segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Os brinquedos dos afetos

Foi assim que a Maria José Simão definiu aos brinquedos que doou ao GEGA, para a criação de um museu na nossa terra. Alguns, já mais antigos, vêm do tempo dos seus pais e dela própria, mas a maior parte foram os brinquedos dos seus filhos. Um ato de grande generosidade!



Para além da família Simão, muitas outras pessoas da nossa terra doaram ou emprestaram também os seus brinquedos e a sala da antiga Junta de Freguesia, nos antigos Paços do Concelho, quase que ia ficando pequena para expor tantos e tão variados brinquedos.
 




E para tornar esta exposição ainda mais interessante, alguns dos mais habilidosos da nossa terra recriaram muitos dos brinquedos que marcaram a infância da maior parte de nós:




(Por trás das “pistolas”, brinquedos feitos de carcódia de pinheiro)

               


 (Com uma baraça e duas pinhas fazia-se uma junta de bois)



Para além dos afetos, quantas memórias...
Parabéns a todos!


(Poema apresentado pelas técnicas da APPACDM de Castelo Branco que falaram sobre o brinquedo e a importância do brincar na infância.)

M. L. Ferreira 

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Ventania



Nesse tempo trabalhava no Refúgio, a construir um prédio de três andares, fora a cave. O teu tio andava em Aldeia de Carvalho, noutra obra, mas veio ajudar-me a deitar o telhado. No fim do dia, o patrão levou-o de volta e eu fiquei lá sozinho, porque o servente ia a dormir a casa.
O tempo já andava frio e nesse dia fazia muito vento. Vimo-nos aflitos para acabar de telhar, sempre de gatas e sentados, para não sermos levados pelo vendaval. Quando eles abalaram, desci para a cave do prédio, que era onde eu dormia. Lavei-me e mudei de roupa e depois preparei qualquer coisa para o jantar. Tinha lá um fogão a gás, pequenito, mas que desenrascava. Fiquei um bocado a ouvir o rádio e depois deitei-me, porque estava maçado e já começava a fazer frio. Debaixo das mantas, com as costas direitas e as pernas estendidas, estava-se melhor. Quando veio o sono, desliguei o rádio e comecei a dormir.
Acordei com um barulho enorme, não sei que horas eram. Apalpei a caixa de fósforos e risquei um. Tirei a chaminé do candeeiro e acendi-o. Vi no relógio de pulso que era quase uma da manhã. Ouvia-se o barulho de chapas a bater. Devia ser do vento. Deixei-me ficar debaixo das mantas. Mas o barulho continuava, às vezes ouviam-se coisas a rebolar.
Levantei-me e vesti uns agasalhos, para ir ver o que se passava. Fui às escuras, a tatear o caminho, porque não valia a pena levar o candeeiro comigo, com aquela ventania. Na escadaria, fui sempre encostado à parede, pois ainda estava em grosso, sem proteção. Quanto mais avançava, mais claro se via, da iluminação da rua. Cheguei à porta e vi a razão daquele barulho tudo. Estava um vendaval dos diabos e já tinha derrubado o taipal que fazia de porta.
Na rua não havia vivalma, nem carros passavam na estrada da Covilhã para o Tortosendo. O meu pensamento foi logo para o telhado, que tínhamos acabado de deitar, mas ainda não estava arrematado. Se o vento pegasse numa ponta, destelhava-o todo.
Saí para a estrada e fui andando até um certa distância, de onde conseguisse ver o telhado. Estava tudo bem. Caminhei em sentido contrário, para ver do outro lado. Não havia tanta luz, mas parecia ver-se uma telha levantada. Andei para o lado, para ver melhor e lá estava ela. Fiquei à rasca. Mal para me ir deitar e acordar de manhã com as telhas todas no chão, mal para subir ao telhado sozinho, com tanto vento e um frio de rachar que vinha da serra.
Voltei ao prédio e subi até ao terceiro andar. Não foi difícil, por causa da luz dos candeeiros públicos. Depois trepei por uma janela para o andaime e continuei a subir até ao nível o telhado. A ventania abanava o andaime todo, abençoado tempo que tínhamos gasto a prendê-lo bem. Alcei-me para o telhado e fui-me arrastando, deitado, até à telha levantada. Não podia estar em sítio pior, junto à empena, num lugar desprotegido do vento.
Cheguei lá e peguei na telha, mas já não sentia as mãos. Tive de as meter debaixo da roupa, rente ao corpo, para aquecerem. Depois coloquei a telha no sítio e ajeitei as outras em volta. O regresso custou ainda mais, porque estava cada vez mais gelado e o corpo já mal me obedecia. Mas consegui sair do telhado sem novidade e depois desci para a cave.
Ainda me lembrei de acender um caldeiro de paus, para me aquecer, mas não tinha ação para nada. Meti-me na cama, vestido e tudo, só tirei as botas. Demorei a aquecer, mas lá acabei por adormecer.
Podia ter morrido naquele telhado, sozinho, sem ninguém saber. O meu patrão é que ficou a ganhar, aquele cabeçudo. Eu e o teu tio chamávamos-lhe o Cabeça Grande. Mas um dia trabalhámo-nos, porque ele trouxe uma boina dele para o teu tio e não lhe servia. Ele deu-ma a experimentar a mim e também não cabia na minha cabeça.

