terça-feira, 30 de abril de 2024

Abril em Lisboa



Estive no 25 de Abril da Avenida da Liberdade, em Lisboa.
Estas fotos dão uma ideia de quantos éramos - tiradas dos Restauradores, no Marquês de Pombal, lá ao fundo, ainda estão parados; para trás de mim, os Restauradores e o Rossio, destino da marcha, está tudo cheio!

Um dever de agradecimento pelos que o fizeram há 50 anos, um acto cívico de afirmação da liberdade, e um acto político, pelas razões que sabemos. Por isso lá estive.

JMT

segunda-feira, 29 de abril de 2024

Abril em São Vicente da Beira

 No domingo, dia 28, os vicentinos juntaram-se e partilharam as suas memórias do 25 de Abril, na Biblioteca, em mais uma tertúlia do projeto Conta-me histórias, que visa animar esta comunidade.

Recordaram-se os tempos em que a Pide vinha inquirir junto do pároco sobre as três pessoas que habitualmente não iam à missa e contou-se o caso do rapaz que aos domingos ia namorar a terra alheia, faltando à missa, e concorreu à Polícia, à GNR e à Guarda Fiscal, mas só foi chamado depois de levar um cabrito ao senhor vigário. E a história daquela menina de Aldeia de Joanes, que lia semanalmente o Jornal do Fundão ao pai e que um dia foi abordada pela Pide que lhe perguntou o que mais gostava de ler no jornal, mas ela respondeu que só lia o anúncio que o pai mandava publicar no jornal.

Lembrámos o nosso militar de Abril, o nosso padre democrata e o nosso empresário que numa noite mudou o nome da nossa Praça, de Salazar para 25 de Abril. E as primeiras férias pagas e a ameaça de incendiar a casa a quem as pagava e fazia descontos para a Segurança Social.

Mais a criação dos autocarros para estudantes e as colónias de férias em que as crianças apreendiam um mundo novo. E as greves por melhores salários, o fim da guerra, a alegria de sermos livres, o recenseamento eleitoral com pausa para a Gabriela, as primeiras eleições e a vizinha que demorou muito a votar, porque havia muitos partidos com quadradinho onde traçar a cruz.

No dia 19 de maio voltamos a encontrar-nos em nova tertúlia, pelas 15 horas, com a Senhora da Orada como tema e local.

Esta segunda tertúlia foi quase totalmente organizada pelas responsáveis da Biblioteca (Celeste, Libânia e Conceição) e pela Maria da Luz. O nosso obrigado e as minhas desculpas, pois na sessão esqueci-me de lhes agradecer, assim como ao presidente da Junta.

José Teodoro Prata

Seguem-se as fotos da Rita Amaro:









sábado, 27 de abril de 2024

quinta-feira, 25 de abril de 2024

25 de Abril - 50 Anos

 Está a ser bonita a festa!

Tenho andado pelas escolas e sente-se um entusiasmo com o 25 de Abril / Democracia, como não me lembro de existir, mesmo em 1975.

Penso que o genocído em Gaza, patrocinado pelo Ocidente, a par do que se passa na Ucrâcia e da ânsia dos políticos europeus de levarem a guerra o mais longe possível, a par dos populismos de extrema-direita na Europa (tipo Chega em Portugal) estão a criar uma crise existencial nas pessoas, que as leva a agarrarem-se à nossa democracia, simbolizada no 25 de Abril.

Vemo-nos domingo, no nosso 25 de Abril, às 15:30h, na sala da Junta de Fregueisa,

Deixo-vos com o grande Fausto e o seu Marcolino, das longas viagenshttps://youtu.be/v_1VjgA_7Go?si=OqJ8Mj1J9VwgYjZz

José Teodoro Prata

segunda-feira, 22 de abril de 2024

Discriminações

Na escola:

Quando acabei o 2.º ano da Telescola, não foi fácil conseguir autorização dos meus pais para continuar a estudar. Valeu-me uma enorme teimosia e as ajudas do Padre Branco e da Dona Teresinha.

Naquele tempo, em aldeias pobres como a nossa, muitas crianças não iam além da quarta classe: começavam cedo a trabalhar no campo, nas obras, nas fábricas ou a servir nas casas ricas da cidade. Das que continuavam a estudar, poucas aspiravam chegar à faculdade, por isso iam quase sempre para a Escola Técnica, que dava maior garantia de trabalho imediato (muitos rapazes iam par o seminário). Eu, sem nenhuma razão consciente, matriculei-me no Liceu. Era o ano letivo de 1969/1970.

Por essa altura, percebi depois, o Liceu de Castelo Branco era uma escola bastante elitista: via-se pela arquitetura do edifício; pela figura de um reitor todo-poderoso que raramente se deixava ver, mas temíamos; pelos professores que abusavam da autoridade e do estatuto, e eram distantes no relacionamento com os alunos; pelo rigor na separação entre sexos; sobretudo pelo critério discriminatório utilizado na constituição das turmas.

