Vê-la florir, verdejar,
Ouvir as aves cantar
Em alegre sinfonia
Dando à serra aquela alegria
Desde o amanhecer
Até ao final do dia.



No final da apresentação a Zulmira, o Luis e alguns amigos da USALBI presentearam-nos com um grande momento de fado (eram tantos que não couberam na fotografia…).

M. L. Ferreira
As fotografias são da Luisa Ferreira e Florinda Baptista Carrega