quinta-feira, 22 de maio de 2025

Restauro do retábulo do altar da Orada

 

No próximo domingo, dia 25 de maio, pelas 12:20h, realizar-se-á a cerimónia de inauguração do restauro do retábulo da ermida de Nossa Senhora da Orada, São Vicente da Beira, evento integrado na romaria anual à mesma Senhora.

Este acontecimento reveste-se de enorme importância, pois o dito retábulo, que adorna o altar-mor da capela, é policromado, data do século XVII e foi trazido da Igreja de São Francisco do extinto convento das religiosas franciscanas, que existiu nesta vila entre meados do século XVI e 1834, data da sua extinção.

E à enorme importância deste evento acresce o facto de o dito retábulo se encontrar em péssimo estado, a desfazer-se em pó, temendo-se a sua perda irreversível, se não fosse recuperado já.

Bastava esta obra para que o nome de Leopoldo Rodrigues, o presidente da Câmara que tornou esta recuperação possível, fique ligado para sempre à valorização do nosso património cultural e religioso. Por mim, o meu profundo obrigado.

(A foto do brasão franciscano do retábulo é do Jaime da Gama e foi tirada em 2015)

José Teodoro Prata

terça-feira, 20 de maio de 2025

segunda-feira, 19 de maio de 2025

Legislativas 2025

 Como aconteceu em todas as eleições legislativas, desde que existe este blogue (2009), o vencedor na nossa freguesia foi o mesmo a nível nacional. Os dados apresentam-se pela seguinte ordem: freguesia de SVB, concelho de CB e todo nacional (ainda sem estrangeiro):

PSD-CDS: 40,03 / 30,79 / 32,08%

PS: 24,36 / 30,79 / 23,39%

CH: 21,12 / 28,48 / 22,60%

IL: 1,36 / 3,92 / 5,51%

L: 2,21 / 2,87 / 4,18%

PCP-PEV: 1,36 / 1,63 / 3,04%

BE: 1,02 / 1,64 / 2,00%

PAN: 0,68 / 1,00 / 1,35%


José Teodoro

terça-feira, 13 de maio de 2025

Milho-rei

Na última sessão do projeto Conta-me histórias, realizada no Casal da Fraga, o Marinheiro e o Chico Insa falaram da descamisa, nas Quintas, onde houveram nascimento e criação. E a Teresa Marcelino cantou as cantigas que nela se cantavam. Depois a Libânia escreveu este texto, com as histórias que contaram e outras informações que recolheu.

Gosto de broa. Tanto que, em tempos, quase achava estranho o desabafo de quem, como os nossos pais e muitas gerações de avós, não teve outro pão em criança: «Quero cá agora broa! Enchi a barriga dela em novo, que era o pão que havia: broa e centeio; trigo, só nas Festas.» Quase achava estranho porque me lembrava dela ainda a fumegar, aberta pelas mãos da minha avó, logo à saída do forno, regada com um fio de azeite. E era um regalo, nos dias em que passava a Ti Palmira, o Maiaca ou o Pinura, uma fatia de broa com uma sardinha assada a pingar por cima, comida nas escadas da Casa do Casal, entrada de tanta gente…

 

Não vão longe os tempos em que, fins de abril, princípios de maio, todos os lameiros à roda da Ribeira estavam prontos para a sementeira do milho. Era trabalho para toda a família e, se fosse preciso, podia sempre contar-se com a mão de algum vizinho. Depois da semente na terra, estando a Lua de feição, passado pouco tempo era um mar de verde por aí acima.

Durante meses não havia descanso a arrelentar, sachar, mondar e regar. Em alturas de seca havia quem tivesse que regar a meio da noite, alumiado pela Lua ou à luz da lanterna (em tempos idos, o avistamento destas luzes alimentou o imaginário popular, que acreditava tratar-se de almas penadas a vaguear pelo mundo). Lá para finais de setembro o milho estava pronto a ser colhido. Nos anos bons, cada grão deitado à terra dava umas três maçarocas. Não haveria fome na mesa nem na manjedoura.

Naquele tempo, entre o Rabaçal, o Vale Caria, a Senhora da Orada, o Ribeiro Dom Bento e as Quintas viviam para cima de dez famílias, algumas com muitos filhos. Quase toda a gente tinha terras suas, e quem não tinha arrendava-as ou tratava-as ao terço, como a Ti Maria Etelvina ou o Ti Luís Teodoro, que eram terceiros do António Neto.

