domingo, 10 de novembro de 2013

Almas Penadas II

 Quem conta um conto…

A propósito das Almas Penadas, fiquei de ir confirmar a existência das duas cruzes a que a história publicada em junho faz referência.
Um dia destes meti-me ao caminho e, um pouco à frente dos Pereiros, lá estava a primeira.
                     
Logo a seguir à Partida, encontrei a outra.


As cruzes são muito semelhantes. Numa vê-se a data de 1955 e as iniciais F M; na outra, que parece ter sido alterada posteriormente, está escrito o nome F. Martins. Será o nome de quem as fez ou mandou fazer.

Continuei pela estrada adiante e, pouco depois, avistei o Vale de Figueiras, uma  espécie de presépio que, atravessado pelo ribeiro, trepa encosta acima.
Atravessei a ponte para o lado de lá, dei uma volta pelas ruas e não avistei vivalma: um presépio sem figuras…
Tive mais sorte do lado de cá, junto à capela, onde encontrei a Ti Maria dos Anjos, uma mulher simpática, faladora, e que foi provavelmente a última tecedeira da freguesia. Ficámos um bom bocado à conversa. Ela a falar dos tempos passados, as casas cheias de gente, a terra a retribuir tudo o que lhe davam; quatro teares em casa, todos a tecer, uma alegria!... Agora, só maleitas, dela e da família; as terras, sem gente que as trate; as ruas sem crianças (a pessoa mais nova tem vinte anos…). «É quase já só velhos…» concluiu, com alguma tristeza. Eu, alimentando a conversa como podia, mas sobretudo ouvindo.
Às tantas, como quem não quer a coisa, disse-lhe que tinha visto uma cruz na estrada, se ela sabia porque é que a tinham ali posto. Respondeu prontamente:
 - Sabe? Nós aqui na terra nunca tivemos cemitério e quando alguém morria tínhamos que o ir enterrar na Partida. Como também não tínhamos a estrada arranjada para cá virem os carros funerários, como agora já temos, o povo ia a pé e o caixão, eram os homens que o carregavam aos ombros; e era ao pé daquela cruz que parávamos para descansar e rezar. Depois continuávamos pelo cabeço acima, até ao cemitério.
 - Devia ser difícil, porque ainda é longe e o caminho quase sempre a subir…
 - Sabe lá! … E no inverno, com a chuva e o frio? A melhor coisa que nos fizeram, foi esta estrada… Graças a Deus!
E logo a seguir, como que a contar um segredo, acrescentou:
- Mas sabe? Também contam uma história sobre aquela cruz e mais uma que está já a caminho dos Pereiros e outra na Partida.
  Fiz-me de nova e pedi que me contasse a história.
- Diz que há muitos anos, havia uma mulher na Partida (ela era daqui, mas tinha lá casado) que ficou viúva muito cedo e já com um rebanho de filhos. Uns tempos depois do homem morrer, começou a aparecer-lhe como se fosse uma luz e a mulher já andava a ficar com medo. Um dia ouviu uma voz que lhe disse que era o homem dela e vinha a pedir-lhe que mandasse fazer duas cruzes que tinha prometido antes de morrer, mas como não tinha cumprido a promessa, ainda andava por aí, feito alma penada. A mulher prometeu que sim, que mandava fazer as ditas cruzes; mas as posses não eram muitas e também morreu sem cumprir o prometido. Então, já depois de morta, começou a aparecer ao filho. Para onde quer que ele fosse, lá estava ela. Ficava parada, a olhar para ele, mas sempre muda. O rapaz já andava a ficar desacorçoado e sem saber o que fazer à vida. Um dia, já ao cair da noite, chegou a casa e lá estava a mãe, vestida tal e qual como andava antes de morrer: toda de preto, embrulhada no xaile, com o lenço amarrado à cabeça, sentada no banquinho onde se costumava sentar em vida, ao canto do borralho. O rapaz ficou todo arrepiado, mas a mãe olhou para ele e disse-lhe assim: «Olha, meu filho, bem sei que andas com medo, mas está descansado que não te quero fazer mal. Só te quero pedir que me faças um favor». «Então e qual é o favor que vossemecê quer de mim, minha mãe?». «Olha, filho, depois do teu pai morrer, apareceu-me a pedir que mandasse fazer duas cruzes porque se não, não podia ir para o céu. Eu disse-lhe que sim, mas como os tempos eram ruins e o que tinha mal dava para matar a fome a ti e aos teus irmãos, não pude cumprir o prometido. Por causa disso ainda andamos os dois por aí, feitas almas penadas. Queria que mandasses tu fazer as cruzes, para podermos ter sossego». «Então e aonde é que vossemecê quer que se ponham as cruzes?» «Olha, meu filho, mandas pôr uma a caminho da Partida para o Vale da Figueira que era a minha terra, e a outra da Partida para os Pereiros, que foi aonde o teu pai nasceu. Mas queria que mandasses fazer também uma no alto da Partida, que foi onde nasceste tu e os teus irmãos». O rapaz disse que sim, que cumpria o prometido logo que pudesse. E assim fez. Como também era pobre, ainda teve que pedir umas notas emprestadas a um vizinho, mas logo que pôde, falou a um homem lá da terra e encomendou-lhe as cruzes, todas em pedra de cantaria. Diz-se que enquanto andou a fazer o trabalho, por cima dele andaram sempre duas borboletas brancas a voar. Depois da obra acabada, viram-se as borboletas a subir, devagarinho, direitinhas ao céu…

