terça-feira, 29 de setembro de 2015

Prisioneiros para Castela

Os irmãos José Duarte Ribeiro e João Duarte Ribeiro requereram, em 1755, ao bispo da Guarda, autorização para fazer, no seu Casal da Serra, uma capela devotada a São João Baptista. A obra já estava concluída em 1760, fiscalizada pelo Padre João Antunes, também casaleiro, mas capelão de São Tiago.
Em 1762, os castelhanos invadiram Portugal, no contexto da Guerra dos Sete Anos. Em São Vicente da Beira, destruíram parcialmente a povoação, incendiaram a câmara municipal, mataram dois homens (um da Vila e outro do Sobral do Campo) e levaram consigo o Pe. João Antunes, talvez para evitarem ataques na sua retaguarda. Sei que na Póvoa de Rio de Moinhos praticaram os mesmos atos e levaram consigo oito homens, alguns dos mais importantes da vila.
Até aqui, tudo velho, pois já divulguei estas informações neste blogue e em várias publicações escritas. Mas hoje encontrei mais elementos.
Num assento de casamento de 17 de julho de 1769, informa-se, no final, que «…os pais dos ditos contrahentes ambos foram prisioneiors para Castella…».
Os pais chamavam-se Manoel Gomes Clamam(Manuel Gomes Clamão) e Joze da Fonsequa(José da Fonseca), ambos naturais de São Vicente da Beira.
Sabemos que o Pe. João Antunes não voltou e os prisioneiros da Póvoa também não. A mesma triste sorte terão tido estes, pois já estávamos em 1769 e a paz com Castela fora assinada logo em 1763.
Nota final: será que este Manoel Gomes foi o nosso primeiro Calmão? Ou o clérigo se enganou ao registar o apelido ou a alcunha era mesmo Clamão (de clamar, gritar) e o povo, no seu falar, foi mudando para Calmão.


José Teodoro Prata

domingo, 27 de setembro de 2015

Os avós

Papel dos avós
Eu só já conheci um avô, o avô materno João Hipólito, homem bondoso e bem- humorado, sapateiro e sacristão. Em contrapartida, ainda conheci ambas as avós durante bastante tempo. A avó paterna ou avó Zefa, viúva havia muitos anos, tratávamo-la por avó do casal, porque vivia no Casal da Fraga. Vinha bastante a nossa casa, porque gostava de falar com o meu pai e ia à horta que tinha junto da ribeira e perto de nós. Chegou quase a centenária.
Os avós da vila - o avô João e a avó Iria - moravam mais longe de nós, no Cimo de Vila e, por isso, vinham menos a nossa casa. Em contrapartida, íamos nós muito a casa deles, quando íamos à missa ao domingo e à escola durante a semana. Tratavam-nos muito bem e tinham sempre uns miminhos para nós.
Estes avós eram vizinhos de porta e amigos do Pe. Tomás da Conceição Ramalho, pároco, no uso local, vigário de São Vicente da Beira, de quem o avô João foi largos anos sacristão. Era na casa deles que mais se falava da hipótese de eu ir para o Seminário, quer dizer, para o Seminário do Fundão, onde tinha andado o meu tio Ernesto, único irmão homem vivo da minha mãe. Os tios Arnaldo e José, irmãos deles, que não cheguei a conhecer, tinham morrido novos embora já adultos, vítimas da pneumónica que, em São Vicente da Beira, fez inúmeras vítimas. Houve famílias que desapareceram inteiramente, vitimadas por essa doença.
(Capítulo II, Semana do meu pai)
(…)
Férias de verão de 1954; a despedida
As férias de verão de 1954 tiveram um cunho especial. Por um lado, foram as últimas antes da nossa partida para Roma, por outro, no meu caso, ficaram tristemente marcadas pela morte repentina do meu avô materno e padrinho de batismo João Hipólito, no início de setembro.
A triste notícia surpreendeu-me na sacristia da Igreja Matriz de São Vicente da Beira, quando me preparava para assistir à missa em que ele, anterior sacristão, também costumava participar.
Corri imediatamente para a casa dele e viu-o já agonizante: uma imagem que nunca mais me deixou. Já não fui à missa e corri depressa ao Casalito, a avisar os meus pais.
Passei o resto do dia em estado de choque e aconteceu-me uma coisa que ainda hoje mexe comigo: não consegui ir ao funeral do meu avô João Hipólito, de quem tanto gostava! Assisti sozinho, de longe, dum lugar donde se avistava o cemitério e se viam as pessoas lá dentro…
Poucos dias depois, despedi-me da terra, dos parentes e conhecidos e segui para Fátima, para o retiro da tomada de hábito.
(Capítulo V, Ida para o Seminário de Guimarães)