José Teodoro Prata

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Óbitos, 1807

ÓBITOS, 1807
Paróquia de Nossa Senhora da Assunção
São Vicente da Beira

- Morreu o vigário Francisco Marques Goulão (registo n.º 22) e foi sepultado em cova própria dos vigários desta Igreja. Sabemos que ela se situava no altar-mor, pelo testamento do Vigário Joze Pegado de Sequeira, falecido em 1767. O cura Domingos Joze Marques Goulão Esteves assumiu o cargo de vigário, talvez apenas interinamente.
- A Joana Jozefa (n.º 7) era criada de Dona Ignes Caetana, viúva de Francisco Caldeira.
- Morrem mais viúvos que viúvas; as mulheres morriam primeiro, em consequência de complicações dos partos.
- Mais uma criança (ou jovem) vítima de afogamento, desta vez no Vale de Figueiras (n.º 11).
- A Dona Izabel (n.º 3) foi sepultada na Igreja da Misericórdia. Ainda lá se faziam enterramentos, em 1807!
- O Bernardo Joze, de São Vicente da Beira, enterrou a mulher em abril (n.º 9) e o filho em agosto (n.º 20).
- O soldado Joze Lourenço (n.º 27), do Tripeiro, faleceu em outubro, mas a Invasão Francesa começou apenas cerca de um mês depois. Dos óbitos a partir de 20 de novembro, dia da entrada dos franceses em Castelo Branco, nenhum mostra ser consequência da invasão.
- A bebé Antonia (n.º 41) e um menino (n.º 28) foram batizados em casa, mas já não na Igreja, por isso os registos de batismo não foram feitos.
- Ano de 1807: 46 registos de batismo + 2(n.º 28 e n.º 41) – 42 óbitos = +6 de saldo fisiológico.

1
Nome: Maria
Família: solteira
Data: 06/01/1807
Observações: só recebeu o sacramento da extrema-unção, por ser demente e muda

2
Nome: Joze Francisco Diabinho
Família: casado com Jozefa Leitoa, do Mourelo
Data: 17/01/1807
Observações: não recebeu sacramentos, por não chamarem e por ser de repente

3
Nome: Dona Izabel
Família: viúva de Domingos Antunes Bicho, de São Vicente da Beira
Data: 07/02/1807
Observações: foi sepultada na Santa Casa da Misericórdia

4
Nome: Antonia Leitoa
Família: viúva de Luis Roque, do Mourelo
Data: 28/02/1807

5
Nome: Domingos
Família: exposto, dado a criar a Joze Leitaõ e sua mulher, dos Pereiros
Data: 09/03/1807

6
Nome: Francisco Antonio dos Santos
Família: de São Vicente da Beira
Data: 10/03/1807

7
Nome: Joana Jozefa
Família: solteira, criada de Dona Ignes
Data: 15/03/1807

8
Nome: Joana
Família: solteira, filha de Faustino Lourenço, do Tripeiro
Data: 18/03/1807

9
Nome: Joana Leitoa
Família: mulher de Bernardo Joze, de São Vicente da Beira
Data: 17/04/1807
Observações: não recebeu a extrema-unção, por não avisarem a tempo

10
Nome: Antonio
Família: solteiro, filho de Antonio Rodrigues e Maria dos Santos, do Mourelo
Data: 22/04/1807

11
Nome: Antonio Leitaõ
Família: solteiro, filho de Joaõ Rodrigues e Maria Leitoa, do Vale de Figueiras
Data: 07/05/1807
Observações: morreu afogado

