terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

O nosso falar: abelhudo e desabelhar

 Andámos a fazer o desdobramento de uma colmeia e no final uma abelha não nos largava, por mais fumo que lhe lançássemos em cima.  

- Desabelha daqui! – disse-lhe o Chico. E rimo-nos, porque a expressão vinha mesmo a calhar.

A abelha anda sempre de um lado para o outro, numa constante azáfama, por isso chamamos abelhudo a alguém com a mesma caraterística, sobretudo se aparece de forma constante e inoportuna. E desabelhar é mandar o abelhudo dar uma volta, desaparecer. Neste caso era mesmo uma abelha!

José Teodoro Prata

sábado, 24 de fevereiro de 2024

Conta-me histórias: sessão inaugural

 


Juntámo-nos à Comissão das Festas de Verão, para dar também o nosso contributo. O primeiro cartaz é o do projeto Conta-me Histórias, que será usasdo para publicitar todas(?) estas tertúlias.

A organização é d´Os Amigos dos Enxidros. Dos Amigos, porque a realização das tertúlias e o êxito que tiverem será sempre mérito de quem as anime e de quem vá assistir. Dos Enxidros, porque lancei o projeto através do blogue Dos Enxidros e porque os enxidros eram, no passado, os baldios da encosta da serra, entre a vila e os altos, da Oles à Senhora da Orada. Tal como os enxidros, este projeto também se quer de todos. A foto que serve de base ao cartaz é da Rua da Misericórdia, antes da demolição da casa do coronel (ela simboliza aqui um pouco do passado que estará presente em cada história que for contada).

Agradeço que divulguem o cartaz nas redes sociais que frequentam.

José Teodoro Prata

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

Homenagem ao ZÉ TALETA

 


Parabéns ao Zé, porque é um bom homem e um corajoso lutador.

Uma homenagem mais que merecida, que também honra quem com ela sabe ser agradecido pelo muito que o Zé nos deu a nós, com o seu exemplo, e à nossa terra, elevando o seu nome tantas vezes ao pódio.

Um dia, o José Mário Branco, 
preocupado com a pobreza da música portuguesa, lançou o repto: 
Que floreçam 100 Marcos Paulos!
Também entre nós todas as iniciativas devem ser acarinhadas, 
para darmos mais vida à nossa comunidade.

José Teodoro Prata

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

O nosso falar: espigos

 Levei grelos de couve-naba a uma amiga do Norte e ela gabou-me a excelência do arroz de espigos, em especial de couve galega. Cada vez que eu falava de grelos, ela respondia-me com espigos e a certa altura disparou:

- Porque é que não dizes espigos?

- Na minha terra também se diz espigos, mas aqui só se fala em grelos… - justifiquei-me.

Quis ser simpático e coloquei-me ao nível dos albicastrenses, mas lixei-me, pois a minha amiga não transige com as suas raízes.

No resto da conversa já só se falou de espigos.

José Teodoro Prata

sábado, 17 de fevereiro de 2024

Sem pingo de compaixão

Viriato Soromenho Marques, professor universitário, in Diário de Notícias

O filósofo Schopenhauer (1788-1860) considerava a compaixão (Mitleid) como o sentimento moral por excelência, e por isso uma das características fundamentais da nossa condição humana. Ser capaz de sentir o sofrimento dos outros, sejam eles humanos ou animais, tinha, para o pensador alemão, uma raiz ontológica fundamental. A dor dos outros, despertava em nós uma espécie de compreensão intuitiva de que todos os seres partilham uma vontade de viver original.  Isso é válido para a mãe que corre risco de se afogar para arrancar o seu filho das ondas, ou para o homem que se deixa imolar pelo fogo na tentativa de salvar o seu cão. A comunhão do sofrimento rompe com a ilusão do egoísmo, mesmo antes da nossa mortalidade o provar definitivamente.

Lembrei-me de Schopenhauer ao perceber o crescente estado de morte ética do Ocidente. Bem sei que a política e a ética estão muitas vezes em rota de colisão. E que o moralismo na política internacional é usado, frequentemente, para esconder a face horrenda de interesses inconfessáveis. Contudo, tudo tem limites. Refiro-me concretamente à maneira inqualificável como uma série de países ocidentais reagiram a um “relatório” de 6 páginas apresentado por Israel aos países doadores da UNRWA, a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina, que neste momento é o único suporte de vida de dois milhões de sobreviventes nas ruínas de Gaza, onde a violência das tropas de Telavive se transformou num horrendo “novo normal”.