José Hipólito Jerónimo, O Zé do Casalito, Autobiografia, Missionários do Verbo Divino, Junho de 2014

José Teodoro Prata

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Casamento por procuração



Ocasionalmente, encontrei o assento de casamento de Lopo Joze de Sequeira, de Crestelo, Seia, com Dona Maria Izabel Esteves de Brito Mouzinho, de São Vicente da Beira.
O curioso é que casaram por procuração, ambos nomeando um homem para os representar.
Lopo Joze de Sequeira morreu muito jovem. Casou em 1768 e, no assento publicado ontem, de 1788, a sua esposa já era viúva.
Entretando, deleitem-se com a letra do Vigário Manuel Viegas de Castro...

José Teodoro Prata

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Cunha Pignatelli


Este é o documento que atesta a vinda dos Cunha Pignatelli para São Vicente da Beira, através do casamento com uma Simões, pelo pai, e Feio de Carvalho, pela mãe.
O facto de o cura Domingos Gaspar escrever Pignatelles em vez de Pignatelli é natural, pois ele escreveu o que lhe disseram em português, não sabendo, talvez nem os próprios, como se escrevia em estrangeiro.
Curioso o "depósito" da noiva em casa de uma viúva, certamente muito piedosa, desde o dia do casamento até ocorreram as bênçãos. Só após estas o casamento devia ser consumado.
Embora não perceba totalmente a questão em termos litúrgicos, uma coisa era(é) o casamento e outra complementar, mas integrando-o, era(é) a bênção dos noivos. Era(é), digamos, este ato que tornava(torna) o casamento sagrado perante Deus.
A Quaresma e o Advento (em todo o mês de dezembro antes do Natal) eram tempos de concentração religiosa, pelo que a Igreja desaconselhava ou até se recusava a fazer casamentos. Quando os realizava, deixava as bênçãos para depois, como aconteceu neste, em que o casamento se realizou a 3 de março, mas as bênçãos (ver final) só foram dadas a 2 de junho. Entre estas duas datas, a noiva esteve em casa neutra, a da viúva de Lopo José.
Este Lopo José de Sequeira era, nos anos 70 do século XVIII, o proprietário que pagava mais impostos pelas suas propriedades rústicas. Vivia entre São Vicente e Seia (era natural da Quinta de Crestelo).
Este casal morava na rua da Costa e talvez este facto não seja alheio à posterior fixação de residência, pelo casal João Cunha e Benedita Simões, nesta mesma rua.

José Teodoro Prata

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Pescaria no Pisco


Achigãs. Uma delícia!


Pescador Guilherme com carpa


Pescador Eusébio com carpa


A carpa sozinha. Está frita!

