sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

As pedras do convento

Sempre me disseram que as pedras do antigo convento são as do muro da Quinta da Casa Cunha, ao longo da Rua de São Sebastião.
Agora encontrei a ata da sessão da Junta da Paróquia em que as pedras foram vendidas. Foi no dia 24 de Agosto de 1845, sendo presidente o Reverendo Vigário Manuel Marques Leite e vogais José Henriques Sénior e João da Conceição, este também escrivão do regedor, Francisco Rodrigues Lobo.
Antes de dar a notícia, tenho de informar que o convento foi extinto em 1835 e, na altura, já estava parcialmente arruinado, residindo nele apenas a Madre Abadessa. Dez anos depois, 1845, nem todo o convento estava na posse da Junta da Paróquia. Parte dele já fora comprado por um particular, o Pe. Joaquim Castanheira (a ata que o refere não indica qual a parte). Mas a Igreja de São Francisco mantinha-se pública e de pé, havendo até diligências no sentido de ser reconstruída nas partes a necessitarem de obras. Assim, a pedra vendida era a que resultava da demolição da parte do convento administrado pela Junta da Paróquia, com exclusão da igreja.


Nesse 24 de Agosto, às 11 horas da manhã, o presidente da Junta ordenou ao vogal João da Conceição que dissesse ao pregoeiro da Câmara, Manuel Francisco, para pôr a lanço, a quem mais desse, «…a pedra das paredes demolidas do extinto comvento desta Villa pertencente aesta Parochia, a Vinte reis cada carrada…».
O pregoeiro apregoou várias vezes e depois veio informá-lo que «…perante elle tinhaõ comparecido o Ill.mo Joaõ Robalo da Cunha, Joaõ Pereira de Carvalho, e Joaõ da Silva Lobo por si e como arrematante em nome da Ex.ma D. Anna de Brito Coelho de Faria todos desta Vila eque todos unanimamente tinhaõ coberto olanço da Junta com hum real, eque nada houvera quem lhe cobrisse este Lanço de Vinte ehum reis por cada carrada…».
Informado disto e não havendo quem desse mais, o presidente mandou entregar o ramo aos quatro arrematantes, pegando nele João da Silva Lobo a rogo dos outros. Foram depois todos ter com o presidente à sacristia da Igreja Matriz, sede da Junta da Paróquia, onde ele lhes disse que levassem a pedra que precisassem, arrematando-se a restante, novamente, caso não a gastassem toda.

4 comentários:

Anônimo disse...

E assim desapareceu definitivamente parte do património da Vila...

Quadrisneto do Conde da Borralha disse...

São os frutos dos tempos! Nada se pode fazer para alterar o passado, mas é importante dar a conhecer estes factos históricos! O altar da dita igreja foi removido para a capela da Srª da Orada, se verificarem com atenção nele está a prova pois lá tem um brasão com a mão de Cristo e de s. Francisco unidas por um cravo! Facto esse que me leva a esta conclusão

José Teodoro Prata disse...

A sua conclusão está certa.
Seria bom manter-se em contacto, pois vou publicar um livro a breve prazo (já está impresso) que tem muitas informações sobre a sua família, em São Vicente, na segunda metade do século XVIII (sobre os avós do 1.º visconde da Borralha).
Neste blogue, consulte a publicação "A Canada dos Carqueijais".

Anônimo disse...

Ao ler o excerto de "Pelourinhos da Beira Interior. Uma página esquecida na História de Portugal" por António Maria Romeiro Carvalho, em "Açafa On Line", nº 6 sw 2013, lembrei-me de imediado da história que aqui contou sobre o antigo convento que existiu em São Vicente da Beira e da venda das suas pedras.

Aqui vaí! Cumprimentos, Hugo Martins

"É errado pensar que os portugueses se preocupam ou preocuparam com a conservação do património cultural, arquitectónico ou outro. Ontem, como hoje, é vulgar a mudança do nome de ruas, largos e outros. Por pouco que se goste de Salazar, a ponte 25 de Abril era Salazar. Por muito que se goste do «nosso» presidente da Câmara Municipal, a Rua da Porta ou a Rua Direita são-no há séculos e não do senho...r presidente.

Antes da década de 1940, escreve Martins: «quem percorresse o País quase não encontraria castelos. Reduzidas as antigas fortalezas medievais a montes de pedras, só a custo se conseguiria divisar aqui ou ali um pedaço de muralha, um vestígio de escadaria ou uma torre arruinada […] Se, num belo dia de 1836, um dos vereadores vimaranenses tivesse votado de forma diferente numa reunião camarária, o Castelo de Guimarães teria sido demolido e a sua pedra utilizada para calcetar as ruas. Foi por um só voto que saiu derrotada a proposta nesse sentido apresentada pela Sociedade Patriótica Vimaranense».

Foi o Estado Novo que, como é vulgar apanágio dos regimes ditatoriais, pôs de pé os castelos de Portugal, como hoje os conhecemos, para glória da Nação, mas pouco ou nada tendo a ver com a realidade da Baixa Idade Média. O mesmo se passou com Igrejas e Sés, caso da Sé de Lisboa ou do mosteiro de Santa Clara a Velha, em Coimbra, que foram reconstruídos de acordo com o original, mas não se conhecendo, ao certo, como era o original.

(...)

Outro exemplo é Idanha-a-Nova. Observando o seu castelo no Livro das Fortalezas (1510), vê-se uma construção imponente. Hoje, pouco resta, além de um pedaço da Torre de Menagem. A maioria das pedras devem jazer na estrada que liga a Senhora da Graça a Idanha-a-Nova, construída em 11 meses, no ano de 1867. Como escreve Catana, «sempre ouvi falar que grande parte dos panos de muralha do castelo de Idanha-a-Nova fora utilizada na construção dos muros de suporte da estrada que liga a Vila à ponte da Senhora da Graça». No referido Livro das Fortalezas vem um pelourinho de gaiola. Também desapareceu. Segundo Catana (2008) terá sido destruído em 1837. Contudo, parece-nos que não terá sido o pelourinho de gaiola que aparece no Livro de Armas (1510), antes um pelourinho semelhante aos actuais do Concelho. Isto porque, seguindo o mesmo autor, o Padre José Lopes Xisto responde à pergunta se a vila tinha brasão de armas: «tinha Pelourinho e casa da Câmara, que foi tudo destruído em 1837». Se fosse o pelourinho de Gaiola, face à sua monumentalidade, teria sido objecto de mais algumas linhas. Além disso, o padre responde em 1858, 21 anos depois da destruição, o que indica existirem muitos homens e mulheres ainda vivos que assistiram à destruição.

(...)

Mas não é só o caso e Idanha-a-Nova. Em 1510, tinham castelo Idanha-a-Nova, Segura, Salvaterra, Penha Garcia e Monsanto. Resta este, pois o de Penha Garcia não passa de uma reconstrução (se é que se pode falar de uma reconstrução) recente."