Israel acusou 12 funcionários da UNRWA de terem participado nos ataques do Hamas de 7 de outubro. Mais tarde, o número caiu para metade, dando razão ao chefe da Agência, Philippe Lazzarini, que considerou inconsistente esse documento acusatório. Apesar de a Agência ter 13.000 funcionários, e de as acusações terem sido apontadas pelo Estado agressor, que tem a correr contra si no ICJ, em Haia, uma séria acusação de genocídio, a verdade é que, logo após a divulgação do texto acusatório, uma constelação de países ocidentais decidiu - antes de qualquer investigação independente se debruçar sobre a acusação - suspender o financiamento à UNRWA. Escrevo aqui os nomes mais sonantes desses países que resolveram juntar-se aos algozes do povo de Gaza: EUA, Austrália, Canadá, Reino Unido, Alemanha, França, Itália, Países Baixos, Finlândia, Japão.

Portugal recusou integrar essa tribo de indignidade. Escrevo-o com a alegria rara de saudar alguma medida acertada do Governo. Pelo contrário, Lisboa aumentou o seu contributo, para compensar a perda de financiamento provocada pelos desertores. António Guterres nomeou uma Comissão de Investigação Independente, liderada por Catherine Colonna, ex-ministra francesa dos Negócios Estrangeiros, suportada por 3 reputados institutos escandinavos. O relatório só estará finalizado em abril. Isso significa que corremos o risco de muitos milhares de vidas serem perdidas, vítimas da fome e da doença, se até lá a Agência continuar subfinanciada. Atrevo-me a dizer que o que está em causa não são os 6 funcionários acusados, mas a hipócrita desumanidade de Estados, saturados de uma retórica de valores e direitos, convertidos agora à lógica de extermínio praticada por Israel.

Quem pune um povo inteiro, é quem não reconhece dignidade pessoal aos seus membros. Sem compaixão, a vida humana ficará cada vez mais descartável. Pressinto que estes são apenas os primeiros sinais de uma imensa e crescente barbárie. Intensa e sem santuários.

 José Teodoro Prata

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

AMOC

Há novas notícias sobre a Circulação Meridional do Atlântico (sigla AMOC, do nome inglês), popularmente conhecida por Corrente do Golfo.

Já não é a primeira vez que aqui escrevo sobre este importante fenómeno natural, que permitiu os descobrimentos portugueses e todas as posteriores navegações à vela no Atlântico. É uma corrente de água no nosso oceano, que movimenta mais água do que todos os rios terrestres juntos.

Poder ler-se um artigo aqui (mas há muita informação na net sobre este fenómeno natural):

https://www.publico.pt/2024/02/09/azul/noticia/circulacao-atlantico-ja-estar-caminho-colapso-sugere-novo-modelo-2079544


Este rio oceânico traz água quente do Golfo do México, suavizando o clima europeu nas estações frias.

Era graças a ele que os portugueses davam a volta pelos Açores, quando queiram regressar da costa africana: quem vinha da Ásia, do Brasil ou simplesmente do Golfo da Guiné ou da zona de Angola, parava em Cabo Verde e depois dava a volta pelos Açores em vez de seguir em linha reta junto á costa africana. Era muito mais longe, mas mais rápido, devido à AMOC.

Também foi graças a ela que os viquingues, por volta do ano 1000, partiram da Escandinávia e povoaram a Islândia e a Gronelândia, chegando à América do Norte. Há indícios de que também terão povoado nessa altura os Açores, pois, como podem ver pelas setas da AMOC, a corrente levava-vos em linha reta da escandinávioa para a Gronelândia, mas no regresso tinham de dar a volta por baixo.


Nesta imagem podemos ver a AMOC em toda a sua extensão atlântica.

Infelizmente, as novidades acima referidas não são boas. A corrente está a abrandar e pode vir a parar, pois a temperatura dos oceanos, nas zonas polares, está a subir muito e a água esta a perder a salinidade, devido ao degelo dos glaciares.

O fenómeno da AMOC é semelhante ao do vento: o ar movimenta-se de zonas quentes para frias e vice-versa (se a temperatura for semelhante em todas as zonas, não há vento) e a água movimenta-se de zonas quentes para frias e vice-versa, devido à temperatura da água e ao seu grau de salinidade.