Maria da Luz Teodoro

domingo, 20 de setembro de 2015

Inquietações

Memória, que se passa contigo?
Não se passa nada.
Umm...
Ando com medo.
Medo de quê?
Daquele intrometido, maldita a hora...Tanto espaço, logo havia de ir construir a sua casa em frente à minha, "só pode ser por birra," não o posso ver, passa por mim com um sorriso enigmático, "tipo mona lisa," tira-me do sério.
Ignora-o, quanto mais pensares nele, maior tua a mortificação.
Falas bem, ele é como a ferrugem, se a deixamos passar...
Memória, não te mortifiques.
Se não me defender, tu e tantos outros como tu, Amigo, estais sujeitos a perder-me, ocupará meu lugar, não há Pensamento que te valha.
Dou-te razão: quando toma o teu lugar a maior parte de nós já estamos com os pés para a cova.
Que vergonha, deixar-me dominar por um fedelho. Pensamento, Amigo, peço-vos perdão se um dia vos perder. Não tens nada que pedir perdão, é a lei da vida. A união faz a força, quem sabe se juntos não o vencemos!
Às vezes dá-me vontade...
Vê lá o que vais dizer: lançar fogo à casa dele. Não faças isso, estavas a ser pior que ele, havemos de encontrar uma solução. Falaste em fogo, lembrei-me da pouca vergonha que para aí grassa com tantos fogos; à sua passagem, tudo destroem, consumindo milhares de hectares de floresta. Assim que o calor chega, a comunicação social divulga ao bom povo: "começou a época dos fogos".
Ei-lo galopando montes e vales, arrasando tudo, deixando para trás um rasto de miséria: "e não há quem ponha cobro a isto".
Existem muitos interesses.
É verdade, são tantos os milhões que saem do depauperado erário: "gastava-se muito menos, se em vez de remediar se prevenisse".
...A força económica sobrepõe-se.
Estás a ver; os dinheiros deviam servir para limpar as matas, milhares de pessoas ganhariam sua vida limpando-as. Os gastos seriam imensamente menores, se o fogo  tentasse entrar mais facilmente o dominariam; as populações podiam dormir mais descansadas.
Olhem, quem vem além embrulhado na sua capa vermelha.
É ele, e dirige-se para tua casa.
Mau: preparemos as mangueiras: parece que vem em paz.
Posso entrar...
Entra.
Ando triste, melancólico, andais escrevendo coisas a meu respeito que me magoam muito.
Não é nenhuma mentira.
Sim, é verdade; descontrolado sou o diabo em figura de gente; não tenho culpa da malvadez humana, cego quando me descontrolam, o mal que faço às pessoas é indesculpável. Sou um destrambelhado quando me soltam o cabresto, penitencio-me pelo mal que ao longo dos séculos tenho causado: para que é que me soltam?
Tens razão; sabe tão bem quando nos aqueces nas noites frias invernosas, o povo até diz: "o fogo é meio sustento." Com rédea curta sirvo a humanidade como ninguém: cozo vossos alimentos, sou purificador e vosso amigo. Porque não me respeitam.
Quando me transformo em fogo de artifício, estrelinhas cintilantes, pequenos fogos-fátuos, quem não gosta de me ver! Nos arraiais, o povo espera que chegue a minha vez de brilhar. Sou o clarão, o facho dos viandantes, dos marinheiros, na noite escura. Juntamente com o ar, a terra e a água somos quatro elementos fundamentais para a vida.
Não devemos brincar contigo, podemo-nos queimar...
Costumamos dizer que determinado local está a ferro e fogo.
Vejam como sou importante, antigamente os sacrários possuíam uma lamparina de azeite que estava acesa dia e noite para o iluminar: fogo sagrado. Nos nossos dias fui substituído pela lâmpada elétrica; sinais dos tempos. E aquele fogo que arde sem se ver! Nas noites de Santo António, São João e São Pedro, o povo salta a minha fogueira.
Livre-nos Deus do fogo do inferno.
Amigo; esse é diferente do meu, se não tiver combustível não existo, o fogo do inferno nunca se extingue. Costumamos dizer; amanhã é a minha prova de fogo, estou em pulgas para a ultrapassar.
Queres um conselho, Amigo, nunca ponhas as mãos no meu fogo, por mais fraquito que seja queimo sempre. Antes que me perguntem dou já a resposta. Antigamente houve gente que me utilizou para queimar desgraçados inocentes, tudo fazia para que esses atos hediondos não acontecessem; "atrasava a queima da lenha" chegava a uma altura que já não aguentava, a combustão fazia-se: as faúlhas eram as minhas lágrimas. Os católicos no sábado de aleluia benzem o lume novo; a igreja está às escuras, de repente afasto a escuridão e venço as trevas.
Se as pessoas souberem utilizar-me, aproveitar-me, são tantas as minhas aplicações.
(Assim Seja)


J.M.S


José Teodoro Prata, 22/09

sábado, 19 de setembro de 2015

Lagariças

Acabo de chegar de um passeio pedestre pelas lagariças da zona da capela de São Lourenço, no Palvarinho.
Nós temos uma ao fundo da Fábrica, mas é impossível não existirem mais.
Na capela de São Lourenço, fiz um contexto histórico, falando das comunidades cristãs de moçárabes que viviam nesta região entre São Vicente e o monte de São Martinho, antes da reconquista cristã, tendo como centros religiosos (paroquiais?) estes templos de mártires cristãos: São Martinho, São Lourenço, São Brás e Senhora da Orada/São Vicente.