Nota: Quando regressei do Vale de Figueiras e passei pela Partida com intenção de confirmar a existência da terceira cruz, já era quase noite, por isso nem tentei procurá-la. É um bom pretexto para lá voltar um dia destes. Por aquilo que vi e ouvi, vale a pena…

M. L. Ferreira

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Óbitos, 1801

ÓBITOS
Registos Paroquiais de São Vicente da Beira
1801

  • No mês de março, não foi registado nenhum óbito.
  • Faleceram duas pessoas de AVC (apoplexia); o n.º 6 e a n.º 15.
  • O casal Manoel Lopes e Cecilia Maria, de São Vicente, perdeu dois filhos menores neste ano de 1801: a Flora (n.º 14) e o Manoel (20).
  • O Joze apareceu morto em casa da pessoa mais importante da Paradanta: Manoel Leitaõ. Rico, só de trabalho, mas livre da miséria em que vivia a maioria das pessoas da época. Joze seria seu criado, talvez pastor ou ganhão. Como era de fora (Barroca) e não contribuía para a Igreja, ficou sepultado no adro.
  • Este ano de 1801 foi um autêntico holocausto para as crianças (como eram muitos outros anos): dos 46 óbitos, 30 foram de menores (de 14 anos ou menos) – 65%.
  • Saldo fisiológico: nasceram 42, morreram 46 = -4 (no ano de 1800, o saldo fora de -2). A população oscilava entre saldos positivos nuns anos e negativos noutros, por isso o crescimento demográfico era muito ténue. Por volta de 1800, nalgumas regiões da Europa, já a população começara a crescer de forma contínua. Em Portugal, a evolução era mais lenta, devido à miséria em que se vivia, mas estes saldos negativos dois anos seguidos nem na região de Castelo Branco eram já normais. Assim, pelo Censo de 1801, sabemos que o saldo fisiológico do Sobral do Campo foi de +2; Louriçal do Campo: +9; Ninho do Açor: -3; Freixial do Campo: 0; Tinalhas: +12; Póvoa de Rio de Moinhos: 0; Almaceda: +14; Sarzedas: +40. O Censo de 1801, relativo a São Vicente, está rasurado e tem 44 nascimentos. A pergunta era sobre os que nasceram e não sobre os que foram batizados. O cura vigário terá escrito 41 (os que indiquei na publicação de há semanas), mas depois acrescentou mais 3, que talvez tivessem morrido à nascença sem terem sido batizados. Assim pelo Censo de 1801, o saldo fisiológico de São Vicente foi de -2 e não de -5, em todo o caso negativo. Parece que a existência de uma elite de lavradores abastados, em São Vicente, que detinham a maioria da terra, tornava mais precária a vida das pessoas.


