sexta-feira, 25 de outubro de 2013

IN ILLO TEMPORE

Pela segunda vez e passados trinta e tal anos, estou a roubar o nome ao livro de Trindade Coelho que ele escreveu a contar as suas aventuras quando era estudante em Coimbra.
A primeira vez que usei este título foi quando foi criado o jornal "O Vicentino" em que eu estava mais ou menos encarregue da parte humorística, vá-se lá saber porquê!
Não vou contar porque tendo nós Vicentinos um jornal, "O Pelourinho", nos fomos meter na aventura de publicar um outro jornal. Só essa história, a sua envolvência, dava um livro bem bonito que DEVIA SER ESCRITO.
Vamos então ao "IN ILLO TEMPORE":
No tempo em que o Chico Manha saiu do Seminário sem ter provado as honras cardinalícias, já outros o tinham feito ou estavam para o fazer. Cada um desabelhou para seu lado à procura de vida mas, quando chegavam as férias, aí os tínhamos a todos a matar saudades da família e amigos.
Numa célebre Quaresma húmida e fria, decidimos por bem ir cantar os Martírios. Que bem que nós cantávamos, ou não fossemos nós ex seminaristas.
Lá ensaiamos e, numa noite em que carujava, saímos para a rua a cantar. 
No Fundo de Vila a coisa correu otimamente mas, já no Cimo de Vila,  quando nos deslocávamos silenciosamente para o próximo local onde iriamos cantar, sai-se de lá o Chico com esta:
- Quadragésima nona estação: Nosso Senhor cai num lapacheiro!!!
Claro que nessa noite não se cantou mais nada de jeito, porque era uma risada pegada.
No dia seguinte, a menina Nelita, que morava no Fundo de Vila, diz-me assim:
- Ai Ernesto, vocês ontem cantaram tão bem!
Entretanto, chega a menina Maria de Jesus (Cimo de Vila) que tanta vez me puxou as orelhas, mesmo muito depois de eu casar, e essa foi logo dizendo:
- O que é que aconteceu ontem que cantastes tão mal?

E queria ele ser cardeal, o sacanita!!!


Ernesto  Hipólito

3 comentários:

José Teodoro Prata disse...

Havia, nos anos 70, da parte dos seminaristas e ex-seminaristas, uma atitude muito mais aberta em relação à divindade do que a das pessoas da Vila, nesse tempo.
A mentalidade do nosso povo era quase a mesma das décadas passadas: submissão, adoração, medo… Mas o Deus em que tínhamos sido educados era muito mais tolerante, mais amigo, mais amor. Não tínhamos medo de brincar com Ele! E isso, por vezes, criava confusões nas mentes das pessoas que nos viam e ouviam.
Por outro lado éramos adolescentes e portanto naturalmente propensos a fazer e dizer parvoíces.
Lembro-me bem desta do lapacheiro, embora não tenha a certeza se estive nesses Martírios. E recordo-me de outra, penso que também da lavra do Chico.
Um dos Evangelhos afirma que, após o desaparecimento do corpo de Cristo do túmulo onde fora sepultado, os apóstolos o procuraram debalde. Ora se dissermos a palavra debalde com uma ligeira pausa entre o de e o balde, o sentido da frase muda. Logo o Chico espalhou a tese de que afinal Cristo não morrera na cruz, mas sim afogado, justificando-se com a tal frase do Evangelho, a que dava a necessário entoação.
Outros tempos!

Anônimo disse...

É bem provável que a Igreja católica estivesse a viver melhores dias se, em vez de padres cinzentos que nos faziam crer que até as coisas mais naturais e inocentes eram pecado, e bom mesmo para a alma era ser pobre, procurasse pessoas felizes e bem humoradas, capazes de se rirem e fazer rir os outros, mesmo das coisas mais sérias! Lá diz o ditado «Um santo triste é um triste santo…».
Pela amostra de ex-seminaristas colaboradores deste blogue (a começar pelo “dono”), só aqui da nossa terra levava uma mão cheia deles… Se calhar ainda bem que não levou porque talvez não nos encontrássemos aqui tantas vezes!
Obrigada, Ernesto, por partilhares connosco esta história e ao José Teodoro que atirou mais uma acha para a fogueira com o comentário que fez.
Agora, só para o Francisco, ainda a propósito dos gafanhotos ou grilos da Senhora da Orada: acabei de ver na Sic Notícias uma reportagem sobre um restaurante em Paris que inclui na ementa gafanhotos e outros insetos gourmet. Para além das proteínas, parece que são ricos em mais uma série de coisas! E, de acordo com os testemunhos, as pessoas estão a gostar!...
Que tal avançares com o projecto?

M. L. Ferreira

Anônimo disse...

Ernesto: Lembro-me bem deste teu título no "Vicentino" e das histórias que contavas com aquele toque final humorístico; histórias muito curtas mas (algumas) finamente irónicas e jocosas, construídas a partir de ocorrências concretas na vila; vividas ou contadas pelos mais velhos; esta já a tinha ouvido, mas é sempre bom recordar.
Deixo-te a palavra para as seguintes (e conto que o Zé Teodoro te dê o espaço correspondente).
Um abraço.
Zé Barroso