Ao contrário de muitas lagariças, como a nossa, em que o pio para onde corria o mosto era cavado na rocha, nesta e noutras o pio seria de madeira, colocado encostado à rocha, no local onde confluíam os "regos" que traziam o mosto.

José Teodoro Prata

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Senhora da Orada

No site http://www.aguas.ics.ul.pt/castelobranco_orada.html, encontrei duas informações importantes sobre a nossa capela. Nenhuma é novidade, mas vale a pena recordá-las:

Perto da ermida, conta freire Agostinho, existia cerca de 1700 uma fonte cuja água muitos devotos utilizavam para se lavarem por lhe atribuírem propriedades terapêuticas. Esta prática curativa era ainda corrente em 1956. Neste ano, escrevia J.M.S. Azevedo: 
«Presentemente, na parte de trás da capela, existe uma fonte que chamam de milagrosa, indo muita gente tomar banho com a água desta, na casa que fica em frente à capela e que foi construída para esse fim, em uma tina que lá se encontra».” (Vasconcelos 1996)

Para baixo do santuário encontra-se uma má construção com tijolo à vista que serve de sanitários públicos e de apoio aos festeiros. Terá sido neste local que existiu o balneário construído na 1ª metade do século XX, para dar apoio aos banhos de romeiros. Por sua vez, este balneário sobrepunha-se a uma estrutura mais antiga, possivelmente uma azenha, como denota o muro de sustentação da roda existente junto do ribeiro.


José Teodoro Prata

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Paulino

Este é o assento de casamento de Joze Paulino, filho de Paulino Leitam.
Estes Paulinos aparecem frequentemente, como testemunhas, nos assentos de batismos já aqui publicados (1800 e seguintes).
O Paulino Leitam terá dado origem ao apelido familiar Paulino, tal como aconteceu com o caso anterior (Hipolito) e outros.

José Teodoro Prata

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Hipólito


Este é o assento de casamento de Hipolito de Jezus, de São Vicente da Beira, com Brizida Maria da Trindade, de São Miguel d´Acha.
É preciso não esquecer que Hipolito de Jezus cumpria serviço militar na fortaleza de Almeida, pelo que era rapaz de largas geografias.
Como expliquei em anteriores publicações, este Hipolito de Jezus é antepassado direto da família Hipólito.
Curioso é que meses depois deste casamento, casou, em segundas núpcias, a viúva de Hipolito de Jezus. Mas não deste, a viúva não se chama Brizida Maria da Trindade.
Continuando a recuar no tempo, lá chegarei ao casamento deste falecido Hipolito de Jezus. E por esse e outros assentos ficaremos a saber porque é que o noivo do assento acima apresentado tomou um nome estranho na sua família. Talvez porque o seu padrinho de batismo foi este falecido Hipolito de Jezus. Mas lá chegaremos, a seu tempo.

Fiz o levantamento dos assentos de batismo, casamento e óbito de 1800 até 1821 (ainda não os publiquei todos, aqui)
Agora parei e comecei a recuar no século XVIII. Por isso encontrei este registo.
O Adelino Costa aderiu a este projeto de recolha de elementos genealógicos e está a trabalhar nas datas a partir de 1822.