1
Joaquim (menor)
Naturalidade: Mourelo
Família: filho de Faustino Rodrigues e Joana Leitoa
Data: 23/01/1801

2
Antonio (menor de 4 anos)
Naturalidade: Mourelo
Família: filho de Joze Francisco e Jozefa Leitoa
Data: 23/01/1801

3
Mathias Marcos
Naturalidade: São Vicente
Família: casado com Maria Faustina
Data: 31/01/1801

4
Antonia Maria
Naturalidade: São Vicente
Família: mulher de Joaõ da Costa
Data: 31/01/1801

5
Joaõ Vas Ramos
Naturalidade: São Vicente
Família: casado com Joana Duarte
Data: 01/02/1801

6
Doutor Antonio Mesquita de Carvalho
Naturalidade: São Vicente
Família: viúvo de Maria Antonia
Data: 03/02/1801
Nota: faleceu de uma apoplexia (AVC)

7
Joze (menor, de 6 meses)
Naturalidade: Vale de Figueiras
Família: filho de Manoel Francisco e Maria Leitoa
Data: 19/02/1801

8
Anna (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Antonio Nunes e Maria Joana
Data: 24/02/1801

9
Joana Duarte
Naturalidade: São Vicente
Família: viúva de João Vas
Data: 28/02/1801

10
Ignes (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Manoel do Espirito Santo e de Barbara Leitoa
Data: 08/04/1801

11
Domingos (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filho de João Leitão Canuto e Izabel Maria
Data: 19/04/1801
Nota: já fora batizado em perigo de vida

12
Maria (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Jeronimo Duarte e Maria Antonia
Data: 22/04/1801

13
Maria (menor)
Naturalidade: Vale de Figueiras
Família: filha de Joze Antonio e de Pulqueria Antunes
Data: 26/04/1801

14
Flora (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Manoel Lopes e Cecilia Maria
Data: 27/04/1801

15
Maria Leitoa
Naturalidade: Pereiros
Família: mulher de Joam Nunes
Data: 10/05/1801
Nota: faleceu de uma apoplexia (AVC)

16
Maria Rodrigues
Naturalidade: Tripeiro
Família: viúva de Joaõ Fernandes Baranda
Data: 20/05/1801

17
Antonia (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Joze Pereira e Brites Maria
Data: 25/05/1801

18
Manoel Fernandes
Naturalidade: São Vicente
Família: casado com Izabel Maria
Data: 02/06/1801
Nota: caçador, pobre

19
Domingos (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filho de Martinho Rodrigues e Margarida Antonia
Data: 13/06/1801
Nota: já fora batizado em perigo de vida

20
Manoel (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filho de Manoel Lopes e Secilia Maria
Data: 27/07/1801

21
Antonio (menor)
Naturalidade: Tripeiro
Família: filho de Joze Matheus e Maria Francisca
Data: 28/07/1801

22
Anna (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: Joaõ Bernardo e Francisca Maria
Data: 03/07/1801

23
Francisco (menor)
Naturalidade: Casal da Serra
Família: filho de Francisco Rolão e Maria Duarte
Data: 04/07/1801
Nota: já nascera em perigo de vida e foi batizado particularmente pelo Capitão João Duarte

24
Anna (menor)
Naturalidade: Partida
Família: filha de Silvestre Francisco e Roza Maria
Data: 07/07/1801

25
Francisco (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filho de Mathias Marcos e Maria Faustina
Data: 13/07/1801

26
Joaquim (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filho de Manoel Duarte e Francisca Maria
Data: 15/07/1801

27
Francisco (menor)
Naturalidade: Casal da Serra
Família: filho de Joze Pestana e Maria Francisca
Data: 26/07/1801

28
Joze (menor)
Naturalidade: Partida
Família: filho de Joze Antunes, viúvo
Data: 31/07/1801

29
Padre Joze Antonio Fernandes Freire
Naturalidade: Partida
Família: não indicada
Data: 07/08/1801

30
Mathias (menor)
Naturalidade: Casal da Serra
Família: filho Manoel Martins e Izabel Duarte
Data: 19/08/1801

31
Joaquim (menor)
Naturalidade: desconhecida
Família: exposto na porta dos enjeitados da Vila e dado a criar a Anna Izabel, solteira, filha de Maria Duarte, de São Vicente
Data: 01/09/1801

32
Domingos Lourenço
Naturalidade: São Vicente
Família: viúvo de Joana Baptista
Data: 02/09/1801
Nota: Pobre

33
Joaquim (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filho de Domingos Lourenço e Tereza de Oliveira
Data: 08/09/1801

