terça-feira, 2 de julho de 2013

Embruxada

Ainda a propósito da Má Hora, contaram-me há muito tempo a seguinte história, passada na minha família:

Uma das minhas tias foi sempre enfezada e, como ela própria ainda diz, fraca da cabeça. Uma altura, já mulherzinha, andava mesmo muito doente: amarelenta, com fastio, sem vontade de trabalhar… Um tormento para ela e transtorno grande para a família!
Um dia passou por um homem que havia cá na terra e sabia muito destas coisas de Deus e do demónio e até tinha um livro sobre o diabo (seria o Livro de São Cipriano?). Só de olhar para ela, o dito homem fez logo o diagnóstico “Tu andas é embruxada, cachopa!”. E recomendou: “Olha, logo à meia-noite, pões uma panela ao lume, metes lá dentro uma peça de roupa tua e, quando começar a ferver, picas a roupa com um espeto com toda a força. Fazes isto até à uma. Vais ver que quem quer que seja que te anda a fazer mal vai entrar pela fechadura da porta toda encarrapata e, com a vergonha, vai deixar de te apoquentar”.
A minha tia que para além de enfezada e “fraca da cabeça” era muito medrosa, foi ter com a minha mãe e contou-lhe o que o tal homem lhe tinha dito. A minha mãe, mais velha e afoita, mas também muito crente nestas coisas do outro mundo, prontificou-se logo para ajudar.
Então, ainda nessa noite, quando todos já tinham ido para a cama, puseram a panela a ferver ao lume, meteram lá dentro uma combinação e, com toda a força que tinham, espicaçaram-na com o espeto de virar as filhoses durante bastante tempo. Já era quase uma da manhã quando, cansadas e desiludidas, mas se calhar também com medo, desistiram…
No dia seguinte, a minha tia voltou a encontrar o tal homem que lhe perguntou como é que as coisas tinham corrido. Quando ela lhe disse que não tinha aparecido ninguém, ele ficou admirado, mas disse que se calhar elas não tinham feito tudo como devia ser. E se calhar não…

M. L. Ferreira

Nota: Acho muito interessantes estas histórias da Boa e Má Hora, até porque foram delas que se alimentou o imaginário de muitos de nós durante a infância. Ainda hoje gosto de as ouvir… Mas, como sugeriu o Ernesto há dias, acho que prefiro a Hora das Loiras ou doutra coisa qualquer, principalmente se for em boa companhia!

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