José Teodoro Prata

domingo, 13 de setembro de 2015

Estrada Castelejo-São Vicente


Este trecho do mapa dos caminhos de ferro, em Portugal, no ano de 1895, foi publicado na revista VISÃO HISTÓRIA, deste agosto.
As estradas estão apresentadas a preto, sendo as de traço contínuo reais e as de tracejado distritais.
O que me interessa aqui realçar é a estrada já existente, em 1895, do Fundão para São Vicente da Beira. A estrada desce um pouco abaixo da Vila, pelo que o troço da Oriana terá sido construído ainda um pouco antes da data que referi na publicação anterior (cerca de 1900).
Sei, por notícia de um jornal regional, que, na década de 90 desde final do século XIX, estava em construção a estrada junto à ponte do Ramalhoso, sobre a Ribeirinha.
A grande novidade para mim é que a construção fez-se de norte para sul e não de sul para norte, como eu julgava.
É natural, pois a sul da Vila a estrada/caminho era razoável e há muito que a circulação se fazia por lá, sem grandes problemas. No Ramalhoso, já existia uma ponte de pau sobre a Ribeirinha, um pouco abaixo do local da atual. A norte é que era difícil, com a subida até ao Alto da Portela e a descida do Arrebentão, para o Vale d´Urso. Assim, cerca de 1890, uma nova estrada foi rasgada do Vale d´Urso para São Vicente, pela Paradanta. Até esta localidade já existiria um bom caminho, de ligação da Partida, pela Paradanta, ao vale da ribeira das Ximassas (Vale d´Urso e Castelejo). A grande novidade foi mesmo o troço Paradanta-São Vicente.
Por outro lado, todas as informações parecem confluir para uma terceira conclusão: a estrada Alcains-Castelejo foi construída nos dois sentidos, confluindo em São Vicente: primeiro do Castelejo para São Vicente (como indica o mapa) e logo a seguir, quase ao mesmo tempo, de Alcains para São Vicente (segundo notícias da década de 90, na imprensa de Castelo Branco).

José Teodoro Prata

Publicação acrescentada a 14 de setembro:

No início dos anos sessenta do século passado, a estrada que nos liga a Castelo Branco por mais cuidado que os zelosos cantoneiros tivessem na sua conservação: "senhores: António Jerónimo (Tonho da Marta); João Candeias (passaião); João Inês; José Jerónimo (Zé da Marta) " era um tormento "principalmente no inverno." O senhor Lourenço (motorista da Auto Transportes do Fundão) "a pedido do meu pai" nas férias esperava pela carreira de Évora "onde eu vinha" por vezes atrasava-se muito, não podia esperar; recorria aos carros de aluguer; "não gostavam de ir à vila,  estrada lamacenta, cheia de buracos... A vila durante muitas décadas esteve votada ao mais completo abandono, só nos finais dos anos sessenta "com a construção da barragem do Pisco" começou a ter algum progresso. Com a variante "estrada nova" o trânsito deixou de passar dentro de São Vicente. (arquivo J.A.E 
O Novo Dicionário Chorographico de Portugal Continental e Insular "Francisco Cardoso de Azevedo" nos rios da nossa região (Tejo; Zêzere; Ponsul; Aravil; Ocreza) inclui a "nossa ribeira:" Ramalhoso; ribeiro que nasce a sudoeste da Serra da Gardunha, a norte de São Vicente da Beira, próximo de Nossa Senhora da Orada e entra  na Ocreza com cerca de 25 km.
Com a requalificação da estrada e o alargamento das pontes o (nosso rio) ficou com três nomes: Senhora da Orada; Ramalhoso e Ribeirinha. Deve ser caso único: tantos nomes...
E esta, hem?!