34
Maria Lourença
Naturalidade: São Vicente
Família: viúva de Joaõ Joze
Data: 11/09/1801

35
Anna (menor)
Naturalidade: Mourelo
Família: filha de Joze Luis e Maria
Data: 20/09/1801

36
Joze (menor)
Naturalidade: Partida
Família: filho de Manoel Joze e Antonia Maria
Data: 22/09/1801

37
Feleciana da Costa
Naturalidade: São Vicente
Família: não indicada, pelo que se conclui que seria adulta
Data: 08/10/1801
Nota: solteira e pobre

38
Joze (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filho de Antonio da Silva e Brites Leitoa
Data: 08/10/1801

39
Maria (menor)
Naturalidade: desconhecida
Família: exposta na roda da Vila, no dia 17 de setembro de 1801
Data: 19/10/1801

40
Micaella Rodrigues
Naturalidade: Partida
Família: viúva de Manoel Fernandes, soldado
Data: 28/10/1801

41
Joze
Naturalidade: Barroca, freguesia do Castelejo
Família: foi achado morto em casa de Manoel Leitão, da Paradanta (seria seu criado)
Data: 09/11/1801
Nota: foi feito exame pela justiça (autopsiado) e sepultado no adro da Igreja

42
Anna Francisca
Naturalidade: Partida
Família: mulher de Joze Leitaõ
Data: 10/11/1801

43
Manoel Joze
Naturalidade: Partida
Família: casado com Antonia Maria
Data: 16/11/1801

44
Maria (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Joze Leitaõ Canesto(?) e Izabel Maria
Data: 07/12/1801

45
Anna Pires
Naturalidade: Salgueiro, mas a viver em São Vicente
Família: mulher de Francisco Jorge Barrozo
Data: 14/12/1801

46
Joze (menor)
Naturalidade: Casal da Serra
Família: filho de Antonio de Matos e Maria Joana
Data: 19/12/1801

José Teodoro Prata

domingo, 3 de novembro de 2013

IN ILLO TEMPORE

No tempo em que o Agostinho (Sargento) era garoto, vivia no Cimo de Vila, na casa que pertence agora à Cila, a funcionária da Junta de Freguesia.
O Agostinho (Sargento) sempre foi uma pessoa rude, mesmo em criança.
Numa célebre Quinta Feira Santa realizou-se à noite a procissão do Ecce-Homo, na qual uma das imagens, penso que o Senhor do Bom Fim, tinha e ainda tem uma corda a envolver-lhe as mãos e o pescoço.
O Agostinho que estava à janela a ver passar a procissão, quando enxerga a imagem,  vira-se para dentro de casa e diz muito alto:
- Ó  madrinha, venha cá depressa que vem aqui  um santo com uma corda atada ao focinho!

SI NON EST VERO!

Foi também numa Semana Santa que a imagem do Senhor na cruz teve que viajar para Norte, a fim de ser submetida  a um processo de restauração.
Por isso tiveram que arranjar um rapaz que substituísse a imagem do Cristo, para se realizarem as cerimónias.
Naquele ano, a Maria Madalena era uma moça de seu nome Henriqueta, cujo papel se resumia a estar agarrada aos pés do Cristo durante toda a cerimónia.
Procuraram a faixa de pano  para por à cintura do rapaz, para depois  o  atarem à cruz, mas não a encontraram e por isso tiveram que lhe enrolar um papel com uns alfinetes a segurar, o que o deixou numa situação precária.
Rasgam-se os véus do Tempo e que quadro mais bonito!
A Henriqueta tinha o cabelo comprido e, com o vento que fazia, esse mesmo cabelo voava e batia  nas pernas do rapaz. Além disso, na posição incómoda em que ela se encontrava, estava sempre a mexer-se,  de tal forma que o papel da cintura do rapaz começou a levantar-se.
O rapaz aflito baixa a cabeça para a Maria Madalena e diz-lhe:
- Stá quieta Henriqueta que se rasga a papeleta!
O Pregador que se encontrava no púlpito, mesmo em frente ao Calvário, a comentar aquela cena tão triste, apercebeu-se  do que se estava a passar. Salta do púlpito e a correr vem com a sobrepeliz para tapar aquela desgraça.
O pobre do rapaz ainda mais aflito vira-se para o Pregador e diz-lhe lá de cima, como se o estivessem a crucificar a sério:
-Não lhe mexa que é pior!!!

P.S.  Desculpem qualquer coisinha!

Ernesto Hipólito

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Quem aprende...