Era uma vida difícil e de muito trabalho. As crianças vinham a pé para a escola, às vezes descalças e mal agasalhadas. Há quem ainda não se tenha esquecido dum par de reguadas em cada mão só porque, para fugir dum aguaceiro, se demorou num curral à espera que estiasse. Há também quem ainda sinta o gelo a estalar na sola dos pés, memórias de quando vinha por aquele caminho abaixo, nas manhãs frias de inverno.

Os mais velhos trabalhavam de sol a sol durante quase todo o ano. Domingos, só para a missa; quando muito, um copo com algum amigo, que o ganal não esperava. Só se perdia algum dia para ir ao mercado ou à feira do Fundão, onde se aviava o que era preciso e vendia o que se pudesse, quase sempre alguma cabeça de gado. Com tanto trabalho, não havia tempo para grandes folguedos, mas qualquer oportunidade que aparecesse servia para tirar a barriga de misérias. Era assim no tempo das descamisas.

 

«Antigamente as pessoas eram mais dadas e ajudavam-se umas às outras naquilo que podiam. Na altura de colher o milho, era só dizer:

 - Ó Ti Matias (é só um exemplo), amanhã vamos colher o milho, apareçam para a descamisa.

No fim da ceia as pessoas iam chegando, as que tinham sido convidadas e outras só por terem ouvido dizer. Naquele tempo havia poucas ocasiões para divertimentos, e as descamisas, por serem à noite, eram oportunidades que ninguém queria perder, principalmente os rapaz e as raparigas. Quando se sabia duma, passava-se logo a palavra. 

À medida que chegavam, sentavam-se numa roda à volta do monte de milho colhido durante o dia. Não havia lugares marcados, mas toda a gente fazia por se sentar ao pé de alguém por quem tinha alguma preferência, às vezes amores secretos. Arranjaram-se muitos namoros assim.

Os serões eram sempre animados a contar piadas e anedotas que punham toda a gente a rir; e quando alguém começava a cantar:

 

Ó malmequer mentiroso,

Quem te ensinou a mentir?

 

 Toda a gente ia atrás:

 

Tu dizes que me quer bem,

Quem de mim anda a fugir.

 

Desfolhei o malmequer

Num lindo jardim de Santarém,

Malmequer, bem me quer,

Muito longe está quem me quer bem.

 

Malmequer não é constante,

Malmequer muito varia,

Vinte folhas dizem morte,

Treze dizem alegria.

 

E atrás desta vinham outras: “Milho verde”, “No cimo daquela serra”, “Água leva o regadinho”… Mas as mãos não paravam, entre a pressa de acabar o trabalho para começar a festa, e a cata de uma maçaroca vermelha.

Quando se ouvia gritar:

- Milho-rei! Milho-rei!

Calava-se tudo a ver quem tinha sido o felizardo ou a felizarda. Quem quer que fosse, levantava-se e corria a roda a dar um abraço a toda a gente. Para os mais novos era uma libertação, que podiam abraçar-se às claras, sem a censura própria daqueles tempos. Desconfiava-se mesmo que alguns rapazes já levavam de casa uma maçaroca vermelha, só para poderem abraçar as raparigas.

No fim do trabalho, os donos ofereciam qualquer coisa para comer e beber, quase sempre pão com queijo, passas, maçãs… e aguardente para os homens ou jeropiga para as mulheres A seguir fazia-se um bailarico ao toque de realejo. Naquele tempo havia muitos rapazes que sabiam tocar bem, mas o Joaquim Feijão, o João Borrego e o Manel Primo, que vinha do Casal da Serra de propósito, eram dos melhores e estavam lá sempre caídos.

O meu pai é que, mal começava o baile, punha-se logo:

- Ó meninos, dois palmos, dois palmos!

E levantava as mãos espalmadas, unidas pelos polegares. Até parecia que se pegava algum mal, quando o que a gente queria era divertir-se.

E por aqueles dias havíamos de ter outros serões iguais, quer fosse na descamisa do António Remualdo, do Francisco Insa, do João Serra, do António Passaraço, ou doutro vizinho qualquer.»

ML Ferreira

terça-feira, 6 de maio de 2025