J.M.S

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Autossuficiência

Eu nasci na casa da Oriana. A estrada já existia, mas só chegava ao fundo da barreira do Hospital e tinha de se passar pela praça. Foi no tempo do tio solteiro da minha mãe, que lhe deixou a propriedade. Ele lamentava-se por lhe terem cortado os leirões, para fazer a estrada. Isso terá sido por volta de 1900.
Já foi no meu tempo que se abriu a estrada da barreira do Hospital até São Sebastião e por isso é que se chama Estrada Nova. Derrubaram a casa onde morava a minha amiga Céu que depois casou com o José Matias. A casa dela ficava mesmo no sítio por onde passou a estrada e por isso fizeram a casa que está agora por baixo, no Pomar.
Nesse tempo, não se comprava quase nada nas lojas, como agora. O meu pai semeava milho, batatas, tudo o que era preciso para comer. Também tinha vinho suficiente para ele, mas não se bebia todos os dias! O azeite era das nossas oliveiras e até vendíamos. O teu avô vendia todo o azeite dos Canavéis, porque era de azeitona bical que dá um azeite muito fino. Por isso é que as oliveiras eram tão altas. Os homens, mesmo na ponta das escadas, mal chegavam aos ramos de cima. Até metia medo! Nesse tempo não se cortavam as oliveiras como agora, que é uma estragação.
­­De carnes, tínhamos o porco, as galinhas e uns borregos ou cabras. Comia-se o que havia. Também tínhamos árvores de fruto nos leirões da Oriana: laranjeiras, ameixeiras, macieiras…
Uma vez por ano, os sapateiros iam à nossa casa a fazer sapatos para todos. Trabalhavam na varanda. Eram o João Hipólito, o Fausto, o António Maria ou outros. Mas antes, o meu pai ia a Tinalhas, a pé, para comprar o cabedal, as solas e o fio. As roupas éramos nós que as fazíamos, com peças de pano que comprávamos. O mesmo com as mobílias, pois a nossa casa era uma casa de carpinteiros, o meu pai e os meus irmãos António e José.
Mas não julgues que vivíamos muito bem! Eu e as minhas irmãs dormíamos no quarto escuro ao lado do corredor e no inverno lembro-me de passar as noites a tremer de frio, só tapadas com uma mantita.
Semeávamos linho no lameiro e depois era arrancado, mergulhado na ribeira, posto a secar, batido com um maço, ripado e fiado. Com o fio tecíamos os panos de linho, para as roupas do corpo e da cama. Antes de casarmos, eu e cada uma das minhas irmãs tivemos de tecer todo o nosso enxoval: peças de linho e colchas. Fazíamos lençóis e fronhas que depois bordávamos. Eu fui das últimas a casar, porque era das mais novas. Como tinha um enxoval muito grande, a minha mãe foi à arca e tirou-me algumas peças, pois queria que todas as filhas levassem um enxoval igual. Tinham-me dado tanto trabalho!
Namorei com o teu pai cinco anos. Começámos antes de ele ir para a tropa e depois mandava-me cartas de Castelo Branco que um soldado lhe escrevia. Quando saiu, começou a aprender de pedreiro. Não podíamos casar sem ele ter um ofício para ganhar a vida.
O teu pai acompanhava-me no caminho da missa para casa, aos domingos. Com o tempo, ele já não se ia embora e eu vinha à janela e ficava a falar com ele. Depois ficávamos sentados à porta, mesmo no tempo frio, e mais tarde já namorávamos dentro de casa. Mas os meus pais arrependeram-se, porque ele era mais pobre do que nós. Voltámos a namorar à porta e um dia a avó até lhe atirou com água, para ele se ir embora. Mas não desistimos e eles acabaram por se conformar.
Depois casámos e nascestes vós…