Como eu salvei hoje um rebanho de cabras

Acordei de manhã com a boa disposição de quem regressará à noite a São Vicente. Preparei os filhos e as malas e rumámos às escolas. Por ser ainda cedo, alterei a ordem natural das entregas e fui deixar o Tiago primeiro.
Ao chegar à rua da escola, deparámo-nos com um rebanho de cabras à solta, trazendo duas delas as cordas a arrastar no chão. As pessoas que por ali estavam exibiam no rosto a sua máscara de espanto e as crianças olhavam os animais como quem vê os ETS da Gardunha e algumas choravam com medo.
Estavam todos tomados pela apatia que se apossou de quase toda a Humanidade. Como aquela senhora, já de idade, que há tempos ficou muito surpreendida com o meu cumprimento, quando se sentou ao meu lado num banco de jardim. A mesma apatia que impede quase toda a gente de repreender os filhos dos outros quando estes disparatam na ausência dos pais.
Mas, regressando às cabras... Disse ao meu Diogo que agarrasse uma corda e eu agarraria a outra. Ele ainda tentou recusar, mas eu incitei-o a ser valente, posto que os animais são mansinhos e até dão leite. Lá fomos devagarinho, para não as assustar, e depois de estarem em nossa posse era ainda preciso descobrir quem era o dono.
Houve palpites para todos os gostos, que eram do Manel ou do Carlos ou de mais não sei quem...Uma senhora cheia de pressa garantiu-me que pertenciam à Lurdes, que fosse por aquele caminho agrícola e virasse à direita, depois de um bocado encontraria a casa das cabras, onde as poderia fechar.
Fiz-me ao caminho, agarrei nas duas cordas e com o Diogo atrás delas com um pau para as convencer a avançar.  
Chegados ao sítio indicado, numa área de mata deserta de pessoas, deparámo-nos com um palheiro cheio de ovelhas.
- Rais parta o damonho, nesta terra nem sabem distinguir cabras de ovelhas!
Resolvi amarrar as cabras a duas árvores e voltar aos meus afazeres. Ficaram todas contentes a comer folhas dos arbustos.
No caminho de regresso, encontrámos o pastor com o seu cajado. Trazia um sorriso enigmático no rosto. Indiquei-lhe a localização dos animais e segui o meu caminho sem ouvir um bem-haja…
E foi assim que salvei um rebanho de cabras ou atrapalhei a vida de um pastor.

Ana Gramunha

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segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Óbitos, 1800

ÓBITOS
Registos Paroquiais de São Vicente da Beira
1800

 - Aconteceu uma desgraça na Senhora da Orada, em 1800: um filho do ermitão perdeu-se e foi encontrado já morto (ver n.º 7).
 - Neste ano, faleceram 34 pessoas, duas delas meninos gémeos (n.º 33), provavelmente acabados de nascer.
 - Os menores falecidos são 14, que representam 41% do total dos óbitos.
Nota: a maioridade alcançava-se aos 15 anos.
 - Dos 18 adultos falecidos, 11 foram considerados pobres (61%), pois não teriam nada para pagar a cova e o serviço fúnebre à Igreja. Conclusão: mais de metade da população vivia em total pobreza. Aliás, morreu-se mais na primavera, quando os cereais do verão passado já se tinham acabado e por isso os corpos, mal alimentados, não resistiram às maleitas primaveris.
 - Quando morria um homem, registava-se que estava casado com…
Quando morria uma mulher, era a mulher de fulano de tal.
 - Ainda se faziam enterramentos na Igreja da Misericórdia ou no adro entre a Igreja Matriz e a Misericórdia, mas em que a irmandade tinha sepulturas (n.º 14).
 - Todos os enterramentos registados foram realizados em São Vicente.
 - No ano de 1800, nasceram 32 crianças e faleceram 34 pessoas. Saldo fisiológico: -2.