12
Nome: Luiza Maria
Família: viúva de Joze Mendes, de São Vicente da Beira
Data: 01/06/1807

13
Nome: Francisco (menor)
Família: filho de Joze Vas e Anna Rita, de São Vicente da Beira
Data: 04/06/1807

14
Nome: Jozefa (menor)
Família: filha de Joaõ Antunes e Maria Antonia, de …(ilegível)
Data: 09/06/1807

15
Nome: Domingos (menor)
Família: filho de Joaõ Leitaõ e Maria Vitoria, de São Vicente da Beira
Data: 10/06/1807

16
Nome: Manoel Nunes da Trindade
Família: não indicada
Data: 06/07/1807

17
Nome: Joze Mendes da Cunha
Família: de São Vicente da Beira
Data: 19/07/1807

18
Nome: Anna (menor)
Família: filha de Joaõ Antunes e Maria Antonia, do Mourelo
Data: 23/07/1807

19
Nome: Manoel Mendes
Família: casado com Joaquina Leitoa, do Mourelo
Data: 08/08/1807

20
Nome: Joaõ (menor)
Família: filho de Bernardo Joze, viúvo, morador em São Vicente da Beira
Data: 22/08/1807

21
Nome: Maria Nunes
Família: viúva de Joze Mendes, de São Vicente da Beira
Data: 08/09/1807

22
Nome: Reverendo Vigário Francisco Marques Goulaõ
Família: não indicada
Data: 10/09/1807
Observações: foi sepultado em cova própria dos vigários desta Igreja

23
Nome: Leonor (menor)
Família: filha de Hipolito de Jesus e Brigida Maria, de São Vicente da Beira
Data: 11/09/1807
Observações: tinha 8 anos e não recebeu sacramentos, por não terem chamado o cura

24
Nome: Manoel Fernandes Ramalhozo
Família: casado com Maria Mendes, do Tripeiro
Data: 18/09/1807

25
Nome: Jacinto (menor)
Família: exposto, dado a criar a Maria Francisca, casada com Domingos Rodrigues, da Partida
Data: 26/09/1807

26
Nome: Maria Pires
Família: viúva de Antonio Gonçalves, do Violeiro
Data: 28/09/1807

27
Nome: Manoel Rodrigues Diabinho
Família: viúvo de Izabel Francisca, do Tripeiro
Data: 16/10/1807

28
Nome: um menino
Família: filho de Joze Luis e Maria Fernandes, do Mourelo
Data: 03/10/1807
Observações: foi batizado em casa e faleceu

29
Nome: Joze Lourenço
Família: soldado, casado com Joana Leitoa, do Tripeiro
Data: 22/10/1807

30
Nome: Joze (menor)
Família: filho de Joaõ Joze e Maria Clara, de São Vicente da Beira
Data: 27/10/1807

31
Nome: Rita Maria
Família: viúva de Antonio Rodrigues, da Partida
Data: 29/10/1807

32
Nome: Maria Pereira
Família: casada com Joze Luis, do Mourelo
Data: 01/11/1807

33
Nome: Antonio Pereira
Família: viúvo de Vitoria Maria, de São Vicente da Beira
Data: 08/11/1807

34
Nome: Antonia (menor)
Família: filha de Domingos Mendes e Ignes Maria, de São Vicente da Beira
Data: 08/11/1807

35
Nome: Francisco (menor)
Família: filho de Gonçallo Duarte e Jozefa da Silva, de São Vicente da Beira
Data: 12/11/1807

36
Nome: Carlota (menor)
Família: filho de Gonçallo Duarte e Jozefa da Silva, de São Vicente da Beira
Data: 16/11/1807

37
Nome: Teodozio Duarte
Família: viúvo de Maria Candeas, de São Vicente da Beira
Data: 16/12/1807

38
Nome: Manoel (menor)
Família: filho de Joaõ Barata e Anna Gonçalves, do Violeiro
Data: 20/12/1807

39
Nome: Joze Alves
Família: dos Pereiros
Data: 2/12/1807

40
Nome: Manoel Gonçalves
Família: viúvo de Maria Francisca, da Paradanta
Data: 23/12/1807

41
Nome: Antonia (menor)
Família: filha de Joze Fernandes Sapateiro e Maria Pires, do Violeiro
Data: 28/12/1807
Observações: foi batizado em perigo de vida, particularmente

42
Nome: Manoel Pereira
Família: casado com Maria Pascoa, do Violeiro
Data: 28/12/1807

José Teodoro Prata