José Teodoro Prata

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Paz e fraternidade

A volta ao mundo III
Novo dia, novos momentos do pensador,
Observo a estátua daquele senhor
Que está na grande praça chinesa
Praça de mártires, mesmo assim é uma beleza
Cidade grandiosa esta Pequim
Ainda bem que cá vim
Já que estou na China vou aproveitar
A grande e enorme muralha visitar
Vê-se da lua, tal a sua grandiosidade
Nunca vi nada assim, já matei minha curiosidade
Sinto-me esmagado, parto a matutar
Quantos morreram aqui a trabalhar
China, traz Macau à minha imaginação
Já foi portuguesa, fruto de nossa vitória é minha opinião
Desbaratamos os piratas que enxameavam o mar
A China deu-nos aquele palmo de terra para nos recompensar
Santo Nome de Deus, Macau é nosso irmão
Está longe, mas muito perto do nosso coração
Sai de Macau com vontade de voltar
Goa, terra do santo Xavier, tinha que cá passar
Damão, Diu; ena tantas recordações
Igrejas onde se escutaram muitos sermões
Albuquerque, construtor de fortalezas
Conquistador, muito amou as gentes goesas
Pensamento não tem barreiras
Nem portas ou outras trincheiras
Mais rápido que o relâmpago quero lembrar...
Timor tão longe e tão perto está; basta olhar
Santa Cruz, onde ao trom dos canhões
Mártires morreram indefesos aos montões
Austrália, terra de contrastes ali tão pertinho
Tem verdor, floresta e um deserto grandinho
Olha os cangurus com os filhotes na barriga
Saltam tanto, para eles não há fadiga
Sydney com sua ópera, vou entrar um bocadinho
Bem que se está neste cantinho
Eis que arribo a Tóquio, tão bela e formosa
Cidade  enérgica, moderna e famosa
Fugi tão linda, de neve carregadinha
Que beleza esta serra tão branquinha
E as cerejeiras no tempo da floração
São um símbolo do Japão
Egipto, terra do rio Nilo o irrigador
Tão grande que é, tem tanto vigor
Pirâmides, cidades soterradas
A pouco e pouco vão sendo desenterradas
Múmias, esfinges, tudo tratado com amor
Terra antiga, bela, sim senhor
Angola, é uma grande nação
País nosso irmão 
Luanda é a sua capital
Cidade já muito industrial
Diamantes, petróleo... terra querida
Tua baía e praias te dão muita vida
Moçambique, Pátria do Gungunhana, veio para Portugal
Mouzinho submeteu-o ao nosso poder real
Berço do Mia Couto e do Eusébio o bom jogador
Tanta alegria nos deu este senhor
Gungunhana; és para teu povo um herói nacional
Apesar de te terem  tirado da tua terra natal
Eis que cheguei às quentes terras brasileiras
Onde as pessoas são alegres e porreiras
Rio de Janeiro, favelas, Copacabana, Corcovado
Num alto morro está implantado
Tuas praias estão rodeadas de palmeiras
Areais sem fim, são as primeiras
Manaus, pelo grande rio é banhada
Recife, Baía, Pernambuco, Brasília, terra amada
Samba, telenovelas e carnaval
Pulam e dançam em qualquer local
Jorge Amado, Drumond... nação bela, adorada
Ainda não sai da minha casa, da minha sacada
Nova Iorque cidade da alta finança
Onde um dia gente má e por vingança
Destruíram dois edifícios altos e populosos
Assuntos sensíveis, belicosos
Nunca dorme, cosmopolita
Multicultural, valeu a pena esta visita   
Canadá, terra de grandes horizontes
Searas sem fim. Ao longe montes
Otava é a capital desta grande nação
Quebeque, Montreal; que emoção
Neves eternas, rios, glaciares e fontes
Niagara, cataratas, grandes mastodontes
Meu pensamento nesta hora e momento
Divaga na Patagónia e nos Andes veloz como o vento
Terras de antigas civilizações
Cortez eliminou muitas das suas tradições
Pela sede do vil metal, sem pensar e truculento
Assassinou seus chefes, soldado violento
Antes de findar, é com emoção
Com muita fantasia e inspiração
Que visito Nazaré e Jerusalém
A gruta onde nasceu o Menino de Belém
Mar Morto, Calvário, Galileia, Rio Jordão
Tudo guardarei como recordação e gratidão
Termino esta minha divagação
Podem crer, nesta narração
Vi tanta coisa bela e maravilhosa
Gente ordeira e comida saborosa
Mas a mais bela, é o meu Lar, o meu Torrão
VIVA A PAZ, A FRATERNIDADE E A UNIÃO


Zé da Villa

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

As alminhas

São monumentos, alguns muito simples, situados quase sempre à saída ou à entrada das povoações, que apelam à oração pelas almas do purgatório. Curiosamente, na nossa terra, apesar da grande religiosidade e culto dos mortos, não existe nenhuma.
Mas encontrei esta, no Tripeiro.

 

Pela inscrição, no cimo, data de 1771 e foi reconstruída em 1957.



Para quem não conseguir ampliar a imagem, a inscrição em baixo diz: «Ó vós que passais, lembrai-vos de nós, que no fogo sofremos tormento atroz».


Esta está junto ao cemitério do Casal da Serra.

 

Não tem data nem qualquer inscrição, e em vez da imagem da Nossa Senhora tem um Cristo na cruz, mas representa também as almas do purgatório.



Esta está na estrada entre a Partida e o Vale de Figueira. Terá sido mandada fazer por intenção de Francisco Martins.



Esta, mais simples, está à saída da Partida, a caminho dos Pereiros. Apela
também à oração por alma de Francisco Martins.



Esta está à entrada do Sobral do Campo. Faz lembrar a do Tripeiro e a inscrição que encima o monumento é quase igual.



Passamos muitas vezes por esta, à saída da Póvoa de Rio de Moinhos.



E por fim esta, numa fonte à entrada do Louriçal. A mesma imagem e o mesmo apelo à oração por aqueles que sofrem no purgatório.

Deve haver muitas mais nas terras à nossa volta. Um bom tema, quem sabe, para outro trabalho de pesquisa, à semelhança das alcunhas…


M. L. Ferreira


Altar das Almas. Igreja Matriz de São Vicente da Beira

J.M.S. 
(adicionado a 07/09/2015)