quinta-feira, 18 de julho de 2013

Pardais, melros, pintassilgos...

Bem me lembro deste poema [ver comentário do Zé Barroso, na publicação anterior], já não sei se do livro de leitura da telescola, ou dos primeiros anos do liceu. Mesmo sabendo que as palavras de Olavo Bilac são uma metáfora de tantas outras prisões a que a vida nos sujeita, foi a partir dele que tive consciência do mal que fazia quando andava aos ninhos e tirava os passarinhos, ainda mal vestidos, para os meter numa gaiola. Pensava eu que estava a protegê-los, mas acabavam quase sempre por morrer…
Talvez para me penitenciar por todo o mal que fiz em criança, agora não me importo muito se os pardais, os melros ou os pintassilgos do meu quintal andam por lá livremente e me comem as primeiras cerejas ou as alfaces acabadas de plantar. Quanto às andorinhas, é uma canseira andar sempre de vassoura e esfregona na mão para limpar tudo o que sujam; mas nada se compara à emoção de assistir a todas as fases e rituais por que passam, desde o refazer do ninho do ano anterior, até ao primeiro voo. Fazem ver a muitas famílias de humanos!
Na fotografia que a Luzita publicou, se não soubéssemos que os andoriscos estavam à espera de comida, mais parecia que estavam a posar para a máquina… Lindos!

M. L. Ferreira


O PÁSSARO CATIVO

Armas, num galho de árvore, o alçapão.
E, em breve, uma avezinha descuidada, batendo as asas cai na escravidão.

Dás-lhe então, por esplêndida morada, a gaiola dourada.
Dás-lhe alpiste, e água fresca, e ovos, e tudo.

Por que é que, tendo tudo, há de ficar o passarinho 
mudo, arrepiado e triste, sem cantar?

É que, criança, os pássaros não falam.
Só gorgeando a sua dor exalam, sem que os homens os possam entender.
Se os pássaros falassem, 
talvez os teus ouvidos escutassem este cativo pássaro dizer:

"Não quero o teu alpiste!

Gosto mais do alimento que procuro na mata livre em que a voar me viste.
Tenho água fresca num recanto escuro.

Da selva em que nasci; da mata entre os verdores,
tenho frutos e flores, sem precisar de ti!

Não quero a tua esplêndida gaiola!
Pois nenhuma riqueza me consola de haver perdido aquilo que perdi...
Prefiro o ninho humilde, construído de folhas secas, plácido, e escondido.

Entre os galhos das árvores amigas...
Solta-me ao vento e ao sol!
Com que direito à escravidão me obrigas?

Quero saudar as pombas do arrebol!
Quero, ao cair da tarde, entoar minhas tristíssimas cantigas!

Por que me prendes? Solta-me, covarde!
Deus me deu por gaiola a imensidade!
Não me roubes a minha liberdade...

QUERO VOAR! VOAR!..."

Estas coisas o pássaro diria, se pudesse falar.
E a tua alma, criança, tremeria, vendo tanta aflição.
E a tua mão, tremendo, lhe abriria a porta da prisão...


Olavo Bilac

Um comentário:

Anônimo disse...

Precisamente, Libânia! Conheço este poema do Olavo Bilac do livro de leituras da Telescola, onde o li há mais de... 40 anos! Por alguma razão também não me esqueci dele!
Gostava de ter lido mais o Olavo Bilac, mas nem sempre tem sido possível. Felizmente há muitos e bons poetas e o tempo escasseia. Mas podem sempre fazer-se opções. Acho que é um poeta muito celebrado no Brasil e mesmo em Portugal. Tem um busto em Setúbal numa praça que também tem o seu nome.

Zé Barroso