Nas turmas A e B andavam os filhos das famílias “bem” da cidade: advogados, médicos, entidades administrativas do Concelho, militares, grandes proprietários ou homens de negócios. Raramente se misturavam com os outros alunos, nem nos corredores, nem nos recreios, muito menos na rua. Só faltava terem uma porta diferente para entrar e sair. O modelo seria semelhante em todo o país.

Eu pertenci sempre à turma C ou D. Na altura, nem tive consciência de que esse facto poderia estar a determinar o meu futuro. Só mais tarde percebi como aquela escola era o instrumento de um sistema educativo injusto, competitivo e elitista, que deixava para trás várias gerações de alunos, não por serem menos competentes que outros, mas apenas com base na origem social e geográfica: os professores, os livros e vários outros aspetos do contexto educativo poderiam ser iguais para todos, mas as expetativas, crenças e preconceitos que se criavam sobre o desempenho de cada um dos grupos influenciavam os resultados. Para além deste efeito psicológico altamente penalizador dos alunos das classes sociais mais baixas, sabia-se que os professores eram pressionados a não dar notas mais altas aos alunos dessas turmas, que as que davam aos das turmas A e B, mesmo que as merecessem.  

Isto acontecia ainda no início da década de setenta, já depois das reformas do Ministro Veiga Simão, que prometiam introduzir alguma democratização no ensino. Só após o 25 de Abril de 1974, com o fim dos Liceus e Escolas Técnicas, a criação das Escolas Secundárias e o alargamento da escolaridade obrigatória, o Sistema Educativo se democratizou. Começou então a falar-se numa Escola para todos e na Educação como elevador social. E foi de facto um dos setores da sociedade que mais evoluiu neste meio século. Apesar disso, passados 50 anos, é evidente como o elevador continua a subir mais facilmente para determinados grupos; para outros é ainda muito vagaroso. As causas estarão, em grande parte, nas assimetrias sociais que continuam a dividir o país, e permitem que haja ainda escolas para ricos e escolas para pobres. Os rankings publicados anualmente são disso uma evidência escandalosa.     

 

No trabalho:

Numas férias de verão fui oferecer-me para a vindima nas Vinhas do Poço (naquele tempo as vindimas faziam-se em finais de setembro e as aulas começavam só em outubro). Olharam-me com cara de quem não acreditava muito nas minhas capacidades, mas devem-me ter valido os créditos herdados dos meus pais e avós, gente de muito trabalho e boas referências. Disseram que me apresentasse na segunda-feira de manhã na Fonte Velha, que era onde se juntava o pessoal apalavrado. Só tinha que levar uma cesta, uma faca que cortasse bem e a merenda. Estava tão ansiosa que fui das primeiras a chegar.

Éramos um rancho grande de homens e mulheres, toda a gente muito animada, a pé, pela estrada adiante até às Vinhas. Era a minha primeira vez numa vindima assim tão grande, mas estava determinada a dar tudo para mostrar que era capaz de merecer o salário. E ia fazendo contas a ver se o que ia ganhar chegaria para os sapatos que andava a namorar há que tempos.

Quando chegámos, as mulheres distribuíram-se pela vinha, cada uma no seu carreiro, a colher as uvas. Trabalho duro: costas curvadas o dia inteiro e o olhar do feitor, sempre em cima de nós, atento ao que fazíamos, principalmente se levávamos tudo a eito ou metíamos à boca mais que a conta de bagos de uva. Os homens carregavam os cestos que íamos enchendo, até ao sítio onde pisavam as uvas. A minha cesta, mal a despejava, voltava a encher-se num instante. Fui até repreendida por me adiantar um pouco às outras mulheres: «Na vindima há que andar todas a par umas das outras; é mais bonito». A partir daí fiz por acompanhar o passo do grupo: nem à frente, nem atrás, cumprindo o ritual que, a pouco e pouco, fui percebendo.

Não me lembro de quanto tempo durou a vindima, mas, à medida que passavam, parece que os dias iam ficando maiores e as costas cada vez mais doridas; mas aguentei sem me queixar nem dar parte de fraca até ao fim. No dia do pagamento estava ansiosa; era o meu primeiro salário! Mas o entusiasmo passou assim que vi que aos homens pagavam uma coisa, às mulheres um pouco menos e a mim uma miséria. Perguntei porquê e responderam-me que toda a vida os homens ganharam mais que as mulheres, e eu também não podia querer o mesmo que uma mulher já feita. Foi uma desilusão; e senti-me discriminada não apenas pelo patrão, mas também pelas outras mulheres, que olhavam para mim a achar que era justo que assim fosse. Na altura nem percebi que era a luta pelo pão a sobrepor-se a qualquer tentativa de solidariedade. Naquele tempo, pensava-se lá em enfrentar os patrões por melhores condições e igualdade no trabalho?!

Já lá vão mais de cinquenta anos desde que isto aconteceu. Entretanto a situação laboral das mulheres melhorou significativamente, mas, reminiscências de um passado que não queríamos tão presente, uma das grandes reivindicações das mulheres continua a ser o fim da discriminação salarial relativamente aos homens.  Salário igual para trabalho igual!

M.L. Ferreira