Consequências? Fim dos invernos amenos nas costas atlânticas da Europa, daqui a umas dezenas de anos. Viram as notícias das recentes tempestades de neve nas costas atlânticas da América do Norte? À mesma latitude, nós temos entre 5 a 10 graus a mais do que eles.

José Teodoro Prata

domingo, 11 de fevereiro de 2024

Hipólito Raposo e os Candeias

 Acabo de chegar de São Vicente, onde participei na palestra do José Miguel Teodoro sobre o patrono da nossa biblioteca, o Hipólito Raposo.

No final, desejando ligar esta personalidade histórica com a atualidade vicentina, afirmei estar ele ligado aos Candeias, com destaque para o João Prata Candeias, que estava presente.

A verdade é que a sua ligação é direta não com este, mas com os primos dele, filhos de João Candeias e Maria de Jesus, pois esta descende dos mesmos antepassados do Hipólito Raposo (na próxima terça-feira completam-se 139 anos que nasceu Hipólito Raposo, na casa onde vive atualmente a sua familiar Amélia Candeias com o marido Carlos Cruz).

De facto, existe uma outra ligação ainda mais antiga aos Candeias e foi essa que me levou ao equívoco:

Em 1840, casaram José Hipólito de Jesus e Ana Raposa, esta filha de Maria Candeias e neta de Ana dos Santos Candeias. Desse casamento nasceu, entre outros, João Hipólito Vaz Raposo, que casou com Maria Adelaide Gama, em 1872. Tiveram, entre outros, José Hipólito Vaz Raposo, o conhecido patrono da biblioteca, que nasceu em 1885. Afinal, era a avó paterna do Hipólito Raposo que era dos Candeias.

Obrigado ao José Miguel Teodoro que veio de Lisboa de propósito para partilhar uns momentos connosco. E às dinamizadoras da biblioteca (Celeste, Libânia e Conceição), que organizaram o evento e nos ofereceram o lanche que permitiu prolongar o nosso convívio.

José Teodoro Prata

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2024

sábado, 3 de fevereiro de 2024

Mais uma corça lusitana

 No livro Novelas do Minho, de Camilo Castelo Branco, mais propriamente na novela Maria Moisés, refere-se a origem do topónimo Santarém.

Já aqui escrevemos sobre o culto da corça pelos Celtas (0s Lusitanos eram Celtas) e da sua presença nas lendas de São Pedro de Vir-A-Corça, Monsanto, e da Senhora da Orada, São Vicente da Beira.

Mas vamos então ao Camilo:

O rei da Lusitânia Gorgoris teve uma filha que se apaixonou por um homem de baixa extração. O que denunciou estes amores foi, diz Bernardo de Brito em uma palavra de cunho português de lei, foi a «emprenhidão».

 - Credo! Que palavra! – exclamou com engulho D. Maria Tibúrcia.

- Não parece palavra de pessoa eclesiástica! – notou a outra senhora não menos escandalizada.

O mano Teutónio, como tinha piscado o olho direito ao cónego, ria-se, e o cónego, com a maior gravidade, disse:

- Minhas senhoras, os antigos faziam as coisas e diziam-nas; hoje em dia a civilidade não permite dizê-las. Ande lá com a filha de Gorgoris, sr. desembargador.

- Deu ela à luz um menino, que o avô deitou às feras; e, como as feras o não comessem, atirou-o ao Tejo. Foi o menino encontrado no sítio que hoje chamam Santarém; e, como quer que uma corça lhe desse o primeiro leite, chamou-se o menino Abidis, e daí veio chamar-se o lugar Esca Abis (manjar de Abidis), e, corrupto, Scalabis, etc.

Notas:

Frei Bernardo de Brito (1569-1617) escreveu uma monumental História de Portugal, em oito volumes, chamada Monarchia Lusitana. É a ela que o desembargador se refere para explicar a origem do nome Santarém.

Nestas 3 situações em que intervém uma corça a amamentar um bebé nascido de uma gravidez indesejada (no caso da nossa Orada, a corça alimenta a moça ainda grávida), a corça é como uma mãe que se dá num amor incondicional. Seria essa a caraterística que os Celtas atribuíam à corça, no culto que lhe prestavam?

José Teodoro Prata