1
Izabel Rodrigues
Naturalidade: Partida
Família: mulher de Joaõ Antunes
Data: 09/01/1800
Nota: pobre

2
João
Naturalidade: São Vicente
Família: filho de Romualdo de Proença e Maria Duarte
Data: 26/01/1800
Nota: solteiro

3
Uma menina
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Domingos Alvez e Tereza de Jesus
Data: 12/03/1800
Nota: batizada pela parteira, por vir em perigo de vida

4
Luis Roque
Naturalidade: Mourelo
Família: casado com Antonia Leitoa
Data: 26/03/1800
Nota: pobre

5
Jozefa (menor)
Naturalidade: Violeiro
Família: filha de Antonio Roiz(Rodrigues) e Inocencia Martins
Data: 27/03/1800

6
Paula Roque
Naturalidade: Violeiro
Família: mulher de Domingos Gonçalves
Data: 31/03/1800

7
Jacinto (menor)
Naturalidade: São Vicente (Senhora da Orada)
Família: filho de Ricardo Joze e Gertrudes Maria
Data: 01/04/1800
Nota: tinha-se perdido e foi encontrado morto

8
Francisca Maria
Naturalidade: São Vicente
Família: mulher de Joze Mendes Carepa
Data: 03/04/1800
Nota: pobre

9
Tereza Jozefa (solteira)
Naturalidade: São Vicente
Família: não indicada (seria adulta)
Data: 05/04/1800
Nota: pobre

10
Maria Roza
Naturalidade: São Vicente
Família: mulher de Joze Vas
Data: 11/04/1800
Nota: pobre

11
Maria da Costa
Naturalidade: São Vicente
Família: mulher de Luis Mendes
Data: 18/04/1800
Notas: pobre; sepultada em cova da Misericórdia, por esmola do provedor

12
Manoel (menor)
Naturalidade: Violeiro
Família: filho de Ivo Joze e Izabel Fernandes
Data: 28/04/1800

13
Joze Roiz
Naturalidade: Paradanta
Família: casado com Maria Nunes
Data: 30/04/1800

14
Maria (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Caetano Duarte e Maria da Ressurreiçaõ
Data: 30/04/1800

15
Leonor (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Domingos Pedro e Francisca Maria
Data: 26/05/1800

16
Maria (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Manoel Lopes e Cicilia Maria
Data: 10/06/1800

17
Maria (menor)
Naturalidade: Vale de Figueiras
Família: filha de Manoel Rodrigues e Maria Nunes
Data: 26/06/1800

18
Ignes Gonçalves
Naturalidade: Partida
Família: Viúva de Antonio Rodrigues
Data: 24/07/1800
Nota: pobre

19
Francisco (menor)
Naturalidade: naturalidade desconhecida, a viver em São Vicente
Família: enjeitado, dado a criar a Anna Luiza, mulher de Joze Barrozo
Data: 05/08/1800

20
Ignes (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: Bernardo Joze Leal e Maria de Saõ Joze
Data: 14/08/1800

21
Joaõ Joze
Naturalidade: São Vicente
Família: casado com Maria Lourença
Data: 15/09/1800

22
Manoel de Almeida
Naturalidade: São Vicente
Família: casado com Tereza de Jesus
Data: 05/10/1800
Nota: pobre

23
Domingos Joze Dias
Naturalidade: São Vicente
Família: viúvo de Maria dos Santos
Data: 12/10/1800

25
Domingos Ferreira
Naturalidade: São Vicente
Família: casado com Maria Jorge
Data: 15/10/1800
Nota: pobre

26
Antonio Roiz(Rodrigues)
Naturalidade: natural das Sarzedas, mas a viver em São Vicente
Família: casado com Maria do Carmo
Data: 03/11/1800
Nota: pobre

27
Joze Caetano de Abrunhoza
Naturalidade: a viver em São Vicente
Família: casado com Caetana Maria
Data: 08/11/1800
Nota: pobre

28
Manoel Roiz(Rodrigues) Francês
Naturalidade: Mourelo
Família: viúvo de Custodia Gonçalves
Data: 10/11/1800

29
Domingos Vas Rapozo
Naturalidade: São Vicente
Família: casado com Ignes Maria
Data: 17/11/1800

30
Anna (menor)
Naturalidade: São Vicente
Família: filha de Joze Caetano e Anna Rita
Data: 28/11/1800

31
Manoel (menor)
Naturalidade: Partida
Família: filho de Joaõ Antunes e Izabel Rodrigues (já defunda)
Data: 13/12/1800
Nota: tinha 12 anos

32
Bonifacio Leitaõ
Naturalidade: Mourelo
Família: casado com Maria Rodrigues
Data: 20/12/1800

33
Domingos e Francisco (menores gémeos)
Naturalidade: São Vicente
Família: Joaõ Bernardo e Francisca Maria
Data: 26/12/1800

José Teodoro Prata